CSM/SP: Registro de Imóveis – Desapropriação parcial de área rural – Aquisição originária da propriedade – Rodovia em área rural – Cabimento do georreferenciamento em cumprimento à Lei de Registros Públicos (artigos 176, § 1º, 3 “a”, 176, §§ 3º e 6º e 225, § 3º) e ao princípio da especialidade objetiva – Cabimento do registro no CAR – Recurso não provido.


  
 

Apelação Cível nº 1002546-11.2017.8.26.0553

Apelante: Concessionaria Auto Raposo Tavares S/A – Cart

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santo Anastácio

VOTO Nº 37.728

Registro de Imóveis – Desapropriação parcial de área rural – Aquisição originária da propriedade – Rodovia em área rural – Cabimento do georreferenciamento em cumprimento à Lei de Registros Públicos (artigos 176, § 1º, 3 “a”, 176, §§ 3º e 6º e 225, § 3º) e ao princípio da especialidade objetiva – Cabimento do registro no CAR – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença de fls. 211/217, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santo Anastácio e manteve a recusa do ingresso de carta de sentença em razão da ausência de georreferenciamento e cadastro ambiental rural da área desapropriada.

Sustenta a apelante cuidar-se de desapropriação de imóvel para fins de trecho de rodovia não cabendo as exigências efetuadas e sim o registro da carta de sentença. Informou que apresentou o memorial com descrição georreferenciada (fls. 201), sendo desnecessária a certificação do INCRA por se tratar de forma originária de aquisição de propriedade (fls. 227/233).

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 260/263).

É o relatório.

Não há divergência entre o Oficial de Registro de Imóveis e a apelante sobre o fato da aquisição da propriedade imóvel por meio de desapropriação encerrar forma originária de aquisição do domínio.

Sobre isso também não há divergência nos precedentes deste Col. Conselho Superior da Magistratura, como se verifica no voto do e. Desembargador José Renato Nalini, então Corregedor Geral da Justiça, no julgamento da apelação nº 0001026-61.2011.8.26.0062, em 17/01/2013.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça também tem essa compreensão:

“PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. DESAPROPRIAÇÃO. AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DE PROPRIEDADE. EXIGIBILIDADE DE TRIBUTOS ANTERIORES À AO ATO DESAPROPRIATÓRIO. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO ENTE EXPROPRIANTE. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. No caso em tela o recorrente exige do ente expropriante, em execução fiscal, os tributos (IPTU e Taxa de Limpeza Pública de Coleta de Resíduos Sólidos) incidentes sobre o imóvel desapropriado, derivados de fatos geradores ocorridos anteriormente ao ato expropriatório. 2. Considerando o período de ocorrência do fato gerador de tais tributos, e, levando-se em consideração que a desapropriação é ato de aquisição originária de propriedade, não há a transferência de responsabilidade tributária prevista no artigo 130 do CTN ao ente expropriante. 3. Recurso especial não provido” (REsp 1668058/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/06/2017, DJe 14/06/2017).

Contudo, a natureza originária da aquisição pela desapropriação não descaracteriza a submissão dessa situação jurídica à hipótese de desmembramento de imóvel rural, porquanto a área desapropriada foi destacada de imóvel rural com área maior, objeto da matrícula nº 2.307 do Registro de Imóveis da Comarca de Santo Anastácio (fls. 104/112).

O artigo 176, parágrafo 3º, da Lei nº 6.015/73, dispõe:

“§ 3o Nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, a identificação prevista na alínea a do item 3 do inciso II do § 1º será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georeferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais”.

Na mesma linha, o artigo 225, parágrafo 3º, da Lei nº 6.015/73, prescreve:

“§ 3° Nos autos judiciais que versem sobre imóveis rurais, a localização, os limites e as confrontações serão obtidos a partir de memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica –  ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais”.

A interpretação teleológica das referidas disposições normativas permite a compreensão de sua incidência no caso da desapropriação de parcela de imóvel rural, notadamente pela repercussão no imóvel objeto da desapropriação parcial no aspecto da especialidade objetiva.

Por sua vez, o § 6º do art. 176, da Lei nº 6.015/73 não dispensa a certificação do INCRA em relação à descrição georreferenciada das áreas públicas, e essa certificação é necessária para evitar que a descrição georreferenciada do imóvel rural que foi desfalcado pela desapropriação não se sobreponha, no cadastro do INCRA, à da área que se tornou de propriedade da apelante.

A sentença judicial em ação de desapropriação não está isenta da incidência das demais determinações legais para o ingresso do título no registro imobiliário.

Desse modo, é necessário o georreferenciamento para o ingresso do título judicial atinente à desapropriação parcial de imóvel para implantação de rodovia, com certificação pelo INCRA relativa ao georreferenciamento.

Em razão da transmissão da propriedade por meio de desapropriação, da interpretação teleológica efetuada, bem como o destaque de área menor, a necessidade do georreferenciamento apenas incide para a área desapropriada, sem necessidade de sua efetivação para fins de apuração do remanescente da matrícula da qual será destacada, o que, aliás, foi observado na exigência formulada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis.

O espaço físico objeto do registro é parte de rodovia, portanto é área de utilidade pública nos termos do artigo 3º, inciso VIII, alínea “b”, da Lei nº 12. 651/12.

O artigo 12, parágrafo 8º, da Lei nº 12.651/12, prescreve:

“Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:

(…)

§ 8° Não será exigido Reserva Legal relativa às áreas adquiridas ou desapropriadas com o objetivo de implantação e ampliação de capacidade de rodovias e ferrovias”.

De outra parte, o artigo 29, caput, da Lei nº 12.651/12 estabelece:

“Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural – CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento”.

Diante disso, em virtude da área desapropriada encerrar imóvel rural para fins de registro imobiliário, compete exigir o Cadastro Ambiental Rural, no que pese a não exigência da Reserva Legal, pois, o CAR tem por “finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento”.

Por todo o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJe/SP de 03.07.2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.