2VRP/SP: Tabelionato de Notas. Procuradoa outorgada por idosos. Recomendação de poderes específicos e prazo determinado.


  
 

Processo 0048072-14.2020.8.26.0100

Pedido de Providências – 2ª Vara de Registros Públicos – VISTOS, Trata-se de pedido de providências instaurado a partir de representação formulada pela Senhora T. L., em face do Senhor Tabelião de Notas da Capital, insurgindo-se contra negativa de lavratura de Procurações Públicas figurando idosos como outorgantes, com prazo de validade indeterminado. O Senhor Tabelião prestou esclarecimentos às fls. 04/34, juntando pertinente documentação. Instada a se manifestar, a Senhora Representante reiterou os termos de sua inicial, bem como declarou que o instrumento público almejado fora devidamente lavrado, sem prazo, junto do Tabelionato de Notas da Capital (fls. 36/38). Sobreveio explicações pela Senhora Interina do Tabelionato de Notas. O Ministério Público apresentou parecer conclusivo pugnando pelo arquivamento do expediente, ante a inexistência de indícios de ilícito funcional por parte do Senhor Titular (fls. 41/42 e 57). É o breve relatório. Decido. Cuidam os autos de representação formulada pela Senhora T. L., em face do Senhor Tabelião de Notas da Capital, insurgindo-se contra negativa de lavratura de Procurações Públicas figurando idosos como outorgantes, com prazo de validade indeterminado. Narrou a Senhora Representante que os idosos que pretendiam a lavratura das Procurações Públicas são absolutamente capazes para todos os atos da vida civil, considerando, assim, que a recusa efetuado pelo Senhor Tabelião foi injustificada. A seu turno, o Senhor Tabelião veio aos autos para informar que a negativa da lavratura do ato sem prazo determinado tem seu fundamento nas Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça, por seu item 131, do Capítulo XIV. Com efeito, esclareceu o ilustre Tabelião que, em contato com a Senhora Representante, lhe expôs detalhadamente suas razões para a negativa em relação ao prazo indeterminado. Instada a se manifestar em réplica, a Senhora Reclamante tornou aos autos para manter sua insurgência e noticiar que conseguiu a lavratura dos atos, conforme desejava, junto do 25º Tabelionato de Notas da Capital. Sobreveio explicações pela Senhora Interina da referida serventia, noticiando que a lavratura da nota fora efetuada após entrevista com os outorgantes, que manifestaram suas razões para a requisição efetuada, inclusive quanto ao prazo, bem como informaram que o ato atribuiria poderes aos seus três filhos, nos quais há plena e total confiança. Pois bem. De início, faço destacar que a normativa que atinge a matéria não estabelece a obrigatoriedade da consignação de prazo de validade em Procuração Pública envolvendo parte idosa. Contudo, é a cautela notarial que assim o recomenda, ao indicar, por meio das NSCGJ, que na confecção de escrituras de mandato com pessoas idosas, especialmente quando insinuado risco concreto de comprometimento patrimonial, seja inscrito prazo de validade não superior a 01 (um) ano, com atribuição de poderes para prática de negócios jurídicos específicos e determinados e sem previsão de cláusula de irrevogabilidade. Com efeito, é função precípua do serviço notarial a garantia da segurança jurídica aos usuários, conferindo fé-pública aos atos praticados. Nesse sentido é a redação dos itens 1º e 1.1, do Capítulo XVI, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, in verbis: 1. O Tabelião de Notas, profissional do direito dotado de fé pública, exercerá a atividade notarial que lhe foi delegada com a finalidade de garantir a eficácia da lei, a segurança jurídica e a prevenção de litígios. 1.1 Na atividade dirigida à consecução do ato notarial, atua na condição de assessor jurídico das partes, orientado pelos princípios e regras de direito, pela prudência e pelo acautelamento. No mais, as NSCGJ são claras ao referir a cautela em casos assemelhados: 132. Nas procurações outorgadas por pessoas idosas, recomenda-se aos Tabeliães de Notas, especialmente quando insinuado risco concreto de comprometimento patrimonial do idoso, que as lavrem com prazo de validade não superior a 01 (um) ano, com atribuição de poderes para prática de negócios jurídicos específicos e determinados e sem previsão de cláusula de irrevogabilidade, ressalvadas as hipóteses em que esta for condição de um negócio jurídico bilateral ou tiver sido estipulada no exclusivo interesse do outorgado/mandatário. No mesmo diapasão, a Recomendação CNJ 46/2020 dispõe acerca de medidas preventivas no âmbito das serventias extrajudiciais, para que se evitem atos de violência patrimonial ou financeira contra pessoa idosa, especialmente vulnerável neste período de pandemia. A redação do artigo primeiro da referida Recomendação assevera: Art. 1º. RECOMENDAR aos serviços notariais e de registro do Brasil, a adoção de medidas preventivas para a coibir a prática de abusos contra pessoas idosas, especialmente vulneráveis no período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), realizando diligências se entenderem necessário, a fim de evitar violência patrimonial ou financeira nos seguintes casos: I- antecipação de herança; II- movimentação indevida de contas bancárias; III- venda de imóveis; IV- tomada ilegal; V- mau uso ou ocultação de fundos, bens ou ativos; e VI- qualquer outra hipótese relacionada à exploração inapropriada ou ilegal de recursos financeiros e patrimoniais sem o devido consentimento do idoso. [grifos meus] Nessa ordem de ideias, é certo que a qualificação notarial negativa efetuada pelo Senhor Titular se encontra regularmente inserida dentro de seu mister de atribuições, objetivando, exatamente, como descrito nas NSCGJ, “garantir a eficácia da lei, a segurança jurídica e a prevenção de litígios”, em atuação que visa proteger o direito dos próprios outorgantes. Desse modo, dentro de sua independência funcional, uma vez fundamentada a recusa, conforme nota devolutiva apresentada à parte por e-mail, não há que se falar em falha na prestação extrajudicial, mesmo que outra unidade, em interpretação diversa e possível, tenha realizado o procedimento. Nesse sentido, no que tange às explicações pela Senhora Interina, também não verifico qualquer ilícito ou falha na prestação do serviço, porque bem fundamentada suas razões assecuratórias que levaram à lavratura do feito. Destarte, diante desse painel, reputo satisfatórias as explicações apresentadas pelo ilustre Delegatário, não vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar a instauração de procedimento administrativo, no âmbito disciplinar. Nessas condições, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, diante do pedido de desistência do pleito e com a concordância do Ministério Público, determino o arquivamento dos autos. Ciência ao Senhor Tabelião, ao Ministério Público e à Senhora Representante, por e-mail (cujo silêncio, desde que certificado o recebimento da mensagem eletrônica pelo servidor de destino, será interpretado como concordância tácita com os termos desta decisão, sem necessidade de posterior conclusão). Não menos importante, determino à z. Serventia Judicial que publique a presente decisão no DJE, uma vez que os fatos aqui relatados são de interesse da sociedade e as observações ora deduzidas contribuirão para a melhora do serviço público como um todo, resultando, como fim maior, no pleno atendimento do cidadão. P.I.C. (DJe de 29.03.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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