Registro de Imóveis – Condomínio edilício – Matrículas de garagens – Bloqueio em procedimento administrativo – Solicitação de desbloqueio das matriculas visando possibilitar o registro de carta de adjudicação expedida em ação de cobrança de despesas condominiais – Garagens que serão transmitidas ao próprio condomínio edilício que, por seu lado, não poderá promover alienações sem prévia autorização concedida pelos condôminos em assembleia a ser convocada para essa finalidade – Inadequação do procedimento administrativo para a solução de litígio entre condôminos, ou desses com terceiros – Recurso provido para determinar do desbloqueio das matriculas.

Número do processo: 1092773-14.2018.8.26.0100

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 189

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1092773-14.2018.8.26.0100

(189/2019-E)

Registro de Imóveis – Condomínio edilício – Matrículas de garagens – Bloqueio em procedimento administrativo – Solicitação de desbloqueio das matriculas visando possibilitar o registro de carta de adjudicação expedida em ação de cobrança de despesas condominiais – Garagens que serão transmitidas ao próprio condomínio edilício que, por seu lado, não poderá promover alienações sem prévia autorização concedida pelos condôminos em assembleia a ser convocada para essa finalidade – Inadequação do procedimento administrativo para a solução de litígio entre condôminos, ou desses com terceiros – Recurso provido para determinar do desbloqueio das matriculas.

Trata-se de recurso interposto pelo Condomínio Conjunto Yuma contra r. decisão da MM. Juíza Corregedora Permanente que manteve o bloqueio administrativo das trezentos e dezoito matrículas das vagas de garagem previstas no registro da sua instituição, para possibilitar o futuro registro de carta de adjudicação que foi expedida em seu favor em ação de cobrança de despesas condominiais.

Alega, em suma, que o bloqueio foi determinado pela MM. Juíza Corregedora Permanente em procedimento em que um dos condôminos afirmou que o número de vagas efetivamente existentes seria inferior ao das matrículas abertas. Esclareceu que as vagas de garagem foram adjudicadas em seu favor e que promoveu esforços para arrecadar os valores necessários para o pagamento do ITBI e para o registro da adjudicação. Aduzi u que as vagas de garagem são objeto de matrículas próprias e foram adjudicadas em ação judicial (Processo nº 0186044-41.2011.8.26.0100 da 4ª Vara Cível da Comarca da Capital). Asseverou que não há decisão judicial declarando a existência de número de vagas inferior às que foram matriculadas. Informou que necessita do registro para a aquisição do domínio das garagens que ainda figuram como de propriedade do construtor. Requereu o provimento do recurso para o desbloqueio das matrículas das vagas de garagem (fls. 77/80).

O Ministério Público opinou pelo não provimento do recurso (fls. 91/92).

É o relatório.

O recorrente pretende o cancelamento do bloqueio das matrículas das vagas de garagem que foi determinado pela Corregedoria Permanente, no Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100 (fls. 69/70), por r. decisão de 17 de julho de 2017.

O pedido de revisão da decisão que determinou os bloqueios foi indeferido porque existiria discrepância entre o espaço físico para as vagas de garagem efetivamente existente, que comportaria duzentas e onze vagas, e quantidade de vagas que são objeto de matrículas próprias, no total de trezentos e dezoito, sem a indicação de fato novo que justificasse a alteração da medida que teve como finalidade preservar a segurança jurídica e os direitos de terceiros (fls. 69/70).

O Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100 da 1º Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital teve início em razão de determinação pela Corregedoria Geral da Justiça, realizada no julgamento de recurso interposto no Processo nº 1118921-67.2017.8.26.0100, para a análise de providências relativas às matrículas das vagas de garagem, visando a proteção de terceiros de boa-fé, em razão da notícia de divergência entre a situação fática e a registral (fls. 01 dos autos em apenso).

Por seu turno, o Processo nº 1118921-67.2017.8.26.0100 foi instaurado em razão de requerimento, formulado por Roberto Berlarmino Herebia, e outros, para a retificação da matrícula nº 23.876 do 4º Registro de Imóveis da Capital, em que promovido o registro da instituição do Condomínio Conjunto Yuma, porque foram abertas matrículas para trezentos e dezoito vagas de garagem, mas, de fato, existem duzentos e onze espaços para guarda de veículos, distribuídos em três pavimentos que são objeto de propriedade comum dos condôminos.

Esse pedido foi indeferido porque, como constou em r. parecer apresentado pelo MM. Juiz Assessor da Corregedoria, Dr. Luciano Gonçalves Paes Leme, que foi aprovado pelo Excelentíssimo Desembargador Pereira Calças, então Corregedor Geral da Justiça, o registro das vagas de garagem foi promovido em consonância com o memorial da incorporação e a instituição e especificação do condomínio que previram a existência de trezentos e dezoito vagas de garagem distribuídas em três subsolos, consistindo essas vagas em unidades autônomas a que foram atribuídas fração ideal do terreno, área útil, área total e designação numérica específica (fls. 04 dos autos em apenso).

Foi considerado, ainda, que a retificação requerida poderia atingir direitos de terceiros que não participaram do procedimento administrativo, em especial pela alteração das vagas de garagem que deixariam de constituir unidades autônomas para passar a consistir em espaços situados em área comum do condomínio.

Além disso, a retificação importaria em atribuir às demais unidades autônomas as frações ideais do condomínio vinculadas às matrículas das vagas de garagem, com alteração substancial da instituição e convenção do condomínio (fls. 06 dos autos em apenso).

Contudo, diante de evidências concretas da existência de espaço físico insuficiente para acomodar o número de vagas de garagem previsto na instituição do condomínio, foi determinada a adoção de providências, pela Corregedoria Permanente, para verificar eventual pertinência do bloqueio das matrículas, de modo a evitar prejuízos a terceiros de boa-fé (fls. 06/07 e 8 dos autos em apenso).

Roberto Belarminio Herebia, e outros, intervieram no Processo nº 1092773-14.2018.8.26.0100 e insistiram na retificação do registro da instituição do condomínio (fls. 13/17 dos autos em apenso).

A seguir, no Processo nº 1092773-14.2018.8.26.0100, foi determinado o bloqueio das matrículas das vagas de garagem para que a dissonância entre a situação fática e a registrária, decorrente da inexistência de espaço suficiente para acomodar trezentos e dezoito vagas de garagem consideradas como unidades autônomas, não cause prejuízo a terceiros de boa fé (fls. 40/42 dos autos em apenso).

Além disso, foi determinada a intimação dessa r. decisão aos proprietários das garagens bloqueadas (fls. 88), informando a Oficial de Registro de Imóveis que todas eram de propriedade de Jorge Antonio Miguel Yunes e sua mulher, Ivani José Kechefi Yunes (fls. 91 autos em apenso).

Ainda no Processo nº 1092773-14.2018.8.26.0100, Ivani José Kechefi Yunes comunicou ao Oficial de Registro de Imóveis o falecimento de Jorge Antonio Miguel Yunes e esclareceu que todas as vagas de garagem foram transmitidas ao Condomínio Conjunto Yuma mediante adjudicação realizada no Processo nº 0186044-41.2011.8.26.0100 (fls. 971124 dos autos em apenso).

Destarte, em que pese a não juntada aos autos das certidões das matrículas bloqueadas, ficou suficientemente esclarecido, e foi confirmado pela Sra. 4ª Oficial de Registro de Imóveis da Capital (fls. 60/61), que essas matrículas são relativas às trezentos e dezoito vagas de garagem que estão registradas como de propriedade de Jorge Antonio Miguel Yunes e Ivani José Kechfi Yunes.

Por sua vez, Jorge Antonio Miguel Yunes e Ivani José Kechfi Yunes transmitiram todas as vagas de garagem ao Condomínio Conjunto Yuma mediante transação realizada no Processo nº 0186044-41.2011.8.26.0100 da 4ª Vara Cível da Comarca da Capital, com posterior expedição de carta de adjudicação em favor do adquirente (fls. 15/41).

Apesar da ausência dos documentos que levaram ao reconhecimento da existência de indícios de que o espaço físico do edifício destinado à guarda de veículos é insuficiente para comportar as trezentos e dezoito vagas de garagem, o desbloqueio das matrículas para permitir o registro da carta de adjudicação não causará riscos a terceiros incertos, ou desconhecidos.

Assim porque, em tese, o registro da adjudicação é necessário para a transmissão da propriedade das trezentos e dezoito vagas de garagem ao próprio condomínio em que estão situadas.

Promovido esse registro, novas alienações somente serão possíveis mediante aprovação pela Assembleia dos Condôminos, a ser convocada mediante notificação de todos os condôminos em que deverá ser consignada a finalidade da assembleia. Nesse sentido:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – CONDOMÍNIO – ALIENAÇÃO DE UNIDADE CONDOMINIAL – Para que o condomínio edifício venda unidade condominial de que seja proprietário, necessária a unanimidade de votos dos condôminos presentes em assembleia geral convocada para este fim, o que não se confunde com unanimidade de todos os condôminos, prescindível à hipótese. Recurso não provido” (Conselho Superior da Magistratura, Apelação nº 1024765-14.2015.8.26.0577, Rel. Desembargador Pereira Calças, j. 05.12.2017).

E nas vendas que forem autorizadas também prevalecerá o que dispuser a convenção do condomínio sobre a possibilidade, ou não, da alienação de vaga de garagem a quem não for proprietário de unidade autônoma consistente em apartamento ou em loja.

Isso permitirá que todos os condôminos participem da assembleia e, se houver litígio, movam as ações pertinentes visando a tutela dos direitos de que se considerarem titulares.

Ademais, nada impede que essas ações sejam movidas de imediato se houver litígio sobre a distribuição e uso das vagas de garagem efetivamente existentes, uma vez que não pode ser resolvido em procedimento de natureza administrativa.

Por igual razão, nas ações que forem movidas poderão as partes solicitar o bloqueio dos registros, ou eventuais outras medidas cautelares que se mostrarem cabíveis para a preservação de seus respectivos direitos.

Por outro lado, o Processo nº 1118921.67.2015.8.26.0100 disse respeito à natureza das vagas de garagem, com pretensão de alteração de vagas consistentes em unidades autônomas para espaço destinado à guarda de veículos em área comum de propriedade de todos os condôminos.

Essa alteração implica em modificação do direito de propriedade atualmente existente, o que depende da retificação ou cancelamento das matrículas das vagas de garagem, pois, como previsto no art. 1.245, § 2°, do Código Civil: “Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel”.

Por essa razão, a alteração da natureza das vagas de garagem depende de negócio jurídico celebrado por todas as pessoas legitimadas, ou de determinação em ação contenciosa.

Essas medidas, por sua natureza, são incompatíveis com o procedimento administrativo de retificação, motivo pelo qual não autorizam o bloqueio determinado.

Por fim, o cancelamento do registro mediante redução ao número de vagas de garagem que, segundo alegado no Processo nº 1118921.67.2015.8.26.0100, corresponderia ao espaço físico existente, também depende de negócio jurídico a ser celebrado pelos legitimados, ou de determinação em ação própria, por afetar diretamente o direito de propriedade decorrente das matrículas que foram abertas em conformidade com a instituição do condomínio edilício.

Por esses motivos, no presente caso concreto mostra-se possível o cancelamento do bloqueio determinado em procedimento administrativo.

Ante o exposto, o parecer que apresento ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de dar provimento ao recurso para revogar o bloqueio das matrículas das garagens do Condomínio Conjunto Yuma determinado no Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100 da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital.

Se aprovado, competirá à MM. Juíza Corregedora Pe1manente expedir o mandado para o cancelamento do bloqueio e, ainda, dar ciência deste parecer, e da r. decisão de Vossa Excelência, a Roberto Belarmino Herebia e outros, porque intervieram, como interessados, no Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100.

Sub censura,

São Paulo, 08 de abril de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou provimento ao recurso para revogar o bloqueio administrativo das matrículas das garagens do Condomínio Conjunto Yuma determinado no Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100 da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital. O mandado para a averbação do cancelamento dos bloqueios será expedido pela Corregedoria Permanente a que competirá, ainda, dar ciência do parecer e desta decisão para Roberto Belarmino Herebia, e outros, que intervieram como interessados no Processo nº 0010674-38.2017.8.26.0100. Oportunamente, remetam-se os autos à Vara de origem. Intimem-se. São Paulo, 10 de abril de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogada: MARIA VALERIA VIEGAS ALVES CARNEIRO, OAB/SP 151.757.

Diário da Justiça Eletrônico de 16.04.2019

Decisão reproduzida na página 073 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

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Civil – Processual civil – Omissão – Ausência de demonstração – Súmula 284/STF – Direito sucessório – Valores existentes em contas de FGTS e PISPASEP – Não levantamento em vida pelo autor da herança – Pagamento à dependente habilitada na previdência social – Impossibilidade – Existência de bens a inventariar – Inaplicabilidade da Lei 6.858/80 – 1. Ação de divórcio em que se discute a titularidade de valores existentes em contas de FGTS e PIS-PASEP não levantados em vida pelo titular – 2. A ausência de precisa indicação acerca da suposta omissão relevante no acórdão recorrido torna incompreensível a fundamentação recursal, atraindo a incidência da Súmula 284/STF – 3. A Lei n. 6.858/80, ao pretender simplificar o procedimento de levantamento de pequenos valores não recebidos em vida pelo titular do direito, aplica-se estritamente a hipóteses em que atendidos dois pressupostos: (a) condição de dependente inscrito junto à previdência; (b) inexistência de outros bens a serem inventariados – 4. Hipótese em que, existentes outros bens deixados pelo falecido a serem inventariados entre os herdeiros, não se aplica a possibilidade de levantamento imediato dos valores pela dependente inscrita na Previdência Social, devendo os valores serem incluídos no monte partível – 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1754726 – RJ (2018/0181188-8)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : SYLVIO FRANCO ARRUDA – ESPÓLIO

REPR. POR : SERGIO ROCHA ARRUDA – INVENTARIANTE

ADVOGADO : KATTIA MARIA BARBOSA ANÉSIO MAGALHÃES – RJ096186

RECORRIDO : ILZE MORAES DO NASCIMENTO

ADVOGADO : ANDRÉ LUIZ ACCIOLY SILVA – RJ134551

INTERES. : SHEILA ROCHA ARRUDA

INTERES. : SIDNEY ROCHA ARRUDA

INTERES. : SUELI ROCHA ARRUDA

INTERES. : RAYSSA SILVA ARRUDA

EMENTA

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. OMISSÃO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO. SÚMULA 284/STF. DIREITO SUCESSÓRIO. VALORES EXISTENTES EM CONTAS DE FGTS E PISPASEP. NÃO LEVANTAMENTO EM VIDA PELO AUTOR DA HERANÇA. PAGAMENTO À DEPENDENTE HABILITADA NA PREVIDÊNCIA SOCIAL. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE BENS A INVENTARIAR. INAPLICABILIDADE DA LEI 6.858/80.

1 – Ação de divórcio em que se discute a titularidade de valores existentes em contas de FGTS e PIS-PASEP não levantados em vida pelo titular.

2 – A ausência de precisa indicação acerca da suposta omissão relevante no acórdão recorrido torna incompreensível a fundamentação recursal, atraindo a incidência da Súmula 284/STF.

3 – A Lei n. 6.858/80, ao pretender simplificar o procedimento de levantamento de pequenos valores não recebidos em vida pelo titular do direito, aplica-se estritamente a hipóteses em que atendidos dois pressupostos: (a) condição de dependente inscrito junto à previdência; (b) inexistência de outros bens a serem inventariados.

4 – Hipótese em que, existentes outros bens deixados pelo falecido a serem inventariados entre os herdeiros, não se aplica a possibilidade de levantamento imediato dos valores pela dependente inscrita na Previdência Social, devendo os valores serem incluídos no monte partível.

5 – Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.

DECISÃO 

Cuida-se de recurso especial interposto pelo espólio de SILVIO FRANCO DE ARRUDA, com base no art. 105, III, alínea “a”, da Constituição Federal, contra o acórdão do TJ/RJ que, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento por ele interposto.

Ação: de inventário de SILVIO FRANCO ARRUDA.

Decisão interlocutória: indeferiu a partilha, no inventário, dos valores existentes em contas individuais do FGTS e do Fundo de Participação PIS-PASEP, ao fundamento de que tais valores devem ser pagos aos dependentes habilitados perante a Previdência Social, na forma da Lei 6.858/60 (fls. 637/638, e-STJ).

Acórdão: por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo recorrente, nos termos da seguinte ementa:

Agravo de Instrumento. Ação de Inventário. Decisão que indeferiu pedido de levantamento de saldo do FGTS pelo Espólio. Irresignação do Espólio. Companheira do falecido, habilitada na Previdência Social. Aplicação da Lei nº 6.858./80. Lei especial que determina que os valores recebidos a título de FGTS e não levantados em vida devem ser pagos aos dependentes habilitados na Previdência Social. Inexistência de violação ao direito à herança e à vocação hereditária. Lei que não exige que a habilitação se dê antes do óbito, ou que o fato gerador de tais valores tenham ocorrido na constância do casamento ou da união estável. FGTS que é regulado por lei especial, que se sobrepõe à lei geral (Código Civil), não havendo que se falar em violação à vocação hereditária. Direito à herança que permanece sendo respeitado, havendo irresignação do Espólio tão somente quanto à divisão dos valores decorrentes do FGTS não recebido em vida pelo de cujus. Precedentes inúmeros desta Corte Estadual a respeito da mesma questão. “Procedimento de Requerimento de Alvará. Levantamento de FGTS e PIS. Recurso da dependente habilitada junto à Previdência Social. Pedido de percepção integral da verba, uma vez que a sentença determinou a divisão do valor com os sucessores. Lei 6858/80 que é peremptória ao dispor que o pagamento se dará aos dependentes habilitados e, apenas na falta destes, aos sucessores. Precedentes. Clareza solar da norma que não autoriza a diferenciação a respeito da data da habilitação da recorrente, se antes ou depois do óbito do titular da verba, uma vez que a lei não faz tal exigência temporal. Recurso provido” (0011484-47.2013.8.19.0003 – Apelação – Des. Mauro Pereira Martins – Julgamento: 09/11/2016 – Décima Terceira Câmara Cível). Decisão que não merece reparo. DESPROVIMENTO DO RECURSO (fls. 32/42, e-STJ).

Embargos de declaração: opostos pelo recorrente, foram rejeitados, por unanimidade. (fls. 82/89, e-STJ).

Recurso especial: aponta-se violação ao art. 1.022 do CPC/15, ao fundamento de que o acórdão recorrido possuiria omissão relevante, e violação ao art. 993, IV, alínea “g”, do CPC/73, ao fundamento de que os valores recebidos a título de FGTS e PIS-PASEP, não levantados em vida pelo falecido, são vultosos e superam o teto de 500 OTN’s e de que há outros bens a inventariar, não se aplicando, pois, a regra da Lei 6.858/80. (fls. 107/114, e-STJ).

Ministério Público Federal: opinou pelo provimento do recurso especial (fls. 169/174, e-STJ).

Relatados os fatos, decide-se.

01) O propósito recursal é definir se houve omissão relevante no acórdão recorrido e se os valores recebidos a título de FGTS e PIS-PASEP, não levantados em vida pelo falecido, podem ser integralmente levantados pela convivente do de cujus ou se devem integrar o monte partível.

02) De início, anote-se que o recorrente, conquanto afirme, no recurso especial, que o acórdão recorrido possuiria omissão relevante, não aponta, precisamente, em que consistiria o referido vício, tampouco em que medida o não enfrentamento da suposta questão relevante pelo TJ/RJ impediria o exame da matéria de fundo por ausência de prequestionamento, razão pela qual é incompreensível a fundamentação recursal quanto ao ponto, aplicando-se, pois, a Súmula 284/STF.

03) De outro lado, sublinhe-se que controvertem as partes acerca da titularidade dos valores recebidos a título de FGTS e PIS-PASEP, não levantados em vida pelo falecido: se pertencem exclusivamente à companheira do falecido, dependente habilitada na Previdência Social, ou se devem ser incluídos no inventário para posterior partilha entre todos os herdeiros.

04) Nesse particular, registre-se, inicialmente, que o acórdão recorrido não tratou da exata quantificação do valor existente nas referidas contas, tampouco se superariam, ou não, o limite de 500 OTN’s estabelecido pela Lei 6.858/80, razão pela qual, nessa perspectiva, o conhecimento do recurso especial é inviável em razão do óbice da Súmula 7/STJ.

05) Todavia, é fato incontroverso a existência de diversos bens deixados pelo falecidos a serem inventariados entre os herdeiros, inclusive a companheira recorrida, razão pela qual essa circunstância impede o levantamento dos valores exclusivamente por ela, exigindo-se sejam eles inseridos no acervo hereditário e oportunamente partilhados entre os herdeiros, na forma do art. 2º, caput, da Lei 6.858/80.

06) A esse respeito, ressalte-se que a jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que “a Lei n. 6.858/80, ao pretender simplificar o procedimento de levantamento de pequenos valores não recebidos em vida pelo titular do direito, aplica-se estritamente a hipóteses em que atendidos dois pressupostos: (a) condição de dependente inscrito junto à previdência; (b) inexistência de outros bens a serem inventariados”. (REsp 1.537.010/RJ, 3ª Turma, DJe 07/02/2017 e AgInt no REsp 1.625.836/MG, 4ª Turma, DJe 25/10/2019).

07) Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, DOU-LHE PROVIMENTO, com base no art. 932, V, “a”, do CPC/15 e Súmula 568/STJ, a fim de determinar que os valores recebidos a título de FGTS e PIS-PASEP, não levantados em vida pelo falecido, sejam incluídos no monte partível.

08) Previno às partes que a interposição de recurso contra esta decisão, se declarado manifestamente inadmissível, protelatório ou improcedente, poderá acarretar sua condenação às penalidades fixadas nos arts. 1.021, §4º, e 1.026, §2º, ambos do CPC/15.

Publique-se. Intimem-se. Oficie-se.

Brasília, 30 de junho de 2020.

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.754.726 – Rio de Janeiro – 3ª Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJ 03.08.2020

Fonte: INR Publicações

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Contribuição patronal sobre salário-maternidade é inconstitucional

Segundo a maioria do Plenário, a parcela não é contraprestação ao trabalho e, portanto, não pode compor a base de cálculo.

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/1991) que instituíam a cobrança da contribuição previdenciária patronal sobre o salário-maternidade. A decisão, por maioria de votos, foi tomada no Recurso Extraordinário (RE) 576967, com repercussão geral reconhecida (Tema 72), julgado na sessão virtual encerrada em 4/8. A decisão servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 6970 processos semelhantes sobrestados em outros tribunais.

O recurso foi interposto pelo Hospital Vita Batel S/A, de Curitiba (PR), com o argumento de que o salário-maternidade não pode ser considerado como remuneração para fins de tributação, pois, no período em que o recebe, a empregada está afastada do trabalho. A empresa sustentava que a utilização da parcela na base de cálculo para fins de cobrança previdenciária caracterizaria fonte de custeio para a seguridade social não prevista em lei. A União, por outro lado, alegava que a empregada continua a fazer parte da folha de salários mesmo durante o afastamento e que, pela lei, o salário-maternidade é considerado salário de contribuição.

O exame do caso havia sido iniciado em novembro de 2019 e foi suspenso por pedido de vista do ministro Marco Aurélio, que liberou o processo para continuidade de julgamento em ambiente virtual, em razão da pandemia da Covid-19.

Contraprestação

No voto condutor da decisão, o relator do RE, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que a Constituição Federal e a Lei 8.212/1991 preveem como base de cálculo da contribuição previdenciária os valores pagos como contraprestação a trabalho ou serviço prestado ao empregador, empresa e entidade equiparada. No caso da licença-maternidade, no entanto, a trabalhadora se afasta de suas atividades e deixa de prestar serviços e de receber salários do empregador. Portanto, o benefício não compõe a base de cálculo da contribuição social sobre a folha salarial. “O simples fato de que a mulher continua a constar formalmente na folha de salários decorre da manutenção do vínculo trabalhista e não impõe natureza salarial ao benefício por ela recebido”, ressaltou.

O relator salienta que a regra questionada (artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 8.212/1991) cria, por lei ordinária, nova fonte de custeio da seguridade social diversa das previstas na Constituição Federal (artigo 195, inciso I, alínea ‘a’). De acordo com a norma constitucional, a criação de outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou a expansão da seguridade social exige a edição de lei complementar.

Discriminação da mulher no mercado de trabalho

Barroso destacou diversas pesquisas que demonstram a reiterada discriminação das mulheres no mercado de trabalho, com restrições ao acesso a determinados postos de trabalho, salários e oportunidades. Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) citado por ele concluiu que, no Brasil, os custos adicionais para o empregador correspondem a 1,2% da remuneração bruta mensal da mulher.

Para o relator, admitir uma incidência tributária que recaia somente sobre a contratação de mulheres e mães é tornar sua condição biológica, por si só, um fator de desequiparação de tratamento em relação aos homens, desestimulando a maternidade ou, ao menos, incutindo culpa, questionamentos, reflexões e medos em grande parcela da população, pelo simples fato de ter nascido mulher. “Impõe-se gravame terrível sobre o gênero feminino, discriminado na contratação, bem como sobre a própria maternidade, o que fere os direitos das mulheres, dimensão inequívoca dos direitos humanos”, afirmou.

Repercussão geral

Por maioria, foi declarada, incidentalmente, a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 8.212/1991, e a parte final do seu parágrafo 9º, alínea ‘a’, em que se lê “salvo o salário-maternidade”. O entendimento do relator foi seguido pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Celso de Mello. Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que negavam provimento ao RE.

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-maternidade”.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

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