STJ: Para Quarta Turma, autor de ação de paternidade tem de apresentar indício do relacionamento

Diante da recusa do réu a fazer o exame de DNA, a presunção de paternidade deve ser considerada dentro do conjunto de provas levantado no processo. Essa recusa não acarreta automaticamente a procedência do pedido, pois é necessário que o autor da ação de paternidade apresente indícios mínimos da existência de relacionamento entre a genitora e o investigado.

O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar um processo em que o réu se recusou por duas vezes a fazer o exame, e o juízo de primeiro grau reconheceu a presunção absoluta por considerar que seria impossível ao autor da ação apresentar provas por outros meios, tendo em vista se tratar de um relacionamento esporádico e clandestino.

O juízo afirmou que seria desarrazoado impor ao autor prova impossível. O réu, no entanto, reclamou que o magistrado antecipou o julgamento da matéria e com isso cerceou sua defesa, já que não havia no processo elementos mínimos que indicassem a existência do suposto relacionamento entre o casal. A sentença se baseou no artigo 232 do Código Civil, segundo o qual a recusa à perícia ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.

De acordo com o ministro Luis Felipe Salomão, que proferiu o voto vencedor na Quarta Turma, a questão deve ser tratada da mesma forma como quando há revelia em processo de investigação de paternidade. Nesses casos, os fatos alegados não podem ser tidos como verdadeiros, cabendo ao autor apresentar prova mínima dos fatos alegados. O ministro considera que a recusa ao exame de DNA não é mais grave do que a revelia.

“Também deve o autor, por simetria, provar minimamente os fatos apontados na inicial da ação”, afirmou Salomão.

Casos furtivos

O relator do processo, ministro Marco Buzzi, que ficou vencido no julgamento, afirmou que não se poderia exigir a produção de provas por parte do autor da ação, porque esta seria impossível. Segundo ele, o relacionamento sexual, muitas vezes, reveste-se de caráter reservado e furtivo, o que dificulta a produção de prova.

Para Salomão, a prova do relacionamento amoroso não é condição indispensável para a declaração de paternidade, muito menos a prova de um relacionamento clandestino ou esporádico. Mas a prova indireta, consistente em indícios, deve ser produzida para que seja prestigiada a verdade real dos fatos. Ele votou no sentido de que o processo volte à primeira instância para que sejam produzidas as provas necessárias.

Segundo alegações do processo, o autor, atualmente com 32 anos, teria tido educação custeada no exterior pelo réu, mas sempre por meios indiretos e com a preocupação de não deixar provas da paternidade.

O réu sustentou que, dado o seu poder econômico, é inviável fornecer material genético toda vez que alguém alega ser seu filho, ainda mais diante de uma realidade de laboratórios mal equipados e de profissionais mal treinados.

Presunção relativa

No Brasil não há norma que obrigue a pessoa a se submeter ao exame de DNA.

No recurso de apelação, a defesa sustentou que, nos termos do artigo 2º-A da Lei 8.560/92 (com redação dada pela Lei 12.004/09), “a recusa do réu em se submeter ao exame genético gerará a presunção de paternidade, a ser apreciada com o conjunto probatório”. A defesa sustenta que não houve contexto probatório levado em consideração pela sentença.

Ao julgar a matéria, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aplicou o enunciado da Súmula 301 do STJ, a qual determina que, “em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantumde paternidade” – ou seja, presunção relativa, que admite prova em contrário.

O TJSP apontou julgado do Supremo Tribunal Federal (STF) segundo o qual “a necessidade da produção da prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa” (RE 101.171).

Situação delicada

O ministro Luis Felipe Salomão considerou que, no caso em julgamento, não houve menção na sentença nem no acórdão aos fatos narrados ou às provas eventualmente produzidas pelas partes.

“Tudo no processo revela a necessidade de as instâncias ordinárias avaliarem com mais precisão a situação posta nos autos, que é extremamente delicada”, disse o ministro. Salomão entende que o TJSP pode vir a aplicar o enunciado da Súmula 301 do STJ, como o fez, mas após o necessário cotejo da prova produzida.

Votaram com Salomão os ministros Raul Araújo e Antonio Carlos Ferreira para dar parcial provimento ao pedido do réu recorrente. A ministra Isabel Gallotti também deu parcial provimento, mas em menor extensão.

O ministro Marco Buzzi, relator original, negou provimento por entender que a procedência da ação investigatória é medida necessária, tendo em vista que não existe nos autos nenhuma prova capaz de desconstituir a presunção relativa de paternidade decorrente da recusa do réu.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ | 12/11/2014.

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Jurisprudência mineira – Apelação Cível – Família – Ação investigatória de paternidade – Coisa julgada – DNA – Recusa injustificada e não comparecimento do réu – Recurso provido

APELAÇÃO CÍVEL – FAMÍLIA – AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE – COISA JULGADA – AFASTADA – PROVA PERICIAL – DNA – RECUSA INJUSTIFICADA E NÃO COMPARECIMENTO DO RÉU – PRESUNÇÃO RELATIVA DE PATERNIDADE – COTEJO PROBATÓRIO – RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE – RECURSO PROVIDO

– Aceita-se a relativização da coisa julgada, na esteira do entendimento do STJ, em ações de investigação de paternidade, quando o exame a que as partes foram submetidas não tem a sensibilidade e a especificidade da prova genética de DNA. – Considerado o conjunto probatório dos autos e a incidência da presunção prevista nos arts. 231 e 232 do CC/2002, bem como na Súmula 301 do STJ, ainda que alegada a exceptio plurium concubentium ao tempo da concepção, deve ser reconhecida a paternidade do réu relativamente à autora.

Recurso provido, para que seja reformada a sentença de improcedência do pedido. 

Apelação Cível nº 1.0592.12.002036-3/001 – Comarca de Santa Rita de Caldas – Apelante: E.C.L.A. – Apelado: V.L.S. – Relatora: Des.ª Hilda Maria Pôrto de Paula Teixeira da Costa

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 5 de agosto de 2014. – Hilda Maria Pôrto de Paula Teixeira da Costa – Relatora.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª HILDA MARIA PÔRTO DE PAULA TEIXEIRA DA COSTA – Trata-se de apelação interposta por E.C.L.A., em face da r.sentença de f. 91/94, prolatada nos autos da ação de investigação de paternidade por ela proposta em face de V.L.S., que julgou improcedente o pedido inicial, julgando extinto o feito, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC. A autora foi condenada ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, fixados em R$1.500,00, a teor do art. 20, § 4º, do CPC, suspendendo a exigibilidade das verbas por ser beneficiária da justiça gratuita. Por fim, foram arbitrados honorários ao d. advogado nomeado (f. 07), às custas do Estado, no valor de R$739,61.

A autora recorreu pelas razões de f. 97/101, arguindo, preliminarmente, não assistir razão ao réu em sua alegação de coisa julgada material, pois o exame de tipagem sanguínea realizado em ação prévia, há 17 anos, em nada se compara ao exame de DNA.

No mérito, afirma que o apelado se recusou a se submeter ao exame de DNA, o que enseja o reconhecimento da paternidade. Explicita que o Magistrado sentenciante, para fundamentar sua decisão, baseou-se nos depoimentos de testemunhas, prestados em 1996, e na alegação do apelado de apenas ter havido uma relação sexual entre ele e a genitora, o que se mostrou indevido diante dos fatos dos autos.

Esclarece ter dispensado a produção de prova oral pelo fato de que, da forma como ocorrera nos Autos nº 0172/95, qualquer testemunha arrolada pelo apelado iria afirmar a prostituição de sua genitora e que, "mesmo confirmada a prostituição da genitora, o que já resta evidenciado, não pode a apelante ter um direito seu protelado pelo apelado injustificadamente".

Questiona se, em sendo a mãe prostituta, é possível restar defeso ao filho saber quem é seu pai.

Recebido o recurso no duplo efeito, o apelado, em contrarrazões, reportou-se à contestação (f. 105v.).

O il. representante do Ministério Público, Dr. Luiz Antonio S. P. Ricardo, apresentou parecer às f. 111/112, opinando pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Conheço do recurso interposto, pois presentes os pressupostos de admissibilidade.

Da detida análise do feito, verifico que pretende a requerente/apelante, por meio da presente ação, a constituição do vínculo de paternidade com o réu V.L.S., que, por sua vez, suscitou preliminar de coisa julgada, em contestação, alegando ser a presente ação mera repetição de outra, julgada em 19.11.1996, com as mesmas partes e mesma causa de pedir.

A apelante pugna, preliminarmente, em suas razões recursais, pelo afastamento desse entendimento. 

Verifico que a preliminar de coisa julgada já fora afastada pelo Magistrado primevo à f. 61, em decisão contra a qual não fora interposto qualquer recurso.

Ademais, agiu corretamente o Juiz a quo ao afirmar a aceitação da relativização da coisa julgada, na esteira do entendimento jurisprudencial do STJ, em ações de investigação de paternidade, quando o exame a que as partes foram submetidas não tem a sensibilidade e especificidade da prova genética de DNA.

A prova pericial de tipagem sanguínea (que fora realizada em ação prévia, há 17 anos), não é hábil a provar a paternidade biológica, e, ainda, não a excluiu. Tal exame, realizado para verificação da compatibilidade sanguínea pelo sistema ABO, não teve o condão de excluir o liame biológico entre as partes.

E, quando o julgamento de improcedência é proferido, por ausência ou pela insuficiência de provas para se decidir com segurança pela procedência do pedido, permanece o direito do interessado de ajuizar nova ação de investigação de paternidade, quando entender que possui elementos de prova suficientes para comprovar as suas alegações, sobretudo após o surgimento do exame de DNA.

Dessa forma, a alegação de coisa julgada material já foi devida e corretamente afastada em primeira instância. 

Quanto à matéria de mérito, entendo que a r. sentença merece reforma, visto que manifesto o entendimento consentâneo ao esposado pelos il. representantes do Ministério Público, em primeira e em segunda instâncias.

Verifica-se que a apelada pugnou pela realização de exame de DNA e, intimada ao depósito dos valores periciais junto ao laboratório credenciado do juízo, arcou com a devida verba e compareceu, na data agendada, para a realização da prova genética.

Contudo, o apelado, devidamente intimado (f. 71), não compareceu ao laboratório para a coleta do material, invocando, posteriormente, "o princípio constitucional de não fazer prova contra si mesmo, negando-se a fazer o exame pericial invocado" (f. 83).

Afirma o apelado, ainda, que a genitora da apelante mantinha relacionamentos com outros parceiros em 1979, apoiando-se nos depoimentos das testemunhas por ele arroladas nos Autos nº 0172/95 (f. 34/36), bem como que manteve apenas uma relação sexual com a genitora da autora, por volta de junho ou julho de 1979, e não em fevereiro do mesmo ano.

Apoia-se, assim, na tese de defesa da exceptio plurium concubentium, ao tempo da concepção.

No entanto, entendo que deve ser afastada tal tese de defesa, ainda que, efetivamente, a genitora da apelante se prostituísse à época da concepção, diante da injustificada recusa do réu a se submeter ao exame de DNA, assim impedindo o juiz de apurar a veracidade da sua alegação e negando a possibilidade, sem razões plausíveis, de que a autora tenha reconhecido seu direito de personalidade.

Ademais, ele mesmo afirma ter mantido relação sexual com a genitora da autora, não tendo produzido prova segura de que tal relacionamento não ocorrera na provável data da concepção.

Dessa forma, o amplo direito de defesa não pode equivaler à necessidade de produção de uma prova diabólica, de inviável realização pela parte interessada, diante de uma recusa imotivada do apelado, com a devida vênia, sob pena de se coroar a própria inércia de um dos litigantes com uma decisão final favorável àquele que se omitiu em juízo no tocante ao ônus de auxiliar na busca da verdade real.

Nesse contexto, deve-se considerar a presunção relativa de paternidade, nos termos dos arts. 231 e 232 do Código Civil, bem como da Súmula 301 do STJ, que assim estabelecem:

"Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa. Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame". 

Súmula 301, STJ: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade".

Isso porque a ausência do interesse na submissão da perícia determinada em juízo contém implícito o receio quanto ao resultado que dela adviria, deixando entrever a hipótese de que o apelado está tentando impedir a materialização de conclusões periciais que lhe seriam adversas.

Não se olvida de que a presunção de paternidade, pela recusa do suposto pai a se submeter ao exame genético, deve ser afastada diante do cotejo com provas que demonstrem o contrário.

Não é, contudo, o caso dos autos, em que a ocorrência do relacionamento entre o apelado e a Sr.ª R.C.L. é induvidosa.

A propósito, leciona Maria Berenice Dias:

"O fato é que a negativa do réu em submeter-se ao exame acabava esvaziando a ação de conteúdo probatório, o que desaguava em uma sentença de improcedência. Ou seja, a omissão do demandado vinha em seu benefício. Tal solução, felizmente, não mais encontra ressonância na lei, pois quem se nega a submeter-se a exame médico necessário não pode se aproveitar de sua recusa (CC 231). A negativa pode suprir a prova que a perícia médica visava obter (CC 232). […] O fato é que, pelo que diz a lei, a postura omissiva do réu induz à presunção de paternidade, o que acaba levando à procedência da ação. Não pode ser outra a solução. A resistência do réu é suficiente para provar a paternidade. Mesmo que inexistam outras provas, sua omissão, por si só, justifica o acolhimento da demanda, sob pena de o direito à identidade deixar de ser uma questão de ordem pública para tornar-se uma questão de ordem privada" (Manual de direito das famílias. 7. ed. São Paulo: RT, 2010, p. 403-404).

Ademais, assiste razão ao il. Procurador de Justiça ao afirmar que, "a prevalecer a tese do apelado, o filho de uma prostituta dificilmente conhecerá seu pai biológico, mesmo sendo possível a realização do exame de DNA. Dependerá sempre da boa vontade do investigado".

Registre-se, por fim, que o estado de filiação é direito personalíssimo e indisponível, umbilicalmente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, devendo o Magistrado valorar a norma de forma a aproximá-la, o máximo possível, da busca da verdade real.

Os Tribunais pátrios já tiveram a oportunidade de concluir no mesmo sentido ao ora esposado:

"Ação rescisória. Art. 485, V, do CPC. Violação a artigo de lei. Juízo reincidente. Ação de investigação de paternidade. Prova pericial. DNA. Não comparecimento do réu ao local de coleta do material genético. Ausência de justificativa. Artigos 231 e 232 do Código Civil. Provas aliadas à presunção relativa de paternidade. Reconhecimento. Procedência do pedido rescisório. – Verificada hipótese que autoriza a rescisão da coisa julgada, deve ser julgado procedente o pedido, desconstituindo, assim, o julgado anterior e promovendo nova apreciação da causa originária (juízo rescisório). – Considerando o conjunto probatório e a incidência da presunção prevista nos arts. 231 e 232 do CC, tendo em vista o não comparecimento injustificado do réu para a submissão ao exame de DNA, por inúmeras vezes, deve ser julgado procedente o pedido rescisório e reconhecida a paternidade do réu relativamente à autora" (TJMG – Ação Rescisória nº 1.0000.07.457459-1/000 – Relator: Des. Edilson  Fernandes – Data do julgamento: 25.03.2014).

"[…] Em ação de investigação de paternidade, a recusa dos investigados a se submeterem ao exame de DNA implica a inversão do ônus da prova e a consequente presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, como já restou decidido pelo STJ no julgamento do REsp nº 557.365/RO; Relatora Ministra Nancy Andrighi; 3ª T.; j. em 07.04.2005; DJ de 03.10.2005, p. 242" (TJMG – Apelação Cível n° 1.0433.04.122096-6/001 – Relator: Des. Edivaldo George dos Santos – Data do julgamento: 12.04.2011). 

"Ação de investigação de paternidade. Prova. Exceptio plurium concubentium. DNA. – Deve ser afastada a alegação de plurium concubentium da mãe da autora, ao tempo da concepção, se os réus (irmãos e herdeiros do investigado) se recusam a se submeterem a exame de DNA, assim impedindo o juiz de apurar a veracidade da sua alegação. – Elementos suficientes de convicção sobre a paternidade imputada ao investigado. Recurso não conhecido" (STJ – REsp 135361/MG – Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar – DJ de 15.03.99).

Em face do exposto, dou provimento ao recurso e reformo a r. sentença, para julgar procedente o pedido inicial e declarar a paternidade do réu V.L.S. relativamente à autora E.C.L.A., determinando ao Cartório de Registro Civil que proceda às alterações necessárias.

Diante da reforma da sentença, condeno o réu ao pagamento das custas processuais e recursais, bem como dos honorários advocatícios em favor do patrono da autora, que fixo em R$724,00 (setecentos e vinte e quatro reais).

DES. AFRÂNIO VILELA – Acompanho a eminente Relatora, Desembargadora Hilda Teixeira da Costa, no sentido de dar provimento ao recurso para reformar a sentença e julgar procedente o pedido inicial, de modo a declarar a paternidade do apelado V.L.S. relativamente à apelante E.C.L.A e determinar ao Cartório de Registro Civil da Comarca de Santa Rita de Caldas que proceda às alterações necessárias.

Consoante ressaltou Sua Ex.ª, a tese de defesa da exceptio plurium concubentium deve ser afastada, diante da injustificada recusa do apelado a se submeter ao exame de DNA, impedindo a apuração da verdade e negando a possibilidade, sem razões plausíveis, de que a apelante tenha reconhecido seu direito de personalidade.

A relação processual existente entre o apelado e a genitora (e então representante da apelante) no Processo nº 0592.12.002.032-2, anterior ao feito, e que gerou reflexos para a recorrente, é distinta da relação processual atual, na qual a apelante pretende o reconhecimento de seu direito de personalidade de filiação.

O caso em tela trata de reconhecimento do direito de uma filha frente ao seu suposto pai, e, segundo o art. 333 do Código de Processo Civil, que trata da distribuição do ônus da prova, cabe ao autor fazer prova de fato constitutivo de seu direito e cabe ao réu fazer prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

A existência de pelo menos uma relação sexual entre o apelado e a genitora da apelante restou incontroversa, e o fato de a mãe da recorrente ter tido outros relacionamentos não afasta a possibilidade de o recorrido ser o pai, apenas o inclui em um rol de diversos supostos pais. Portanto, caberia ao apelado fazer prova de que deve ser excluído dessa lista, ou seja, de fato impeditivo do direito da apelante, através do exame de DNA.

A recusa do apelado a submeter-se ao referido exame faz presumir que é o pai, na forma do parágrafo único do art. 2º-A da Lei nº 8.560/92, incluído pela Lei nº 12.004/09, bem como nos arts. 231 e 232 do Código Civil/2002, e no Enunciado nº 301 do STJ. O princípio constitucional suscitado pelo apelado de não produzir provas contra si mesmo (f. 83), em conformidade com o art. 5º, inciso II, da CR/88, que prevê que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei, deve ser sopesado com o fato de existir lei expressa no sentido da presunção de paternidade em decorrência da recusa a se submeter a exame de DNA (Lei nº 8.560/92).

Dessa feita, o direito de não se submeter à produção de provas contra si mesmo não é um direito absoluto, possuindo exceções, como é o caso do exame de DNA para fins de apuração da paternidade.

Assim, impõe-se a aplicação da presunção prevista nos dispositivos legais supracitados. 

É como voto.

DES. MARCELO RODRIGUES – Após minucioso exame dos autos, acompanho a Relatora para dar provimento ao recurso. Na ação de investigação de paternidade, a prova dos fatos milita sempre a favor daquele que pretende descobrir a verdade real quanto ao seu ascendente.

Nesse sentido, a exceção à presunção de inocência, disciplinada nos art. 231 e 232 do Código Civil de 2002, veio a ser contemplada pelo legislador, em razão da construção jurisprudencial pretoriana, calcada no Enunciado 301 da Súmula do STJ, dispondo que aquele que se recusa a se submeter ao exame de DNA se sujeita ao reconhecimento do pedido.

E não de outra forma, por se tratar de presunção relativa, cabia ao apelado promover a prova de que não é o genitor da apelante, não bastando a indicação de que a genitora se tratava de pessoa que vivia em local de meretrício da cidade. 

Os robustos e lúcidos fundamentos utilizados pela Relatora e pelo Revisor melhor coadunam com o objetivo da lei em prestigiar o direito de família, na busca pela solução dos conflitos que essas situações trazem à tutela do Poder Judiciário.

Apenas acrescento que seja expedido o indispensável mandado de averbação ao assento de nascimento da parte perante o Cartório do Registro Civil de Pessoas Naturais pertinente.

É como voto

Súmula – DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Recivil – DJE/MG | 11/09/2014.

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STJ: Dúvida não autoriza anulação de registro de filho que foi reconhecido voluntariamente

É impossível declarar a nulidade do registro de nascimento, após o reconhecimento voluntário da paternidade, sob a simples alegação de dúvidas com relação ao vínculo biológico com o registrado, sem que existam provas robustas de erro ou falsidade do ato jurídico. 

O entendimento unânime foi da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que considerou improcedente o pedido de um pai que, após relacionamento afetivo efêmero e casual, decidiu registrar o filho sem realizar exame de DNA. 

Após quatro anos de vida do menor, o pai requereu a nulidade do registro, pedindo a produção de perícia sanguínea para apurar a paternidade biológica, pois suspeitou que a genitora tivesse mantido outros relacionamentos à época da concepção. Além disso, alegou não perceber semelhanças físicas entre ele e o menor. 

No curso da ação, o pai faleceu. Em razão do óbito, a primeira instância deferiu a habilitação dos pais do falecido no caso e reconheceu, baseado na interpretação em sentido contrário da Súmula 301 do STJ, a presunção de que o menor não era filho do autor falecido, pois não havia comparecido ao exame em duas ocasiões. 

A súmula diz que, em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção relativa de paternidade. 

Aplicação inversa 

Inconformado com a decisão, o filho apelou para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que manteve a aplicação inversa da súmula e confirmou a possibilidade da sucessão processual. 

Ao apresentar recurso especial, o filho sustentou que esse tipo de ação é de cunho personalíssimo, de modo que seus avós não poderiam suceder o pai falecido no polo ativo da demanda. Assegurou que as hipóteses de afastamento da presunção de paternidade são restritas. Insurgiu-se também contra o indeferimento da prova genética no cadáver e contra a aplicação da súmula. 

No STJ, o entendimento do tribunal de origem com relação à interpretação da súmula foi reformado, porém, mantida a tese da sucessão processual. De acordo com a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, ainda que se trate de direito personalíssimo, “tendo o pai registral concretizado sua intenção de contestar a paternidade ainda em vida, impõe-se admitir a sucessão processual de seus ascendentes, a fim de dar prosseguimento à ação proposta”. 

Ao se referir ao registro de nascimento, a ministra explicou que o ato possui valor absoluto, independentemente de a filiação ter-se verificado no âmbito do casamento ou fora dele, “não se permitindo negar a paternidade, salvo se consistentes as provas do erro ou falsidade, não se admitindo para tal fim que o erro decorra de simples negligência de quem registrou”. 

Mero arrependimento

A relatora ressaltou que o Poder Judiciário não poderia prejudicar a criança por “mero capricho” de um adulto, que decidiu livremente registrá-la, mesmo com todas as consequências jurídicas e afetivas decorrentes desse ato, e que, após tantos anos, pretende “livrar-se do peso da paternidade” por “mero arrependimento”. 

“Por essa razão, a presunção de veracidade e autenticidade do registro de nascimento não pode ceder diante da falta de provas evidentes do vício de consentimento, para a desconstituição do reconhecimento voluntário da paternidade”, acrescentou. 

A ministra refletiu que, diante de relacionamentos efêmeros, em que o envolvimento das partes restringe-se à conotação sexual, “a ação negatória de paternidade não pode se fundar em mera dúvida, desconfiança que já havia ou deveria haver quando do reconhecimento voluntário”. 

Entendimento equivocado 

Nancy Andrighi reconheceu o exame de DNA como um “instrumento valioso” na apuração da verdade biológica, que se aproxima da certeza absoluta. Porém, afirmou que a prova genética não pode ser considerada o único meio de prova da paternidade. 

Para ela, o entendimento do tribunal de origem, que concluiu pela presunção de que o autor não era pai, em prejuízo do menor, mostra-se “equivocado” e é contrário à proteção que o ordenamento jurídico brasileiro confere à criança e ao adolescente, pelo princípio do melhor interesse do menor. 

Segundo a ministra, em virtude desse princípio, não se pode interpretar a súmula do STJ em desfavor dos interesses da criança, “desconstituindo a paternidade reconhecida e maculando seu direito à identidade e ao desenvolvimento de sua personalidade”. 

Por essas razões, a Turma considerou insuficiente para a exclusão da paternidade o não comparecimento do menor ao exame de DNA, desacompanhado de quaisquer outros elementos probatórios. 

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ I 28/11/2013.

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