TJSC: Filha só descoberta após 30 anos não pode reclamar de abandono afetivo

A 1ª Câmara de Direito Civil do TJ confirmou decisão que negou indenização por danos morais pleiteada por uma mulher de 30 anos, sob a alegação de abandono afetivo paterno. Em seu recurso, a filha buscava também a condenação do pai por litigância de má fé, ao acusá-lo de protelar o trâmite processual e insistir na negativa de paternidade. Seus argumentos não convenceram os integrantes da câmara.

O relator do recurso, desembargador Raulino Jacó Brüning, lembrou que não ficou provado que o apelado soubesse ser pai da recorrente antes da sentença. Acrescentou que a paternidade só foi reconhecida, através da respectiva investigação, quando a moça já contava 30 anos de idade.

Embora o abandono afetivo dos pais em relação aos filhos ocorra quando os genitores se omitem no tocante a deveres de educação, afeto, atenção, cuidado e desvelo, essenciais ao sadio desenvolvimento da criança e do adolescente, o caso analisado apresentou outros contornos.

"No caso em apreço, é possível observar a existência da omissão do genitor, do nexo causal e do dano, porém, não se vislumbra culpa na sua conduta", anotou Raulino. Os desembargadores entenderam que se trata de pai que desconhecia o fato de ter um filho. "Neste contexto, não há o que se falar em indenização, até mesmo porque não houve ruptura do vínculo afetivo, o qual nunca se concretizou", arrematou o relator.

A acusação de má fé também foi rejeitada e interpretada como o legítimo direito da parte exercer sua defesa em contraponto aos posicionamentos jurídicos apresentados pela autora. Conforme os autos, quando o réu contestou o pedido de indenização da autora, o direito dela  não estava reconhecido, porquanto a ação de investigação de paternidade ainda não havia sido julgada. A  decisão foi unânime.

Fonte: TJSC | 24/07/2013.

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Abandono afetivo inverso pode gerar indenização

Especialista diz que a falta do cuidar, por parte dos filhos,  é premissa para indenização

“Amar é faculdade, cuidar é dever”.  A ministra Fátima Nancy Andrighi, da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgado de 2012,  afirma, desta forma, ser possível exigir indenização por dano moral decorrente de abandono afetivo pelos pais.  A pena  foi de  R$ 200 mil, imposta  ao pai por abandonar a filha material e afetivamente durante a sua infância e adolescência. Apesar de ser tema polêmico, desde  esse julgamento ficou estabelecido  o entendimento, na jurisprudência,  de que cabe pena civil em razão do abandono afetivo. 

Contudo, questiona-se: e o abandono afetivo inverso? E se os males advindos da falta de amor, cuidado e atenção vitimizam os pais?  Diz-se abandono afetivo inverso, segundo o desembargador Jones Figueirêdo Alves (PE), diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), “a inação de afeto ou, mais precisamente, a não permanência do cuidar, dos filhos para com os genitores, de regra idosos”. Segundo o diretor,  esta falta do cuidar serve de premissa de base para a indenização.

O amor é uma celebração permanente de vida, reflete o desembargador, e, como tal, “realidade espontânea e vivenciada do espírito; todavia o abandono moral e material, como instrumento de desconstrução de vida pode ser mensurado em níveis de quantificação indenizatória”. Os  parâmetros “são os circunstanciais de vida dos próprios atores envolvidos, sinalizando uma reparação civil adequada e necessária”, complementa.

Na China, desde o último dia 1 de julho, vigora lei que obriga os filhos a visitarem os pais idosos, prevê multa e até prisão. E no Brasil? Qual o preço do abandono afetivo inverso? Existe Lei que regulamente a matéria? Confira na entrevista:

IBDFAM – O que é abandono afetivo inverso?

JF – Diz-se abandono afetivo inverso a inação de afeto, ou mais precisamente, a não permanência do cuidar, dos filhos para com os genitores, de regra idosos, quando o cuidado tem o seu valor jurídico imaterial servindo de base fundante para o estabelecimento da solidariedade familiar e da segurança afetiva da família.

O vocábulo “inverso” da expressão do abandono corresponde a uma equação às avessas do binômio da relação paterno-filial, dado que ao dever de cuidado repercussivo da paternidade responsável, coincide valor jurídico idêntico atribuído aos deveres filiais, extraídos estes deveres do preceito constitucional do artigo 229 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual “…os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência e enfermidade”. 

Aliás, o princípio da solidariedade, “marco paradigmático que caracteriza a transformação do Estado liberal e individualista em Estado democrático e social” (Paulo Luiz Netto Lobo, 2007), tem servido como questão de direito de fundo na diretiva de sua aplicação nas relações familiares, nomeadamente quando perante os mais vulneráveis (crianças, adolescentes, idosos, carentes alimentares, etc.).

Assim, não há negar que, axiologicamente, o abandono constitui um desvio desconcertante do valor jurídico estabilidade familiar, recebendo aquele uma modelagem jurídica e jurisdicional capaz, agora, de defini-lo para os fins de responsabilização civil. O abandono afetivo afeta, sensivelmente, o perfil da família, cuja unidade é a representação melhor do sistema.

Efetivamente, recentes decisões judiciais cuidam de inibir, impedir ou punir a “negligência intolerável” como conduta inaceitável à luz do ordenamento jurídico. A mais significativa delas, resultou da 3ª Turma do STJ, que obrigou um pai a indenizar o filho, na quantia de R$ 200 mil, por abandono moral. A relatora ministra Fátima Nancy Andrighi acentuou que "amar é faculdade, cuidar é dever".

IBDFAM – No primeiro semestre de 2013, a Secretaria Especial do Idoso do Distrito Federal registrou 60 denúncias de violência contra a pessoa idosa, sendo abandono – 20 casos (33%). Como o senhor avalia esse número?

JF – No Dia Mundial de Combate à Violência Contra a Pessoa Idosa, instituído desde 2007 pela ONU e celebrado em 15 de junho passado, foram revelados novos dados significativos da violência ocorrente. Na composição dos dados, o abandono afetivo inverso se constitui, de fato, como a violência mais gravosa. 

Mais do que a violência física ou financeira, a negligência pelo abandono impõe ao idoso uma negação de vida, quando lhe é subtraída a oportunidade de viver com qualidade. Pior ainda é que as maiores violências contra os idosos assumem o território próprio da família, nela acontecendo as mais severas agressões. 

Sabido e consabido que dos 22,3 milhões de idosos, atualmente no país, apenas 2,7 milhões com mais de 60 anos, moram sozinhos (1,8 milhão de mulheres e 938 mil homens) enquanto que na composição familiar 15,5 milhões daqueles ainda chefiam suas famílias, a geração de idosos sob abandono inverso assume índice preocupante. É um contingente ancião da recente tendência de menor prole que por isso mesmo fica a depender, uma vez alcançada a faixa etária provecta, de menos guardiões.

Lado outro, o abandono mais se perfaz dentro da família; ou seja, nada obstante esteja o idoso na companhia familiar falta-lhe a assistência material e moral dos devidos cuidados, importando o déficit afetivo em sério comprometimento de vida. Esse tipo de violência não tem maior visibilidade. Enquanto isso, dados da Secretaria de Saúde paulista indicam (15.06.13) que nove pessoas com 60 anos ou mais, em São Paulo, “são internadas por semana em hospitais públicos em razão de agressões físicas”.

Não há dúvida, portanto, que essa estatística revela, com maior visibilidade, severa realidade infratora dos direitos humanos contra o idoso e que deve ser combatida por urgente compromisso social.

No considerar o idoso como “pessoa em situação especial”, suscetível de cuidados compatíveis ao elevado espectro de sua dignidade e ante realidades fáticas diversas, reclamam-se novas tutelas jurídicas especificas. 

 IBDFAM – Desde que o afeto foi considerado valor jurídico, abandono afetivo pode gerar indenização. E o abandono afetivo inverso?

JF – Sim. Desde quando o afeto juridicamente passou a ter a sua valoração, no efeito de ser reconhecido como vinculo familiar (João Baptista Vilela, 1980), em significado amplo de proteção e cuidado, no melhor interesse da família, a sua falta constitui, em contraponto, gravame odioso e determinante de responsabilidade por omissão ou negligência.

A autonomia da pessoa idosa, enquanto patriarca, chefe de família e pai, exige a assistência filial, moral e afetiva, como imprescindível instrumento de respeito aos seus direitos existenciais de consolidação de vida. 

No ponto, o abandono afetivo como falta grave ao dever de cuidar, para além de constituir ilícito civil, será caracterizado como crime, nos termos do Projeto do Senado, de nº 700/2007, já aprovado, dezembro passado, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, daquela casa parlamentar. Entretanto, o projeto apenas cuida de modificar a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) para caracterizar o abandono (moral) como ilícito civil e penal; não cogitando, todavia, do abandono inverso, no pólo contrário do composto da relação (filhos/pais), o que reclama alteração legislativa pontual do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003). Aquele projeto está pronto, exatamente há um ano (desde 11.07.2012), para a pauta da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado.

Como abandono afetivo inverso, na mesma dimensão jurídico-axiológica que reclama os cuidados de proteção na relação paterno-filial, devemos considerar que a falta do cuidar serve de premissa de base para a indenização.

IBDFAM – Na sua avaliação deveria existir uma lei para regulamentar a matéria?

JF – Não é demais admitir que o abandono afetivo inverso, em si mesmo, como corolário do desprezo, do desrespeito ou da indiferença filiais, representa fenômeno jurídico que agora deve ser tratado pela doutrina e pelo ordenamento legal carecido de um devido preenchimento, seja por reflexões jurídicas, seja por edição de leis. A sua presença na ordem jurídica servirá, no espectro da ilicitude civil, como nova espécie de comportamento ilícito, pautado por uma configuração jurídica específica, tal como sucede com a dogmatização jurídica do abuso de direito.

IBDFAM – Tal lei seria como na China "sui generis", ou seja, feita para despertar a conscientização para a questão?

JF – Não é suficiente a lei impor a visitação obrigatória dos filhos, como a recente lei chinesa determina (sem especificar, sequer, o mínimo necessário) ou estabelecer sanções civis e penais.  Antes de mais, políticas públicas devem destinar emprego de esforços, inclusive de assistência social, para monitorar, continuadamente, a qualidade de vida da pessoa idosa, sob pena de o abandono afetivo inverso ser apenas um instituto jurídico de efeito reparatório civil ou repressivo penal, sem qualquer profilaxia sócio-criminal que o impeça acontecer.

Não adianta tipificar ilicitudes civis e crimes, para as imputações cabíveis, sem que o Estado aparelhe a dignidade e a sobrevivência das pessoas idosas de estruturas adequadas a serviço de uma tutela integral protetiva e preventiva. 

No caso, a lei servirá, de imediato, como um aviso eloquente para que possa ser estabelecida, afinal, uma sociedade mais solidária.

IBDFAM – E qual seria o preço do abandono?

JF – Não se pode precificar o afeto ou a falta dele, na exata medida que o amor é uma celebração permanente de vida e como tal, realidade espontânea e vivenciada do espirito; todavia o abandono moral e material, como instrumento de desconstrução de vida pode ser mensurado em níveis de quantificação indenizatória. Os parâmetros são os circunstanciais de vida dos próprios atores envolvidos, sinalizando uma reparação civil adequada e necessária.

IBDFAM – Embora não haja lei específica que regulamente a matéria, é possível invocar uma interpretação principiológica para tal pretensão?

JF – Sim. O princípio do “neminem laedere” (“não causar dano a ninguém”)  que serve de fundamento para toda a doutrina da responsabilidade civil. Demais disso, cuidando-se de ilicitude civil de conduta, exorta-se a regra geral do art. 186 do Código Civil, onde ínsito o princípio, segundo a qual “aquele que por, ação ou omissão voluntária, negligência ou imprududência violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Segue-se, então, a aplicação do artigo 927 do mesmo estatuto civilista, indicando que aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo; sendo certo que dita reparação pela via da indenização, deve   medir-se pela extensão do dano, na forma do artigo 944 do Código Civil.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM | 16/07/2013.

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