Decisão da Corregedoria de Justiça permitiu a criança ter o nome das duas mães no registro de nascimento sem que o casal tivesse que recorrer à Justiça
O reconhecimento voluntário da filiação socioafetiva pode ser realizado em cartório sem a necessidade de apresentação de provas de filiação. Com este entendimento, a Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo (CGJ-SP) autorizou a inclusão do nome de mãe socioafetiva na qualidade de mãe e os nomes dos pais dela como avós no registro de nascimento da criança, em um caso envolvendo um casal de mulheres.
O casal de mulheres, que vive em união estável desde 2006, se submeteu à inseminação heteróloga – quando o esperma é doado por terceira pessoa -para conceber seu filho. A criança, atualmente com um ano de idade, tinha apenas o nome da mãe biológica no registro de nascimento, motivo pelo qual o casal formulou requerimento ao oficial de registro civil pedindo a inclusão do nome da mãe socioafetiva também na qualidade de mãe, e dos pais dela como avós.
O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) interpôs recurso contra decisão da CGJ-SP alegando que a competência para tal decisão cabe à Vara de Família, em razão da ausência de determinação de vínculo biológico entre a criança e mãe socioafetiva, e que a decisão não interpretou corretamente o artigo 1.597, do Código Civil. O MP alegou, ainda, que o princípio constitucional da isonomia foi violado. A CGJ-SP opinou pelo não provimento do recurso ministerial e manteve a decisão recorrida.
Presunção de paternidade -Segundo o artigo 1.597 do Código Civil, presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga e os havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.
De acordo com o parecer do juiz assessor da Corregedoria, Gustavo Henrique Bretas Marzagão, após o julgamento da ADI-4277 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar, todos os dispositivos legais que, de alguma forma, permitam ou induzam tratamento diverso entre os casamentos e uniões estáveis heterossexuais e homoafetivos, devem passar por uma releitura para atender às suas novas finalidades.
Assim, se a presunção da paternidade contida no artigo 1.597 do Código Civil vale para companheiros que vivem em união estável e se, aos casamentos e uniões estáveis de pessoas do mesmo sexo são garantidos os mesmos direitos, não se pode recusar à mãe socioafetiva o direito de reconhecer como seu o filho havido nestas circunstâncias, “do contrário, criar-se-ia a seguinte situação injustificada de desigualdade: os cônjuges ou companheiros de sexos diferentes (relacionamento heterossexual) teriam acesso à via mais rápida do reconhecimento direto perante o registrador, ao passo que os companheiros ou cônjuges de mesmo sexo (relacionamento homoafetivo) teriam de trilhar a morosa e dispendiosa via judicial”.
Discriminação – Gustavo Marzagão aponta que, em relação aos filhos biológicos havidos durante a constância do casamento, a lei presume a filiação; quanto aos filhos concebidos fora do casamento, basta a declaração do pai perante o registrador para que a paternidade seja averbada no registro de nascimento, ou seja, a lei não exige qualquer prova específica daquele que se apresenta como pai para registrar uma criança, sendo suficiente a afirmação desta qualidade perante o registrador ou juiz.
Nesse sentido, quanto à filiação por socioafetividade, a via judicial também é dispensável,pois a Lei nº 8.560/92 cuida do reconhecimento de filhos havidos fora do casamento, sem discriminar o tipo de filiação, seja biológica ou socioafetiva. Assim, impedir o reconhecimento da filiação socioafetiva na via administrativa implicaria discriminação da filiação, o que é vedado pela lei. “Deste modo, se o filho biológico pode ser reconhecido voluntariamente pelo pai mediante simples declaração – desacompanhada de qualquer prova – feita perante o oficial de registro civil, o mesmo direito, nas mesmas condições, deve ser concedido ao filho socioafetivo”, ressaltou.
Desjudicialização – O juiz destaca que a utilização da via administrativa representa, ainda, medida de desjudicialização, porque transfere a órgão não jurisdicional questão que dispensa manifestação do Estado-Juiz. Além disso, o reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva em cartório já é realidade em diversos Estados como Pernambuco, Maranhão e Ceará, onde as respectivas Corregedorias Gerais de Justiça editaram Provimentos regulamentando a matéria. A decisão é do dia 22 de outubro último.
Fonte: IBDFAM | 19/11/2014.
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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