Projeto aprovado contém regras sobre uso de dados pessoais em estudos de saúde pública

O projeto de lei sobre tratamento de dados (PL 4060/12) aprovado pela Câmara dos Deputados nesta terça-feira (29) especifica que, para a realização de estudos em saúde pública, os órgãos de pesquisa poderão ter acesso a bases de dados pessoais, mas deverão tratá-los em ambiente controlado e seguro.

Sempre que possível, os estudos deverão realizar a anonimização, ou seja, procedimento que torne os dados anônimos ou difíceis de serem associados a uma pessoa em particular.

Será proibida a comunicação ou o uso compartilhado entre responsáveis de dados sensíveis referentes à saúde com o objetivo de obter vantagem econômica, exceto nos casos de portabilidade de dados consentida pelo titular.

Crianças e adolescentes

Quanto ao tratamento de dados pessoais de crianças e de adolescentes, o substitutivo de Orlando Silva (PCdoB-SP) prevê que ele somente poderá ser realizado com o consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou responsável legal.

Na participação em jogos, aplicações de internet ou outras atividades, por exemplo, os responsáveis por tratamento de dados não devem condicioná-la ao fornecimento de mais informações pessoais que as estritamente necessárias.

Direitos

O titular dos dados pessoais tem direito a obter do responsável várias informações ou procedimentos em relação aos seus dados:
– confirmação da existência de tratamento;
– acesso aos dados;
– correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados;
– anonimato, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários ou excessivos;
– portabilidade de seus dados pessoais a outro fornecedor de serviço ou produto;
– a informação das entidades públicas e privadas com as quais o responsável realizou uso compartilhado de dados;
– a informação da possibilidade de não fornecer o consentimento e sobre as consequências dessa negação;
– a revogação do consentimento; e
– entrar com petição contra responsável perante o órgão competente e os organismos de defesa do consumidor.

O responsável pelo tratamento de dados deverá informar de maneira imediata a outros com os quais tenha compartilhado esses dados sobre o pedido de correção, eliminação, transformação em anonimato ou bloqueio dos dados, para que repitam idêntico procedimento.

Penalidades

Os agentes de tratamento de dados estão sujeitos a penalidades que vão desde advertência a suspensão ou proibição de funcionamento, passando por multa e eliminação obrigatória de dados.

As multas serão simples ou diárias, de até 4% do faturamento da pessoa jurídica de direito privado, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, limitadas no total a R$ 50 milhões por infração.

Metodologia divulgada antecipadamente deverá prever gradação da multa por gravidade da infração.

A suspensão parcial ou total de funcionamento do banco de dados será por um máximo de seis meses, prorrogáveis por igual período até a regularização da atividade.

Órgão regulador

Como órgão regulador, o projeto cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, entidade integrante da administração pública federal indireta, submetida a regime autárquico especial e vinculada ao Ministério da Justiça.

O órgão terá um Conselho Diretor com três conselheiros e mandato de quatro anos. As decisões serão por maioria.

Entre as atribuições, destacam-se elaborar diretrizes para uma Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade; fiscalizar e aplicar sanções; promover entre a população o conhecimento das normas e das políticas públicas sobre proteção de dados pessoais e as medidas de segurança; promover ações de cooperação com autoridades de proteção de dados pessoais de outros países, de natureza internacional ou transacional; e realizar ou determinar a realização de auditorias.

A autoridade terá autonomia administrativa e financeira, com recursos vindos da execução da sua dívida ativa; dotações orçamentárias; cobrança de emolumentos por serviços prestados; e recursos provenientes de acordos, convênios ou contratos celebrados com entidades, organismos ou empresas, públicos ou privados, nacionais e internacionais.

Conselho

Também é criado o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, composto por 23 representantes titulares dos seguintes órgãos:
– seis representantes do Executivo federal;
– um representante indicado pelo Senado Federal;
– um representante indicado pela Câmara dos Deputados;
– um representante indicado pelo Conselho Nacional de Justiça;
– um representante indicado pelo Conselho Nacional do Ministério Público;
– um representante indicado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil;
– quatro representantes da sociedade civil com atuação comprovada em proteção de dados pessoais;
– quatro representantes de instituição científica, tecnológica e de inovação; e
– quatro representantes de entidade representativa do setor empresarial ligado à área de tratamento de dados pessoais.

Entre suas competências, podem ser citadas a proposição de diretrizes estratégicas; a elaboração de relatórios anuais de avaliação da execução das ações da Política Nacional de Proteção de Dados; a realização de estudos e debates sobre o tema; e a disseminação do conhecimento sobre o assunto entre a população em geral.

ÍNTEGRA DA PROPOSTA:

Fonte: Agência Câmara Notícias | 30/05/2018.

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TRF3 – Usucapião de Terreno de Marinha Ocupado. Inexistência de Enfiteuse

Impossibilidade de usucapião por ausência de demonstração do domínio útil de imóveis públicos, inexistindo prévia enfiteuse. Na ocupação inexistem vínculos jurídicos definitivos entre o ocupante e o bem ocupado, caracterizada pela precariedade, enquanto na enfiteuse o vínculo é seguro, constituindo um direito real imobiliário. Os terrenos de marinha, reconhecidos constitucionalmente como bens públicos (CF/88, art. 20, inciso VII), não podem ser adquiridos por usucapião, conforme preceitua o art. 183 da Constituição Federal.

TRF 3 – APELAÇÃO CÍVEL: 0012749-36.2009.4.03.6104/SP
LOCALIDADE: São Paulo DATA DE JULGAMENTO: 05/03/2018 DATA DJ: 13/03/2018
RELATOR: Maurício Kato
LEI: CF – Constituição da República – 1988 ART: 183
LEI: CF – Constituição da República – 1988 ART: 20 INC: VII
LEI: DL – – 9.760/46 ART: 2

PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. TERRENO DE MARINHA. BEM DA UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE. ENFITEUSE. NÃO COMPROVAÇÃO. REGIME DE OCUPAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Rejeitada a preliminar da União de inovação do pedido em sede de apelação. Verifica-se dos autos que o pedido contido na inicial se refere à declaração de usucapir o domínio útil do imóvel, e ainda que os autores tivessem pleiteado apenas em sede recursal, o pedido de usucapião do domínio pleno do imóvel engloba o útil.

2. São terrenos de marinha as faixas de terra com profundidade de 33 metros contados do início do mar para dentro do continente, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 9.760/46.

3. Restou comprovado nos autos que o imóvel em questão se encontra cadastrado em regime de ocupação junto à Secretaria do Patrimônio da União – SPU.

4. Na ocupação não existem vínculos jurídicos definitivos entre o ocupante e o bem ocupado, estando ela caracterizada pela precariedade, enquanto na enfiteuse o vínculo é seguro, constituindo um direito real imobiliário.

5. Impossibilidade de usucapião por ausência de demonstração do domínio útil de imóveis públicos, inexistindo prévia enfiteuse.

6. Os terrenos de marinha, reconhecidos constitucionalmente como bens públicos (CF/88, art. 20, inciso VII), não podem ser adquiridos por usucapião, conforme preceitua o art. 183 da Constituição Federal.

7. Apelação desprovida.

ÍNTEGRA

PODER JUDICIÁRIO – TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012749-36.2009.4.03.6104/SP

RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : FABIO FERREIRA DA SILVA e outro(a)
  : VANDA AQUINO DA SILVA
ADVOGADO : SP235918 SIDNEY AUGUSTO DA SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000001 MARLY MILOCA DA CAMARA GOUVEIA E AFONSO GRISI NETO e outro(a)
APELADO(A) : IRENE NERY DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SP226932 ESTER LÚCIA FURNO PETRAGLIA e outro(a)
APELADO(A) : CUSTODIO GOMES BANDEIRA e outros(as)
  : FRANCISCA DE SOUZA SILVEIRA
  : CABRAL NAPOLEAO NAM
ADVOGADO : SP269408 MARCELLA VIEIRA RAMOS e outro(a)
No. ORIG. : 00127493620094036104 4 Vr SANTOS/SP

PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. TERRENO DE MARINHA. BEM DA UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE. ENFITEUSE. NÃO COMPROVAÇÃO. REGIME DE OCUPAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Rejeitada a preliminar da União de inovação do pedido em sede de apelação. Verifica-se dos autos que o pedido contido na inicial se refere à declaração de usucapir o domínio útil do imóvel, e ainda que os autores tivessem pleiteado apenas em sede recursal, o pedido de usucapião do domínio pleno do imóvel engloba o útil.

2. São terrenos de marinha as faixas de terra com profundidade de 33 metros contados do início do mar para dentro do continente, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 9.760/46.

3. Restou comprovado nos autos que o imóvel em questão se encontra cadastrado em regime de ocupação junto à Secretaria do Patrimônio da União – SPU.

4. Na ocupação não existem vínculos jurídicos definitivos entre o ocupante e o bem ocupado, estando ela caracterizada pela precariedade, enquanto na enfiteuse o vínculo é seguro, constituindo um direito real imobiliário.

5. Impossibilidade de usucapião por ausência de demonstração do domínio útil de imóveis públicos, inexistindo prévia enfiteuse.

6. Os terrenos de marinha, reconhecidos constitucionalmente como bens públicos (CF/88, art. 20, inciso VII), não podem ser adquiridos por usucapião, conforme preceitua o art. 183 da Constituição Federal.

7. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação dos autores, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 05 de março de 2018.

MAURICIO KATO
Desembargador Federal

[v. AC 0012749-36.2009.4.03.6104]

Fonte: iRegistradores – TRF3 | 01/06/2018.

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Registro de Imóveis e SINTER: a necessária interconexão entre registro e cadastro

Cerca de cem pessoas participaram da II Jornada Registral sobre Usucapião e Regularização Fundiária Urbana, realizada nos dias 18 e 19 de maio de 2018, em Balneário Camboriú, com apoio do Colégio Registral Imobiliário de Santa Catarina.

O diretor de Tecnologia da Informação do IRIB, Flauzilino Araújo dos Santos (1º RI, São Paulo, SP), apresentou o tema de maior impacto para a classe em todo o Brasil neste momento de implantação do registro eletrônico. De forma simples e didática esclareceu o que está por trás das siglas hoje estreitamente associadas ao futuro da atividade: SINTER (Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais), SREI (Sistema de Registro de Imóveis eletrônico) e ONR (Operador Nacional do Registro de imóveis eletrônico). Publicamos, a seguir, um extrato das principais ideias expostas na palestra.

Confira a íntegra da palestra proferida. SJ.

Registro de Imóveis e SINTER: a necessária interconexão entre registro e cadastro

O SINTER é um projeto de importante dimensão para nosso País, como instrumento de gestão e de orientação de políticas públicas e, dentro de sua especificação, as informações do Registro de Imóveis são fundamentais para a composição de sua base cadastral.

Algumas premissas dessa abordagem:

  1. A necessidade de integração entre registro e cadastro físico é um problema que precisa ser resolvido. O SINTER é o veículo para concretizar essa integração;
  2. A conexão entre o SREI e o SINTER propiciará benefícios recíprocos;
  3. Os registros de segurança jurídica não se desnaturalizam com a conjugação de informações nos cadastros físicos;
  4. É preciso extremar conceitos e finalidades próprias do registro e do cadastro, que promiscuamente rendem interpretações equívocas. Na realidade, registro e cadastro embora se completem, não se misturam; cada um deles tem sua própria órbita;
  5. Por definição legal e por força dos princípios que informam o sistema de registro de imóveis brasileiro – princípios da fé pública, da inscrição, da segurança jurídica, dentre outros – é privativo do oficial de registro de imóveis expedir certidões e informações sobre situações inerentes aos assentos registrais – titularidade de domínio e direitos conexos. O SINTER não pode usurpar essa atividade.
  6. Ao contrário do Direito Civil em que o agente pode fazer tudo o que a lei não proíbe, em Direito Administrativo, ao agente só lhe é dado fazer o que a lei o autoriza (Princípio da legalidade estrita).

O SINTER nasceu tendo por base o Decreto nº 8.764, de 10/5/2016, que instituiu o Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (SINTER) e procurou regulamentar o disposto no art. 41 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, que é o “registro eletrônico”.

Decreto 8.764/2016 previa em seu art. 5º, in verbis:

Art. 5º Os serviços de registros públicos disponibilizarão à administração pública federal, sem ônus, documentos natodigitais estruturados que identifiquem a situação jurídica do imóvel, do título ou do documento registrado, na forma estabelecida pelo Manual Operacional.

Essa inadequação congênita no Decreto nº 8.764/2016, que o submergia no pântano da ilegalidade, foi percuciente e sabiamente solucionada no PLV de conversão da MPV 759/2016 na Lei nº 13.465, de 2017, por proposta da Secretaria da Receita Federal, apresentada perante a Comissão Mista do Congresso Nacional que examinou referida MPV. A proposta da SRF deu origem ao parágrafo 7º, restando assim disposto:

Art. 76 da Lei nº 13.465/2017

Art. 76. O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) será implementado e operado, em âmbito nacional, pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR).

7º. A administração pública federal acessará as informações do SREI por meio do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), na forma de regulamento.

Por regras de hermenêutica e de exegese nem é necessário que se diga que o parágrafo (§ 7º) está subordinado ao caput (Art. 76), cujo efeito foi a ab-rogação das disposições do Decreto nº 8.764/2016, ditas inadequadas, relativamente:

[1º] ao armazenamento dos dados registrais de todas as matrículas de todas as unidades de Registro de Imóveis do País, o que faria exsurgir um cartório nacional com dados eletronicamente estruturados, sob a gestão da SRF; e,

[2º] a prestação de informações registrais diretamente pelo SINTER para os entes elencados no § 1º, do art. 3º, do Decreto 8.764/2016 e, também, para o Poder Judiciário e o Ministério Público (Art. 3º, § 2º).

Conclusões preliminares

  1. O deslocamento da Publicidade Registral do ambiente do Registro de Imóveis para o ambiente do SINTER configurava absoluta afronta ao sistema constitucional previsto no art. 236, regulamentado pela Lei nº 8.935/1994.

1.1. Essa ilegalidade foi prontamente corrigida na Lei nº 13.465/2017 (§ 7º do art. 76), no entanto, a alteração não foi observada pelo Comitê Temático na elaboração do Manual Operacional apresentado ao CNJ (Proc. 0005650- 96.2016.2.00.0000), porque se ateve apenas aos termos do Decreto nº 8.764, de 2016.

  1. O SREI será acessado pelo SINTER via infraestrutura do Operador Nacional do Registro de imóveis Eletrônico (ONR), a ser regulamentado e fiscalizado pela Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ.

Da guarda e conservação dos dados registrais

É preciso sublinhar que os dados registrais, constantes de livros, documentos, papeis, títulos, mantidos em meios tradicionais ou eletrônicos (art. 16 c.c. art. 25 da Lei 6.015/1973), devem ficar sob a guarda, conservação, custódia e responsabilidade de registradores públicos (art. 24 da Lei 6.015/1973 e inc. I do art. 30 c.c. art. 46 da Lei 8.935/1994).

Outros diplomas relacionados com o SINTER

  1. Decreto Nº 8.777, de 11/5/2016, que institui a Política de Dados Abertos do Poder Executivo federal;
  2. Decreto Nº 8.789, de 29/6/2016, que dispõe sobre o compartilhamento de bases de dados na administração pública federal;
  3. Portaria nº 457, de 8/12/2016 (DOU de 9/12/2016, p. 102), que dispõe sobre a disponibilização de acesso, para terceiros, pelo Serviço Federal de Processamento de Dados (SERPRO), a dados e informações que hospeda, para fins de complementação de políticas públicas.

DECRETO Nº 8.777, DE 11 DE MAIO DE 2016.

Institui a Política de Dados Abertos do Poder Executivo federal.

CAPÍTULO II

DA LIVRE UTILIZAÇÃO DE BASES DE DADOS

Art. 4º Os dados disponibilizados pelo Poder Executivo federal, bem como qualquer informação de transparência ativa, são de livre utilização pelo Governo federal e pela sociedade.

Parágrafo único. Na divulgação de dados protegidos por direitos autorais pertencentes a terceiros, fica o Poder Executivo federal obrigado a indicar o seu detentor e as condições de utilização por ele autorizadas.

DECRETO Nº 8.789, DE 29 DE JUNHO DE 2016

Dispõe sobre o compartilhamento de bases de dados na administração pública federal.

Art. 3º …

2º A Secretaria da Receita Federal do Brasil disponibilizará, na forma por ela disciplinada, aos órgãos interessados, os seguintes dados não protegidos por sigilo fiscal conforme o disposto neste Decreto:

I – informações constantes da Declaração de Operações Imobiliárias – DOI, relativas à existência do bem imóvel, localização do ato registral, número e situação de CPF e CNPJ das partes;

O decaimento dos dados encaminhados para a SRF para a categoria de “dados cadastrais” representa um risco de vulneração da privacidade e de desnaturação do próprio sistema registral de tutela pública de interesses privados.

Os dados que originariamente ostentavam o caráter registral, mesmo quando compunham a DOI-RF, e que supúnhamos protegidos pelo manto do sigilo, agora se converteram em meros “dados cadastrais” (inc. I do § 2º do art. 3º do Dec. 8.789/2016) passíveis de utilização extra registral [1].

Podem esses dados ser vendidos?

A Portaria do Ministério da Fazenda nº 457, de 8/12/2016 (DOU de 9/12, p. 102), dispõe sobre a disponibilização de acesso, para terceiros, pelo Serviço Federal de Processamento de Dados, a dados e informações que hospeda, para fins de complementação de políticas públicas [2].

Fato digno de nota é que o SERPRO poderá ser “remunerado diretamente pelos terceiros, usuários de solução de disponibilização de dados e/ou informações, de modo a ressarcir os valores necessários à sustentabilidade dos sistemas informatizados envolvidos”:

Art. 3º. O Serpro será remunerado diretamente pelos terceiros, usuários da solução de disponibilização de dados e/ou informações, de modo a ressarcir os valores necessários à sustentabilidade dos sistemas informatizados envolvidos.

1ª Conclusão

Doutrinariamente, não se pode separar, radicalmente, desde o terreno dos princípios registrais, a publicidade material da publicidade formal. Elas são indissociáveis e interdependentes.

A inadequação do Decreto 8.764/2016, que previa o deslocamento das bases de dados dos cartórios de registros de imóveis para compor uma réplica de todos os cartórios (o cartório dos cartórios), em ambiente extrarregistral, estranho ao controle do oficial de registro, foi solucionada pela Lei nº 13.465, de 2017, ao dispor:

Art. 76. O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) será implementado e operado, em âmbito nacional, pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR).

7º. A administração pública federal acessará as informações do SREI por meio do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), na forma de regulamento.

2ª Conclusão

A formação de uma base de dados no SINTER paralela à do Cartório de Registro de Imóveis é contrária à cultura registral.

Aqui temos que fazer a distinção entre Publicidade Direta e Publicidade Indireta, observando que a publicidade direta, antes prevista no art. 19, do Decreto nº 4.857/39, não foi acolhida pela Lei nº 6.015/73 (art. 16). A Lei de Registros Públicos segue o sistema da Publicidade Indireta, via certidões e informações, que não se confunde com o acesso direto aos arquivos registrais, por qualquer meio, físico ou eletrônico (telemático).

Cabe aos registradores dar um tratamento profissional para a publicidade formal e isso exclui a apresentação para terceiros dos dados carentes de transcendência jurídica, e implica que a publicidade formal se expresse a partir de sua base única e primária com clareza e simplicidade, sem prejuízo do valor jurídico da informação, prestada na forma da lei.

3ª Conclusão

A formação de uma base de dados no SINTER paralela à do Cartório de Registro de Imóveis é contrária a todas as disposições legais regulatórias.

Os artigos 22/26 da Lei 6.015, de 1973 dizem que os oficiais são os guardiões dos livros de registro; que são responsáveis pela vigilância, custódia e guarda; que respondem pela sua ordem e por sua conservação; e que os livros, papéis, dados e imagens devem permanecer indefinidamente na serventia.

Lei 8.935, de 1994:

Art. 46. Os livros, fichas, documentos, papéis, microfilmes e sistemas de computação deverão permanecer sempre sob a guarda e responsabilidade do titular de serviço notarial ou de registro, que zelará por sua ordem, segurança e conservação.

Lei 11.977, de 2009:

Art. 41. A partir da implementação do sistema de registro eletrônico de que trata o art. 37, os serviços de registros públicos disponibilizarão ao Poder Judiciário e ao Poder Executivo federal, por meio eletrônico e sem ônus, o acesso às informações constantes de seus bancos de dados, conforme regulamento.

Decompondo o articulado no Art. 41, da Lei 11.977/2009:

I – A disponibilização será feita a partir da implementação do Registro Eletrônico, e não antes. Então, a preexistência do Registro Eletrônico em funcionamento, perfeitamente estruturado, é um pré-requisito para disponibilização ao Poder Judiciário e ao Poder Executivo Federal.

II – Que os registros públicos disponibilizarão ao Poder Judiciário e ao Poder Executivo federal o acesso a informações constantes de seus bancos de dados. Disponibilizar o acesso a um banco de dados é completamente diferente de entregar uma réplica completa desse banco de dados para compor um espelho em ambiente estranho ao Registro.

III – Que essa disponibilização sem ônus será apenas para o Poder Judiciário e o Poder Executivo Federal. Evidentemente, outros usuários estarão sujeitos ao pagamento de custas e emolumentos, na forma da lei.

Por sua vez, o decreto que criou o SINTER previa (porque ab-rogado) em seu artigo 3º que outras entidades poderiam acessá-lo, inclusive, usuários que normalmente estão sujeitos ao pagamento dos emolumentos, in verbis:

Art. 3º O acesso pelos usuários às informações armazenadas no Sinter deverá ser efetuado observando o limite de suas competências, do sigilo fiscal e das demais hipóteses legais de sigilo e de restrição ao acesso a informações.

1º Serão usuários do Sinter:

I – a Secretaria da Receita Federal do Brasil;

II – os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta;

III – os serviços de registros públicos e os serviços notariais; e

IV – as administrações tributárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante convênio celebrado com a Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Em confronto com essa disposição dispõe o art. 41, da Lei 11.977/2009:

Art. 41.  A partir da implementação do sistema de registro eletrônico de que trata o art. 37, os serviços de registros públicos disponibilizarão ao Poder Judiciário e ao Poder Executivo federal, por meio eletrônico e sem ônus, o acesso às informações constantes de seus bancos de dados, conforme regulamento.

Aqui o legislador se referiu explicitamente ao “acesso às informações constantes de seus bancos de dados”. O pronome “seus” aponta de maneira inequívoca para a sede substantiva dos dados (publicidade material). Os dados não se deslocam; os dados permanecem “seus”, ou seja, sob a custódia, a guarda e a responsabilidade do Oficial de Registro.

É princípio basilar de hermenêutica jurídica segundo o qual a lei não contém palavras inúteis: verba cum effectu sunt accipienda. Ou seja, as palavras devem ser compreendidas como tendo alguma eficácia. Não se presumem, na lei, palavras inúteis[3].

Então, só é adequada a interpretação que encontrar um significado útil e efetivo para cada expressão contida na norma. E aqui a palavra é “acesso às informações constantes de seus bancos de dados”.

Aliás, podemos ver aqui o direito do cidadão a que seus dados de caráter pessoal e patrimonial – dados que pertencem à área de sua privacidade – fiquem sob a tutela do Oficial do Registro de Imóveis, que zelará por sua ordem, integridade, incolumidade, segurança e conservação, nos termos da lei.

4ª Conclusão

O deslocamento dos dados do Registro de Imóveis para o SINTER está na contramão da tecnologia.

A tecnologia atual é o Google. Não há necessidade de formação de base de dados paralela. De conformidade com os fundamentos da comunicação eletrônica, os dados devem permanecer armazenados em sua fonte primária, onde as informações estão protegidas e são atualizadas em tempo real e, de onde são também acessadas com a devida segurança lógica.

O que é necessário, de um lado, é que haja um mecanismo de pesquisa eficaz na base de dados, com ferramentas inteligentes; e, do outro lado, que esses dados gozem de confiabilidade, integridade, alta disponibilidade e que sejam acessíveis na forma da lei.

Não se ignora que com o advento das novas tecnologias de Big Data, as organizações, e também os Oficiais de Registro de Imóveis, estão sendo desafiados a levar ainda mais em consideração o acesso aos seus dados e determinar a melhor abordagem para um desempenho ótimo.

Nesse cenário, os dados, mesmo sendo analisados pelas novas tecnologias de Big Data, ficam na origem dos dados – em suas bases primárias – e somente os resultados são trazidos como visualizações para análise futura.

Por essas razões parece lógico que o Manual Operacional do SINTER:

  1. seja retirado da pauta do plenário do CNJ e
  1. retorne para a Comissão Temática a fim de que sejam feitas as devidas adequações na forma da Lei nº 13.465, de 2017[4].

NOTAS DO EDITOR

[1] Vide JACOMINO. Sérgio. O Sinter e os irmãos siameses da gestão territorial. Decretos Federais 8.764 e 8.777 de 2016 em debate. In RDI 81, jul./dez. 2016. Acesso: http://bit.ly/sinter-rdi. Vide do mesmo autor: Meus dados registrais – meu cadastro estatal in Observatório do Registro. Acesso: http://bit.ly/sinter-obs.

[2] Não se desconhece a Portaria Interministerial 553, de 18/12/2017, que estabelece “diretrizes e políticas gerais a serem observadas na administração do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais”. Acesso: http://bit.ly/sinter-portaria. Aparentemente o enxoval normativo não tem sido suficiente para agasalhar a privacidade do cidadão e proteger os dados registrais. A Portaria 457/2016 terá sido expressamente revogada. Seja como for, prevalece sempre o decreto, como norma hierarquicamente superior. Após a realização do evento, o jornal O Globo, pelo Portal G1, publicou matéria que revela  suposto esquema de venda de dados pessoais de brasileiros pelo Serpro. Vide: http://bit.ly/serpro-globo. [mirror].

[3]  MAXIMILIANO. Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 8ª. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965, p. 262.

[4] O IRIB requereu a retirada de pauta do plenário do pedido de providências em curso no CNJ suscita ainda questão de ordem para que, “observado o art. 76 da Lei 13.465/2017, seja suspensa a tramitação do presente pedido de providências até que sobrevenha a regulação do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR), ou caso assim não se entenda, que sejam excluídos do Manual Operacional do Sinter os regramentos afetos aos registros de imóveis, uma vez que a lei atribui esta especialidade registral ao Sistema Eletrônico de Registro de Imóveis (SREI), que será operado pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, a ser regulamentado e fiscalizado por essa Corregedoria Nacional de Justiça”. O pleito foi atendido e a apreciação do pleito foi adiada. V. http://bit.ly/sinter-cnj.

Fonte: Observatório do Registro | 01/06/2018.

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