Tributário – ITCMD – Sobrepartilha – Interpretação extensiva do art. 21, I, da Lei Estadual nº 10.705/00 – Inviabilidade – Ausência de atraso na abertura do inventário – Cobrança de multa e juros – Impossibilidade – Não conhecimento dos bens à época da declaração original – Sentença Mantida – Precedentes deste E. Tribunal de Justiça – Nega-se provimento aos recursos oficial e do réu.


  
 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária nº 1035146-28.2020.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO e Recorrente JUÍZO EX OFFICIO, são apelados EDUARDO VENDRAMINI MARTHA DE OLIVEIRA (INVENTARIANTE) e ANTONIO JOSE MARTHA DE OLIVEIRA (ESPÓLIO).

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RICARDO DIP (Presidente) E AROLDO VIOTTI.

São Paulo, 25 de novembro de 2020.

AFONSO FARO JR.

Relator

Assinatura Eletrônica

Apelação/Reexame Necessário nº 1035146.28.2020.8.26.0053

Recorrente: Juízo “Ex Officio”

Apelante: Estado de São Paulo

Apelados: Antonio José Martha de Oliveira (Espólio) e outro

Interessado: Secretário da Fazenda do Estado de São Paulo

Comarca: São Paulo 11ª Vara da Fazenda Pública

Juiz(a) de Direito: Walter Godoy dos Santos Júnior

Voto nº 11.854

TRIBUTÁRIO – ITCMD – SOBREPARTILHA – Interpretação extensiva do art. 21, I, da Lei Estadual nº 10.705/00 – Inviabilidade – Ausência de atraso na abertura do inventário – Cobrança de multa e juros – Impossibilidade – Não conhecimento dos bens à época da declaração original – Sentença Mantida – Precedentes deste E. Tribunal de Justiça.

NEGA-SE PROVIMENTO AOS RECURSOS OFICIAL E DO RÉU.

Vistos.

A r. sentença de fls. 215/222, cujo relatório é adotado, julgou procedente o mandado de segurança impetrado pelo ESPÓLIO DE ANTONIO JOSÉ MARTHA DE OLIVEIRA e OUTROS contra ato do SECRETÁRIO DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, concedendo a ordem para tornar definitiva a liminar anteriormente deferida (fls. 160/166), para determinar que a autoridade coatora se abstenha de computar juros e multas por atraso referentes ao protocolo da declaração de ITCMD nº 66241520.

O Ministério Público demonstrou desinteresse em se manifestar nos autos (fls. 178/179).

Ao lado do reexame necessário, recorre o Estado de São Paulo às fls. 224/230. Afirma que não colaborou para o atraso do processamento da sobrepartilha, motivo pelo qual a multa e os juros relativos ao ITCMD são devidos. Ressalta que o bem sobrepartilhado existia no momento da morte da inventariada, só não era de conhecimento dos herdeiros, mas que tal fato não tem o condão de isentá-los da cobrança de multa e juros.

É o relato do necessário.

Trata-se de mandado de segurança impetrado pelo ESPÓLIO DE ANTONIO JOSE MARTHA DE OLIVEIRA em face de suposto ato coator praticado pelo SECRETÁRIO DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, afirmando, em síntese, que, após sobrepartilha realizada dos bens deixados por Carmen Cecília Martha de Oliveira, foi necessário realizar declaração de ITCMD retificadora. Todavia, alega que ter sido incluso na cobrança do imposto quantias correspondentes a juros e multas que entende ser indevido.

O mandado de segurança é o remédio constitucional contra ato ilegal ou abusivo de autoridade pública, cujos fatos devem estar comprovados de plano (direito líquido e certo).

Ensina Hely Lopes Meirelles que:

Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. (…) Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante; se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.” [1]

Verifica-se que, apresentada a declaração de ITCMD em 2014, dentro do prazo legal, e homologada a partilha dos bens deixados por Carmen Cecília Martha de Oliveira para seus irmãos (Antônio José e Carlos Eduardo), foi necessária a realização de sobrepartilha, eis que a falecida era filha e herdeira de Carmen Martha Gomes de Oliveira, cujo inventário tramitou perante a 2ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de Bauru/SP, Processo n° 0023488-05.1999.8.26.0071. Somente houve a expedição do formal de partilha em setembro/19, não constando os referidos bens herdados, por óbvio, na declaração de ITCMD efetuada em 2014.

Nesse sentido, o direito do apelado está encartado ante a não incidência da sua situação à norma aplicada pela autoridade coatora, qual seja, o art. 21, I, da Lei Estadual n° 10.705/00:

“Art. 21 – O descumprimento das obrigações principal e acessórias, instituídas pela legislação do Imposto sobre Transmissão ‘Causa Mortis’ e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, fica sujeito às seguintes penalidades:

I – no inventário e arrolamento que não for requerido dentro do prazo de 60 (sessenta) dias da abertura da sucessão, o imposto será calculado com acréscimo de multa equivalente a 10% (dez por cento) do valor do imposto; se o atraso exceder a 180 (cento e oitenta) dias, a multa será de 20% (vinte por cento);”

Resta claro que não há subsunção dos fatos à referida norma. Não houve atraso na abertura do inventário, pois a partilha original foi aberta e concluída dentro dos prazos legais, inclusive com o pagamento integral dos tributos sobre o patrimônio que existia à época. Não cabe interpretação extensiva da norma supra para abarcar a sobrepartilha.

No caso em análise, o que ocorreu foi a necessidade de pedido de sobrepartilha em razão de bens que surgiram após o inventário, com base no art. 2.022 do Código Civil [2], o que não justifica a cobrança da multa e dos juros especificados na lei supramencionada, não só por falta de previsão legal em relação à sobrepartilha, mas também porque o valor do imposto, nesse caso, não era exigível antes da homologação do cálculo, a teor da Súmula nº 114 do STF [3].

Nesse sentido, não havia como considerar viável a inserção dos referidos bens na declaração de ITCMD realizada em 25.06.14. Como bem ponderado pelo juízo monocrático:

“Portanto, no caso dos autos não são devidos os acréscimos de multas, juros e correção monetária atinentes à declaração de ITCMD nº 66241520, considerando que não existia a disposição de bens atual à época da declaração original em 2004, ante a superveniência do julgamento final da ação nº 0023488-05.1999.8.26.0071, que tramitou perante a 2ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de Bauru/SP.” (fls. 220/221).

Outrossim, é o entendimento deste Egrégio Tribunal:

“MANDADO DE SEGURANÇA – Impetração para o fim de afastamento os juros e a multa de protocolamento – Aplicam-se as regras do inventário à sobrepartilha, inclusive quanto ao recolhimento do ITCMD imposto antes da lavratura da escritura pública com fulcro no artigo 18, § 1º, da Lei Paulista n.º 10.705/2000 – Tempestivo ajuizamento para abertura, registro e cumprimento de testamento – Artigo 21, inciso I, da Lei Paulista n.º 10.705/2000 ao qual não cabe interpretação extensiva -Ausência de recursos voluntários – Remessa necessária não provida.” (Remessa Necessária nº 1011239-58.2019.8.26.0053, 5ª Câmara de Direito Público, Relator Fermino Magnani Filho, j. 25.11.19).

“APELAÇÃO. Sobrepartilha. Incidência do ITCMD. Justo motivo. Demandas ainda em curso ao tempo daabertura da sucessão. Prazo para recolhimento do tributo que se inicia com a homologação da sobrepartilha e, no caso presente, posterga-se até a data do presente julgamento. Recurso provido.” (AP nº 0027231-42.2013.8.26.0100, 4ª Câmara de Direito Privado, Relator Maurício Campos da Silva Velho, j. 26.09.19).

“Mandado de Segurança. ITCMD. Cobrança de multa e juros, com base no artigo 21, inciso I, da Lei Estadual n. 10.705/2000. Inadmissibilidade. Escritura de inventário extrajudicial lavrada dentro do prazo legal. Pedido de sobrepartilha, posteriormente ao encerramento do inventário, que não justifica a cobrança de encargos dessa natureza. Ausência de previsão legal. Segurança concedida. Recursos desprovidos.” (AP nº 1045428.62.2019.8.26.0053, 4ª Câmara de Direito Púbico, Relator Ferreira Rodrigues, j. 09.10.20).

Assim, de rigor a manutenção da r. sentença que concedeu a ordem para que autoridade coatora se abstenha de computar juros e multas por atraso referentes ao protocolo da declaração de ITCMD nº 66241520.

Por todo o exposto, nega-se provimento aos recursos oficial e do réu.

Eventual inconformismo em relação à presente decisão será objeto de julgamento virtual, ficando cientes as partes de que discordância quanto a essa modalidade de julgamento deverá ser manifestada quando da interposição do recurso.

AFONSO FARO JR.

Relator

Nota:

[1] Mandado de segurança e ações constitucionais, 33ª ed., São Paulo, Malheiros, 2010, p. 37

[2] Art. 2.022 – Ficam sujeitos a sobrepartilha os bens sonegados e quaisquer outros bens da herança de que se tiver ciência após a partilha.”

[3] “Súmula 114 O imposto de transmissão ‘causa mortis’ não é exigível antes da homologação do cálculo.” – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação / Remessa Necessária nº 1035146-28.2020.8.26.0053 – São Paulo – 11ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Afonso Faro Jr – DJ 27.11.2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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