Registro de Imóveis – Pedido de providências – Pesquisa eletrônica de bens via Central de Registradores de Imóveis – Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados – Pesquisa on line – Revisão dos dados do fólio real e atualização da qualificação das pessoas que figurarem em cada registro imobiliário, distinguindo-se com exatidão titulares de domínio e as demais pessoas que forem credoras ou devedoras – Requerimento de revogação da determinação.

Número do processo: 195461

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 559

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 2016/195461

(559/2019-E)

Registro de Imóveis – Pedido de providências – Pesquisa eletrônica de bens via Central de Registradores de Imóveis – Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados – Pesquisa on line – Revisão dos dados do fólio real e atualização da qualificação das pessoas que figurarem em cada registro imobiliário, distinguindo-se com exatidão titulares de domínio e as demais pessoas que forem credoras ou devedoras – Requerimento de revogação da determinação.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

A Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARJSP requereu a revogação das rr. decisões, prolatadas no presente procedimento, para que os responsáveis pelas delegações correspondentes aos Registros de Imóveis do Estado de São Paulo promovam a alteração das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados, de maneira que reflitam com absoluta precisão a qualidade de cada pessoa que figure no fólio real (se titular de domínio, ou se credor ou devedor) nas pesquisas feita on line por meio da Central de Registradores de Imóveis (fls. 59/60 e 128/129).

Alega a inviabilidade material de atendimento da determinação que demanda o reexame de todas as matrículas mantidas em cada delegação do serviço extrajudicial de Registro de Imóveis para que sejam identificados os direitos incidentes sobre os imóveis e a qualidade de seus titulares. Esclarece que essa identificação não se mostra possível a partir da leitura das imagens das matrículas que não foram digitalizadas com tecnologia OCR – Optical Character Recognition, nem pela transposição dos dados dos indicadores pessoais porque, ao longo do tempo, foram mantidos pelos responsáveis pelas delegações em livros físicos, sem padrão uniforme. Informa, por fim, que a separação ocorrerá a partir da implantação do Operador Nacional do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico, cujos estatutos são objeto de análise pelo Conselho Nacional de Justiça (fls. 211/219).

Opino.

Como indicado no parecer de fls. 180/183, com a implantação da Central Registradores de Imóveis, administrada pela Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo -ARISP, viabilizou-se a instituição dos módulos de “Penhora on line“, “Pesquisa de bens on line” e visualização de matrículas por meio do sistema “Matrícula on line“.

A “Pesquisa de bens on line” é realizada mediante acesso aos bancos de dados das respectivas unidades do serviço de Registro de Imóveis, sejam esses dados mantidos em Banco de Dados Light ou em Web Services interligados ao Sistema de Registro Eletrônico.

Feita a pesquisa sobre a existência de direito real em favor de determinada pessoa e obtido resultado positivo, pode o interessado visualizar a respectiva matrícula pelo módulo “Matrícula on line” e, assim, identificar a natureza do direito real ostentado pela pessoa pesquisada.

Porém, a pesquisa on line não permite, de forma autônoma, a identificação da natureza do direito real existente em nome da pessoa pesquisada, podendo esse direito ser de propriedade, ou direito real sobre coisa alheia ou de garantia, ou decorrer de eventual medida constritiva ou de averbação premonitória promovida pelo autor de execução, ou de registro de citação em ação real ou pessoal reipersecutória visando possibilitar o exercício do direito de sequela.

Em razão disso, determinou-se, pela r. decisão de fls. 59/60, a revisão de todos os dados do fólio pessoal e a atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados, de maneira a refletir com precisão absoluta a qualidade de cada pessoa que figurar como titular de direito de propriedade, ou de crédito, ou como devedora (fls. 56/57).

Para isso foi concedido prazo de um ano com início em 05 de julho de 2017 (fls. 59/60), posteriormente prorrogado por 180 dias (fls. 128/129) e, a seguir, novamente suspenso (fls. 184).

Para efeito de escrituração, a Lei nº 6.015/73 distingue os titulares dos direitos sobre bens alheios e os titulares dos direitos atingidos como credores e devedores, prevendo seu art. 220:

“Art. 220 – São considerados, para fins de escrituração, credores e devedores, respectivamente:

I – nas servidões, o dono do prédio dominante e dono do prédio serviente;

II – no uso, o usuário e o proprietário;

III – na habitação, o habitante e proprietário;

IV – na anticrese, o mutuante e mutuário;

V – no usufruto, o usufrutuário e nu-proprietário;

VI – na enfiteuse, o senhorio e o enfiteuta;

VII – na constituição de renda, o beneficiário e o rendeiro censuário;

VIII – na locação, o locatário e o locador;

IX – nas promessas de compra e venda, o promitente comprador e o promitente vendedor;

X– nas penhoras e ações, o autor e o réu;

XI – nas cessões de direitos, o cessionário e o cedente;

XII – nas promessas de cessão de direitos, o promitente cessionário e o promitente cedente”.

A complexidade e os custos da medida determinada, que ao final abrange a revisão do Livro nº 5 – Indicador Pessoal mediante sua confrontação e atualização com o que constar nas respectivas matrículas, ensejaram sucessivas prorrogações do prazo fixado para a revisão de todos os dados do fólio pessoal e a atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados (fls. 128/129 e 184).

Porém, segundo informado pela ARISP, ao final dos prazos concedidos foi constatado que a atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services, para identificar titulares do domínio, credores e devedores, não se mostrou materialmente viável (fls. 211/219).

É sabido, porque constatado nas correições realizadas diretamente pela Corregedoria Geral da Justiça, que os responsáveis pelas delegações de Registro de Imóveis adotaram, ao longo do tempo, diferentes medidas para a revisão e atualização dos indicadores pessoal que originalmente eram escriturados somente por meio físico, o que ocorreu por ser também distinta a situação de cada serventia.

Contudo, e ainda que em sua maioria transpostas para sistemas informatizados, as informações dos indicadores pessoais continuaram não identificando como credores e devedores os titulares de direitos sobre coisa alheia e os titulares dos direitos reais atingidos.

Essa distinção, ademais, não era necessária antes da implantação das buscas informatizadas, que permitem consultas abrangentes e em bloco, englobando todas as unidades de Registro de Imóveis do Estado de São Paulo, porque na busca solicitada fisicamente, no balcão da serventia, basta a consulta ao indicador pessoal e, na sequência, a consulta direta às matrículas dos imóveis.

Entretanto, a nova realidade, decorrente dos avanços tecnológicos, não foi imediatamente seguida pela substituição dos livros físicos por sistema de registro eletrônico.

Ao contrário, apesar do decurso do prazo de cinco anos previsto na Lei nº 11.977/2009 (art. 39), não foi, até o momento, definido o sistema a ser utilizado para o registro eletrônico a que se refere o seu art. 37:

“Art. 37. Os serviços de registros públicos de que trata a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, observados os prazos e condições previstas em regulamento, instituirão sistema de registro eletrônico”.

A definição desse sistema, por seu turno, não compete isoladamente às Corregedorias Gerais da Justiça porque o art. 76 da Lei nº 13.465/2017 prevê que seguirá o padrão a ser adotado pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico (ONR), mediante autorização pelo Conselho Nacional de Justiça, ao passo que o Decreto nº 8.764/2016 dispõe sobre a adoção de sistema de registro eletrônico que permita o fornecimento de informações estruturadas para a alimentação do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais – SINTER, visando a utilização pelas entidades nele relacionadas.

A partir da formação de banco de dados eletrônico, alimentado por informações obtidas de forma estruturada, serão possíveis buscas automatizadas pelas qualidades de titular do domínio, credor e devedor, com consultas abrangendo simultaneamente todas as unidades do Registro de Imóveis instaladas no país.

Desse modo, assiste razão à requerente ao afirmar que a implantação da Central Eletrônica dos Registradores, que permite a solicitação de informações abrangendo, simultaneamente, todas as delegações do Registro de Imóveis do Estado de São Paulo, não foi acompanhada da revisão e reestruturação do indicador pessoal que em razão do formato originalmente previsto na Lei nº 6.015/73 não era mantido, em cada unidade, com distinção das pessoas entre titulares de domínio, credores e devedores.

Por seu lado, as diferentes rendas das delegações, proporcionadas pela efetiva demanda do serviço existente em cada comarca, não torna materialmente viável, atualmente, fixar prazo para que as informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados passem a conter essas distinções.

Ademais, a futura definição do sistema de registro eletrônico que será adotado em âmbito nacional repercutirá diretamente na escrituração do Livro nº 5 – Indicador Pessoal, porque todos os dados escriturados anteriormente deverão ser transpostos para o novo sistema, como previsto no art. 39 da Lei nº 11.977/2009:

“Art. 39. Os atos registrais praticados a partir da vigência da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, serão inseridos no sistema de registro eletrônico, no prazo de até 5 (cinco) anos a contar da publicação desta Lei.

Parágrafo único. Os atos praticados e os documentos arquivados anteriormente à vigência da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, deverão ser inseridos no sistema eletrônico”.

Dessa forma analisada a questão, mostra-se pertinente a solicitação formulada pela Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP no que tange à atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados.

Essa medida não impede que os responsáveis pelas delegações de Registro de Imóveis, desde logo, atualizem os indicadores pessoais para que contenham distinção entre titulares de domínio, credores e devedores, nem prejudica a identificação dessas diferentes qualidades mediante buscas individualizadas nas matrículas que são feitas a partir das solicitações dos usuários.

Ressalva-se, porém, que a matéria poderá ser objeto de futuros estudos, em especial se mantida a indefinição relativa à instituição do sistema de registro eletrônico nacional, para adequação dos serviços prestados às novas demandas decorrentes da informatização das serventias e das disponibilidades aos usuários proporcionadas pelas Centrais Eletrônicas dos Registradores de Imóveis, observada, na normatização, a adequação dos serviços prestados pelas referidas Centrais à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais que terá vigência a partir do final do ano de 2020.

Ante o exposto, o parecer que apresento à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de revogar as rr. decisões de fls. 59/60, 128/129 e 184 somente no que diz respeito à imediata revisão de todos os dados do fólio pessoal e atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados visando possibilitar a distinção entre titulares de direitos reais, credores e devedores.

Sub censura.

São Paulo, 11 de outubro de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos, para revogar os efeitos das rr. decisões de fls. 59/60 e 128/129 e 184 somente no que diz respeito à revisão de todos os dados do fólio pessoal e atualização das informações encaminhadas ao Banco de Dados Light e Web Services a ele interligados visando identificar nas buscas, separadamente, os titulares de domínio, credores e devedores. Ressalvo, porém, que a matéria poderá ser objeto de futuros estudos para adequação dos serviços prestados às novas demandas decorrentes da informatização das serventias e das disponibilidades aos usuários proporcionadas pelas Centrais Eletrônicas dos Registradores de Imóveis, observada, na normatização a ser editada, a adequação dos serviços prestados pelas referidas Centrais à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais que terá vigência a partir do final do ano de 2020. Publique-se, dando-se ciência à Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP. São Paulo, 11 de outubro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 17.10.2019

Decisão reproduzida na página 187 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

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1VRP/SP. Registro de Imóveis. Pacto de corvina. Herança de pessoa viva. Princípio da Fungibilidade.

Processo 1080578-89.2021.8.26.0100
Espécie: PROCESSO
Número: 1080578-89.2021.8.26.0100
Processo 1080578-89.2021.8.26.0100
Dúvida – Registro de Imóveis – Izolda de Almeida dos Santos – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada e, em consequência, mantenho o óbice. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA CARDOSO (OAB 260084/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo Digital nº: 1080578-89.2021.8.26.0100
Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis
Requerente: 6º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital – Sp
Requerido: Izolda de Almeida dos Santos
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 6º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Izolda de Almeida dos Santos, tendo em vista negativa de registro de carta de sentença extraída de ação de divórcio consensual (autos n. 0012024-39.2000.8.26.0009), que tem como objeto imóvel da matrícula n. 11.810 daquela serventia.
Informou o Oficial que a negativa é motivada pela existência de cláusula nula na partilha com indicação de usufruto: “… no caso de falecimento do DIVORCIANDO seu quinhão reverterá automaticamente a favor da divorcianda e caso venha a DIVORCIANDA a falecer, o quinhão pertencente a mesma, reverterá a favor do divorciando …”; que a cláusula é espécie de pacta corvina, vedada pelo art. 426 do Código Civil (na época do acordo era vedada pelo art. 1.089 do CC de 1916); que a transmissão da herança deveria ter ocorrido por testamento; que permitiu a cindibilidade para o registro tão somente da partilha e do usufruto, o que não foi aceito pela parte suscitada.
Vieram documentos às fls. 04/49.
Em manifestação dirigida ao Oficial (fls. 37/42), a parte suscitada, por meio de seu patrono, sustenta que o acordo dos divorciandos, consistente no usufruto do imóvel em favor da divorcianda, com acréscimo futuro da meação pelo cônjuge supérstite, foi devidamente homologado pelo juízo do divórcio, sem oposição do Ministério Público; que referida cláusula fundamenta-se no disposto no art. 1.178 do Código Civil de 1916 (art. 551 do atual); que não se trata de reversão, mas sim de doação conjuntiva do direito de acrescer; que se deve respeitar o princípio da autonomia da vontade. Desse modo, a carta de sentença deve ser registrada tal como extraída da ação de divórcio.
O Ministério Público opinou pela procedência, com manutenção dos óbices (fls. 54/57).
É o relatório.
Fundamento e decido.
No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.
De início, vale destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação, positiva ou negativa, para ingresso no fólio real.
O Egrégio Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa de título judicial não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7).
Neste sentido, também a Apelação Cível nº 464-6/9, de São José do Rio Preto:
“Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.
E, ainda:
“REGISTRO PÚBLICO – ATUAÇÃO DO TITULAR – CARTA DE ADJUDICAÇÃO – DÚVIDA LEVANTADA – CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – IMPROPRIEDADE MANIFESTA. O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal – crime de desobediência -, pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado” (STF, HC 85911 / MG – MINAS GERAIS, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, j. 25/10/2005, Primeira Turma).
Sendo assim, não há dúvidas de que a mera existência de título proveniente de órgão jurisdicional não basta para autorizar automaticamente seu ingresso no registro tabular.
No caso específico, na ação de divórcio consensual movida pela parte suscitada e por seu ex-cônjuge (autos n. 0012024-39.2000.8.26.0009), estabeleceu-se a partilha do referido imóvel em partes iguais, com usufruto em favor da divorcianda, sendo que, no caso de falecimento de qualquer dos divorciandos, o quinhão a ele pertencente reverter-se-ia em favor do divorciando supérstite (fl. 09).
De fato, como salientado pelo Oficial e pelo Ministério Público, a cláusula em destaque é nula de pleno direito, pois contrária ao estabelecido no art. 1.089 do Código Civil vigente na época do acordo homologado (atual art. 426, sem qualquer modificação), que assim dispunha:
“Art. 1.089. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva”.
Ao contrário do que alegou a parte suscitada perante o Oficial, o convencionado entre os divorciandos não se fundou em direito legal de acrescer pelo cônjuge sobrevivo donatário, em consonância como o art. 551 do atual Código Civil, que assim dispõe:
“Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual.
Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo”.
E isso por dois motivos simples: 1º) a cláusula considerada nula não tratou de doação, mas de verdadeira transmissão de herança de pessoa ainda viva; 2º) o acordo ocorreu em partilha decorrente de divórcio, pelo que deixou de existir qualquer direito de acrescer decorrente do casamento.
Portanto, a cláusula atacada realmente dispõe sobre transmissão de herança de pessoa viva.
Embora a qualificação registrária, a princípio, restrinja-se aos aspectos formais e extrínsecos do título, não há qualquer dúvida de que o exame da legalidade consiste também na aceitação para registro somente de título que estiver de acordo com a lei.
Nesse sentido, os ensinamentos de Afrânio de Carvalho e Pontes de Miranda (nossos destaques):
“É incontestável, portanto, que, por ser a nulidade um efeito que se produz ipso jure em decorrência apenas da existência do vício, o registrador ao examinar o título, em processo semelhante ao de jurisdição voluntária, deve levá-la em conta para opor a ‘dúvida’ tendente a vetar a inscrição requerida. A regra dominante nesse assunto, no nosso direito como em qualquer outro, é a de que o funcionário público deve negar sua colaboração em negócios manifestamente nulos, inclusive abster-se de fazer inscrições nos registros públicos” (AFRÂNIO DE CARVALHO, Registro de Imóveis, Rio de Janeiro: Forense, edição de 1977, páginas 256 a 257).
“Legalidade e validade são conceitos largos. A referência aos dois [reporta-se o autor ao Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939] não é escusada, porque o título pode ser válido e não ser legal o registo (e.g.: válido mas irregistrável no registo de imóveis). Desde logo afastemos as anulabilidades, porque essas dependem de sentença constitutiva negativa em ação própria, e não poderiam ser invocadas quaisquer anulabilidades ao oficial de registo, ou de ofício. (…) A dúvida do oficial do registo somente pode ser, portanto, quanto às nulidades: a) se o escrito está assinado por pessoa absolutamente incapaz; b) se ilícito ou impossível o seu objeto; c) se foi infringida regra cogente de forma; d) se foi preterida alguma solenidade que a lei considera essencial para a sua validade; e) se a lei diz que é nulo o ato ou lhe nega efeito (Código Civil, art. 145, I-V)” (PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, § 1233, n. 4).
Vale ressaltar que o Oficial permitiu a cisão do título para ingresso no fólio real, com o registro apenas da partilha e do usufruto, ignorando-se, portanto, a cláusula nula.
Porém, o registro não foi aceito pela parte suscitada.
Os elementos dos autos, portanto, demonstram que houve acerto na qualificação negativa do título em razão da existência de cláusula manifestamente nula.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada e, em consequência, mantenho o óbice.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.
P.R.I.C.
São Paulo, 20 de setembro de 2021.
Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Juiz de Direito. (DJe de 22.09.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP. 

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Agravo de Instrumento – Decisão que indeferiu a pretensão de ser determinado aos cartórios o cancelamento dos protestos independentemente do pagamento dos emolumentos – Insurgência – Impossibilidade – Previsão legal de pagamento dos emolumentos até mesmo quando o cancelamento for por determinação judicial – Lei nº 9.492/1997, artigo 26, §3º – Inviabilidade da transferência dos ônus pela prática dos atos ao tabelião – Precedente desta Corte – Decisão mantida – Recurso não provido. (Nota da Redação INR: ementa oficial)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2187431-17.2021.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante CELSO ABUGÃO SILVEIRA, são agravados FERNANDO MUNHOZ GALERA e SCAN LESTE COMÉRCIO DE PEÇAS LTDA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 15ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores ACHILE ALESINA (Presidente), MENDES PEREIRA E RAMON MATEO JÚNIOR.

São Paulo, 17 de agosto de 2021.

ACHILE ALESINA

Relator(a)

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº : 21907

AG. DE INST. : 2187431-17.2021.8.26.0000

COMARCA : Foro Central Cível 34ª Vara Cível

AGTE. : Celso Abugão Silveira

AGDO. : Fernando Munhoz Galera

AGDO. : Scan Leste Comércio de Peças Ltda

AGRAVO DE INSTRUMENTO – Decisão que indeferiu a pretensão de ser determinado aos cartórios o cancelamento dos protestos independentemente do pagamento dos emolumentos – Insurgência – Impossibilidade – Previsão legal de pagamento dos emolumentos até mesmo quando o cancelamento for por determinação judicial – Lei nº 9.492/1997, artigo 26, §3º – Inviabilidade da transferência dos ônus pela prática dos atos ao tabelião – Precedente desta Corte – Decisão mantida – Recurso não provido.

Trata-se de agravo de instrumento contra a r. decisão de fls. 34 dos autos subjacentes, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 34ª Vara Cível do Foro Central Cível, Dr. Adilson Aparecido Rodrigues Cruz que, nos autos da ação declaratória em cumprimento de sentença ajuizada pelo agravante, que entendeu ser inviável a isenção de emolumentos pretendida, em razão do recorrente não ser beneficiário da gratuidade da justiça.

Busca o exequente a reforma do decidido.

Recurso regularmente processado.

Preparo recursal apresentado às fls. 12/13.

É o relatório.

Trata-se de ação declaratória em cumprimento de sentença ajuizada pelo agravante, pretendendo em síntese expedição de ofícios para cancelamento dos protestos dos cheques declarados inexigíveis, bem como intimação do agravado Fernando para devolução das cártulas, tudo nos termos da r. sentença proferida nos autos principais.

Após regular tramite processual o exequente agravante, requereu a determinação aos cartórios de cancelamento dos protestos independentemente de pagamento dos emolumentos que se trata o artigo 26, §3º da Lei nº 9.492/97 (fls. 28/31 dos autos principais).

A r. decisão indeferiu a pretensão, nos seguintes termos:

“Vistos.

Não consta que a parte interessada esteja sob os benefícios da assistência judiciária gratuita. Inviável o atendimento do pleito.

Indefiro.

Cumpra-se a sentença em seu inteiro teor, providenciando o próprio interessado, querendo.

Decorrido prazo legal deste pronunciamento, arquivem o processo.

Int.”

Insurge-se o exequente contra tal decisão.

Em suas razões alega em síntese que os protestos foram declarados irregulares por ordem judicial, não sendo justo, tampouco razoável impor ao recorrente o custeio do cancelamento dos protestos, havendo possibilidade do cumprimento independentemente do prévio pagamento das custas e emolumentos.

Requer a reforma para ser determinado aos cartórios o cancelamento dos protestos independentemente do pagamento dos emolumentos.

O recurso não comporta provimento.

Constata-se que a pretensão recursal se resume especificamente que (fls. 10):

“seja determinado aos cartórios o cancelamento dos protestos mencionados na petição inicial (fls. 1/3) independentemente de pagamento dos emolumentos de se trata o art. 26, §3º da Lei nº 9.492/97, […]” (g.n.).

Sem razão, contudo.

Com efeito, a Lei 9.492/1997, de fato, dispõe a respeito do cancelamento do registro de protesto e de emolumentos devidos pela sua consecução, “in verbis”:

“Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.

§ 3º O cancelamento do registro do protesto, se fundado em outro motivo que não no pagamento do título ou documento de dívida, será efetivado por determinação judicial, pagos os emolumentos devidos ao Tabelião”. (…)

Art. 37. Pelos atos que praticarem em decorrência desta Lei, os Tabeliães de Protesto perceberão, diretamente das partes, a título de remuneração, os emolumentos fixados na forma da lei estadual e de seus decretos regulamentadores, salvo quando o serviço for estatizado.

§ 1º Poderá ser exigido depósito prévio dos emolumentos e demais despesas devidas, caso em que, igual importância deverá ser reembolsada ao apresentante por ocasião da prestação de contas, quando ressarcidas pelo devedor no Tabelionato.

§ 2º Todo e qualquer ato praticado pelo Tabelião de Protesto será cotado, identificando-se as parcelas componentes do seu total(…)” (g.n.).

Desta feita, o cancelamento do protesto constitui um ato tendente à extinção dos efeitos de protestos lavrados, que, mesmo quando derivado de ordem judicial, não isenta o pagamento de custas e emolumentos.

Assim, não há possibilidade de transferir ao tabelião, como titular de uma delegação de serviço público, a responsabilidade pelos respectivos encargos, com relação as custas e emolumentos pelo cancelamento do protesto determinada por decisão judicial, como pretende o recorrente.

A propósito o entendimento desta E. Corte:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – Indeferimento do pedido de que o cartório fosse obrigado a efetuar o cancelamento do protesto sem a cobrança de emolumentos. CABIMENTO: Considerando-se a existência de obrigação legal de recolhimento dos emolumentos pela baixa do protesto determinada por decisão judicial, não há como impor ao Tabelião a responsabilidade pelos respectivos encargos. Possibilidade de adiantamento das custas pelo interessado e inclusão do valor no cumprimento de sentença. Aplicação do art. 26, §3º da Lei nº 9.492/97. Decisão mantida. RECURSO DESPROVIDO.” (TJSP; Agravo de Instrumento 2264704-77.2018.8.26.0000; Relator (a): Israel Góes dos Anjos; Órgão Julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 25ª Vara Cível; Data do Julgamento: 07/03/2019; Data de Registro: 07/03/2019) (g.n.).

Assim, é inviável a determinação aos cartórios, o cancelamento dos protestos, sem o pagamento dos emolumentos respectivos, não havendo qualquer respaldo legal a prentensão do agravante.

Nesse contexto, tem-se que a r. decisão combatida deve ser mantida, por suas razões e fundamentos.

Em harmonia com todo o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso.

ACHILE ALESINA

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Agravo de Instrumento nº 2187431-17.2021.8.26.0000 – São Paulo – 15ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Achile Alesina – DJ 20.08.2021

Fonte: INR Publicações. 

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.   

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