STJ: Companheira não tem direito real de habitação sobre imóvel de 13 proprietários

Não há direito real de habitação se o imóvel no qual os companheiros residiam era propriedade conjunta do falecido e de mais doze irmãos. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial de uma mulher, cujo companheiro era proprietário de apenas 1/13 do imóvel onde ela pretendia continuar morando após a morte dele. 

O casal morou durante cinco anos no imóvel de um dos irmãos do companheiro, já falecido, que não deixou filhos nem pais vivos. Com a morte do companheiro, a mulher moveu ação possessória contra os irmãos dele que, segundo ela, passaram a agir de forma agressiva com o objetivo de obrigá-la a deixar o imóvel. 

O juízo da vara cível do Rio de Janeiro entendeu que não cabia discussão acerca da posse e sim sobre a existência ou não de união estável e, consequentemente, de direito real de habitação da companheira. Diante disso, declinou da competência para uma das varas de família. 

Enquanto viver

O juízo da vara de família julgou o pedido procedente para declarar a união estável entre o casal, de 1999 a 19 de outubro de 2002 (data do falecimento do companheiro), e para reconhecer o direito real de habitação à autora sobre o bem localizado em Copacabana (RJ). 

Contudo, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro reformou a sentença para afastar o direito à permanência da autora no imóvel. No STJ, ela sustentou que o direito real de habitação independe da existência ou não do direito sucessório sobre o imóvel. 

O ministro Luiz Felipe Salomão, relator do recurso especial, explicou que, em matéria de direito sucessório, a lei de regência é aquela referente à data do óbito. 

“Assim, é de se aplicar ao caso a Lei 9278/96 – que prevê o direito real de habitação aos companheiros –, uma vez que o Código Civil ainda não havia entrado em vigor quando do falecimento do companheiro da autora”, disse. 

Peculiaridade

Contudo, Salomão verificou que o caso traz uma peculiaridade: o bem sobre o qual a autora pretende exercer o direito real de habitação pertence a 13 proprietários, de modo que ao companheiro falecido cabia apenas 1/13 sobre o imóvel. 

De acordo com Salomão, o parágrafo único do artigo 7º da referida lei, ao utilizar os termos "relativamente ao imóvel destinado à residência da família", “não teve o condão de conceder à companheira direito real de habitação em bens de terceiros”. 

Para ele, o dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o conteúdo sobre direito real de habitação existente quando de sua criação, ou seja, o previsto no artigo 1.611 e parágrafos do Código Civil de 1916. 

“O direito real à habitação limita os direitos de propriedade, porém, quem deve suportar tal limitação são os herdeiros do de cujus, e não quem já era proprietário do imóvel antes do óbito, como é o caso dos recorridos, que haviam permitido a utilização do imóvel pelo casal a título de comodato”, afirmou o relator. 

Por fim, Salomão ressaltou que a autora não poderia obter mais direitos do que os previstos atualmente para o cônjuge, “sob pena de infringência ao princípio da isonomia previsto na Carta Constitucional”. 

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1212121.

Fonte: STJ I 24/12/2013.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de escritura pública de doação – Imposição imotivada de cláusulas restritivas – Inteligência dos artigos 1.848, “caput”, e 2042 do Código Civil – Nulidade – Cindibilidade do título – Desconsideração das limitações – Recurso provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 0008818-68.2012.8.26.0438

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 0008818-68.2012.8.26.0438, da Comarca de Penápolis, em que é apelante DIEGO GARMES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE PENÁPOLIS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 6 de novembro de 2013.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação cível n° 0008818-68.2012.8.26.0438

Apelante: Diego Garmes

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Penápolis

VOTO N° 21.343

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de escritura pública de doação – Imposição imotivada de cláusulas restritivas – Inteligência dos artigos 1.848, "caput", e 2042 do Código Civil – Nulidade – Cindibilidade do título – Desconsideração das limitações – Recurso provido.

O Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoa Jurídica e Tabelionato de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Penápolis obstou o registro de Escritura de Doação, incidente sobre os imóveis retratados nas matrículas n° 6634 e 35471, entendimento que foi prestigiado pelo MM Juiz Corregedor Permanente no julgamento da dúvida suscitada (fls. 40/41).

Inconformado, apelou o interessado Diego Garmes (fls. 43/48), sustentando que o objeto da doação não extrapolou a parte disponível da donatária, sendo inaplicável o dispositivo legal que obriga a motivação para a imposição de cláusulas restritivas.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 97/98).

É o relatório.

O Registrador alega que o ato de disposição feito pela donatária, com imposição de cláusulas restritivas de incomunicabilidade e impenhorabilidade é nulo, pela inobservância dos artigos 1848 e 549, ambos do Código Civil.

Da leitura dos dispositivos invocados resta claro que a exigência só tem cabimento na hipótese em que os bens doados integrem a legítima, ou seja, parte da herança reservada aos herdeiros necessários do doador.

O apelante sustenta que os imóveis doados não ultrapassavam a metade do acervo dos bens da doadora. Não havia, entretanto, esta comprovação no momento em que o título foi levado a registro, o que justifica o óbice apresentado pelo Oficial.

Apenas por ocasião da interposição deste recurso foram juntados os documentos comprobatórios de que a parte possuía patrimônio suficiente para dispor livremente dos imóveis objeto do contrato de doação.

Todavia, entendo que a inobservância apontada macula apenas as disposições acessórias do contrato, e não o ato de disposição de vontade como um todo.

Ademar Fioranelli, em obra específica sobre o tema, comenta que:

"Respeitadas as opiniões divergentes, o certo é que o novo código autoriza expressamente a imposição de cláusulas restritivas à legítima, por testamento ou doação (como antecipação de legítima), exigindo que no título constem as razões do testador para impô-las (a justa causa). Não mais prevalece a vontade incondicionada do testador, mas a necessidade legal de declarar o justo motivo para tornar válida e efetiva a imposição." [1]

Conforme decidido em voto da lavra do Des. Maurício Vidigal (Apelação Cível n° 0024268-85.2010.8.26.0320): "Mas a falta de justa causa compromete apenas a validade da cláusula restritiva, não da doação. Há muito este Egrégio Conselho Superior da Magistratura vem aplicando a regra da cindibilidade do título, pelo qual autoriza-se o registro daquilo que possa ingressar no fólio real, e nega-se o daquilo que não possa, permitindo-se extrair do título apenas aquilo que comporta o registro. A doação é hígida e foi livremente celebrado entre os contratantes. Apenas a cláusula de impenhorabilidade padece de vício, por afronta ao art. 1848, "caput", do Código Civil. Admissível, portanto, o registro da escritura de doação, desconsiderando-se a cláusula de impenhorabilidade nele inserida.

Em caso similar, este Egrégio Conselho Superior decidiu:

"Há, contudo, um único vício no instrumento de compra e venda do imóvel adquirido pela apelante que impede o seu ingresso no registro, na forma como elaborado. Diz respeito à cláusula de incomunicabilidade inserida na escritura. Com efeito, quando a interveniente Maria Helena doou a importância de R$ 120.000,00, representada pelo apartamento do edifício Príncipe de Liverpool, no. 63, transmitindo-o a seguir aos vendedores Edmundo Antônio e sua mulher, fez constar que a doação se fazia com exclusividade, em caráter incomunicável, como adiantamento de sua legítima. A disposição constante do título é nula, porque afronta o disposto no art. 1848 do Código Civil… Todavia a nulidade ora apontada se restringe apenas à cláusula inserida no título e não importa na invalidade deste, mas somente na sua cindibilidade, a fim de que se torne viável o seu registro a seguir" (Ap. Civ. 440-6/0, de 06 de dezembro de 2005, Rel Des. José Mário Antônio Cardinale). "

Comungo do entendimento acima esposado, para admitir o ingresso do título no registro imobiliário, com a desconsideração das cláusulas restritivas de impenhorabilidade e incomunicabilidade nele inseridas.

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento ao recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] "Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade", Editora Saraiva, pag. 9 (D.J.E. de 11.12.2013 – SP).

Fonte: DJE I 12/12/2013.

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STJ: Falta de registro de doação de imóvel não impede oposição de embargos contra penhora

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não há como manter a penhora sobre imóvel doado aos filhos menores, em razão de dívida contraída pelos pais posteriormente à doação. Seguindo voto do ministro Raul Araújo, a Quarta Turma definiu que a falta de registro imobiliário da doação não impede que os filhos apresentem embargos de terceiro contra penhora realizada sobre imóvel que eles haviam recebido dos pais anteriormente. 

Em ação de separação judicial, homologada em 1994, os pais fizeram doação de um imóvel aos filhos menores. O registro imobiliário da doação não foi feito. Posteriormente, em 1995, realizaram uma operação de crédito no Banco do Brasil, dando em garantia o mesmo imóvel, e omitindo seu real estado civil. 

Ante o não pagamento da obrigação, o banco ajuizou ação executiva de título extrajudicial (cédula de crédito rural) e pediu a penhora do imóvel. Os filhos apresentaram embargos à execução. Afirmaram que o fato de não existir registro da doação no cartório de imóveis não exclui o seu direito de oferecer embargos de terceiro para proteção de sua propriedade. Sustentaram que “a sentença que homologa a separação e a partilha produz efeitos do trânsito em julgado, independentemente de qualquer registro”. 

Estelionato

Em primeiro grau, o juiz reconheceu a impossibilidade da penhora, porque os menores não poderiam ser penalizados com a alienação de bem que lhes coube na separação judicial dos pais. O juiz ainda destacou que os pais cometeram estelionato, ao dar em garantia bem imóvel que não mais lhes pertencia. 

O banco apelou e o tribunal local reverteu a sentença. Se, quando da assinatura da cédula de crédito, não houve o registro de restrição pela doação do imóvel, “maliciosamente omitida pelos devedores”, os embargos deveriam ser rejeitados, mantendo-se a penhora – entendeu o tribunal de segunda instância. 

Os filhos recorreram ao STJ. Em decisão monocrática, foi dada razão aos embargantes, ao entendimento de que a penhora se deu sobre bem que já não integrava mais o patrimônio dos devedores e que o fato de a partilha não ter sido registrada não impede a defesa por meio dos embargos de terceiro. 

Proteção 

O banco recorreu com agravo regimental, mas a posição foi mantida pela Turma. O relator do agravo, ministro Raul Araújo, destacou que o objeto dos embargos de terceiro é a possibilidade de proteção da propriedade, ainda que carente de registro no cartório. 

O ministro reconheceu que é cabível a apresentação dos embargos pelos filhos menores para defender sua posse e discutir a legitimidade da penhora do imóvel, principalmente porque a propriedade do bem se encontra amparada em decisão transitada em julgado. Raul Araújo ainda lembrou que a jurisprudência do STJ é no sentido de considerar que a falta de registro da doação no cartório de imóveis não impede a oposição dos embargos de terceiro. 

O relator também salientou que qualquer responsabilização dos pais pelas consequências de possíveis crimes no negócio firmado com o banco deve ser perseguida em via adequada. 

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 469709.

Fonte: STJ I 10/12/2013.

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