Retificação de escritura pública – Pedido de retificação de escritura pública de compra e venda para inclusão de informação quanto à qualificação do imóvel alienado – Requerimento formulado com fundamento nos arts. 212 e 213, I, “a” da Lei de Registros Públicos – Impossibilidade jurídica do pedido

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1004487-26.2014.8.26.0286, da Comarca de Itu, em que é apelante ROSANA MARIA SPINELLI, é apelado OFICIAL DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E TABELIÃO DE NOTAS DE PIRAPITINGUI, ITU/SP.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento aorecurso, com observação. V.U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente) e BERETTA DA SILVEIRA.

São Paulo, 14 de setembro de 2018.

Alexandre Marcondes

Relator

Assinatura Eletrônica

Apelação nº 1004487-26.2014.8.26.0286

Comarca: Itu

Apelante: Rosana Maria Spinelli

Apelado: Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas de Pirapitingui – Comarca de Itu/SP

Juiz: Cássio Henrique Dolce de Faria

Voto nº 14.218

RETIFICAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA. Pedido de retificação de escritura pública de compra e venda para inclusão de informação quanto à qualificação do imóvel alienado. Requerimento formulado com fundamento nos arts. 212 e 213, I, “a” da Lei de Registros Públicos. Impossibilidade jurídica do pedido. Escritura de compra e venda que, embora pública, não possui natureza de registro imobiliário. Retificação que deve ser feita mediante nova declaração de vontade das partes contratantes, nos termos das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça. Demanda que, todavia, deve ser extinta sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI do CPC/1973 (vigente à época da sentença) e não julgada improcedente. Precedentes. Sentença mantida.

RECURSO DESPROVIDO, COM OBSERVAÇÃO.

A r. sentença de fls. 115/118, de relatório adotado, julgou improcedente pedido de retificação de escritura pública de compra e venda formulado por Rosana Marina Spinelli em face do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de notas de Pirapitingui – Comarca de Itu/SP.

Recorre a autora, sustentando, em breve síntese, que o pedido de retificação de escritura pública está alicerçado nos artigos 212 e 213, I, “a” da Lei de Registros Públicos, ressaltando que a omissão nela existente está suficientemente demonstrada pelos documentos dos autos (em especial o termo de quitação outorgado pela vendedora do imóvel) e que a medida postulada não prejudicará terceiros. Afirma que está há muito tempo tentando solucionar o vício do documento e que a existência de centenas de processos em face da vendedora evidencia seu desinteresse no atendimento dos consumidores, inviabilizando a solução administrativa da questão (fls. 130/135).

Contrarrazões a fls. 146/150.

Opinou a D. Procuradoria Geral de Justiça pelo desprovimento do recurso (fls. 160/162).

Não há oposição ao julgamento virtual (fl. 170).

É o relatório.

Não prospera o inconformismo.

Registre-se, de saída, que a sentença recorrida (fls. 115/118) e a apelação (fls. 146/150) remontam à vigência do Código de Processo Civil de 1973 e, portanto, com base naquele diploma serão apreciadas.

A autora ajuizou esta demanda buscando a retificação da “escritura de venda e compra com pacto adjeto de confissão de dívida e de primeira, única e especial hipoteca”, celebrada entre ela (compradora, confidente e devedora hipotecária) e as empresas Incorpol Empreendimentos e Comércio Ltda. (vendedora) e Gaplan Administradora de Bens S/C Ltda. (interveniente, credora e credora hipotecária) em 12/01/1991 (fls. 84/88).

Conforme consta da petição inicial, referida escritura contém vício quanto a aspecto essencial de identificação do objeto do contrato, isto é, omite qual o bloco do empreendimento “Condomínio Edifício Swiss Ville” está localizado o apartamento adquirido pela autora, impedindo seu efetivo registro junto à matrícula do imóvel (matrícula nº 118.312 do 3º Cartório de Registro de Imóveis de Campinas fls. 12/83).

Com isso, a autora pretende seja judicialmente determinado o acréscimo, na escritura, da descrição do bloco em que se localiza sua unidade autônoma (qual seja, “Bloco 1”).

A despeito da irresignação da requerente, a sentença recorrida deu correta solução à demanda, muito embora sua conclusão mereça pequeno reparo.

Em primeiro lugar, como bem assentou o i. Magistrado a quo, a escritura de venda e compra não se confunde com o ato de registro ou averbação do documento em dada matrícula por Oficial de Registro de Imóveis.

Dessa forma, as normas legais invocadas para justificar a retificação pretendida (artigos 212 e 213, I, “a” da Lei de Registros Públicos) são impertinentes na espécie. Aliás, isso está evidenciado pela própria inserção daqueles dispositivos no Capítulo III (“Do Processo do Registro) do Título V (“Do Registro de Imóveis”) da Lei nº 6.015/73.

Sobre a matéria, cumpre destacar as ponderações lançadas pelo eminente Desembargador Milton Carvalho em julgamento de caso análogo ao destes autos, verbis:

A ordem normativa pátria somente admite a retificação de registros civis, nos termos em que dispõem os artigos 109 a 112 da Lei 6.015/73. Os registros de imóveis, por sua vez, têm por atribuição o registro e a averbação das situações previstas no artigo 167 da referida Lei.

O contrato de compra e venda, por sua vez, ainda que público, não possui natureza de registro imobiliário, de modo que não é possível a retificação de qualquer informação nele contida por esta via.

Com efeito, tratando-se de contrato, qualquer alteração do instrumento deve atender às normas a ele atinentes, observando-se, assim, o princípio da autonomia da vontade das partes e, por isso, não pode ser estendido ao caso o procedimento de retificação de registro civil.

Nesse passo, não verificado caso de flagrante erro, cumpre às partes promover novo ato retificando o anterior, a fim de suprimir a alegada falha na declaração de vontade, mas não substituí-la judicialmente” (Apelação nº 0020019-30.2006.8.26.0224, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 22/08/2013).

Incontornável, pois, o desfecho de que a autora deve retificar a escritura mediante nova manifestação de vontade das partes contratantes (seguindo inclusive as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, conforme explicitado pelo requerido em contrarrazões fls. 146/150), o que é possível e aparentemente sequer foi tentado no caso concreto.

Por outro lado, o que se verifica é que o pedido formulado pela autora carece de respaldo legal e, portanto, deve ser tido por juridicamente impossível. Consequentemente, a demanda não deve ser julgada improcedente, mas sim extinta sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI do CPC/1973.

Confiram-se, nesse mesmo sentido, os seguintes precedentes desta Corte:

“RETIFICAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA E DE REGISTRO IMOBILIÁRIO Sentença de improcedência Alegação de erro substancial Impossibilidade de retificação judicial acerca da manifestação de vontade (escritura pública) – RECURSO DOS AUTORES IMPROVIDO” (Apelação nº 0011835-64.2010.8.26.0606, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Flavio Abramovici, j. 16/04/2013).

“ESCRITURA PÚBLICA DE DOAÇÃO Pretensão de retificação de escritura pública de doação Impossibilidade Necessidade da lavratura de novo documento público de retificação para alteração do conteúdo da escritura e posterior modificação do registro Pedido juridicamente impossível Autor carecedor da ação Ilegitimidade passiva da corré Reconhecimento de ofício Processo julgado extinto sem exame do mérito, aplicando-se o disposto no art. 267, VI, do CPC Recurso prejudicado” (Apelação nº 0089668-36.2010.8.26.0000, 1ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. De Santi Ribeiro, j. 19/06/2012).

“RETIFICAÇÃO DE ESCRITURA PUBLICA – IMPOSSIBILIDADE DE SUA IMPOSIÇÃO POR MEIO JUDICIAL – EVENTUAL CORREÇÃO APENAS PELA PRODUÇÃO DE NOVO INSTRUMENTO, MEDIANTE O CONSENSO DAS PARTES – PRECEDENTES AUSÊNCIA DE INTERESSE DE  AGIR – DECRETO DE EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO – RECURSO IMPROVIDO” (Apelação nº 9119605-16.2002.8.26.0000, 5ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Oscarlino Moeller, j. 30/04/2008).

“Retificação de escritura pública de compra e venda. Autora pretende alterar o nome da vendedora e a descrição do bem. Impossibilidade jurídica do pedido configurada. Somente as partes que integraram a escritura original é que estão aptas à pretensa mudança. O Judiciário não pode substituir nenhum dos integrantes. Expedição de alvará autoriza que terceiro possa representar integrante da escritura falecido, no entanto, jamais substituir algum dos contratantes. Ausência de uma das condições da ação. Apelo desprovido” (Apelação nº 9058816-12.2006.8.26.0000, 4ª Câmara de Direito Privado, Rel. Natan Zelinschi de Arruda, j. 30/08/2007).

Em arremate, ratificados os demais fundamentos do julgamento monocrático nos termos do artigo 252 do RITJSP, fica a sentença recorrida reformada apenas para que a demanda seja extinta sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, VI do CPC/1973.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, com observação.

ALEXANDRE MARCONDES

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1000934-54.2015.8.26.0053 – São Paulo – 2ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Claudio Augusto Pedrassi – DJ 28.09.2018

Fonte: INR Publicações.

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