STJ: Lei brasileira não se aplica à herança de imóvel situado na Alemanha

A disputa por um imóvel confiscado pela Alemanha Oriental logo após a Segunda Guerra Mundial chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ainda durante a guerra, em 1943, um casal de alemães fez testamento deixando o imóvel para o cônjuge sobrevivente. Caso ambos falecessem, o bem deveria ser dividido igualmente entre os dois filhos, um homem e uma mulher. E se um deles morresse, o patrimônio seria destinado integralmente para o filho vivo.

A família veio para o Brasil. O filho morreu em 1971, deixando esposa e dois filhos. No ano seguinte, faleceu o pai e, em 1980, a mãe. Os bens adquiridos no Brasil foram regularmente partilhados. O imóvel na Alemanha não entrou na partilha porque o casal não era proprietário do bem na ocasião das mortes.

Com a queda do muro de Berlim em 1989, que unificou a Alemanha, os imóveis confiscados foram devolvidos aos antigos donos. Em viagem ao país europeu, um dos netos do casal descobriu que a tia, usando o testamento feito em 1943, obteve na Justiça alemã seu reconhecimento como única herdeira da propriedade, que foi vendida em 1993.

Os sobrinhos entraram com ação de sonegados no Brasil pedindo o pagamento do valor total recebido pelo imóvel, alegando má-fé da tia, pois eles a haviam questionado sobre o bem e, segundo o processo, ela teria dito que nada sabia a respeito.

Jurisdição

O pedido dos sobrinhos foi negado em primeira e segunda instâncias pela Justiça de São Paulo. Os magistrados entenderam que o caso estava fora da jurisdição brasileira.

No recurso ao STJ, os sobrinhos alegaram que o artigo 8º, parágrafo 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) estabelece que “os bens móveis trazidos para o país serão regidos pela nossa legislação”. Para eles, o produto da venda da casa localizada na Alemanha, dinheiro que foi trazido ao Brasil, deveria ter sido dividido na proporção de 50% para a tia e 50% para eles.

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou no processo que, em correspondência enviada a advogados na Alemanha, a tia deixou clara a intenção de preservar os interesses dos sobrinhos, caso eles tivessem algum direito hereditário perante a legislação alemã. Contudo, o tribunal alemão reconheceu a tia como única herdeira, conforme expresso no testamento.

Regra do domicílio

Bellizze explicou que a discussão no caso era definir qual estatuto deveria ser aplicado à sucessão de bem situado no exterior: se a lei brasileira, que considera a lei do domicílio do falecido, ou se a lei alemã, onde está o imóvel e onde o testamento foi feito.

Para o relator, a prevalência da lei do domicílio do indivíduo para regular suas relações jurídicas pessoais não é absoluta. A conformação do direito internacional privado exige a ponderação de outros elementos de conectividade que deverão, a depender da situação, prevalecer sobre a lei de domicílio do falecido.

No caso, observou o ministro, não bastasse o imóvel, objeto da pretensão de sobrepartilha, encontrar-se situado na Alemanha, circunstância suficiente para tornar inócua a incidência da lei brasileira (a do domicílio da de cujus), a autora da herança, naquele país, deixou testamento lícito, segundo a lei alemã regente à época de sua confecção, conforme decidido pelo órgão do Poder Judiciário alemão.

Lei do país do imóvel

Bellizze apontou que a própria Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), como é chamada hoje a LICC, dispõe no seu artigo 8º, caput, que as relações concernentes aos bens imóveis devem ser reguladas pela lei do país em que se encontrem.

Já o artigo 89 do Código de Processo Civil é expresso ao reconhecer que a jurisdição brasileira, com exclusão de qualquer outra, deve conhecer e julgar as ações relativas aos imóveis situados no país, assim como proceder ao inventário e partilha de bens situados no Brasil, independentemente do domicílio ou da nacionalidade do autor da herança.

“A lei brasileira, de domicílio da autora da herança, não tem aplicação em relação à sucessão do bem situado na Alemanha antes de sua consecução, e, muito menos, depois que o imóvel passou a compor a esfera jurídica da única herdeira. Assim, a pretensão de posterior compensação revela-se de todo descabida, porquanto significaria, em última análise, a aplicação indevida e indireta da própria lei brasileira”, ponderou Bellizze.

A conclusão do relator para negar o recurso dos irmãos foi seguida pela Turma. Os ministros decidiram que a existência de imóvel situado na Alemanha, bem como a realização de testamento nesse país, são circunstâncias prevalentes para definir a norma do local onde o bem se encontra (lex rei sitae) como a regente da sucessão relativa a esse bem. Afasta-se, assim, a lei brasileira, de domicílio da autora da herança, e o herdeiro do imóvel será apenas quem a lei alemã disser que é.

Fonte: STJ | 13/05/2015.

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Presidente do IRIB responde artigo publicado pelo portal Zero Hora

João Pedro Lamana Paiva é também vice-presidente do Colégio Registral do Rio Grande do Sul e oficial do Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre

Confira texto do presidente do IRIB, João Pedro Lamana Paiva, em resposta ao artigo intitulado “Um pouco de crime”, de autoria de David Coimbra, publicado na edição do jornal Zero Hora, do dia 11/05/2015. Lamana Paiva também é vice-presidente do Colégio Registral do Rio Grande do Sul e oficial do Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre/RS.

Senhor David Coimbra,

Cordiais saudações.

O que menos se deve esperar de um jornalista é que não faça colocações irresponsáveis, no exercício de seu mister profissional.
Esse é um fundamento ético de qualquer profissão.

Não se está a apregoar que o jornalista deva escrever somente o que agrade a tantos quantos leiam o que escreveu, mas que, pelo menos, ele fale com propriedade e conhecimento acerca daquilo que resolveu transformar em matéria jornalística.
É isso que esperam e merecem os leitores.

Pois bem, surpreendeu-nos, em matéria assinada pelo senhor, que os cartórios brasileiros tenham sido referidos num artigo, publicado em Zero Hora, sob o sugestivo título “Um pouco de roubo”.

Se o caro jornalista não tinha intenção de ser ofensivo, saiba que o foi, especialmente por estabelecer essa infeliz relação entre “roubo” e cartórios.

Estamos preocupados em esclarecê-lo de que, no Brasil, não vigora o “sistema anglo-saxão” a que fez referência, não havendo como compará-lo com uma realidade que pratica um sistema cuja origem é latina.

Já começam por aí as grandes diferenças. Talvez por isso é que o notário a que fez referência ter usado os serviços nos Estados Unidos tenha sido encontrado atrás do balcão de um banco privado e que, além disso, prestou-lhe um trabalho gratuito.

Além do inusitado local de atendimento do notário, é bom que se esclareça de que não existe trabalho gratuito. O que pode ter acontecido é que outro interessado na operação tenha pago esse trabalho.

Dessa forma, quer-nos parecer que o que verdadeiramente ocorreu naquela inusitada situação e que é muito comum de ocorrer em países como os EUA é que se tratava da realização de um negócio garantido pela cobertura de um seguro (fornecido por esse banco privado, em cujos custos, com certeza, estava incluída a remuneração do trabalho prestado pelo notário).

Essa é uma peculiaridade daquele sistema, onde o notário é um simples “arquivador” de documentos, não oferecendo nenhum grau de segurança jurídica ao negócio realizado.

Aqui no Brasil, onde vigora o notariado do tipo latino, as coisas são bem diferentes porque o sistema pretende dar segurança aos negociantes, esmiuçando juridicamente o contrato, antes de conferir-lhe o devido registro. É um sistema infinitamente mais barato, porque diz respeito somente ao ato praticado episodicamente na vida do cidadão e não requer a renovação permanente de um seguro para a garantia do contrato.

No sistema latino, a segurança vem da intervenção do notário e do registrador, ao passo que nos sistemas de origem anglo-saxônica a segurança vem do pagamento do seguro. Este último é um sistema mais caro e menos eficiente, mas, talvez, mais adequado a países mais ricos.

Assim, se uma pessoa for comprar um imóvel no Brasil, vai pagar os custos da escritura lavrada pelo Tabelião e do registro feito no cartório do Registro de Imóveis para garantia da segurança jurídica do negócio. Como isso não existe em países como os EUA, o que vai garantir o negócio lá será o seguro de responsabilidade civil, renovado todos os anos, o que encarece a operação.

De acordo com o Doing Business 2014, publicado pelo Banco Mundial (Registro de propriedades no Brasil tem um dos menores custos do Mundo, aponta Banco Mundial, disponível em www.migalhas.com.br), nosso país é o que apresenta um dos menores custos do Mundo para a realização do registro de propriedade imobiliária. De acordo com esse estudo, o custo do procedimento no Brasil é 50% menor que a média da América Latina.

Entendemos importante, portanto, que quem escreve, especialmente com acesso à grande mídia, tenha o exato alcance sobre o que está escrevendo, para não correr o risco de ser injusto, mal compreendido ou tido por desinformado.

Na condição de presidente do Instituto do Registro Imobiliário do Brasil – IRIB, entidade representativa dos mais de 3.600 registradores imobiliários do país, lamentamos constatar que a categoria está indignada com sua manifestação que, lamentavelmente, espelha desconhecimento sobre a realidade do setor no país.

É por isso que o convidamos a visitar o Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre, ofício que está completando 150 anos de existência, para que possa ter a real noção do trabalho empreendido pelos registros imobiliários em prol do Brasil, inclusive com a prestação de muito trabalho realmente gratuito nas regularizações fundiárias de interesse social e outros benefícios instituídos em lei, dando sua parcela de contribuição para nosso desenvolvimento econômico e social. Nessa visita, temos certeza de que o nobre comunicador vai descobrir que os cartórios garantem a veracidade dos atos e negócios jurídicos em todo o país.

Entendemos, também, que o mais importante para o comunicador que produziu uma matéria como a que estamos comentando, seja o de identificar a verdadeira repercussão do que foi veiculado, sob risco de ser interpretado como autor de um discurso que tem a intenção de introduzir no Brasil um sistema que melhor sirva aos interesses dos grandes bancos privados e não àquilo que melhor interessa ao nosso país.

Fonte: IRIB.

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STF: Dispensa de licenciamento ambiental no Tocantins é questionada em ADI

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5312) no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar dispositivo da Lei 2.713/2013, do Estado do Tocantins, que instituiu o Programa de Adequação Ambiental de Propriedade e Atividade Rural (TO Legal). O artigo 10 da lei dispensa do licenciamento ambiental as atividades agrossilvipastoris (que integram lavoura-pecuária-floresta). Segundo Janot, o dispositivo contraria a Constituição Federal na parte em que estabelece a competência da União para legislar sobre normas gerais relativas à proteção ambiental.

Na ADI, o procurador argumenta que o artigo 24 da Constituição estabelece a competência da União para legislar sobre normas gerais relativas a florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição, e ressaltam a competência suplementar dos estados para legislar sobre o tema. Com isso, se já foi editada lei de âmbito federal sobre proteção do meio ambiente, resta ao estado-membro regulamentar apenas as normas específicas, atento à regra federal.

“O licenciamento ambiental é instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, prevista na Lei Federal 6.938/81, norma geral segundo a qual compete ao Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) estabelecer as regras e os critérios para licenciamento”, argumenta o procurador-geral. Ainda que a atividade agrossilvipastoril pressuponha o uso integrado de áreas rurais com cultivo, pastagem e florestas, a ser manejada de maneira sustentável, com baixo custo ambiental, Janot argumenta que isso não garante a ausência de dano ao meio ambiente, a ponto de dispensar o licenciamento ambiental.

O procurador-geral pede liminar para suspender os efeitos do dispositivo até o julgamento do mérito da ADI, quando espera que o artigo 10 da Lei tocantinense 2.713/2013 seja declarado inconstitucional por ofensa ao artigo 24, inciso VI, parágrafos 1º e 2º, e ao artigo 225, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição Federal.

O relator desta ADI é o ministro Teori Zavascki.

Fonte: STF | 11/05/2015.

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