Ausência de testemunhas em contratos e a falta de seu registro em cartório pode gerar questionamento fazendário quanto à validade do documento para fins fiscais

* Rogério Pires da Silva

Os art. 135 e 1.067 do CC/16 exigiam a assinatura de duas testemunhas e registro público do contrato como condição para a oposição de seus efeitos a terceiros. O novo CC/02reproduz aqueles comandos nos art. 221 e 288, no qual foi suprimida apenas a exigência de assinatura de duas testemunhas.

A rigor, a assinatura de duas testemunhas é hoje condição imposta apenas para que o instrumento particular tenha eficácia de título executivo extrajudicial (art. 585, II, do CDC).

Todavia, em alguns julgados o CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais já decidiu que a ausência de testemunhas no contrato e a falta de seu registro em cartório impede, por exemplo, a dedutibilidade das despesas dele decorrentes (para fins de IRPJ – imposto de renda da pessoa jurídica), porque em tais circunstâncias o contrato não produz efeitos em relação a terceiros e, da mesma forma, em relação ao próprio fisco.

No julgamento do Recurso 145.205 a 5ª Câmara do antigo Primeiro Conselho de Contribuintes ementou sua decisão como segue: "O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na disposição e administração livre de seus bens, sem a assinatura de duas testemunhas e sem a transcrição no registro público, não tem efeito contra terceiros. (CC Arts. 135/1067). Os contratos entre pessoas jurídicas submetidas ao lucro real, para serem válidos em relação ao fisco devem, além de atender a legislação civil, serem escriturados, ou seja, os lançamentos contábeis devem a eles se referirem e caso haja alteração ou modificação precisam também constar da escrita fiscal."

Naquele precedente, a Corte administrativa houve por bem desconsiderar a alteração de contrato operada pelas partes em 2000 (sob a vigência do CC/16) e trazida pelo contribuinte como prova dos fatos por ele alegados no processo – na verdade, no caso concreto, certos contratos de mútuo foram repactuados pelas partes envolvidas, de modo que passaram a vigorar como contratos de adiantamento para futuro aumento de capital. O negócio jurídico foi desconsiderado pelo CARF apenas em razão da falta de assinatura de duas testemunhas e inexistência de registro público do contrato.

Em outro julgamento (Recurso n. 14.883) aquele tribunal desconsiderou instrumento de doação que comprovava o negócio jurídico havido entre as partes, apenas porque não se encontravam presentes as assinaturas de duas testemunhas e o registro público.

Ora, é sabido que a condição imposta pelo CC para eficácia do contrato perante terceiros diz respeito apenas aos terceiros com potencial interesse no negócio jurídico. Em outras palavras, a exigência de registro público (e mesmo a condição de duas testemunhas) visa proteger o terceiro eventualmente prejudicado com os efeitos reflexos do contrato – e que não tenha participado do negócio jurídico. O fisco não é terceiro interessado no negócio, nem há regra jurídica que imponha esse tipo de condição para assegurar a dedutibilidade de despesas para fins de IRPJ.

Afinal, o negócio jurídico é pactuado exclusivamente entre as partes envolvidas e, via de regra, no máximo poderá prejudicar interesses de terceiros que possuam algum vínculo direto com o objeto do negócio (por exemplo, a doação de um automóvel pode prejudicar interesse de um terceiro em face do qual a venda do veículo já fora prometida, ou até do fisco se o veículo estivesse penhorado em face de dívida tributária ajuizada).

Para o fisco o negócio jurídico pode ser – e é, no mais das vezes – o fato gerador da obrigação de pagar algum tributo (por exemplo, o imposto sobre doações, em face da doação de um automóvel), de modo que seria absurdo cogitar de recusa fazendária na exigência do tributo devido só porque o negócio jurídico foi pactuado sem as formalidades que assegurem sua eficácia perante terceiros – como também é absurdo o questionamento fazendário da dedutibilidade de uma despesa, para fins de IRPJ, só porque ausentes aquelas formalidades na respectiva contratação.

De resto, a própria escrita contábil regular da pessoa jurídica faz prova em seu favor (art. 923 do Regulamento do Imposto de Renda), de modo que a exigência daquelas formalidades é forçosamente dispensável se houver compatibilidade entre os dados e valores do negócio jurídico com aqueles escriturados contabilmente.

Mesmo assim, recomenda-se que os contribuintes procurem formalizar da melhor maneira possível os negócios jurídicos que possam trazer impactos tributários de qualquer natureza, seja pelo costumeiro excesso de zelo fazendário, seja pela cautela que se impõe nos negócios propriamente ditos.

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* Rogério Pires da Silva é advogado da Boccuzzi Advogados Associados.

Fonte: Migalhas I 27/11/2013.

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Ação negatória de paternidade não é aceita pelo STJ após ausência de suposto pai ao exame de DNA

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu,  no dia 24 de julho, que não é possível relativizar a coisa julgada para afastar, em ação negatória, a paternidade declarada em decisão já transitada em julgado.Esta decisão foi tomada  diante de recurso interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina contra decisão do tribunal local, que permitiu a um suposto pai apresentar prova pericial em nova ação. Por  maioria de votos,   os desembargadores entenderam  que a relativização é possível em" casos excepcionalíssimos" , que não é o do recurso.

Para o desembargador Raduan Miguel Filho, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família de Rondônia, a decisão é interessante ao reconhecer que a falta do interessado à perícia médico-legal (exame de DNA) tem o mesmo efeito de recusa.

No caso, o homem ajuizou ação negatória de paternidade em 2006, quando já havia decisão transitada em julgado declarando a paternidade. Essa decisão foi baseada em prova testemunhal, tendo em vista que réu se mudou para os Estados Unidos, sem cumprir a intimação para realização do exame de DNA que ele concordou em fazer. Para a Quarta Turma do STJ, mesmo diante de eventual erro, deve-se prestigiar, no caso, a segurança jurídica.

A relativização da coisa julgada em ações de investigação de paternidade tem sido admitida, segundo Raduan Filho, nas situações em que a não realização do exame de DNA ocorre por fatores alheios à vontade dos interessados.“Esse raciocínio esposado na referida decisão, embora possa parecer inédita no âmbito do STJ, já vinha tendo acolhida por muitos magistrados e sempre em nome de uma tranquilidade jurídica espelhada pelo trânsito em julgado”, garante .

Segundo o desembargador,  o fato de o pai não comparecer para fazer o exame de DNA não prejudica a busca da verdade real, entendimento já consolidado pelo STJ, com a Súmula 301. E disse que “empresta presunção legítima da paternidade quando o pretenso pai se recusa a submeter-se  ao exame de DNA. Com isso, não se está prejudicando a verdade real, mas ao contrário, pela recusa, agora com esse entendimento também manifestada pelo abandono da causa, enseja a presunção referida na Súmula".

Ele entende que  a decisão é incomum e, com base nesta recente interpretação do STJ, é possível  que os juizes analisem de forma diferente a relativização da coisa julgada nas ações de investigação de paternidade. “Veja que foi disponibilizado ao pretenso pai a realização do exame de DNA, que inclusive foi por ele aceito, mas não o fez porque mudou-se para outro país e o magistrado, então, julgou o feito com as provas existentes nos autos; o exame não se realizou por ato de vontade do pai, aplicando-se, assim, os ensinamentos da Súmula 301”, ressaltou.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM | 25/07/2013.

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