CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida julgada promitente vendedor adquirente do imóvel durante a constância do casamento sob o regime da separação de bens previsto no artigo 258, parágrafo único, IV, do Código Civil de 1916 – Comunicabilidade estabelecida pela Súmula 377 do STF – Cônjuge falecida – Necessidade de prévio registro do formal de partilha com atribuição da totalidade do bem ao viúvo promitente vendedor, em observância ao princípio da continuidade – Recurso não provido.

ACÓRDÃO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 0002335-32.2013.8.26.0100

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação0002335-32.2013.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante FRANCISCO STELLA NETTO, é apelado 15° OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GONZAGA FRANCESCHINI, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 11 de fevereiro de 2014.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n° 0002335-32.2013.8.26.0100

Apelante: Francisco Stella Netto

Apelado: 15°Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO N° 33.931

Registro de imóveis – Dúvida julgada promitente vendedor adquirente do imóvel durante a constância do casamento sob o regime da separação de bens previsto no artigo 258, parágrafo único, IV, do Código Civil de 1916 – Comunicabilidade estabelecida pela Súmula 377 do STF – Cônjuge falecida – Necessidade de prévio registro do formal de partilha com atribuição da totalidade do bem ao viúvo promitente vendedor, em observância ao princípio da continuidade – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença do MM. Juiz Corregedor Permanente do 15° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve as exigências decorrentes do exame do instrumento particular de promessa de venda e compra datado de 16 de novembro de 2011, pelo qual o interessado Francisco Stella Netto, viúvo, prometeu vender a sua filha Maria Cristina Stella de Mello Ribeiro e seu marido Luiz Carlos de Mello Ribeiro, com a anuência dos demais filhos, o imóvel matriculado sob n° 163.097 do registro imobiliário.

O apelante afirma que a exigência de prévio registro do formal de partilha, pelo fato de o bem haver sido adquirido pelo promitente vendedor na constância de casamento sob o regime da separação obrigatória de bens é indevida, porque o Oficial pretende decidir sobre a comunicabilidade ou não do bem imóvel em questão, o que não é sua função. Diz que o formal de partilha instruído com a impugnação apresentada demonstra que os aquestos foram inventariados, sem que tenha havido qualquer impugnação dos herdeiros, e que a sentença, ao afirmar que a demonstração de incomunicabilidade não foi feita no momento oportuno, faz pressupor que embora tardia, foi feita, e deixou de se pronunciar sobre o ponto fulcral da dúvida.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

A exigência de prévio registro do formal de partilha dos bens deixados pela falecida esposa do interessado é devida, e, mesmo que, apenas a título de argumentação, fosse caso de considerar a juntada do formal de partilha ocorrida com a apresentação da impugnação, o ingresso do título ao fólio real continuaria inviável.

Não se trata, como afirma o apelante, de discussão acerca da ocorrência ou não da comunicabilidade do bem imóvel em questão, porque esta foi estabelecida por força da norma legal e respectiva súmula que disciplinam a matéria (artigo 258, parágrafo único, IV, do Código Civil de 1916 e Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, nos termos da qual "No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento").

Uma vez estabelecida a comunicabilidade pela lei, o bem imóvel em questão deveria ter sido inventariado e partilhado, no caso, mediante atribuição da parte ideal de propriedade da cônjuge falecida integralmente ao viúvo, que passaria a ter a titularidade do domínio sobre a totalidade do imóvel, de modo a possibilitar, com o registro do formal de partilha nestes termos, o registro do título sob exame. Tal providência não foi tomada, o que torna inviável o registro, pois a situação, tal como se apresenta, configura quebra do princípio da continuidade.

Consoante lições de Afrânio de Carvalho, o Oficial tem o dever de proceder o exame da legalidade do título e apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e sua formalização instrumental ("Registro de Imóveis", editora Forense, 4ª edição).

O exame da legalidade consiste na aceitação para registro somente do título que estiver de acordo com a lei.

O registro perseguido comprometeria o exato encadeamento subjetivo das sucessivas transmissões e aquisições de direitos reais imobiliários, porque de acordo com o "R.4" da matrícula 163.097 (fls. 18/20) o imóvel foi adquirido pelo interessado, casado com Lucy Marque Stella, cuja comunicabilidade do bem é inconteste, nos termos acima expostos, e, de acordo com o título apresentado, a transmissão da totalidade do imóvel foi feita somente pelo interessado, o qual não é o único titular do domínio.

Indispensável, pois, observar o artigo 225, §2°, da Lei de Registros Públicos, que consagra o princípio da continuidade, que é corolário do princípio da especialidade.

Afrânio de Carvalho, ao tratar do tema, assim dispõe:

"…importa lembrar que o título atual só é admissível no registro quando aí encontre outro pretérito a que possa ligar-se: o encadeamento há de ser ininterrupto. Essa afirmação não é senão um corolário de preceito latente do sistema, por mim realçado no anteprojeto atrás aludido, segundo o qual a pré-inscrição de titular antigo é indispensável à inscrição de novo titular." (Revista dos Tribunais 643/20 – "Títulos Admissíveis no Registro")

O mesmo doutrinador preleciona:

"(O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente." e acrescenta:

"Ao exigir-se que todo aquele que dispõe de um direito esteja inscrito como seu titular no registro, impede-se que o não-titular dele disponha. A pré-inscrição do disponente do direito, da parte passivamente interessada, constitui, pois, sua necessidade indeclinável em todas as mutações jurídicos-reais." (Registro de Imóveis, 4ª ed., Ed. Forense, 1998, p. 254).

À vista do exposto, nego provimento ao recurso.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (D.J.E. de 21.03.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 24/03/2014.

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1ª VRP: Registro de imóveis – dúvida – em regra geral não é possível dar-se por suprida a exigência de compra e venda, celebrada por escritura pública (LRP/1973, arts. 167, I, 29, e 221), mediante o só compromisso de compra e venda, ainda que este haja sido avençado por escritura pública e esteja acompanhado de prova de adimplemento do preço

Processo 0065574-10.2013.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Franco Paulista S.A – Registro de imóveis – dúvida – em regra geral não é possível dar-se por suprida a exigência de compra e venda, celebrada por escritura pública (LRP/1973, arts. 167, I, 29, e 221), mediante o só compromisso de compra e venda, ainda que este haja sido avençado por escritura pública e esteja acompanhado de prova de adimplemento do preço – in casu, porém, é possível aplicar o disposto na Lei 6.766/1979, art. 26, § 6º, em interpretação extensiva, se se considerar que o imóvel não só está em região ocupada por loteamentos e desmembramentos, como ainda adveio, ele próprio, de desmembramento que se fez para o fim de celebrar o compromisso de compra e venda – ademais, há prova de adimplemento do preço – dúvida improcedente (afastado o óbice).

CP 354 Vistos etc.

Recebi estes autos em 11 de novembro de 2013.

1. O 1º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (1º RISP) suscitou dúvida (fls. 02-06; prenotação 319.369) a requerimento de Franco Paulista S. A. (fls. 21-28), suscitada que apresentara a registro, para a aquisição de domínio (fls. 07-10) sobre imóvel da inscrição 9.496 (fls. 57-58), uma certidão de escritura pública de compromisso de compra e venda (7º Tabelionato de Notas de São Paulo, livro 1026, fls. 29 verso; nestes autos, fls. 11-13) acompanhada de certidão negativa de distribuição cível na comarca de São Paulo (fls. 14).

1.1. Segundo o termo de dúvida, para a aquisição do domínio é ecessária escritura pública de compra e venda (ou outro título que se lhe equivalha, como mandado passado em ação de adjudicação compulsória), de modo que o dito compromisso de compra e venda não serve para esse fim, conquanto tenha sido celebrado por escritura pública, haja sido inscrito e esteja acompanhado da prova de inexistência de ação para a cobrança de preço. Além disso, não é possível aplicar ao caso o disposto na Lei 6.766, de 19 de dezembro de 1979, art. 26, § 6º, porque a área não foi objeto de loteamento ou desmembramento.

1.2. O 1º RISP, contudo, ressalva que, no seu particular modo de entender, o fato de o compromisso de compra e venda ter sido celebrado mediante escritura pública já é suficiente para que se dê por suprida a exigência do vigente Cód. Civil, art. 108, razão pela qual não há por que exigir nova escritura pública. Logo, à suscitada só se deveria exigir, além da prova do registro do compromisso de compra e venda celebrado por escritura pública, a demonstração do adimplemento do preço ou do imposto de transmissão.

1.5. O termo de dúvida veio instruído com documentos (fls. 07-90, 94-95 e 98).

2. A suscitada impugnou (fls. 100-116).

2.1. Segundo a impugnação, o imóvel em questão está em região que se integrara a cidade por meio de parcelamento, em particular no final do séc. XIX (cf. fls. 102-107), ou seja, adveio da subdivisão de uma gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes (Lei 6.766/79, art. 2º, § 1º). Portanto, aplica-se ao caso o disposto na Lei 6.766/79, art. 26, § 6º, e a escritura pública de compra e venda, já inscrita, acompanhada – como está – de prova de adimplemento e prescrição do preço, é bastante para a transmissão do domínio, sem que a suscitada tenha de recorrer à ação de usucapião ou de adjudicação compulsória.

2.2. A impugnação foi instruída por documentos (fls. 117-187).

3. O Ministério Público opinou por que se desse a dúvida por procedente, ou seja, por que se mantivesse a recusa do ofício de registro de imóveis (fls. 189-191).

4. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

5. Em que pesem as razões do 1º RISP (fls. 04-06), não é caso de dispensar a escritura pública de compra e venda sempre que houver compromisso de compra e venda celebrado mediante escritura pública e prova de adimplemento de preço e de tributos, porque legem habemus em sentido contrário: com efeito, a Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – LRP/1973, arts. 167, I, 29, e 221, I-V, exigem título (a compra e venda) e título formal (e. g., escritura pública) para que em tal caso o registro – que é causal – opere a transmissão de domínio.

5.1. Note-se que mesmo em sistema jurídico que admite o negócio jurídico júri-real abstrato, como o alemão (Código Civil alemão, §§ 873 e 925), é preciso que esse negócio jurídico, abstrato embora, exista, valha e seja eficaz, e seja celebrado por ato público, ou seja, por escritura pública (para a compra e venda: Código Civil alemão, § 331 b). Por maior força de razão, há de ser exigido o negócio jurídico em sistema registrário causal, como é o brasileiro.

6. Entretanto, não há óbice a que se aplique in casu o disposto na Lei 6.766/1979, art. 26, § 6º.

7. Em primeiro lugar, o E. Conselho Superior da Magistratura – CSM já vem dando interpretação mais ampla a essa regra, como se vê a partir do julgamento da Apelação Cível – Ap. Cív. 0012161- 30.2010.8.26.0604 – Sumaré, Rel. Maurício Vidigal, j. 06.10.2011, DJe 29.02.2012).

8. Em segundo lugar, a essa orientação do CSM coaduna-se a atual preocupação com a regularização fundiária, para a qual se admite maior flexibilidade para a prova das transmissões (Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – NSCGJ, tomo II, capítulo XX, itens 230-232 – e, grosso modo, de regularização fundiária é que se cuida in casu, em que não há lide, mas apenas difficultas praestandi, dificuldade em suprir os documentos necessários para uma inscrição que leve à transmissão do domínio.

9. Em terceiro lugar, verifica-se a fls. 151-156 que a interessada Franco Paulista celebrou o compromisso de compra e venda sobre uma área que para esse fim foi desmembrada, de maneira que, conquanto não se possa falar em loteamento, é possível – dentro de uma interpretação ampla, como dito – aplicar a Lei 6.766/79, art. 26, § 6º, também a essa hipótese.

10. Observe-se que o adimplemento do preço não foi óbice levantado pelo ofício de registro de imóveis e, de qualquer forma, está provado o cumprimento desse requisito, não só pelo que consta do próprio compromisso de compra e venda (fls. 151 verso), mas ainda pelo que resulta da certidão negativa de distribuição cível (fls. 131).

11. Do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo 1º Ofício do Registro de Imóveis de São Paulo a requerimento de Franco Paulista S. A. (prenotação 319.369). Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Desta sentença cabe apelação, com efeito devolutivo, dentro em quinze dias, para o E. Conselho Superior da Magistratura. Uma vez preclusa esta sentença, cumpra-se a LRP/1973, art. 203, II, e arquivemse os autos se não for requerido nada mais. Esta sentença vale como mandado.

P. R. I. C. – CP-354 – ADV: MARIANE CHAN GARCIA (OAB 311030/SP), MARCELO MANHAES DE ALMEIDA (OAB 90970/SP)

(D.J.E. de 19.12.2013 – SP)

(…)

Fonte: DJE I 19/12/2013.

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1ª VRP|SP: Registro de imóveis – Dúvida – Um direito à aquisição de imóvel, decorrente de compromisso de compra e venda

1ª VRP|SP: Registro de imóveis – Dúvida – Um direito à aquisição de imóvel, decorrente de compromisso de compra e venda, era indisponível, mas foi penhorado e arrematado a terceiro – O domínio sobre esse mesmo imóvel nunca foi indisponível – A arrematação foi registrada – O dono, de um lado, e o arrematário e sua mulher, de outro, celebraram então uma compra e venda, e declararam que, na respectiva escritura pública, que sobre o imóvel não existia nenhum ônus, feito ajuizado ou ação – Em seu contexto, essa afirmação é verdadeira, porque sobre o imóvel (leia-se, sobre o domínio) de fato nunca houve indisponibilidade, e não há exigir aos figurantes que a desdigam – O ato de disposição do dono (= a venda) não pode ser agora obstado no registro de imóveis, porque teve por pressuposto a disposição de um direito (= o decorrente do compromisso de compra e venda) que outrora fora indisponível, mas que agora sofreu disposição mediante arrematação e registro da arrematação – Dúvida improcedente.

Processo 0037806-12.2013.8.26.0100

CP 193 – CP 185
Dúvida
Registro de Imóveis – 5º Oficial De Registro de Imoveis de São Paulo
R. H. – – S. L. H.

Registro de imóveis – dúvida – um direito à aquisição de imóvel, decorrente de compromisso de compra e venda, era indisponível, mas foi penhorado e arrematado a terceiro – o domínio sobre esse mesmo imóvel nunca foi indisponível – a arrematação foi registrada – o dono, de um lado, e o arrematário e sua mulher, de outro, celebraram então uma compra e venda, e declararam que, na respectiva escritura pública, que sobre o imóvel não existia nenhum ônus, feito ajuizado ou ação – em seu contexto, essa afirmação é verdadeira, porque sobre o imóvel (leia-se, sobre o domínio) de fato nunca houve indisponibilidade, e não há exigir aos figurantes que a desdigam – o ato de disposição do dono (= a venda) não pode ser agora obstado no registro de imóveis, porque teve por pressuposto a disposição de um direito (= o decorrente do compromisso de compra e venda) que outrora fora indisponível, mas que agora sofreu disposição mediante arrematação e registro da arrematação – dúvida improcedente.

Vistos etc. Somente nesta data por força de acúmulo de serviços.

1. O 5º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo (5º RISP) suscitou dúvida (fls. 02-03) a pedido de Roberto Hucke e Silvana Lagnado Hucke (nos autos CP 193: matrícula 41.335 – fls. 22-25, e prenotação 266.894; nos autos CP 185: matrícula 5.910 – fls. 21-23, e prenotação 266.897).

1.1. Segundo o termo de dúvida trazido nestes autos CP 193, em escritura pública lavrada em 18 de janeiro de 2013 (8º Tabelião de Notas de São Paulo, livro 3.393, fls. 152 – nestes autos, fls. 08-09) a vendedora Lugano Comercial Ltda. declarou que sobre o imóvel vendido não constavam ações, feitos ajuizados e ônus reais que pudessem fazer inválido ou ineficaz o negócio jurídico de compra e venda.

1.2. Porém, na mat. 41.335 – Av. 10 – 5º RISP (fls. 24) e no Livro de Registro de Indisponibilidades, registro 607, de 20 de março de 2001, consta indisponibilidade de bens e direitos, averbação essa que não foi cancelada, sequer pela arrematação que consta do R. 12 (fls. 24 verso): afinal – sustenta o 5º RISP -, a arrematação não é modo originário de aquisição, e a Av. 10 produz efeitos enquanto não for cancelada (Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – LRP73, art. 252).

1.3. Os compradores Roberto e Silvana, a despeito da averbação de indisponibilidade, não concordam em subscrever declaração segundo a qual tenham ciência disso, o que faz presumir que o registro, feito nessas circunstâncias, poderá levar a futuras controvérsias, o que deve e pode ser evitado.

1.4. Salienta ainda o 5º RISP que o cancelamento tem de ser requerido à autoridade que impusera a indisponibilidade, e não pode ser dado na via administrativa, seja pelo próprio ofício do registro de imóveis, seja pela corregedoria permanente.

1.5. O termo de dúvida foi instruído com documentos (fls. 04-27).

2. Os suscitados impugnaram (fls. 29-35).

2.1. Segundo a impugnação, a indisponibilidade deixou de existir quando foi arrematado o direito sobre o qual recaía, especialmente se se considerar que a arrematação funda uma aquisição originária.

3. O Ministério Público (MP) opinou por verificar-se se a indisponibilidade ainda seria eficaz ou não, ou pela procedência da dúvida (fls. 37, 44, 46 e 48-50).

4. Apensados a estes de número CP 193 (0037806-12.2013.8.26.0100) estão os autos CP 185 (0036084-40.2013.8.26.0100): em ambos os feitos discute-se a mesma questão, nas mesmas circunstâncias de fato e de direito, valendo notar apenas que, naqueles autos CP 185, a escritura pública (fls. 08-10; prenotação 266.897) foi também lavrada em 18 de janeiro de 2013 (8º Tabelião de Notas de São Paulo, livro 3.393, fls. 156) e o imóvel é o da matrícula 5.910 – 5º RISP, e que, lá, suscitada a dúvida (termo e documentos: fls. 02-26), os suscitados Roberto e Silvana impugnaram (fls. 28-34), e aguarda-se o julgamento conjunto nestes autos CP 193.

5. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

6. Cabe destacar o zelo do MP, que cuidou em solicitar providência para verificar se, ao fim e ao cabo, existisse ou não, ainda, o título que dera causa à Av. 10 da mat. 41.335 (fls. 44 e 48 destes autos CP 193) e à Av. 7 da mat. 5.910 (fls. 22-23 dos autos CP 185); porém – como ficou dito a fls. 46 -, a providência não tem lugar em dúvida, pois a indisponibilidade estava na matrícula na data em que foram prenotadas as escrituras públicas (fls. 08-09; fls. 08-10 dos autos CP 185), as quais escrituras, portanto, têm de ser qualificadas à luz dessa indisponibilidade, ainda que essa limitação ao poder de dispor (datum sed non concessum que exista) depois venha a ser cancelada.

7. In medias res, as dúvidas são improcedentes.

8. É preciso fazer patente o seguinte (estes dois pontos são da máxima importância): (a) nunca constou indisponibilidade sobre os domínios (o “imóvel” ou os “imóveis”) das matrículas 41.335 (fls. 22-24 destes autos) e 5.910 (fls. 21-23 dos autos CP 185). Logo, a titular desses domínios (= Lugano Comercial Ltda.) sempre teve livre poder de disposição, segundo os princípios, e nesse sentido são verdadeiras, nas escrituras públicas, as afirmações segundo as quais “a outorgante vendedora declara que sobre referido imóvel e sua pessoa não constam ações, feitos ajuizados e ônus reais, que possam impedir a presente transação” (fls. 09 destes autos; fls. 09 dos autos CP 185); e (b) a indisponibilidade constou única e exclusivamente sobre direitos reais limitados concernentes a esses imóveis, qual seja, os direitos à aquisição, decorrentes de compromisso de compra e venda (mat. 41.335 – R. 9 e Av. 10, fls. 23-24 destes autos; mat. 5.910 – R. 6 e Av. 7, fls. 22 dos autos CP 185), direitos à aquisição dos quais a titular era Maria de Lourdes Severino Guedes. Logo, Maria de Lourdes, somente ela, não podia dispor desse direito à aquisição (e. g., não podia cedê-los).

9. Sucede que, para bem ou para mal, sobre os direitos à aquisição (repita-se: indisponíveis, e pertencentes a Maria de Lourdes) recaiu penhora (mat. 41.335 – Av. 11, fls. 24 destes autos; mat. 5.910 – Av. 8, fls. 22-23 dos autos CP 185) e deles se fez arrematação judicial em favor de Roberto Hucke, um dos ora suscitados, arrematação essa que foi registrada, com o que se lhe transferiu a titularidade sobre os direitos à aquisição que pertenciam a Maria de Lourdes (mat. 41.335 – R. 12, fls. 24 destes autos; mat. 5.910 – R. 9, fls. 23 dos autos CP 185). Ou seja: houve disposição sobre os direitos que eram indisponíveis (= os direitos à aquisição dos imóveis), e essa disposição conseguiu ingresso no registro de imóveis.

10. Se por meio de arrematação podia haver ou não disposição desses direitos, ou se a arrematação funda uma aquisição originária ou derivada, essas são questões que não cabe discutir aqui. A qualificação tem de fazer-se pelo que consta do registro, e não pelo que deveria ou poderia ter constado, e pelo que hoje consta houve disposição, que se consumou com o registro da arrematação.

11. Ora, inscrito um ato de disposição (= a arrematação) de um direito que era indisponível (= o direito de compromissário comprador que cabia a Maria de Lourdes), é forçoso concluir que agora não há como paralisar um outro ato de disposição (= a venda) feito pelo dono (que nunca sofreu indisponibilidade), ainda que esse ato do dono tenha por pressuposto a disposição que contrariou (correta ou incorretamente) a indisponibilidade – à qual se daria, então, uma eficácia que originalmente não tinha, ou seja, eficácia para prejudicar as faculdades do domínio sobre o qual não recaiu.

12. Em suma: já porque o domínio nunca foi indisponível (e nesse sentido estão corretas as expressões das escrituras públicas, e não se pode exigir aos contratantes que afirmem algo diferente), já porque o domínio não se pode fazer, agora, indisponível por via reflexa (impedindo que o dono disponha em favor de quem adquiriu direito que outrora fora indisponível), não existe óbice aos registros das duas escrituras públicas, e as dúvidas levantadas nestes e nos autos CP 185 são ambas improcedentes, como se disse.

13. Do exposto, julgo improcedentes as dúvidas suscitadas pelo 5º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo a requerimento de Roberto Hucke e Silvana Lagnado Hucke (prenotações 266.894 e 266.897). Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Desta sentença cabe apelação, com efeito suspensivo, dentro em quinze dias, para o E. Conselho Superior da Magistratura. Uma vez preclusa esta sentença, cumpra-se a LRP73, art. 203, I, e arquivem-se os autos, se não for requerido nada mais.

P. R. I.
São Paulo, .
JOSUÉ MODESTO PASSOS
Juiz de Direito

Fonte: Blog do 26 – DJE I 24/10/2013.

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