TJ/AL: Despacho/Decisão – Recurso Administrativo – Pedido de Providências – Interposição de recurso contra decisão do E. CNJ – Provimento expedido pela CGJ-AL suspendendo a aplicação de desconto de 50% nos atos de registro de primeira aquisição de imóvel pelo SFH – Legislações federal e estadual que preveem o desconto – Impossibilidade do Poder Judiciário usurpar a competência legislativa – Suspensão do provimento – Descabimento de que o registradores tenham de arcar com a devolução dos valores, vez agiram em conformidade com ordens administrativas – Manutenção da decisão.


  
 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – 0008038-98.2018.2.00.0000

Requerente: SINDICATO DOS SERVICOS NOTARIAIS E DE REGISTRO DO ESTADO DE ALAGOAS

Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE ALAGOAS – TJAL

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Retomado o julgamento, o Conselho, por maioria, deu parcial provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido referente à devolução dos 50% dos valores dos emolumentos relativos à aquisição do primeiro imóvel financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação, recolhidos com fundamento no revogado Provimento CGJ/AL n. 04/2016, e determinar que se observe, nesse aspecto, o inteiro teor da decisão antes proferida pelo CNJ nos autos do PCA 0001402-19.2018.2.00.0000. Vencidos os Conselheiros Maria Thereza de Assis Moura (então Relatora), Jane Granzoto e Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, que negavam provimento ao recurso. Lavrará o acórdão o Conselheiro Sidney Madruga. Votou a Presidente. Ausente, justificadamente, o Conselheiro Sidney Madruga. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 11 de abril de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão (Relator), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (RELATORA):

Trata-se de Recurso Administrativo interposto pela CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS (Id 3701751), em face da decisão monocrática proferida Corregedor Nacional de Justiça Substituto à época, mediante a qual foi deferido o “item III” da petição inicial do presente Pedido de Providências, proposto pelo SINDICATO DOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO DO ESTADO DE ALAGOAS – SINOREG (Id 3253177).

Da decisão impugnada, extrai-se a determinação de que a CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS (CGJ/AL) observe:

“i) o cumprimento da legislação estadual que disciplina a matéria, uma vez que até o momento não foi objeto de qualquer ação de controle de constitucionalidade; e

ii) que, ao editar novos atos administrativos que fixem emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, o faça de acordo com o que prevê a Lei Federal n. 10.169/00.” (Id. 3666231).

A recorrente sustenta, em síntese, quanto à atualização monetária da tabela de custas e emolumentos (Resoluções TJ/AL nos 06/2006 e 32/2016), que, “o TJ/AL não exerceu indevidamente Controle de Constitucionalidade em procedimento administrativo, tampouco alterou critérios estabelecidos em lei estadual vigente, muito menos contribuiu para suspensão da eficácia da legislação estadual pela via administrativa” (id 3701751, p. 14).

Quanto à devolução de cinquenta por cento dos valores dos emolumentos relativos ao primeiro imóvel financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH), alega que, “ainda que os valores dos emolumentos relativos ao primeiro imóvel financiado pelo SFH tenham sido “… calculados e cobrados em conformidade com o Provimento CGJ/AL n° 04/2016 …” (= sic), ao analisar o tema, o Conselho Nacional de Justiça já se pronunciou no sentido da necessidade de redução dos emolumentos devidos em razão da primeira aquisição de imóveis por meio do Sistema Financeira da Habitação — SFH, assim como da obrigatoriedade de devolução das quantias pagas a maior. Com isso, a Corregedoria-Geral da Justiça/AL, ao publicar o Provimento n° 16, de 12/07/2018, atuou como mera executora da ordem legítima emanada do Conselho Nacional de Justiça, razão pela qual o decisum vergastado merece reconsideração/reforma por parte de Vossa Excelência.” (id 3701751, p. 15).

A Corregedoria local em sua peça recursal conclui que:

“a) A Resolução TJAL n° 14/2017 está em pleno vigor, até porque a respeitável decisão do Corregedor Nacional de Justiça substituto Aloysio Corrêa da Veiga não declarou qualquer revogação do ato administrativo, apenas determinando que a CGJAL adequasse suas regulamentações à Lei Estadual AL n° 3.185/1971 e a Lei Federal n° 10.169/2000.

b) A Resolução n° 14/2017 em nenhum momento ofendeu a Lei Estadual AL n° 3.185/1971 e tampouco aos ditames da Lei Federal n° 10.169/2000.

c) Caso esteja havendo algum descumprimento por parte dos Cartórios Extrajudiciais dos comandos contidos na Resolução n° 14/2017, o desobediente estará sujeito a responder Processo Administrativo, podendo suportar todos os consectários, até porque este Corregedor Geral da Justiça Alagoana não promoveu, por hora, qualquer mudança normativa no aludido ato.”  (Id 3701751, p. 24).

Por fim, requer a reconsideração da decisão proferida ou a submissão do julgamento do presente recurso ao Plenário do Conselho Nacional de Justiça.

A Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Alagoas (ADEMI/AL) requereu o seu ingresso como terceira interessada nos autos do presente Pedido de Providências. Pugnou, ainda, pela reconsideração da decisão anteriormente proferida (Ids: 3717532 – 3717549).

O Sindicato dos Serviços Notariais e de Registro do Estado de Alagoas (SINOREG/AL), apresentou contrarrazões de recurso administrativo (Ids: 3719049 – 3719050).

O recurso administrativo foi recebido pelo então Corregedor Nacional de Justiça Substituto (Id 3729793), que, na mesma oportunidade, determinou a suspensão dos efeitos da decisão monocrática anteriormente deferida, nos termos do art. 115, § 4º, segunda parte, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

Além disso, foi deferido o ingresso da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Alagoas (ADEMI/AL) como terceira interessada nos autos do presente expediente.

É o relatório.

VOTO PARCIALMENTE DIVERGENTE

Adoto na íntegra, o relatório bem lançado pela Excelentíssima Senhora Ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura, Corregedora Nacional, todavia, quanto ao mérito, peço vênia a Sua Excelência para apresentar parcial divergência, especificamente no que diz respeito à devolução de emolumentos cobrados de forma indevida aos cidadãos com fundamento no Provimento CGJ/04/2016.

Para contextualizar a controvérsia, registro que a Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas (TJ/AL) editara, em 2011, o Provimento GCJ n.º 11/2011, o qual concedia o “desconto” de 50% nos emolumentos cobrados em decorrência da prática de atos relacionados à primeira aquisição imobiliária, para fins residenciais, financiada pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH), consoante determina o caput, do artigo 290 [1], da Lei n.º 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos).

Posteriormente, editou-se o Provimento CGJ/AL n.º 04/2016, que revogou o Provimento CGJ/AL n.º 11/2011, além de suprimir o referido “desconto” de 50%, sob a justificativa de que o inciso III, do art. 151, da Constituição Federal [2] não autoriza a União a instituir isenções de tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.

Nada obstante, à vista da decisão proferida pelo Ministro Celso de Melo, do Supremo Tribunal Federal, no Agravo em Recurso Extraordinário n.º 913.952/RS, quanto à aplicação e à constitucionalidade do artigo 290 da Lei dos Registros Públicos, a Corregedoria alagoana declarou a nulidade absoluta do Provimento CGJ/AL n.º 04/2016, e determinou a expedição de novo Provimento para tratar da matéria (Provimento CGJ/AL n. 13/2017), instituindo, mais uma vez, a dedução de 50%.

Esse último ato regulamentar – Provimento CGJ/AL n. 13/2017 – previu expressamente que seus efeitos ocorreriam apenas a partir de sua publicação (efeitos ex nunc), mantendo-se hígidos os recolhimentos efetuados indevidamente com base no Provimento CGJ/AL n. 04/2016, o que autorizaria, por conseguinte, os delegatários a não devolverem os valores aos contribuintes.

Sem embargo, o Ministério Público do Estado de Alagoas propôs perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o Procedimento de Controle Administrativo (PCA) 0001402-19.2018.2.00.0000, distribuído em 12/3/2018, para impugnar justamente a parte da decisão que havia restringido os efeitos do reconhecimento da nulidade do Provimento CGJ/AL n. 04/2016 para o futuro, porquanto ensejaria fator impeditivo para que os contribuintes buscassem o ressarcimento dos valores cobrados pelos serviços extrajudiciais.

Em 5/7/2018, o pedido formulado no mencionado PCA foi julgado procedente pelo CNJ, decisão contra a qual não houve a apresentação de recurso, oportunidade em que foi declarada, em parte, a nulidade, da decisão antes proferida no Processo Administrativo n.º 2017/2.069, pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Alagoas, de forma a excluir a determinação de eficácia ex nunc do Provimento CGJ/AL n. 04/2016, bem como para: “[…] declarar a nulidade parcial do artigo 2º do Provimento CGJ/AL n.º 13, de 21 de março de 2017, para dele excluir a expressão ´a partir da vigência do presente Provimento´”

Confira-se, por oportuno, trechos da decisão proferida no referido PCA pela então Conselheira Daldice Santana, in verbis:

[…]Como bem observado pelo requerente, o decurso de pouco mais de um ano, à evidência, é insuficiente para tornar irreversíveis as relações jurídicas firmadas sob a égide do provimento ilegal.

Na realidade, em se tratando de segurança jurídica, o ordenamento contempla lapsos de tempo superiores a esse, a exemplo do prazo quinquenal conferido à Administração para anular os atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis para os destinatários (artigo 54 da Lei n. 9.784/1999) e dos prazos prescricionais previstos nos artigos 205 e 206 do Código Civil, os quais variam de 1 (um) a 10 (dez) anos.

Ademais, permitir a modulação dos efeitos da decisão que reconheceu a nulidade do Provimento CGJ/AL n. 04/2016, além de perpetuar a situação de ilegalidade, implica tratamento desigual àqueles que adquiriam seus imóveis no curto intervalo de tempo em que o direito ao desconto nos emolumentos não foi observado, sem que exista, no entanto, justificativa razoável para tanto.

Constitui, desse modo, providência manifestamente desproporcional, que certamente fomentará a litigiosidade e a judicialização da matéria. Isso implica, ao fim, mais insegurança jurídica, a pretexto de resguardá-la.

Vale mencionar que o Sistema Financeiro de Habitação compõe microssistema jurídico próprio (formado pela Lei n. 4.380/1964 e outros diplomas normativos), que visa à promoção do direito fundamental à moradia (artigo 6º da CF/1988), em especial para as classes da população de menor renda (artigo 1º da Lei n. 4.380/64).

Nesse contexto, sobrepor os interesses financeiros das serventias extrajudiciais à proteção desse direito fundamental vai de encontro à própria principiologia do SFH e ao espírito da regra trazida pelo artigo 290 Lei de Registros Públicos.

Se, de um lado, é certo que a legítima confiança depositada nos atos administrativos pelos delegatários de serviços notariais e de registro é merecedora de tutela, de outro, soa de todo desarrazoado que a população tenha de arcar com o ônus do ato administrativo ilegal praticado pela Corregedoria-Geral da Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas.

Com essas considerações, é imperioso concluir pela indevida atribuição de efeitos ex nunc ao reconhecimento e à declaração da ilegalidade do Provimento CGJ/AL n. 04/2016 nos autos do Processo Administrativo Virtual n. 2017/2.069 e na parte final do artigo 2º do Provimento CGJ/AL n. 13, de 21 de março de 2017, transcrito alhures. […]

A partir desse julgamento, o TJ/AL não mais restringiu a sobredita cobrança pelos contribuintes prejudicados, concernente aos valores pagos indevidamente.

Entretanto, tal decisão foi omitida no Pedido de Providência em questão, o que, grosso modo, permitiria os sindicalizados, fundamentados em Provimento nulo, gize-se, a não devolver os valores cobrados indevidamente dos contribuintes, o que, sem dúvida, deve ser obstaculizado por este Conselho.

Destarte, considerando que a questão foi apreciada pelo CNJ e decidida de forma contrária à decisão ora sub examine, deve ser provido o recurso nessa parte, para que seja julgado improcedente o pedido formulado, no que tange à devolução do valor pago indevidamente com fundamento no revogado Provimento CGJ/AL n.º 04/2016, devendo, pois, ser observado o que ficou decidido no julgamento do PCA 0001402-19.2018.2.00.0000.

Outrossim, em razão da natureza tributária, o recebimento impróprio de 50% dos emolumentos pelos delegatários, ainda que de boa-fé, deve ser restituído, visto que se equipara a cobrança indevida feita pelo Estado em prejuízo do cidadão, não cabendo, porém, ao CNJ definir critérios de devolução de valores, os quais deve ocorrer de acordo com a legislação em vigor.

Ante o exposto, e pedindo vênia à Excelentíssima Ministra Relatora, dou parcial provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido referente à devolução dos 50% dos valores dos emolumentos relativos à aquisição do primeiro imóvel financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação, recolhidos com fundamento no revogado Provimento CGJ/AL n. 04/2016, e determinar que se observe, nesse aspecto, o inteiro teor da decisão antes proferida pelo CNJ nos autos do PCA 0001402-19.2018.2.00.0000

É como voto.

Brasília/DF, data registrada no sistema.

SIDNEY PESSOA MADRUGA

Conselheiro 

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (RELATORA):

Tratam os autos de Pedido de Providências proposto pelo SINDICATO DOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO DO ESTADO DE ALAGOAS (SINOREG-AL) em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS.

Na inicial, o Requerente postulou intervenção do Conselho Nacional de Justiça  por considerar manifesta a insegurança jurídica por meio dos atos administrativos praticados pelo Poder Judiciário de Alagoas, em afronta às legislações vigentes, de âmbito Estadual e Federal. Nesse sentido, indicou como irregulares os seguintes pontos:

“i) forma de reajuste das tabelas de custas e emolumentos;

ii) questão afeta à devolução de valores por custas e emolumentos cobrados na aquisição do primeiro imóvel, inclusive a forma de restituição, se for a hipótese;

iii) forma de cobrança dos valores relativos aos atos de registro e baixa de hipotecas, alienações fiduciárias, afetação de patrimônio e securitização de créditos imobiliários; e

iv) forma de cobrança dos valores relativos aos atos de cobrança de emolumentos para os atos de registro de incorporação imobiliária ou especificação, instituição de condomínio, bem como registro de convenção de condomínio.”

Tendo em vista a narrativa da inicial, o Conselheiro que me antecedeu, na qualidade de Corregedor Nacional de Justiça Substituto, proferiu decisão, nos seguintes termos:

_________________________________

“[…]  o requerente buscou a intervenção do Conselho Nacional de Justiça, por considerar manifesta a insegurança jurídica por meio dos atos administrativos praticados pelo Poder Judiciário de Alagoas em afronta à legislação estadual vigente, a saber: i) forma de reajuste das tabelas de custas e emolumentos; ii) questão afeta a devolução de valores por custas e emolumentos cobrados na aquisição do primeiro imóvel, inclusive a forma de restituição, se for a hipótese; iii) forma de cobrança dos valores relativos aos atos de registro e baixa de hipotecas, alienações fiduciárias, afetação de patrimônio e securitização de créditos imobiliários; e iv) forma de cobrança dos valores relativos aos atos de cobrança de emolumentos para os atos de registro de incorporação imobiliária ou especificação, instituição de condomínio, bem como registro de convenção de condomínio.

Posto isto, ao analisar o presente procedimento, verifica-se que o Tribunal de Justiça de Alagoas exerceu controle de constitucionalidade em sede de procedimento administrativo, alterando critérios estabelecidos em lei estadual vigente.

[…].

No caso sob análise, não há notícia de que a legislação local esteja em conflito com a jurisprudência da Suprema Corte. Sendo assim, não caberia ao Tribunal de Justiça de Alagoas editar ato administrativo que diverge da legislação estadual vigente, sob pena de usurpar a competência do Poder Legislativo.

Nestas condições, percebe-se que houve a suspensão da eficácia da legislação estadual pela via administrativa, quando, na verdade, deveria o Tribunal requerido, caso entendesse inconstitucional a lei, adotar os meios jurisdicionais aplicáveis à espécie.

No que tange à discussão acerca da redução de emolumentos contemplada no art. 290 da Lei Federal nº 6.015/1973, salienta-se que os emolumentos devidos aos Serviços Notariais e de Registro privatizados têm natureza tributária, consoante a jurisprudência firmada pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, a partir da Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.378/ES, publicada em 30 de maio de 1999, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços públicos.

Em consequência, sujeita-se quer no que concerne a sua instituição e majoração, quer no que se refere a sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam, entre outras, as garantias essenciais da reserva de competência impositiva, da legalidade, da isonomia e da autoridade, e, sob esse enfoque, o tema deve ser analisado.

O art. 28 da Lei nº 8.935/94, que estabelece normas gerais para o exercício da atividade notarial e de registro, prescreve que ‘os notários e oficiais de registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na Serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei’.

O legislador federal definiu, no art. 3º do Código Tributário Nacional, que ‘tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada’. Ademais, as leis de emolumentos descrevem em seus bojos as hipóteses de incidência da cobrança de emolumentos.

As hipóteses de incidência de emolumentos estão previstas nas leis estaduais e, com a sua ocorrência, nasce o fato gerador da obrigação tributária, segundo a inteligência do §1º do art. 113 e do art. 114, ambos do Código Tributário Nacional, e, assim sendo, só se poderia proibir a cobrança relativa a um determinado ato, em sede administrativa, se houvesse uma norma de exclusão nos respectivos diplomas estaduais.

No caso em tela, percebe-se que o Poder Judiciário de Alagoas, por ato administrativo (Provimento CGJ/2016), revogou expressamente a redução de 50% (cinquenta por cento) sobre os valores dos emolumentos incidentes sobre todos os atos de registros referentes à primeira aquisição de imóveis financiados pelo Sistema Financeiro de Habitação, sendo posteriormente revogado pelo Provimento CGJ/AL nº 13/2017, determinando que os Cartórios passem a conceder a referida redução.

Com efeito, assiste razão aos argumentos lançados pelo requerente no presente pedido de providências, pois agiram os oficiais de registro de acordo com as determinações emanadas da Corregedoria local.

A mencionada isenção resta disciplinada por legislação própria, fato que não poderia a Corregedoria local, por ato administrativo (Provimento nº 04/2016), revogar a redução de 50% sobre os valores dos emolumentos incidentes sobre os atos de registros referentes à primeira aquisição de imóveis financiados pelo SFH.

Sendo assim, com base no princípio da confiança legítima, não cabe aos registradores o ônus da devolução dos valores, pois agiram de boa-fé, seguindo as determinações da Corregedoria local, entretanto, com base no princípio da segurança jurídica consagrado no art. 146 do CTN, a mudança de entendimento do judiciário local não poderá produzir eficácia quanto aos fatos pretéritos referentes ao período em que vigorou o entendimento.

Nesse sentido, cumpre destacar parte do voto do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, quando do julgamento do REsp 1.669.310/RS:

‘Todavia, no sistema tributário vigente, a revisão dos atos administrativos não pode ser admitida de forma indiscriminada, observando-se que a modificação empreendida sobre a interpretação tributária gera efeitos ex nunc, ou seja, somente pode ser considerada para os fatos geradores ocorridos posteriormente à sua introdução, a impedir que a autoridade coatora atribua à nova interpretação efeito retroativo, o que é vedado pelo art. 146 do CTN, como forma de conferir ao contribuinte maior previsibilidade e segurança jurídica. 8. Logo, os critérios nos quais se funda a resposta dada à Consulta formulada pelo TJRS, exposta no Ofício 492/04/SRRF10/Gabinete, não tem eficácia prospectiva, ficando a Administração livre para alterar os critérios jurídicos em relação a fatos geradores futuros. Entretanto, com base no princípio da segurança jurídica consagrado no art. 146 do CTN, a mudança da solução da consulta pela autoridade fiscal, na forma proposta pelo ofício 567/05/SRRF10/Gabinete, de 17.8.2005, não produz eficácia quanto aos fatos pretéritos, referentes ao período em que vigorou o entendimento da Receita Federal posteriormente revogado’.

Em relação à forma de cobrança dos valores relativos aos atos de registro e baixa de hipotecas, alienações fiduciárias, afetação de patrimônio e securitização de créditos imobiliários, denota-se disciplinamento inserido no art. 1º da Lei Estadual nº 3.185/1971, bem como no item VI da tabela B, onde contempla a possibilidade de cobrança por atos de averbações e registros praticados em razão dos valores declarados nos títulos apresentados ao Oficial de Registro.

Sendo assim, não deveria a administração do tribunal local, por determinação administrativa, sem que houvesse uma norma de exclusão nos respectivos diplomas estaduais, suspender sua eficácia.

Por fim, não obstante o presente pedido de providências versar sobre o recolhimento de emolumentos, ao compulsar os autos não se tem notícia de ter sido observado o que dispõe a Lei Federal nº 10.169, de 29 de dezembro de 2000, durante a edição das Resoluções aqui analisadas. O presente texto legal traz matéria regulamentadora do §2º do art. 236 da Constituição Federal, ao estabelecer normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

Ante o exposto e do mais que dos autos consta, defiro os pedidos formulados no ‘item III’ da peça inicial deste pedido de providências (ID 3253177 p. 26).

Posto isso, determino à Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Alagoas i) o cumprimento da legislação estadual que disciplina a matéria, uma vez que até o momento não foi objeto de qualquer ação de controle de constitucionalidade; e ii) que, ao editar novos atos administrativos que fixem emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, o faça de acordo com o que prevê a Lei Federal nº 10.169/00”. (Id. 366231).

_________________________________

Contra essa decisão interpõe o presente Recurso Administrativo a CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS, alegando que “o decisum vergastado não apreciou todas as questões que integram o objeto do processo, tendo se atentado apenas de maneira genérica as discussões quanto ao controle de constitucionalidade em procedimento administrativo; a devolução dos 50% (cinquenta por cento) dos emolumentos cobrados com base no Provimento CGJ/AL no 04/2016; a forma de cobrança dos atos de registro e baixa de hipoteca; e por fim, outros temas secundários” (Id. 3702267).

Ainda de acordo com as razões recursais apresentadas pelo Corregedor Geral de Justiça do Estado de Alagoas, a decisão recorrida teria “sido emitida de forma dúbia e genérica, sem correlação completa com as providências almejadas pelo requerente” (Id. 3702267).

Pelo exame dos fatos narrados e documentos juntados aos autos, verifica-se que o Tribunal de Justiça de Alagoas exerceu controle de constitucionalidade em sede de procedimento administrativo, alterando critérios estabelecidos em lei estadual vigente.

Com efeito, no caso em análise, no que se refere à forma de reajuste das tabelas de custas e emolumentos, a Resolução n. 14/2017 (TJAL), negou vigência ao que prevê o art. 1º da Lei Estadual n. 5.673/95, deixando de aplicar a disciplina legal relativa à correção monetária dos valores de custas e emolumentos da tabela lançada pela Resolução n. 06/2006 (TJAL).

E, não havendo evidências de que a referida lei estadual tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, não caberia ao Tribunal de Justiça de Alagoas editar ato administrativo que diverge da legislação estadual vigente, sob pena de usurpar a competência do Poder Legislativo.

Por isso é que, como bem demonstrado na decisão recorrida, entende-se que houve suspensão de eficácia da legislação estadual pela via administrativa, quando, na verdade, deveria o Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas adotar os meios jurisdicionais aplicáveis à espécie, caso entendesse inconstitucional mencionada lei.

Por outro lado, no que tange à discussão acerca da redução de emolumentos prevista no art. 290 da Lei Federal n. 6.015/1973, constata-se, do exame dos autos, que o Poder Judiciário de Alagoas, por meio de sua Corregedoria de Justiça, publicou o Provimento CGJ/AL n. 04/2016, o qual revogou expressamente a redução de 50% dos valores dos emolumentos incidentes sobre todos os atos de registros referentes à primeira aquisição de imóveis financiados pelo Sistema Financeiro de Habitação.

Posteriormente, referido provimento foi revogado pelo Provimento CGJ/AL n. 13/2017 (TJAL), o que ocasionou diversas decisões administrativas determinando às serventias extrajudiciais a devolução dos valores pagos a maior na vigência do Provimento CGJ/AL n. 04/2016 (TJAL).

E, como bem restou consignado na decisão recorrida, assiste razão ao Recorrido, quando indica que agiram os oficiais de registro de acordo com as determinações emanadas pela Corregedoria local à época.

É que, com base no princípio da confiança legítima, entende-se que não pode ser imposto aos registradores o ônus da devolução de valores, pois agiram de boa-fé, seguindo as determinações da Corregedoria local.

E tal conclusão decorre também por força do princípio da segurança jurídica consagrado no art. 146 do CTN, haja vista que a mudança de entendimento do Judiciário local não poderá produzir eficácia quanto aos fatos pretéritos, referentes ao período em que vigorou o entendimento.

Também no que se refere à forma de cobrança dos valores relativos aos atos de registro e baixa de hipotecas, alienações fiduciárias, afetação de patrimônio e securitização de créditos imobiliários, entende-se que não assiste razão ao Recorrente, uma vez que a disciplina legal sobre a matéria, nos termos do art. 1º da Lei Estadual n. 3.185/1971, bem como do item VI da tabela B, contemplam a possibilidade de cobrança por atos de averbações e registros praticados em razão dos valores declarados nos títulos apresentados ao Oficial de Registro.

Desse modo, não caberia ao TJAL, por ato administrativo, negar vigência ou suspender a eficácia da disciplina constante de respectivos diplomas estaduais.

Por fim, não obstante o objeto dos presentes autos relacionar-se a recolhimento de emolumentos, a título de reforço argumentativo,  destaca-se que os atos normativos exarados pelo Poder Judiciário do Estado de Alagoas – ora questionados – não observaram a regulamentação do § 2o do art. 236 da Constituição Federal, quanto às normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro, nos termos do disposto na Lei Federal n. 10.169, de 29 de dezembro de 2000.

E tal circunstância é mais uma evidência da profunda insegurança jurídica causada por referidos atos, conquanto eivados de vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade.

Desse modo, não subsistem os argumentos propostos pela Recorrente.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo e, por conseguinte, mantenho a decisão recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

É como voto.

Notas:

[1] Art. 290. Os emolumentos devidos pelos atos relacionados com a primeira aquisição imobiliária para fins residenciais, financiada pelo Sistema Financeiro da Habitação, serão reduzidos em 50% (cinquenta por cento).

[2] Art. 151.  É vedado à União: […] III – instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. – – /

Dados do processo:

CNJ – Pedido de Providências nº 0008038-98.2018.2.00.0000 – Alagoas – Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJ 14.04.2023

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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