Artigo: Identidade do natimorto em dignidade do seu óbito* – Por Jones Figueirêdo Alves

*Jones Figueirêdo Alves

A identidade do natimorto pela possibilidade de atribuição do seu nome em assento do óbito constitui ato registral de imensa dignidade à família e ao nascituro que nasce sem vida.

Neste propósito, petição “on-line” veiculada na internet há cerca de dois meses e subscrita por uma jovem mãe cuja filha Lara não teve o nome incluído no seu assento de natimorto, dirigida à Corregedoria Geral de Justiça do Rio de Janeiro, vem conclamar permissão normativa que assegure aos pais a identificação nominal dos seus filhos natimortos. O pleito de Luciana Santos Krull já obteve assinatura de quase oitenta mil apoiadores.

O Provimento nº 12/2014, da Corregedoria Geral de Justiça de Pernambuco, de nossa autoria, de 08/09/2014 (TJPE- DJe de 11/09/14, p. 69), um dos pioneiros no país, regulamentou o assento do óbito fetal facultando aos pais o direito de atribuição de nome no registro a ser assentado pelo Ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais.

O que hoje acontece, de ordinário, é que o filho já esperado pelo nome que lhe seria dado, torna-se apenas um mero registro do feto que feneceu, como sombra de si mesmo e feto, enquanto tal, por não ter vindo à luz com vida, mesmo que por mínima fração de tempo, não terá nome na abertura do assento do seu óbito.

De efeito, ao nascituro que nasce sem vida, feto que falece no interior do útero ou no parto, como tal havido natimorto, após uma gestação superior a vinte semanas, não lhe é dado alcançar direito personalíssimo ao nome e sobrenome. Cumpre-se apenas o registro do óbito fetal, em livro próprio – “C-Auxiliar” (Lei nº 6.015/73, art. 53), com indicação dos pais, dispensado o assento de nascimento.

Pois bem. Essa espécie de mortalidade tem se constituído em evento jurídico a exigir novas atuações da doutrina, dos tribunais do país, da legislação e de políticas públicas de saúde, quando cerca de 3,3 milhões de crianças, a cada ano, no mundo, são natimortos, com morte intrauterina nos três últimos meses de gestação.

Nomeadamente são postas questões novas, a exemplo: (i) o feto anencéfalo é um natimorto cerebral; (ii) “a proteção que o Código Civil confere ao nascituro alcança o natimorto, no que concerne aos direitos da personalidade, tais como nome, imagem e sepultura” (Enunciado nº 01, da I Jornada de Direito Civil – CJF-STJ, em 11-13/09/2002); e (iii) existe o direito de os pais registrarem os filhos natimortos com nome e sobrenome.

No plano legislativo não ocorreram avanços. O então vice-presidente da República Michel Temer, no exercício do cargo de presidente da República, vetou integralmente, em 30/06/2015, o Projeto de Lei nº 88, de 2013 (nº 5.171/2013 na Câmara dos Deputados) que previa o registro do nome ao natimorto. Em sua justificativa, Temer argumentou que “a alteração poderia levar a interpretações que contrariariam a sistemática vigente no Código Civil, inclusive com eventuais efeitos não previstos para o direito sucessório”.

No plano administrativo, revisão normativa da Corregedoria Geral de São Paulo (onde anotam-se cinco mil natimortos por ano) ao seu Código de Normas de Serviço (Cap. XVII, Tomo II, item 32), facultou o direito de atribuição de nome do natimorto, sem necessidade de duplo registro (nascimento e óbito). E em Minas Gerais, o Provimento nº 260/CGJ/2013 prevê expressamente, em seu artigo 537, a faculdade dos pais em dar nome ao natimorto.

Na doutrina avançada de Teixeira de Freitas, anotou-se que “as pessoas por nascer existem, porque, suposto não sejam ainda nascidas, vivem já no ventre materno”. Lado outro, em seu voto pioneiro, o desembargador Rui Portanova assinalou que a omissão do nome ao natimorto constitui “uma crueldade para com os pais, que já passaram pelo traumático evento da criança morta, e não precisam passar por uma segunda “morte” do filho, desta vez causada pelo desprezo da ordem jurídica” (TJRS, 8ª CC, Apel. Cível nº 70020535118, 25/10/2007).

De fato, há um luto social diante do natimorto, filho dos pais que não o tiveram e cidadão que a sociedade não o recebeu. Mães de mãos vazias e parturientes de parto inútil compõem uma realidade de vida que não pode ser despercebida pelo direito.

*Artigo publicado no jornal Folha de Pernambuco em 22 de outubro

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* Jones Figueirêdo Alves é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e mês em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa (FDUL)

Fonte: TJPE | 24/10/2016

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Artigo: União Internacional do Notariado: Conhecimento notarial sem fronteiras – Por José Flávio Bueno Fischer

*José Flávio Bueno Fischer

Entre os dias 19 e 22 de outubro de 2016, ocorreu em Paris, na França, o 28º Congresso Internacional do Notariado, logo após a realização das reuniões administrativas e estratégicas da UINL. Lá estivemos participando da delegação brasileira, juntamente com o Presidente do Colégio Notarial do Brasil (CNB/CF), Ubiratan Guimarães, e os demais conselheiros da UINL, os notários Paulo Roberto Gaiger Ferreira, João Figueiredo Ferreira e Filipe Andrade Lima Sá de Melo, além de outros colegas brasileiros participantes.
Organizado pela União Internacional do Notariado (UINL), o Congresso debateu assuntos pontuais para o desenvolvimento e aprimoramento da atividade notarial, como “a formação necessária para acender à função notarial e sua atualização contínua”, “as pessoas vulneráveis e o papel do Notário”, e “a confiança depositada no notário pelos cidadãos, empresas e o Estado: suas razões sociais, jurídicas e econômicas”. Sobre este último tema, inclusive, contribuímos com a reflexão através da apresentação de um trabalho no segundo dia do evento.
Durante as reuniões ocorreu a eleição do novo Presidente da UINL para o triênio 2017-2019, José Marqueño de Llano, da Espanha, bem como a aprovação da adesão da Sérvia como 87º membro da União Internacional do Notariado.
Para o novo Presidente, José Marqueño de Llano, nós, notários, “devemos saber demonstrar algo que é uma realidade: o sistema notarial é tão mais eficiente, como é também o menos oneroso”[1]. Portanto, seus principais objetivos na sua futura gestão são “afirmar a presença notarial como garantia dos direitos fundamentais do cidadão, transmitir à sociedade os valores do notariado, ampliar suas funções em benefício dos cidadãos e defender o documento notarial, promovendo seu reconhecimento como a espinha dorsal do sistema de segurança jurídica preventiva mundial, em atenção à sua utilidade social.”[2]
Da leitura destes objetivos, depreendemos que há uma grande preocupação em conscientizar a população da real importância e eficiência do notário para a Sociedade. Desta forma, podemos perceber que não é só no Brasil que a atividade notarial tem sido atacada e desvalorizada, isto tem ocorrido em escala mundial.
Pois bem. Algumas das ações do novo Presidente para tentar reverter este cenário envolvem “fomentar a participação do notariado mundial ante seus organismos nacionais e internacionais para dar a conhecer a potencialidade do sistema notarial” e “promover diálogos e intercâmbio entre os distintos sistemas jurídicos para encontrar pontos de encontro e colaboração’. [3]
E, é neste ponto que chegamos ao foco deste texto: conscientizar o Notariado brasileiro que somente através de sua constante participação e atuação em organismos e entidades nacionais e internacionais, que promovam o intercâmbio e o diálogo, como a UINL, é que a classe notarial brasileira se tornará mais forte e apta a mostrar à população brasileira o quanto somos essenciais para garantir a segurança jurídica nas relações e para manter a paz social.
Bons exemplos, que deram certo em outros países, em outras comunidades, devem ser seguidos. É o caso do notariado espanhol em colaboração com os notários brasileiros, no combate à corrupção e lavagem de dinheiro. Exemplo que o Colégio Notarial do Brasil está seguindo para implementar nosso próprio sistema de colaboração dos notários com as autoridades, contra estes crimes. E, na verdade, isso só está sendo possível devido ao intercâmbio em nível mundial e o acesso facilitado às informações notariais globalizadas que a UINL proporciona aos seus membros.
O mundo globalizado atual exige conhecimento sem fronteiras. Compartilhar informações, trocar ideias, estudar com outras culturas, com outros países, é a única forma de melhorar e aperfeiçoar o direito notarial no Brasil.
Para fortalecermos o Notariado Brasileiro e criar um espírito de classe, precisamos que cada vez mais notários participem deste intercâmbio mundial. Por isso, neste texto, fazemos um chamamento a todos os notários brasileiros que ainda não fazem parte da UINL, para que se unam a esta grande família, se tornando um Aderente Individual da União Internacional do Notariado. É rápido e simples, e as informações necessárias para a inscrição estão todas relacionadas nos itens abaixo.
Juntos somos mais fortes! Seja um aderente individual da UINL e faça parte da história do Notariado Brasileiro!

TORNE-SE UM ADERENTE INDIVIDUAL DA UNIÃO INTERNACIONAL DO NOTARIADO

1.    A União Internacional do Notariado (UINL)
A União Internacional do Notariado (UINL) é uma organização internacional não governamental integrada por organizações notariais de 87 países que reconhecem a origem de seus sistemas jurídicos no direito romano-germânico.
Fundada em Buenos Aires, em 2 de outubro de 1948, a UINL promove, organiza e desenvolve os interesses e as funções da profissão notarial ao redor do mundo, assegurando a independência e a imparcialidade dos notários, a fim de que eles prestem um melhor serviço para a sociedade onde estão inseridos.
A União Internacional do Notariado (UINL) é uma rede mundial com uma ambição comum: estar a serviço de uma sociedade mais justa, mais humana, mais harmoniosa.

2.    Finalidades da União Internacional do Notariado (UINL)
– Facilitar a relação entre notários dos diferentes notariados membros para compartilhar informações e experiência;
– Promover e fortalecer a formação profissional e apoiar os trabalhos científicos em âmbito notarial;
– Promover congressos, conferências e encontros internacionais;
– Favorecer a circulação das escrituras notariais, conferindo-lhes eficácia jurídica internacional;
– Apoiar ações de interesse social, promovendo direitos como à moradia e ao registro de nascimento;
– Representar o Notariado frente às organizações internacionais e colaborar com estas;
– Colaborar no plano internacional para a harmonização das legislações notariais nacionais;
– Estabelecer e promover relações com os notariados nacionais a fim de colaborar com sua organização e desenvolvimento;
– Apoiar a evolução do direito em matéria notarial para aqueles países que solicitem;
– Promover a aplicação dos princípios fundamentais do sistema de notariado de direito civil e, em particular, os princípios de deontologia notarial.

3.    Torne-se um Aderente Individual da União Internacional do Notariado
A UINL, constatando o interesse em sua atividade por parte de um grande número de notários, instituiu a categoria dos Aderentes Individuais, permitindo que todos os notários e futuros notários que compartilham de seus ideais possam partilhar de suas ações.
No caso do Brasil, que é um Notariado membro da UINL, podem tornar-se Aderentes Individuais tanto notários em exercício, como aposentados, assim como futuros notários.

4.    Vantagens de ser um Aderente Individual
Cada notário Aderente se une de forma privilegiada a União e obtém, deste modo, acesso à informações importantes inerentes à profissão notarial, passando a integrar e usufruir da Rede Mundial do Notariado, assim como de uma série de benefícios, dentre eles:
– Revistas editadas pela UINL (Revista Internacional do Notariado, Newsletter, Boletim eletrônico);
– Resenhas informativas e periódicas sobre as atividades da UINL;
– Informação sobre temas notariais de dimensão internacional;
– Acesso a artigos e trabalhos dos membros da UINL;
– O direito de participar dos Congressos Internacionais do Notariado, Seminários e Jornadas organizados pela UINL (com uma redução no valor das inscrições);
– O direito de acessar os estudos e trabalhos realizados pela UINL por meio de um sítio web reservado a seus membros;
– A oportunidade de fazer parte da grande família dos notários que constitui uma rede mundial a serviço de seus usuários.

5.    Como aderir?
Tornar-se um Aderente Individual é muito fácil! Basta acessar o link http://www.uinl.org/133/hágase-adherente-individual, preencher os dados e enviar sua ficha de inscrição.
Dúvidas podem ser esclarecidas através do e-mail adherent.uinl@uinl.org.

6.    Contribuição e modalidades de pagamento
A contribuição financeira anual a UINL para tornar-se Aderente Individual é de 80 € ou 100 USD, e é possível realizar o pagamento com cheque, transferência bancária ou cartão de crédito.
7.    Quando termina a adesão?
A qualidade de membro se renova automaticamente a cada ano mediante o pagamento, no início do ano, da contribuição anual.
A adesão termina tanto por pedido escrito do aderente dirigida a Secretaria da UINL, quanto pela morosidade no pagamento da cota anual.


[1] COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL – CONSELHO FEDERAL. José Marqueño de Llano, da Espanha, é eleito presidente da UINL. Disponível em http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=ODUzOA==. Acesso em 24 0ut. 2016.

[2] COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL – CONSELHO FEDERAL. José Marqueño de Llano, da Espanha, é eleito presidente da UINL. Disponível em http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=ODUzOA==. Acesso em 24 0ut. 2016.

[3] COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL – CONSELHO FEDERAL. José Marqueño de Llano, da Espanha, é eleito presidente da UINL. Disponível em http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=ODUzOA==. Acesso em 24 0ut. 2016.

*José Flávio Bueno Fischer: 1º Tabelião de Novo Hamburgo/RS, Ex-presidente do CNB-CF e Membro do Conselho de Direção da UINL

Fonte: Colégio Notarial do Brasil/CF | 27/10/2016

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STJ: Condomínio não pode utilizar medidas não pecuniárias para punir condômino devedor

O condomínio não pode ignorar os meios expressamente previstos em lei para cobrança de dívida condominial. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considera que o Código Civil (CC) é taxativo quando estabelece sanções pecuniárias para o caso de inadimplemento de despesas condominiais.

De acordo com o ministro Marco Aurélio Bellizze, o Código de Processo Civil (CPC) de 1973 já estabelecia o rito mais célere, o sumário, para a respectiva ação de cobrança, justamente levando em consideração a necessidade de urgência para satisfação do crédito relativo às despesas condominiais.

Na sistemática do novo código, explicou o ministro, as cotas condominiais passaram a ter natureza de título extrajudicial (artigo 784, inciso VIII), de forma a viabilizar o manejo de ação executiva, tornando a satisfação do débito ainda mais rápida.

E uma das garantias para a satisfação do débito é a constrição judicial da própria unidade condominial, “não sendo dado ao condômino devedor deduzir, como matéria de defesa, a impenhorabilidade do bem como sendo de família”, observou Bellizze. Isso é previsto na Lei 8.009/90 e pacificado no âmbito do STJ.

Instrumentos

Outra hipótese prevista no CC é a possibilidade de o condomínio, por meio da aprovação de três quartos dos moradores, impor outras penalidades pecuniárias, como multas, de forma proporcional à gravidade e à repetição da conduta.

Para Bellizze, “diante de todos esses instrumentos (de coercibilidade, de garantia e de cobrança) postos pelo ordenamento jurídico, inexiste razão legítima para que o condomínio dele se aparte”.

Mesmo assim, não é incomum chegarem ao Poder Judiciário, e especificamente ao STJ, queixas de condôminos que foram penalizados de forma diversa, com sanções que constrangem e até mesmo atingem sua honra e a imagem.

Área comum

A proibição de acesso e de utilização de qualquer área comum pelo condômino e seus familiares – seja de uso essencial, social ou de lazer, com o único e ilegítimo propósito de expor ostensivamente a condição de devedores perante o meio social em que residem – foge dos ditames do princípio da dignidade humana.

Esse posicionamento foi adotado pela Terceira Turma, em agosto deste ano, ao julgar recurso especial de condomínio residencial que teria impedido moradora e familiares de frequentar o clube do condomínio, com base em previsão regimental (REsp 1.564.030).

Para os ministros, o direito do condômino ao uso das partes comuns não decorre da situação de adimplência das cotas condominiais, mas, sim, do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes comuns.

Por essa razão, “a sanção que obsta o condômino em mora de ter acesso a uma área comum (seja qual for a sua destinação), por si só, desnatura o próprio instituto do condomínio, limitando, indevidamente, o correlato direito de propriedade”, defendeu o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze.

A turma, em decisão unânime, negou provimento ao recurso do condomínio, em conformidade com as instâncias ordinárias.

Serviços essenciais

A falta de pagamento de taxas condominiais não autoriza a suspensão, por determinação da assembleia geral de condôminos, do uso de serviços essenciais. Para a Terceira Turma, a substituição de meios expressamente previstos em lei pela restrição ao condômino inadimplente quanto à utilização dos elevadores afronta o direito de propriedade e sua função social, além da dignidade da pessoa humana (REsp 1.401.815).

No recurso especial julgado pela turma, a proprietária de um apartamento do Edifício Chopin, localizado em Vitória (ES), foi surpreendida com a desprogramação dos elevadores que davam acesso ao andar de sua residência após deixar de pagar duas taxas condominiais, que à época do ajuizamento da ação custavam quase R$ 3 mil.

Na ação de indenização por danos morais, ela afirmou que, ao passar por dificuldades financeiras, foi submetida a situação vexatória, que lhe causou abalos morais. O juízo de primeiro grau considerou que a medida não foi ilícita, já que aprovada em assembleia, com expressa concordância da autora. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo.

Autonomia limitada

No STJ, a proprietária sustentou que o sistema legal prevê sanções específicas para o inadimplemento das cotas condominiais, quais sejam, juros e multa.

“Não sendo o elevador um mero conforto, em se tratando de edifício de diversos pavimentos, com apenas um apartamento por andar, localizando-se o apartamento da recorrente no oitavo pavimento, o equipamento passa a ter status de essencial à própria utilização da propriedade exclusiva”, esclareceu a ministra Nancy Andrighi, relatora.

Segundo ela, embora a convenção de condomínio, o regimento interno e as demais normas instituídas pela assembleia geral sejam manifestação da autonomia da vontade e tenham força de lei nas dependências do condomínio, assim como nas demais relações jurídicas de direito civil, essa autonomia privada não é irrestrita, “sendo limitada por outras normas públicas cogentes”, defendeu.

Execução forçada

Dessa forma, disse Andrighi, a autonomia privada no estabelecimento das sanções deve ser exercida “nos limites do direito fundamental à moradia, do direito de propriedade e sua função social e outros, todos enfeixados no princípio-mor da dignidade da pessoa humana”.

Para solução do inadimplemento, a ministra considerou a execução forçada, sendo facultado ao credor ingressar na esfera patrimonial do devedor para obter a quantia em atraso e as penalidades previstas em lei.

Andrighi mencionou ainda a possibilidade de a execução da dívida recair sobre a unidade condominial que gerou a obrigação: “É firme o entendimento do STJ no sentido de que o imóvel, conquanto se trate de bem de família, sujeita-se à penhora em execução de dívida decorrente do inadimplemento de cotas condominiais.”

Multas e juros

O artigo 1.336, parágrafo 1º, do CC prevê que o condômino em dívida com despesas condominiais fica sujeito aos juros moratórios convencionados ou, caso não previstos, aos de 1% ao mês e multa de até 2% sobre o débito.

Já o condômino que deixa de pagar reiteradamente o valor correspondente à manutenção do condomínio – considerado condômino nocivo ou condômino antissocial – poderá ser obrigado a pagar multa de até o décuplo do valor da contribuição mensal para as despesas condominiais, conforme a gravidade e a reiteração, desde que haja aprovação de três quartos dos condôminos em assembleia.

Contudo, a aplicação da sanção prevista no artigo 1.337, caput e parágrafo único, do CC, conforme ressalta o ministro Luis Felipe Salomão, exige que o condômino “seja devedor reiterado e contumaz, não bastando o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos”.

Salomão explica que “a intenção legislativa foi a de coibir eventuais abusos e excessos eventualmente praticados por alguns condomínios, cujo permissivo legal somente deverá ser utilizado quando a conduta do comunheiro revelar efetiva gravidade”.

Devedor contumaz

Em outubro de 2015, a Quarta Turma debateu a possibilidade da aplicação de multa acima do patamar de 2% para o devedor contumaz de despesas condominiais, tendo por fundamento a regra inserida no artigo 1.337 do CC.

O condomínio do Edifício Brasília Trade Center ajuizou ação contra o Grupo Ok Construções e Empreendimentos objetivando a cobrança de taxas condominiais ordinárias e extraordinárias (REsp 1.247.020).

O juízo de primeiro grau condenou o devedor ao pagamento das despesas não pagas, com acréscimo de juros de mora, correção monetária e multa moratória de 2%. Contudo, afastou a aplicação da multa de 10% fixada em assembleia geral. Em grau de apelação, a sentença foi reformada para possibilitar a cobrança da multa.

“A utilização do termo ‘reiteradamente’ pelo caput do artigo 1.337 exprime conduta repetida, renovada e repisada pelo condômino”, observou o relator, ministro Salomão. Além disso, em seu entendimento, “o estatuto civil exige um agravamento da conduta capaz de colocar em risco a convivência com os demais condôminos, colocando em perigo, inclusive, a sua própria solvência financeira”.

Via judicial

Quanto ao caso específico, ele observou no acórdão do tribunal de origem que, desde 2002, todos os pagamentos efetuados pelo Grupo Ok foram feitos por via judicial, com atrasos que chegavam a mais de dois anos.

Para ele, os deveres da boa-fé objetiva foram violados, “principalmente na vertente da cooperação e lealdade, devendo o julgador rechaçar veementemente atitudes graves que colocam em risco a continuidade da propriedade condominial”.

Diante das constatações, Salomão concluiu que a conduta do devedor se amoldava ao preceito legal do caput do artigo 1.337 do CC, “pois se trata de evidente devedor contumaz de débitos condominiais, apto a ensejar a aplicação da penalidade pecuniária ali prevista”.

A Quarta Turma, por maioria de votos, negou provimento ao recurso especial do Grupo Ok Construções e Empreendimentos.

Jurisprudência em Teses

Esta matéria foi redigida com base em teses apontadas pela Secretaria de Jurisprudência do STJ na 68º edição de Jurisprudência em Teses, sob o tema Condomínio.

Para visualizar o conteúdo da seleção, com 17 teses sobre o assunto, acesse o menu Jurisprudência na página inicial e abra o link Jurisprudência em Teses. É possível consultar pelo número da edição, pelo ramo do direito ou por outros critérios, como o assunto. Ao clicar em cada tese, o usuário terá acesso a todos os julgados sobre o tema relacionado.

A notícia refere-se aos processos: REsp 1564030, REsp 1401815 e REsp 1247020.

Fonte: STJ | 30/10/2016

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