No caso, filha menor de idade pediu que o pai registral fosse desconsiderado pai biológico e, em contrapartida, que o suposto pai biológico fosse declarado como tal. A menor, de 10 anos de idade, sempre foi cuidada e educada por seus pais registrais, ambos analfabetos e empregados, durante muitos anos, da fazenda do suposto pai biológico, que tendo conhecimento da paternidade, ameaçava demitir todos da família da menina se o fato fosse revelado. O exame em DNA comprovou que o ex-patrão é o pai biológico da menor.
A juíza Ana Maria Gonçalves Louzada, presidente do IBDFAM/DF, com base na tese da multiparentalidade, decidiu que deve ser reconhecida tanto a paternidade socioafetiva como a biológica, com todos os seus efeitos legais, devendo constar no registro de nascimento da menor de idade a dupla paternidade e estabeleceu a guarda em favor da mãe e do pai afetivo, com a convivência livre a favor do pai biológico. A magistrada fixou alimentos devidos pelo pai biológico no valor de cinco salários mínimos mensais. A decisão é do dia 6 de junho. Na ação foi ressaltado que a demanda é de interesse econômico e refuta a existência de vínculo de afeto com o pai biológico.
Paternidade socioafetiva – O pai registral afirmou, nos autos, nutrir sentimentos de pai em relação à menina, e que a ama como aos demais filhos que possui com a companheira, com quem mantém união estável há 17 anos. Ele também alegou que a registrou por pensar ser sua filha biológica, apesar de já ser vasectomizado quando a esposa ficou grávida. Ficou demonstrado que o homem a registrou pelo afeto que nutria pela infante, uma vez que já devia prever que não era sua filha biológica.
A menina também demonstrou que reconhece como pai o homem que cuidou dela desde o nascimento, quando questionada sobre com quem morava, a menor respondeu que morava com a mãe, os irmãos e o pai. “A afetividade mantida entre os dois, apesar de não possuírem o mesmo DNA, faz com que deva ser mantida a paternidade até então estabelecida”, afirmou a magistrada.
Durante o processo, o pai biológico se mostrou avesso a esta paternidade, afirmando, inclusive, que não nutre qualquer sentimento pela infante, que possui outra família e que pretende seguir sua vida como antigamente. Fato este que, segundo a decisão, não concede o direito de ver afastada a declaração de paternidade.
Filiação e parentalidade – De acordo com Ana Louzada, o direito ao reconhecimento da multiparentalidade está embasado nos direitos da personalidade e, em atenção ao princípio da proteção integral da criança e do adolescente, “sempre sublinhado pelo princípio da dignidade da pessoa humana, a multiparentalidade se desenha com cores que anunciam um novo caminho social”, disse.
“A filiação socioafetiva constitui uma relação de fato que deve ser reconhecida e amparada judicialmente. Isso porque a maternidade (ou paternidade, como no presente caso concreto) que nasce de uma decisão espontânea deve ter guarida no Direito de Família, assim como os demais vínculos advindos da filiação”, ressaltou a juíza Ana Louzada.
Direitos da multiparentalidade – A magistrada analisou que quando o filho é adotado no Brasil, perde os vínculos com a família biológica (salvo os impedimentos matrimoniais), não herda e tampouco pode pedir pensionamento alimentar. No entanto, isto não acontece em outros países como na Argentina, onde existe um tipo de adoção, chamada adoção simples, que não exclui o filho adotivo dos direitos supracitados. Para ela, o acolhimento da tese da multiparentalidade é o que vem subsidiar o melhor interesse da criança, uma vez que poderá ser mantida e cuidada por várias pessoas.
“De se ver que a multiparentalidade, se afigura modelada a este caso concreto. Temos flagrante paternidade socioafetiva estabelecida entre o pai registral e a infante, bem como a evidenciada paternidade biológica, que poderá agasalhar o melhor interesse da autora, na medida em que poderá proporcionar a ela bons colégios, faculdade, saúde, lazer, e, quem sabe, uma outra família que poderá amá-la”, assegurou a presidente do IBDFAM/DF, Ana Louzada.
A juíza refletiu que o pai biológico exibe confortável situação financeira e possui alto padrão de vida, e que “deixar de estender à infante as benesses que esta paternidade pode lhe oferecer, é não atentar para o melhor interesse da criança, Princípio Constitucional e basilar do Estatuto da Criança e do Adolescente! Imprescindível que o Direito acolha a realidade de cada pessoa, a vida como verdadeiramente se apresenta para cada um”, garantiu.
Fonte: IBDFAM | 11/06/2014.
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.