Tabelião de Protesto de Letras e Títulos – Protesto de cheques – Prescrição da ação de execução – Possibilidade de recusa do protesto de cheques prescritos, em conformidade com a atual jurisprudência do Col. Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Eg. Superior Tribunal de Justiça – Precedente da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso provido em parte.


  
 

Número do processo: 10275172720188260100

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 361

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1027517-27.2018.8.26.0100

(361/2019-E)

Tabelião de Protesto de Letras e Títulos – Protesto de cheques – Prescrição da ação de execução – Possibilidade de recusa do protesto de cheques prescritos, em conformidade com a atual jurisprudência do Col. Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Eg. Superior Tribunal de Justiça – Precedente da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso provido em parte.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra r. decisão da MM. Juíza Corregedora Permanente do 2° Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Comarca da Capital que afastou a negativa do protesto de cheques que, em tese, foram apresentados depois do decurso do prazo de prescrição da ação executiva.

O recorrente alegou, em suma, que a atual jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a prescrição atinge os aspectos formais do título, retirando sua força executiva, o que atinge a certeza e exigibilidade da obrigação. Asseverou que compete ao Tabelião obstar o protesto de título que tenha irregularidade formal. Ademais, a partir do julgamento do Processo nº 2018/00051452, da Eg. Corregedoria Geral da Justiça, ficaram os Tabeliães de Protesto autorizados a promover a recusa do ato em relação aos títulos em que ocorrida a prescrição da ação cambial de execução que, por sua vez, não se confunde com a ação por enriquecimento sem causa (fls. 176/183).

O recorrido apresentou contrarrazões em que requereu o não conhecimento do recurso pela ausência de pedido expresso para a reforma da r. decisão da MM. Juíza Corregedora Permanente. No mais, pugnou pela manutenção da r. decisão que afastou a recusa dos protestos dos cheques (fls. 186/191).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 194/197).

Opino.

As razões de recurso contêm requerimento expresso de reforma da r. decisão para que seja mantido o óbice ao protesto dos títulos de crédito (fls. 183).

Ademais, cuida-se de procedimento de natureza administrativa, voltado exclusivamente à análise da insurgência quanto ao motivo da recusa dos protestos, em que o recurso devolve a qualificação dos títulos por inteiro, o que permite a apreciação de toda a matéria que, de qualquer modo, também é realizada com base no princípio da autotutela da Administração Pública.

Por essas razões, afasta-se o pedido de não conhecimento do recurso.

Em 19 de fevereiro de 2018 foram apresentados para protesto o cheque nº 000034, emitido em 20 de junho de 2017 (fls. 23/25), e o cheque nº 000035, emitido em 20 de julho de 2017 (fls. 26/28).

Os protestos dos títulos foram recusados porque as ações de execução estariam prescritas na data em que foram apresentados (fls. 40/41).

O prazo de prescrição da ação de execução do cheque é de seis meses contados da expiração do prazo de apresentação que, por sua vez, é de trinta dias para os emitidos no lugar do pagamento e de sessenta dias para os emitidos em outro local (arts. 33, 47 e 59 da Lei nº 7.357/85).

Diante disso, e conforme consignado na r. decisão recorrida, o cheque nº 000035, emitido em 20 de julho de 2017 (fls. 26/28), foi apresentado para protesto antes do decurso do prazo de prescrição, sendo indevida a recusa manifestada com esse fundamento (fls. 168).

Igual, porém, não ocorre com o cheque nº 000034, emitido em 20 de junho de 2017 (fls. 23/25).

Isso porque a ação de execução cambial estava prescrita quando da apresentação do título, o que permitia ao Tabelião recusar o protesto tão somente com fundamento na prescrição.

Não se ignora o disposto no art. 9° da Lei nº 9.492/97 que, em tese, afastaria da qualificação promovida pelos Tabeliães de Protesto de Letras e Títulos a análise da prescrição.

O Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nessa linha, editou a Súmula nº 17 que dispunha: “A prescrição ou perda da eficácia executiva de título não impede sua remessa a protesto, enquanto disponível a cobrança por outro meio”.

Contudo, essa Súmula foi revogada pelo v. acórdão prolatado pelo Col. Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR nº 2197939-95.2016.8.6.0000, (Proc. nº 82.816/2017), em que foi considerado que seu conteúdo se tornou incompatível com a atual jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça, em especial com a tese fixada no julgamento do REsp nº 1.423.464/SC.

Além do Recurso Especial nº 1.423.464/SC, em que fixada a tese invocada para a revogação da Súmula nº 17 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a vedação ao protesto de título cambial em razão da prescrição da ação executiva foi reiterada pelo Col. Superior Tribunal de Justiça nos v. acórdãos prolatados nos recursos a seguir indicados:

“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CHEQUE PRESCRITO. PROTESTO. NÃO CABIMENTO. PRECEDENTES. CANCELAMENTO. DANOS MORAIS. PRECLUSÃO.

1. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de ser indevido o protesto de cheque prescrito. Precedentes.

2. O apontamento indevido de título de dívida a protesto gera dano moral in re ipsa. Porém, no caso em apreço, a sentença já havia afastado tal condenação e o autor deixou de recorrer desse ponto, motivo por que descabe, em recurso especial, condenar o réu a tal rubrica, uma vez já operada a preclusão.

3. Agravo regimental não provido” (AgRg no REsp 123650/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 13/08/2015);

“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. PROTESTO INDEVIDO. CHEQUE PRESCRITO. RESPONSABILIDADE DO ENDOSSAT ÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC/1973. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Nos termos da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, é indevido o protesto de cheque prescrito.

2. O endossatário que recebe, por endosso translativo, título de crédito contendo vício formal, sendo inexistente a causa para conferir lastro a emissão de duplicata, responde pelos danos causados diante de protesto indevido, ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas (REsp 1.213.256/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, DJe de 14.11.2011). Recurso especial julgado pelo rito dos recursos repetitivos.

3. Agravo interno não provido” (Aglnt no AREsp 164.252/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 05/06/2019);

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CAMBIÁRIO. PROTESTO. CHEQUE PRESCRITO. NÃO CABIMENTO. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Nos termos da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, é indevido o protesto de cheque prescrito. Precedentes.

2. Agravo interno a que se nega provimento” (Aglnt no REsp 1598573/MT, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 15/09/2016, DJe 05/10/2016).

Entre os fundamentos adotados para afastar a regularidade do protesto de título de crédito quando ocorrida prescrição da ação de execução cambial encontra-se a edição da Lei nº 11.280/2006 que em seu art. 3º alterou o Código de Processo Civil, então vigente, para autorizar o Juiz a declarar a prescrição agindo de ofício, como se verifica no v. acórdão prolatado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça no AgRg no AgRg no REsp nº 1100768/SE, de que foi relator o eminente Ministro Marco Buzzi, que foi citado nas razões de recurso (fls. 181) e que teve a ementa a seguir reproduzida:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO DE DUPLICATA PRESCRITA DECISÃO MONOCRÁTICA QUE RECONSIDEROU ANTERIOR PRONUNCIAMENTO A FIM DE DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DO AUTOR. INSURGÊNCIA DO CREDOR.

1. O protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em título e outros documentos de dívida, sendo hígido quando a obrigação estampada no título se revestir de certeza, liquidez e exigibilidade.

O entendimento desta Corte Superior é no sentido de que o protesto de título de crédito prescrito enseja o pagamento de indenização por dano moral, que inclusive se configura in re ipsa.

Precedentes.

A duplicata prescrita serve apenas como princípio de prova da relação jurídica subjacente que deu ensejo a sua emissão, não possuindo a necessária certeza e exigibilidade que legitimam o portador a exigir seu imediato pagamento e, por conseguinte, a fazer prova do inadimplemento pelo protesto.

2. Em que pese o artigo 9° da Lei nº 9.492/97 estabelecer que não cabe ao tabelião investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade, é preciso observar a inovação legislativa causada pelo advento da Lei nº 11.280/2006, que alçou a prescrição ao patamar das matérias de ordem pública, cognoscíveis de ofício pelo juiz, passando, portanto, o exame da prescrição a ser pertinente à observância da regularidade formal do título, condição para o registro de protesto, como exige o parágrafo único do mesmo art. 9º da Lei nº 9.492/97.

3. Agravo regimental desprovido” (AgRg no AgRg no REsp 1100768/SE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 17/11/2014 – grifei).

Por essas razões, Vossa Excelência, no julgamento do Processo nº 2018/00051452, alterou a redação do item 16 do Capítulo XV do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça para excluir a menção à análise da prescrição dos títulos promovida na qualificação pelo Tabelião de Protesto, passando o referido item a ter o seguinte teor:

“16. Na qualificação dos títulos e outros documentos de dívida apresentados a protesto, cumpre ao Tabelião de Protesto de Títulos examiná-los em seus caracteres formais”.

Portanto, não é irregular a recusa do protesto de cheque que foi apresentado, para essa finalidade, depois do decurso do prazo de prescrição da ação de execução.

Essa conclusão não se afasta pela alegação de ausência de dano ao erário público, promovida em contrarrazões de recurso, porque a qualificação consiste em exame da legalidade do ato pretendido, cujo resultado não se altera pelo fundamento invocado pelo recorrido.

Ante o exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de dar parcial provimento ao recurso para manter a recusa do protesto do cheque nº 000034, emitido em 20 de junho de 2017, por ser o único que teve a ação de execução prescrita antes de sua apresentação (fls. 23/25).

Sub censura.

São Paulo, 10 de julho de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou parcial provimento ao recurso administrativo para manter a recusa do protesto do cheque nº 000034, emitido em 20 de junho de 2017, que teve a ação de execução prescrita antes de sua apresentação. Oportunamente, restituam-se os autos à Vara de origem. Intimem-se. São Paulo, 23 de julho de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: DANILO MARINS ROCHA, OAB/SP 377.611.

Diário da Justiça Eletrônico de 30.07.2019

Decisão reproduzida na página 146 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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