Número do processo: 1041586-80.2022.8.26.0114
Ano do processo: 2022
Número do parecer: 563
Ano do parecer: 2023
Parecer
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 1041586-80.2022.8.26.0114
(563/2023-E)
Registro de imóveis – Pedido de providências – Recurso administrativo – Requerimento de averbação de óbito – Desnecessidade de prova de partilha – Existência, entretanto, de demonstração de que os bens em questão não são aquestos – Observância, ademais, do limite da rogação registral – Parecer pelo provimento do recurso, para permitir os averbamentos requeridos.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
O 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, a requerimento de Mizue Morita (fls. 35), suscitou pedido de providências (fls. 01/07) em que reporta o seguinte: foi-lhe solicitada a averbação do óbito de Ary Gonsales (fls. 08) nas matrículas n. 102.186 e n. 102.252, de seu cartório (fls. 19/22 e 23/26); no entanto, a requerente Mizue Morita e o mencionado falecido eram casados (fls. 57) na separação obrigatória de bens (separação legal), e os imóveis foram comprados na constância do casamento; desse modo, por força da Súmula n. 377, do Supremo Tribunal Federal, era necessário fazer a partilha desses bens, ou apresentar requerimento de averbação, com a declaração de que a partilha seria feita posteriormente; a demonstração da existência ou não de esforço comum teria de ser feita ou mediante a partilha, ou em inventário negativo, ou ainda por escritura pública que houvesse retificado o instrumento notarial das aquisições, de maneira que – ao contrário do que pretendeu a requerente – nada disso poderia ser suprido por mero instrumento particular de rerratificação de promessa de compra e venda, firmado antes da própria escritura pública das aquisições, a qual, de resto, não foi trazida pela requerente para provar erro na transposição do título; assim, tudo somado, e considerando que a retificação de escritura pública de compra e venda, depois do registro stricto sensu, só pode ser retificada mediante nova escritura pública, com a participação de todos os figurantes originais, ou mediante decisão judicial, não foi possível atender ao pedido de averbamento deduzido pela interessada, a qual, entretanto, por não se conformar a isso, solicitou o início deste pedido de providências.
Por r. sentença (fls. 183/186), a MM.ª Juíza de Direito da 1ª Vara Cível de Campinas, Corregedora Permanente, decidiu que o óbice levantado era justo, e que o pedido de providências era procedente. Segundo o decisum, para o averbamento visado pela interessada era necessário proceder à retificação do título aquisitivo (a compra e venda, mediante escritura pública), uma vez que não ocorreu nenhum erro extrínseco imputável ao cartório de registro de imóveis; todavia, considerado o falecimento do adquirente Ary Gonsales, essa retificação é impossível, e desse modo a averbação do óbito depende de partilha, uma vez que os bens em questão foram adquiridos na constância do casamento, em regime da separação legal, o que faz valer a presunção decorrente da Súmula n. 377 do Supremo Tribunal Federal.
Da r. sentença recorreu a interessada Mizue Morita (fls. 193/205), pedindo a reforma do julgado e sustentando que é a única compradora e dona de ambos os imóveis; o seu marido Ary faleceu em 2019, e a relativa partilha realizou-se sem a inclusão desses bens, que não lhe pertenciam, já que ambos tinham sido casados no regime da separação obrigatória (separação legal); ademais, segundo o vigente entendimento do Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 1.623.858-MG, j. 23.5.2018), a comunicação decorrente da Súmula n. 377 depende de prova de esforço comum, o que não existe no caso; assim, falta amparo legal à exigência da nota devolutiva, e a r. sentença, como requerido, tem de ser reformada.
A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 224/225).
É o relatório.
Opina-se.
De meritis, o recurso administrativo tem de ser provido, em que pese aos termos da bem lançada r. sentença: com efeito, haja ou não incidência da Súmula n. 377 do Supremo Tribunal Federal, está demonstrado que os bens em questão não são aquestos, pois, como se conclui pelo inventário e partilha dos bens do falecido marido da recorrente, ficou expressamente declarado, assim pela viúva (ora interessada) como pelos herdeiros (cf. fls. 102, 103 e 104, especificamente), que os imóveis em questão não tinham sido adquiridos pelo finado.
Ademais, ainda que assim não fosse, fato é que a atuação do Oficial de Registro de Imóveis tinha de pautar-se pela rogação como foi feita, uma vez que não lhe tocava agir de ofício, extrapolando o que fora solicitado (Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 13). Como já teve a oportunidade de decidir esta Corregedoria Geral da Justiça nos autos do Recurso Administrativo n. 1114357-06.2019.8.26.0100, julgado em 4 de novembro de 2021 pelo então Corregedor Geral da Justiça Des. Ricardo Mair Anafe (referência do parecer):
“Esse requerimento delimitou o ato pretendido pelo recorrente uma vez que, ressalvadas as hipóteses em que houver previsão legal ou normativa, não compete ao registrador agir de ofício, dependendo a sua atuação da rogação pelo interessado como previsto no art. 13 da Lei nº 6.015/1973:
‘Art. 13. Salvo as anotações e as averbações obrigatórias, os atos do registro serão praticados:
I – por ordem judicial;
II – a requerimento verbal ou escrito dos interessados;
III – a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar.
§ 1º O reconhecimento de firma nas comunicações ao registro civil pode ser exigido pelo respectivo oficial’.
Ainda nesse sentido: ‘A ação do registrador deve ser solicitada pela parte ou pela autoridade. É o que no Direito alemão se costuma chamar de princípio da instância, expressão adequada também no Direito brasileiro, por traduzir bem a necessidade de postulação do registro. Sem solicitação ou instância da parte ou da autoridade o registro não pratica os atos do seu ofício’ (Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 269).
Por sua vez, a averbação do divórcio é prevista no art. 167, inciso II, nºs 5 e 14 e não depende da concomitante apresentação, ou averbação, da carta de sentença extraída de ação judicial ou da escritura pública de separação, divórcio ou dissolução de união estável, para comprovar se foi, ou não, realizada a partilha de bens.
Em razão disso, para a averbação solicitada pelo recorrente bastava a apresentação da certidão de casamento com a anotação do divórcio.”
Portanto, apresentada a certidão de óbito, e limitando-se à rogação ao averbamento (fls. 08/09), não havia outro óbice que opor ao pedido da interessada, cujo recurso deve ser provido para que nas matrículas n. 102.186 e n. 102.252 se faça como pedido (= averbar o óbito de Ary Gonsales).
Do exposto, o parecer que respeitosamente se apresenta ao atilado critério de Vossa Excelência é pelo provimento do recurso administrativo.
Sub censura.
São Paulo, 12 de dezembro de 2023.
Josué Modesto Passos
Juiz Assessor da Corregedoria Geral da Justiça
DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor desta Corregedoria Geral da Justiça e, por seus fundamentos, ora adotados, dou provimento ao recurso, para permitir as averbações, como rogadas. São Paulo, 13 de dezembro de 2023. (a) FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA, Corregedor Geral da Justiça. ADV: FRANCISCO LUIZ MACCIRE JUNIOR, OAB/SP 135.094.
Diário da Justiça Eletrônico de 15.12.2023
Decisão reproduzida na página 186 do Classificador II – 2023
Fonte: INR Publicações
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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