CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de escritura pública de doação – Imposição imotivada de cláusulas restritivas – Inteligência dos artigos 1.848, “caput”, e 2042 do Código Civil – Nulidade – Cindibilidade do título – Desconsideração das limitações – Recurso provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 0008818-68.2012.8.26.0438

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 0008818-68.2012.8.26.0438, da Comarca de Penápolis, em que é apelante DIEGO GARMES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE PENÁPOLIS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 6 de novembro de 2013.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação cível n° 0008818-68.2012.8.26.0438

Apelante: Diego Garmes

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Penápolis

VOTO N° 21.343

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de escritura pública de doação – Imposição imotivada de cláusulas restritivas – Inteligência dos artigos 1.848, "caput", e 2042 do Código Civil – Nulidade – Cindibilidade do título – Desconsideração das limitações – Recurso provido.

O Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoa Jurídica e Tabelionato de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Penápolis obstou o registro de Escritura de Doação, incidente sobre os imóveis retratados nas matrículas n° 6634 e 35471, entendimento que foi prestigiado pelo MM Juiz Corregedor Permanente no julgamento da dúvida suscitada (fls. 40/41).

Inconformado, apelou o interessado Diego Garmes (fls. 43/48), sustentando que o objeto da doação não extrapolou a parte disponível da donatária, sendo inaplicável o dispositivo legal que obriga a motivação para a imposição de cláusulas restritivas.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 97/98).

É o relatório.

O Registrador alega que o ato de disposição feito pela donatária, com imposição de cláusulas restritivas de incomunicabilidade e impenhorabilidade é nulo, pela inobservância dos artigos 1848 e 549, ambos do Código Civil.

Da leitura dos dispositivos invocados resta claro que a exigência só tem cabimento na hipótese em que os bens doados integrem a legítima, ou seja, parte da herança reservada aos herdeiros necessários do doador.

O apelante sustenta que os imóveis doados não ultrapassavam a metade do acervo dos bens da doadora. Não havia, entretanto, esta comprovação no momento em que o título foi levado a registro, o que justifica o óbice apresentado pelo Oficial.

Apenas por ocasião da interposição deste recurso foram juntados os documentos comprobatórios de que a parte possuía patrimônio suficiente para dispor livremente dos imóveis objeto do contrato de doação.

Todavia, entendo que a inobservância apontada macula apenas as disposições acessórias do contrato, e não o ato de disposição de vontade como um todo.

Ademar Fioranelli, em obra específica sobre o tema, comenta que:

"Respeitadas as opiniões divergentes, o certo é que o novo código autoriza expressamente a imposição de cláusulas restritivas à legítima, por testamento ou doação (como antecipação de legítima), exigindo que no título constem as razões do testador para impô-las (a justa causa). Não mais prevalece a vontade incondicionada do testador, mas a necessidade legal de declarar o justo motivo para tornar válida e efetiva a imposição." [1]

Conforme decidido em voto da lavra do Des. Maurício Vidigal (Apelação Cível n° 0024268-85.2010.8.26.0320): "Mas a falta de justa causa compromete apenas a validade da cláusula restritiva, não da doação. Há muito este Egrégio Conselho Superior da Magistratura vem aplicando a regra da cindibilidade do título, pelo qual autoriza-se o registro daquilo que possa ingressar no fólio real, e nega-se o daquilo que não possa, permitindo-se extrair do título apenas aquilo que comporta o registro. A doação é hígida e foi livremente celebrado entre os contratantes. Apenas a cláusula de impenhorabilidade padece de vício, por afronta ao art. 1848, "caput", do Código Civil. Admissível, portanto, o registro da escritura de doação, desconsiderando-se a cláusula de impenhorabilidade nele inserida.

Em caso similar, este Egrégio Conselho Superior decidiu:

"Há, contudo, um único vício no instrumento de compra e venda do imóvel adquirido pela apelante que impede o seu ingresso no registro, na forma como elaborado. Diz respeito à cláusula de incomunicabilidade inserida na escritura. Com efeito, quando a interveniente Maria Helena doou a importância de R$ 120.000,00, representada pelo apartamento do edifício Príncipe de Liverpool, no. 63, transmitindo-o a seguir aos vendedores Edmundo Antônio e sua mulher, fez constar que a doação se fazia com exclusividade, em caráter incomunicável, como adiantamento de sua legítima. A disposição constante do título é nula, porque afronta o disposto no art. 1848 do Código Civil… Todavia a nulidade ora apontada se restringe apenas à cláusula inserida no título e não importa na invalidade deste, mas somente na sua cindibilidade, a fim de que se torne viável o seu registro a seguir" (Ap. Civ. 440-6/0, de 06 de dezembro de 2005, Rel Des. José Mário Antônio Cardinale). "

Comungo do entendimento acima esposado, para admitir o ingresso do título no registro imobiliário, com a desconsideração das cláusulas restritivas de impenhorabilidade e incomunicabilidade nele inseridas.

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento ao recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] "Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade", Editora Saraiva, pag. 9 (D.J.E. de 11.12.2013 – SP).

Fonte: DJE I 12/12/2013.

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REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de loteamento – Artigo 18, § 2º, da Lei 6766/79 – Ações judiciais não elencadas nas hipóteses impeditivas – Comprovação de patrimônio suficiente para a garantia do pagamento de dívidas da loteadora e seus sócios – Improvável ocorrência de dano a futuros adquirentes – Recurso provido.

Apelação Cível n° 0002977-41.2012.8.26.0358

Apelante: Residencial Matheus Empreendimentos Imobiliários Ltda.

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Mirassol.

VOTO N° 21.318

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de loteamento – Artigo 18, § 2º, da Lei 6766/79 – Ações judiciais não elencadas nas hipóteses impeditivas – Comprovação de patrimônio suficiente para a garantia do pagamento de dívidas da loteadora e seus sócios – Improvável ocorrência de dano a futuros adquirentes – Recurso provido.

O Oficial do Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mirassol obstou o registro de loteamento urbano, incidente sobre o imóvel objeto da matrícula n° 31.978, entendimento que foi prestigiado pelo MM Juiz Corregedor Permanente no julgamento da dúvida suscitada (fls. 1374/1376).

Inconformada, apelou a interessada Residencial Matheus Empreendimentos Imobiliários Ltda. (fls. 1402/1412), sustentando a existência de patrimônio suficiente dos loteadores para a garantia dos adquirentes dos lotes.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso, arguindo, em preliminar, a competência da E. Corregedoria Geral da Justiça para o seu julgamento (fls. 1560/1562).

É o relatório.

Afasto a preliminar de incompetência argüida pelo Ministério Público.

A controvérsia versa sobre registro de loteamento, com o que há de prevalecer, para o julgamento do reclamo, a competência do Conselho Superior da Magistratura, nos termos do art. 16, V, e 181, II, b, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. O fato de não importar o ato transmissão de domínio ou constituição de direito real não constitui exceção à regra estabelecida, que prestigia a natureza formal do registro, sem excepcionar suas conseqüências.[1]

No mérito, entendo que assiste razão à apelante.

Como ressaltado nas razões do recurso apresentado, a r. sentença apelada fundamentou a recusa ao ingresso pleiteado apenas em razão da possibilidade de risco aos adquirentes dos lotes, considerando que pendem sobre os sócios da pessoa jurídica titular de domínio do bem, Sr. José Pascoal Constantini, esposa e filhos, dívidas fiscais, cíveis e trabalhistas, que alcançam 16,5 milhões de reais. Os sócios, por imposição legal, respondem solidariamente pela obrigação.

O Registrador embasa sua recusa no disposto no artigo 18, parágrafo 2º, da Lei 6.766/79, que estabelece que as ações referentes a crimes contra o patrimônio e a Administração Pública impedem o registro de loteamento[2] e pondera que deve ser comprovada a existência de patrimônio suficiente para o pagamento de possíveis condenações.

As ações penais apontadas pelo Registrador não se enquadram nas modalidades expressamente previstas na lei, não versando sobre delitos contra o Patrimônio ou à Administração da Justiça.

Como bem reconhecido pelo MM Juiz Corregedor Permanente: "As ações penais em si, e aqui diferentemente do entendimento do Oficial Registrador, não configuram óbice ao registro, pois nenhuma delas se refere, rigorosamente falando, a crimes contra o patrimônio e contra a Administração Pública, que são apenas aqueles como tais definidos nos respectivos capítulos do Código Penal." (fls. 1375).

A existência de ações de execuções fiscais de valores elevados realmente obriga à cautela na realização do registro, tendo em vista o disposto no artigo 185 do Código Tributário Nacional.

Entretanto, na hipótese em tela, os bens dos demandados foram avaliados em valor superior a 320 milhões de reais, o que confere lastro bastante razoável para afastar eventual risco de dano a terceiros.

A farta documentação trazida pela apelante comprova a higidez e extensão do patrimônio dos sócios da loteadora, o que não justifica a recusa ao registro.

O loteamento "Parque Residencial Prof. Matheus" conta com a aprovação dos órgãos municipais competentes, conforme certificado nos autos (fls. 1045).

Como bem ponderado pelo D. Procurador de Justiça, citando Walter Ceneviva, a suscitação de dúvida deve ser "razoável, no sentido de que é função do serventuário buscar soluções que tendam a viabilizar – e não impedir o registro." (fls. 1561).

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento ao recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Art. 16. Compete ao Conselho Superior da Magistratura:

V – julgar os processos de dúvidas de serventuários dos Registros Públicos;

Art. 181. Salvo disposição legal ou regulamentar, os feitos serão distribuídos nas seguintes classes:

II – no Conselho Superior da Magistratura:

b) dúvidas de registro de serventuários dos Registros Públicos;

[2] Art. 18. Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:

§ 2° – A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente. (D.J.E. de 31.10.2013 – SP).

Fonte: D.J.E I 01/11/2013.

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Para o Registro Imobiliário não importa o momento da celebração do contrato, mas a data da apresentação do título

Para o Registro Imobiliário não importa o momento da celebração do contrato, mas a data da apresentação do título, em atenção ao princípio tempus regit actum.

O Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CSM/SP) julgou a Apelação Cível nº 0015089-03.2012.8.26.0565, que decidiu pela impossibilidade de registro de escritura pública de compra e venda lavrada anteriormente à averbação de indisponibilidade, mas apresentada a registro após o gravame. O acórdão teve como Relator o Desembargador José Renato Nalini e o recurso foi, à unanimidade, improvido.

No caso em tela, inconformado com a r. decisão proferida pelo juízo a quo, o apelante interpôs recurso, alegando que adquiriu o imóvel em 1998, quando a empresa vendedora ainda se encontrava ativa e o imóvel livre de qualquer gravame de indisponibilidade. Afirmou que a aquisição ocorreu anteriormente ao Provimento CG nº 13/2012, de modo que não pode ser por ele atingido, porque seu direito já havia sido adquirido.

Ao analisar o caso, o Relator entendeu ser correta a negativa do registro do título, devendo ser mantida a sentença originária. Observou, ainda, que o CSM/SP tem considerado que, para fins de registro, não importa o momento da celebração do contrato, mas a data de sua apresentação ao Registro Imobiliário, em atenção ao princípio tempus regit actum, sujeitando o título à lei vigente no momento da apresentação do título. Posto isto, o Relator concluiu que, ainda que a escritura pública tenha sido lavrada em data anterior à da averbação de indisponibilidade, ao tempo de sua apresentação perante o Registro de Imóveis, esta já se encontrava inscrita, impedindo o registro. Neste caso, não há que se falar em direito adquirido. Ademais, o Relator observou, também, que na própria escritura pública havia a informação de que o ato jurídico celebrado era subordinado ao cancelamento da indisponibilidade.

Diante do exposto, o Relator concluiu que, enquanto não for cancelada a indisponibilidade pelo juízo que a determinou, a escritura pública de compra e venda não pode ser registrada.

Clique aqui e confira a íntegra da decisão.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br).

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