Artigo: Publicidade registral como ferramenta processual – Por Marla Camilo

* Marla Camilo

As averbações premonitórias e as citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias relativas a imóveis são ferramentas processuais de grande valia porquanto dão publicidade da lide judicial afastando possível boa-fé de adquirentes ou terceiros que receberam o imóvel em garantia.

O objetivo da averbação premonitória na matrícula do imóvel é dar publicidade do feito executório de forma que se presuma fraude à execução qualquer alienação ou oneração de bens realizadas após essa inscrição. O reconhecimento da fraude à execução não desfaz a alienação, mas promove a ineficácia desta em relação àquele que promoveu a publicidade registral da execução.

A lei 11.383/2006 inseriu o artigo 615-A no Código de Processo Civil (CPC) que apregoa que o exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento da execução para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.

A averbação premonitória poderá incidir em qualquer bem passível de execução, todavia, importante que o interessado seja claro sobre quais bens deverão ser inscritos tendo em vista que a averbação indevida dá direito a perdas e danos à parte contrária nos termos do §4º do artigo 615-A do CPC. Ademais, também é preciso informar na certidão os dados do processo como natureza da execução, número, comarca e vara para que aquele que tiver interesse na aquisição do imóvel possa obter informações sobre o feito.

Por conseguinte, o exequente terá que comunicar o juízo sobre as averbações efetivadas no prazo de 10 dias da sua concretização nos termos do §1º do art. 615-A do CPC. Insta salientar que o cancelamento da averbação premonitória não é automático sendo imprescindível mandado de ordem específica de baixa para cada averbação.

Noutro norte, também há a possibilidade de registro das citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias relativas a imóveis, nos termos do artigo 167, I, 21, da Lei 6015/73, para dar publicidade de ações de conhecimentos a terceiros para que estes não aleguem desconhecimento da existência destas. Nesse caso, diferentemente das averbações premonitórias, é caso de registro e este deverá ocorrer apenas sobre o bem em discussão no processo.

Destarte, o documento a ser registrado é o instrumento citatório ou a sua determinação que deverá indicar o juízo, comarca, vara e processo, tipo de ação, bem como o imóvel, autor e a parte contrária da ação.

Por fim, a lei de registros públicos não definiu um prazo para que o interessado informasse ao magistrado sobre o registro das citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias, possibilidade que deverá ser observada no Código de Normas de cada Estado. Ressalta-se que o cancelamento também não é automático sendo necessário pedido de baixa, nesse caso, judicial ou extrajudicialmente já que a lei também não especificou.

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Referências Bibliográficas

BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm. Acesso em 25 abr. 2015.

SERRA, Monete Hipólito; SERRA; Márcio Guerra. Registro de Imóveis II, atos ordinários.1. ed. 2º tiragem. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 130 -140.

CORRÊA, Wilson Leite. Da fraude de execução. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: . Acesso em: 25 abr. 2015.

Fonte: Notariado | 01/05/2015.

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Artigo: Imposto Estadual sobre transmissão “Causa Mortis” e doação (ITCMD) – exigência ilegal em face de bens transferidos aos sócios por ocasião da liquidação da Sociedade – Por Rogério Pires da Silva

* Rogério Pires da Silva

Recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o campo de incidência do ITCMD permite identificar que os limites da lei são cada vez mais desrespeitados pela fúria arrecadatória. A aparente ausência de barreiras para a “interpretação” fazendária – aliada à ausência de punição para os excessos da fiscalização – conduz ao absurdo lançamento fiscal que somente o Poder Judiciário pôde obstaculizar nos autos da apelação cível n. 0007687-15.2013.8.26.0053 (processo julgado em 8.9.2014).

Em suma, naquele caso a Corte paulista houve por bem anular débito fiscal de ITCMD lançado pela autoridade fazendária do Estado de São Paulo em face (dentre outros) de transmissão de bens da sociedade aos sócios, por ocasião da liquidação regular da empresa.

O absurdo salta aos olhos porque na liquidação da sociedade não há transmissão “causa mortis”, e de doação também não se pode cogitar – mas a autoridade fazendária interpretou que no caso concreto os bens teriam sido transferidos pela sociedade aos sócios por mera “liberalidade” daquela, e com amparo nessa leitura dos fatos formalizou o lançamento do ITCMD, antevendo suposta “doação” sujeita ao imposto.

Foi preciso que o Tribunal de Justiça de São Paulo se debruçasse sobre o tema para dizer o óbvio: os bens recebidos a título de distrato da sociedade não se submetem ao ITCMD.

De fato, a Constituição outorga aos Estados (e ao Distrito Federal) a competência para instituir e cobrar o imposto sobre “transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos” (art. 155, I), e o Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/66, com eficácia de lei complementar em razão da matéria) estipula que nem mesmo a lei pode alterar a “definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias” (art. 110).

A doação é negócio jurídico definido expressamente no art. 638 do Código Civil (Lei n. 10.406/02): “Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.”

Já a liquidação de sociedade é negócio jurídico totalmente distinto (arts. 51, 1.033 e ss., e especialmente 1.102 e ss., do Código Civil), em virtude do qual a transmissão de bens pela sociedade aos sócios decorre de partilha de haveres (idem, art. 1.103, IV), jamais por mera “liberalidade” da sociedade.

Tais conceitos de direito privado são relevantes, portanto, para a delimitação do campo de incidência do ITCMD, e não havendo fraude ou simulação – posto que isso não foi sequer aventado pela fiscalização no caso concreto – não se pode confundir a doação sujeita ao tributo e o pagamento de haveres aos sócios na liquidação de sociedade de pessoas.

O lançamento original contemplava ainda a cobrança do imposto em face de doação de imóveis efetivamente ocorrida, mas regularmente submetida à incidência do tributo. Neste caso, a doação de imóveis do pai para cada um de seus três filhos foi feita por escritura pública, com divisão igualitária, de modo a aquinhoar cada donatário com 1/3 (um terço) dos imóveis – e cada quinhão acabou ficando abaixo do limite de isenção do imposto, que é de duas mil e quinhentas UFESP (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo), de conformidade com o art. 6º, inciso II, alínea “a”, da Lei Estadual nº 10.705/00 (reproduzida no art. 6º, II, “a”, do Decreto Estadual nº 46.655/02, que regulamenta aquele diploma).

Ocorre que uma das donatárias, por engano, declarou ao fisco federal ter recebido em doação o valor total dos imóveis, e com base tão somente nessa declaração ao fisco federal a autoridade fazendária estadual partiu do pressuposto de que a referida donatária, na verdade, teria recebido todos os imóveis – pelo que recusou fé à escritura pública de doação dos imóveis, lançando o ITCMD supostamente devido pela referida donatária em face do valor integral dos imóveis doados.

Ora, o valor da soma dos imóveis doados ultrapassou o limite de isenção acima referido, mas é fora de dúvida que a donatária não possuía capacidade contributiva para arcar com o imposto – eis que, ao fim e ao cabo, recebeu apenas 1/3 (um terço) dos imóveis – e de todo modo a regra de isenção prevalece para cada doação isoladamente considerada.

De mais a mais, a escritura de doação é documento público. E é vedado ao Estado negar fé ao documento público (art. 19, II, da Constituição Federal). Por isso mesmo não poderia prevalecer no lançamento do ITCMD, contra o próprio documento público, a mera declaração (equivocada) entregue pela donatária ao fisco federal.

Tais elementos foram simplesmente ignorados pela fiscalização estadual no caso concreto, novamente com base numa suposta liberdade de “interpretação” da autoridade fazendária. Como se os imóveis pudessem ser considerados inteiramente transmitidos a um só dos donatários apenas em razão da declaração (unilateral) por ele prestada ao fisco federal.

A esta altura é irrelevante se houve equívoco naquela declaração, como se pode facilmente constatar, porque bens imóveis não podem ser considerados transmitidos (independente do negócio jurídico: doação ou compra e venda, não importa) por singela declaração de uma das partes. A lei exige instrumento público para esse tipo de transação (art. 108 do Código Civil), e o instrumento público prevalece – como é evidente – em detrimento de qualquer outra manifestação de vontade.

Como se não bastasse, a manifestação de vontade do contribuinte (dotada ou não de equívoco) é irrelevante para fazer nascer a obrigação de pagar o tributo, pois em nosso direito tributário a obrigação é “ex lege” – ou seja, só há tributo devido quando ocorrida, na realidade dos fatos, a hipótese de incidência prevista abstratamente na lei.

De todo modo, a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo no caso concreto demonstra que há certo despreparo dos servidores no trato da matéria – revelando a necessidade de que o fisco redobre a atenção no treinamento de seus agentes fazendários (com ênfase nos elementos de direito tributário e nos fundamentos de direito privado essenciais à atividade de quem está encarregado de lançar o ITCMD).

É preferível acreditar que essa deficiência foi a única causadora do lançamento impugnado no processo em epígrafe; a prevalecer a ideia de que a tese fazendária resultou de uma interpretação “possível” da norma em vigor – e se essa interpretação se difundir para vitimar outros contribuintes – o já assoberbado Poder Judiciário remanescerá como último limite para corrigir erros elementares das autoridades fazendárias.

* Rogério Pires da Silva (Advogado em São Paulo, sócio de BOCCUZZI ADVOGADOS ASSOCIADOS)

Fonte: Migalhas | 29/04/2015.

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STJ: DIREITO EMPRESARIAL. AVAL EM CÉDULAS DE CRÉDITO RURAL.

Admite-se aval em cédulas de crédito rural. Isso porque a proibição contida no § 3º do art. 60 do Decreto-Lei 167/1967 não se refere ao caput (cédulas de crédito), mas apenas ao § 2º (nota promissória e duplicata rurais). Dispõe o art. 60 do DL 167/1967 que “Aplicam-se à cédula de crédito rural, à nota promissória rural e à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial, inclusive quanto a aval, dispensado porém o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas”. O § 2º do referido artigo, por sua vez, impõe ser “nulo o aval dado em Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente ou por outras pessoas jurídicas”. Já o § 3º preceitua que “também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas”. Observe-se que a afirmação de que “também são nulas” outras garantias só pode complementar dispositivo no qual haja referência a outra nulidade, e o único dispositivo do citado artigo a fazer tal assertiva é o § 2º, no tocante à nulidade do aval. É dizer que a afirmação de que “também são nulas” outras garantias não pode mesmo dizer respeito aocaput, que não contém previsão alguma acerca de nulidade de garantias. Frise-se, ademais, que os arts. 11, 17 e 18 do Decreto-Lei 167/1967 fazem referência textual a garantias prestadas por terceiros em cédulas de crédito rural. De mais a mais, observa-se que as alterações promovidas pela Lei 6.754/1979 – que acrescentou ao art. 60 os parágrafos 1º a 4º –, pretenderam retirar a responsabilidade cambiária do produtor rural pelo endosso e aval nas notas promissórias rurais ou duplicatas rurais descontadas em instituição bancária, quando o principal devedor, a indústria agrícola, fraudulentamente ou não, deixava de honrar a dívida garantida pelas cártulas. A disciplina das cédulas de crédito rural, por sua vez, é absolutamente diferente. Mesmo porque se trata de títulos de crédito referentes a financiamentos tomados pelos produtores rurais com integrantes do sistema nacional de crédito rural ou cooperativas (nesse sentido, são os arts. 1º,caput e parágrafo único, 14, IV, 20, IV, 25, IV, e 77, parágrafo único, todos do Decreto-Lei 167/1967). Com efeito, as alterações trazidas pela Lei 6.754/1979, a toda evidência, não tiveram como destinatárias as Cédulas de Crédito, pois estas são títulos representativos de financiamento rural tomado pelo produtor ou cooperado para o incremento de suas próprias atividades. Ou seja, nelas o produtor figura mesmo como devedor, ao contrário da nota promissória rural e da duplicata rural, nas quais o devedor é o comprador do produto rural a prazo – no mais das vezes, a agroindústria de grande porte. Nessa linha de raciocínio, o aval prestado por terceiros nas cédulas de crédito rural constitui reforço de garantia do próprio produtor rural, sem o qual figuraria sozinho como responsável pelo financiamento perante o credor. A um só tempo, o crédito rural estaria sensivelmente dificultado – e certamente mais caro – ao pequeno produtor rural, e, além disso, tal circunstância vai de encontro ao próprio sistema do crédito rural, o qual tem como um dos principais objetivos “possibilitar o fortalecimento econômico dos produtores rurais, notadamente pequenos e médios” (Lei 4.829/1965, art. 3º, III). REsp 1.315.702-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/3/2015, DJe 13/4/2015.

Fonte: STJ – Informativo nº 0559 | 6 a 16 de abril/2015.

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