CNB LANÇA PRIMEIRA FASE DO BACKUP EM NUVEM E-NOTARIADO

O Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF) lançou a primeira fase da instalação da plataforma “Backup em Nuvem e-Notariado”, uma solução para a preservação dos atos notariais em meio digital desenvolvida e gerenciada pelo próprio CNB/CF.

O objetivo da iniciativa é demonstrar o avanço do notariado brasileiro, na conformidade com os requisitos de segurança da informação e padronização de procedimentos.

Para essa primeira fase, o CNB/CF está selecionando até 20 tabelionatos de notas, que sejam associados ao Colégio, para poder avaliar o desempenho da solução. Após a conclusão dos testes, o serviço ficará disponível para os demais tabeliães.

Como se credenciar na primeira fase?
Os interessados devem preencher um formulário on-line e, em seguida, será enviado um e-mail de confirmação da seleção do tabelionato de notas. O cadastramento pode ser realizado até 26 de outubro e durante o período da primeira fase de operação, não haverá custos para os selecionados.

Clique aqui e faça a sua inscrição.

Fonte: CNB/CF | 18/10/2018.

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Recurso Especial – Ação de reintegração de posse – Direito das sucessões – Direito real de habitação – Art. 1.831 do Código Civil – União estável reconhecida – Companheiro sobrevivente – Patrimônio – Inexistência de outros bens – Irrelevância

RECURSO ESPECIAL Nº 1.582.178 – RJ (2012/0161093-7)

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

RECORRENTE : ANTÔNIO DA CORTE ANDRÉ – ESPÓLIO

REPR. POR : ELIZABETH LOURDES DA CORTE MARTINS – INVENTARIANTE

ADVOGADA : FERNANDA MENDONÇA DOS SANTOS FIGUEIREDO DAL MORO E OUTRO(S) – DF023890

RECORRENTE : MARIA FERREIRA

ADVOGADO : MARCOS KNOPP – RJ128373

RECORRIDO : OS MESMOS

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DIREITO DAS SUCESSÕES. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART. 1.831 DO CÓDIGO CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL RECONHECIDA. COMPANHEIRO SOBREVIVENTE. PATRIMÔNIO. INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENS. IRRELEVÂNCIA.

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. Cinge-se a controvérsia a definir se o reconhecimento do direito real de habitação, a que se refere o artigo 1.831 do Código Civil, pressupõe a inexistência de outros bens no patrimônio do cônjuge/companheiro sobrevivente.

3. Os dispositivos legais relacionados com a matéria não impõem como requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge/companheiro sobrevivente.

4. O objetivo da lei é permitir que o cônjuge/companheiro sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar que residia ao tempo da abertura da sucessão como forma, não apenas de concretizar o direito constitucional à moradia, mas também por razões de ordem humanitária e social, já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelos cônjuges/companheiros com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência, constituíram não somente residência, mas um lar.

5. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, decide a Terceira Turma, por maioria, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votou vencida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 11 de setembro de 2018(Data do Julgamento)

Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por ANTÔNIO DA CORTE ANDRÉ – ESPÓLIO, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Noticiam os autos que o ora recorrente propôs ação de reintegração de posse contra MARIA FERREIRA objetivando a retomada do imóvel descrito na inicial pelos herdeiros, ao fundamento de que extinto o comodato após a morte do companheiro – autor da herança.

Aduziu, ainda, que a ré permaneceu na posse imóvel a despeito de ser proprietária de um outro imóvel, destinado à sua moradia, doado pelo finado (e-STJ fls. 3-6).

A decisão que deferiu o pedido liminar (e-STJ fl. 116) foi reformada em agravo de instrumento (e-STJ fls. 131-135).

Em contestação (e-STJ fls. 161-170), a ré sustentou, em síntese, não ser comodatária do imóvel objeto da lide, mas, sim, companheira sobrevivente da união estável constituída com o finado Antônio da Corte André, pelo que teria direito de permanecer na posse do imóvel. Além disso, afirmou que o autor não teria se desincumbido do ônus de provar que a autora é proprietária de outro bem imóvel doado pelo falecido.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido inicial, afastando a existência do alegado contrato de comodato e reconhecendo o direito real de habitação (e-STJ fls. 282-288).

Os recursos de apelação interpostos tiveram seu seguimento negado por meio de decisão monocrática que recebeu a seguinte ementa:

REINTEGRAÇÃO DE POSSE – UNIÃO ESTÁVEL RECONHECIDA – REVELIA – DIREITO REAL DE HABITAÇÃO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – Rejeição à alegação da ré de descabimento da decretação da revelia porque comprovado seu comparecimento espontâneo. Restou comprovada a união estável, o que legitima a ocupação pela ré do imóvel em litígio, pois configurada a moradia dos companheiros antes do falecimento do varão. Indenização a título de dano moral descabida. Honorários advocatícios corretamente mensurados. Negado seguimento aos recursos” (e-STJ fl. 370).

A decisão monocrática foi integralmente mantida em agravo interno cujo acórdão ficou assim resumido:

AGRAVO LEGAL – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – UNIÃO ESTÁVEL RECONHECIDA – REVELIA – DIREITO REAL DE HABITAÇÃO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – Rejeição à alegação da ré de descabimento da decretação da revelia porque comprovado seu comparecimento espontâneo. Restou comprovada a união estável, o que legitima a ocupação pela ré do imóvel em litígio, pois configurada a moradia dos companheiros antes do falecimento do varão. Indenização a título de dano moral descabida. Honorários advocatícios corretamente mensurados. Negado provimento ao recurso” (e-STJ fl. 403).

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (e-STJ fls. 420-425).

Seguiu-se a interposição de recursos especiais pelo autor (e-STJ fls. 428-439) e pela ré (e-STJ fls. 456-463), que foram inadmitidos na origem (e-STJ fls. 478-490), ensejando a interposição de agravos em recurso especial (e-STJ fls. 493-505 e 507-518).

Os agravos em recurso especial, por meio de decisões monocráticas, foram conhecidos a fim de negar seguimento aos recursos especiais (e-STJ fls. 538-540 e 541-543).

Os agravos regimentais que se seguiram foram providos, determinando-se a conversão dos agravos em recursos especiais (e-STJ fls. 574-575 e 576).

Na sequência, o recurso especial de ANTÔNIO DA CORTE ANDRÉ – ESPÓLIO não foi conhecido (e-STJ fls. 584-585) ao passo que o recurso especial de MARIA FERREIRA foi parcialmente conhecido e não provido (e-STJ fls. 586-589).

Apenas o autor interpôs recurso de agravo interno em tempo hábil (e-STJ fls. 598-608), tendo a Terceira Turma, na sessão do dia 5/6/2018, conferido-lhe provimento para determinar a posterior inclusão de seu recurso especial em pauta de julgamento (e-STJ fl. 627).

A recorrida MARIA FERREIRA não interpôs recurso de agravo interno contra a decisão que conheceu parcialmente do seu recurso especial e negou-lhe provimento tendo sido certificado o decurso do prazo para recurso (e-STJ fl. 630).

Em petição única (e-STJ fls. 612-622), a ora recorrida apresentou impugnação ao agravo interno, fazendo acostar ao seu final razões de um pretenso recurso a que denominou de “recurso adesivo” (e-STJ fls. 619-622).

Nas suas razões recursais (e-STJ fls. 428-439), aponta o autor, ora recorrente, além de dissídio jurisprudencial, violação dos artigos 1.831 do Código Civil e 7º, parágrafo único, da Lei nº 9.278/1996.

Sustenta, em síntese, que a recorrida não teria direito real de habitação sob a alegação de que seria proprietária de imóvel residencial doado pelo autor da herança.

Não foram apresentadas contrarrazões (e-STJ fl. 440).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): De início, registra-se que o acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

1. Da delimitação da controvérsia recursal

Cinge-se a controvérsia a definir se o reconhecimento do direito real de habitação, a que se refere o artigo 1.831 do Código Civil, pressupõe a inexistência de outros bens no patrimônio do cônjuge/companheiro sobrevivente.

2. Dos contornos fáticos

O quadro fático ficou definitivamente delimitado pelas instâncias de cognição plena da seguinte forma:

(i) a união estável entre a ré e o autor da herança foi reconhecida pelo Juízo da 9ª Vara de Família da Comarca da Capital (e-STJ fl. 373);

(ii) o comodato alegado na inicial não foi provado (e-STJ fl. 285);

(iii) a ré vivia com o falecido no imóvel objeto da lide ao menos desde 2006 (e-STJ fl. 287);

(iv) não há informação nos autos acerca de outros bens de mesma natureza a inventariar (e-STJ fl. 408);

(v) o autor alegou que a ré seria proprietária de outro bem imóvel que teria sido doado pelo autor da herança;

(vi) a ré nega que seja proprietária de outro imóvel;

(vii) ambas as instâncias de cognição plena consideraram irrelevante a averiguação acerca da existência de outros bens de propriedade da ré; e

(viii) não há prova nos autos de que o suposto bem imóvel de propriedade da ré tenha sido doado pelo autor da herança (e-STJ fl. 408).

3. Da alegada ofensa aos artigos 1.831 do Código Civil e 7º, parágrafo único, da Lei nº 9.278/1996

Para as instâncias de cognição plena, o direito real de habitação assegura ao cônjuge/companheiro sobrevivente a permanência no imóvel que era destinado à residência do casal, sendo o único requisito legal para o seu reconhecimento a inexistência de outros bens da mesma natureza a inventariar.

Desse modo, seria irrelevante, para fins de reconhecimento do direito real de habitação, a averiguação acerca da existência ou não de outros bens no patrimônio próprio da recorrida.

Por outro lado, para o recorrente, o direito real de habitação teria natureza meramente assistencial, de modo que sendo a recorrida proprietária de outro imóvel residencial capaz de lhe garantir o direito à moradia, deveria ser afastada a benesse, porquanto ausente situação de desamparo.

Não merece prosperar a irresignação.

Eis a redação dos dispositivos legais apontados como malferidos no apelo nobre: Código Civil

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar“.

Lei nº 9.278/1996

Art. 7º Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos.

Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família“.

Com efeito, da leitura dos dispositivos legais relacionados com a matéria, nota-se que a única condição que o legislador impôs para garantia do cônjuge sobrevivente ao direito real de habitação é que o imóvel destinado à residência do casal fosse o único daquela natureza a inventariar.

Nenhum dos mencionados dispositivos legais impõe como requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente.

Não é por outro motivo que a Quarta Turma, debruçando-se sobre controvérsia semelhante àquela ora em exame, entendeu que o direito real de habitação é conferido por lei, independentemente de o cônjuge ou companheiro sobrevivente ser proprietário de outros imóveis.

Confira-se a ementa:

DIREITO DAS SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO ABERTA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. COMPANHEIRA SOBREVIVENTE. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART. 1.831 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.

1. O Código Civil de 2002 regulou inteiramente a sucessão do companheiro, ab-rogando, assim, as leis da união estável, nos termos do art. 2º, § 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB. Portanto, é descabido considerar que houve exceção apenas quanto a um parágrafo.

2. É bem verdade que o art. 1.790 do Código Civil de 2002, norma que inovou o regime sucessório dos conviventes em união estável, não previu o direito real de habitação aos companheiros. Tampouco a redação do art. 1831 do Código Civil traz previsão expressa de direito real de habitação à companheira. Ocorre que a interpretação literal das normas conduziria à conclusão de que o cônjuge estaria em situação privilegiada em relação ao companheiro, o que não parece verdadeiro pela regra da Constituição Federal.

3. A parte final do § 3º do art. 226 da Constituição Federal consiste, em verdade, tão somente em uma fórmula de facilitação da conversão da união estável em casamento. Aquela não rende ensejo a um estado civil de passagem, como um degrau inferior que, em menos ou mais tempo, cederá vez a este.

4. No caso concreto, o fato de a companheira ter adquirido outro imóvel residencial com o dinheiro recebido pelo seguro de vida do falecido não resulta exclusão de seu direito real de habitação referente ao imóvel em que residia com o companheiro, ao tempo da abertura da sucessão.

5. Ademais, o imóvel em questão adquirido pela ora recorrente não faz parte dos bens a inventariar.

6. Recurso especial provido“.

(REsp 1.249.227/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 25/03/2014 – grifou-se)

A parte final do artigo 1.831 faz referência tão somente à necessidade de que o imóvel seja “o único daquela natureza a inventariar“, ou seja, que dentro do acervo hereditário deixado pelo falecido não existam múltiplos imóveis destinados a fins residenciais.

Ademais, nota-se que até mesmo essa exigência legal – inexistência de outros bens imóveis residenciais no acervo hereditário – é amplamente controvertida em sede doutrinária. Daí porque esta Corte, em pelo menos uma oportunidade, já afastou a literalidade de tal regra, consoante se observa do seguinte julgado unânime proferido por esta Turma:

UNIÃO ESTÁVEL. 1) DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE, NA RESIDÊNCIA EM QUE VIVIA O CASAL. EXISTÊNCIA DE OUTRO IMÓVEL RESIDENCIAL QUE NÃO EXCLUI ESSE DIREITO. 2) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO POR EQUIDADE. MAJORAÇÃO NECESSÁRIA. 3) RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.

1.– O direito real de habitação, assegurado, devido à união estável, ao cônjuge sobrevivente, pelo art. 7º da Lei 9287/96, incide, relativamente ao imóvel em que residia o casal, ainda que haja mais de um imóvel residencial a inventariar.

2.– Esta Corte admite a revisão de honorários, pelo critério da equidade (CPC, art. 20, § 4º), quando o valor fixado destoa da razoabilidade, revelando-se irrisório ou exagerado, ocorrendo, no caso concreto, a primeira hipótese, pois estabelecidos em R$ 750,00, devendo ser majorados para R$ 10.000,00. Inviável conhecimento em parte para elevação maior pretendida, em respeito ao valor dado à causa pela autora.

3.– Recurso Especial conhecido, em parte, e nessa parte provido, reconhecendo-se o direito real de habitação, relativamente ao imóvel em que residia o casal quando do óbito, bem como elevando-se o valor dos honorários advocatícios“.

(REsp 1.220.838/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 27/06/2012 – grifou-se)

Não é outra a lição de Fábio Ulhoa Coelho:

(…)

O cônjuge e o companheiro têm direito real de habitação referente ao imóvel em que residia ao tempo da abertura da sucessão, podendo excluir do uso do bem os descendentes e ascendentes do falecido que porventura se tornarem seus condôminos, a menos que também já morassem no local.

Desse modo, independentemente de existirem ou não outros imóveis na herança, o cônjuge ou companheiro do falecido tem o direito de usar aquele em que residia ao tempo da abertura da sucessão, podendo ademais excluir desse uso os descendentes e ascendentes que se tornaram seus condôminos, a menos que também já residissem no local“. (Curso de direito civil. v. 5. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, pág. 270 – grifou-se)

Com efeito, o objetivo da lei é permitir que o cônjuge sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar que residia ao tempo da abertura da sucessão como forma, não apenas de concretizar o direito constitucional à moradia, mas também por razões de ordem humanitária e social, já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelos cônjuges com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência, constituíram não somente residência, mas um lar.

Além disso, a norma protetiva é corolário dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar que tutela o interesse mínimo de pessoa que, em regra, já se encontra em idade avançada e vive momento de inconteste abalo resultante da perda do consorte.

Nessa linha:

(…)

Se tiver deixado mais de um imóvel residencial, a lei presume que não haveria prejuízo para o cônjuge sobrevivente, pois disporá de outra opção equivalente de moradia. Evidentemente, que cada caso é um caso. Se, como freqüentemente ocorre, o imóvel habitado pela família é o mais valorizado, inclusive afetivamente, tendo o outro imóvel residencial reduzido valor ou localização desvantajosa para o cônjuge sobrevivente, essa circunstância não impede a incidência do direito real de habitação sobre o primeiro. O fim social da norma legal é assegurar ao cônjuge sobrevivente a permanência no local onde conviveu com o de cujus, que é o espaço físico de suas referênciasafetivas e de relacionamento com as outras pessoas. O trauma da morte do outro cônjuge não deve ser agravado com o trauma de seu desenraizamento do espaço de vivência. O direito do cônjuge sobrevivente à vivência ou ao processo de viver prevalece ou é mais relevante que a posse direta do bem adquirido pelos parentes do de cujus“. (LÔBO, Paulo. Direito Civil: sucessões. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, pág. 127 – grifou-se)

(…)

Para além de tudo isso, convém reconhecer que a finalidade das regras que estabelecem o direito real de habitação em favor do cônjuge (e, via de conseqüência, e do companheiro sobrevivo) é dúplice: garantir uma qualidade de vida ao viúvo (ou viúva), estabelecendo um mínimo de conforto para a sua moradia, e, ao mesmo tempo, impedir que o óbito de um dos conviventes sirva para afastar o outro da residência estabelecida pelo casal.

Bem por isso, com esse específico fim, o direito de habitação independe do direito à meação (submetido ao regime de bens) e do direito à herança. Ou seja, mesmo que o cônjuge (ou companheiro) sobrevivente não seja meeiro e não seja herdeiro e, por conseguinte, mesmo que não tenham qualquer direito sobre o aludido imóvel, terá assegurado em seu favor o direito de ali permanecer residindo, enquanto vida tiver“. (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil. 4. ed. Salvador: JusPodivm, 2018, págs. 374-375 – grifou-se)

Assim, por qualquer ângulo que se examine a questão, deve ser mantido o acórdão recorrido que considerou irrelevante a averiguação acerca da existência de bens próprios no patrimônio da ré para fins de ser assegurado o direito real de habitação.

Por fim, deixa-se de conhecer da postulação inserida na peça de impugnação ao agravo interno, porquanto, além de manifestamente inadmissível a interposição de recurso adesivo em agravo interno (a teor do artigo 997, § 2º, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015 – correspondente ao artigo 500, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973), a matéria ali suscitada encontra-se preclusa em virtude da ausência de interposição de agravo interno contra a decisão de fls. 586-589 (e-STJ).

4. Do dispositivo

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.

É o voto.

VOTO-VISTA

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI:

Cuida-se de recurso especial em que se discute, em síntese, se deve ser concedido o direito real de habitação à companheira sobrevivente, no mesmo imóvel em que residia com o de cujus, ainda que possua ela um outro imóvel que poderia lhe servir de moradia.

Voto do e. Relator, Min. Ricardo Villas Bôas Cueva: negou provimento ao recurso especial, mantendo o direito real de habitação concedido à recorrida, ao fundamento de que o art. 1.831 do CC/2002 não estabelece como requisito que a beneficiária não seja titular de outro imóvel que possa lhe servir de moradia, devendo o direito real de habitação ser examinado à luz do direito constitucional à moradia, da necessidade de manutenção dos vínculos afetivo e psicológico criados pelos cônjuges em relação ao imóvel e da aplicação dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar.

Revisados os fatos, decide-se.

Como assentado no voto do e. Relator, de fato não há, textualmente, na regra contida no art. 1.831 do CC/2002, a exigência de que o cônjuge ou o companheiro, para fazer jus ao direito real de habitação, não seja proprietário de outros imóveis que possam lhe servir de moradia.

A questão que deve ser objeto de reflexão, todavia, é se a interpretação gramatical do referido dispositivo legal é suficiente para extrair o efetivo conteúdo da norma jurídica que lhe é subjacente. Dito de outra maneira, é preciso examinar se a literalidade da norma atende, integralmente, aos fins propostos pelo próprio instituto jurídico do direito real de habitação.

A esse respeito, destaque-se inicialmente que a habitatio instituída ainda durante o Império Romano é a origem mais remota do direito real de habitação, tratando-se de instituto jurídico que foi sendo paulatinamente introduzido nos ordenamentos jurídicos contemporâneos e que atualmente existe, por exemplo, na França, na Itália, em Portugal e na Argentina. No Brasil, o direito real de habitação tem a sua origem mais longínqua na Lei 4.121/62, comumente chamada de Estatuto da Mulher Casada.

Trata-se, como se afirma na doutrina, de um direito “criado para garantir a manutenção da família e do seio familiar, conferindo ao cônjuge (ou ao companheiro) sobrevivente o direito de habitar o lar conjugal na forma legal, independentemente do regime de bens que havia no vínculo mantido com o falecido”. (BLIKSTEIN, Daniel. O direito real de habitação na sucessão hereditária. Belo Horizonte: Del Rey, 2012, p. 213).

O direito real de habitação tem como uma de suas principais características o fato de privar os demais herdeiros, ainda que momentaneamente, de usar um determinado bem imóvel que, a despeito de compor o acervo hereditário, passará à posse exclusiva do cônjuge ou do companheiro sobrevivente por um certo lapso temporal, findo o qual o referido bem não mais possuirá essa restrição e, portanto, poderá ser enfim partilhado.

Dado que o direito real de habitação priva todos os demais herdeiros de exercer os direitos de posse que lhes seriam automaticamente transmitidos em razão do princípio da saisine por um fundamento humanitário de maior relevância – garantir à moradia ao cônjuge ou ao companheiro sobrevivente, evitando o seu desamparo em momento difícil e preservando-lhe condições mínimas de sobrevivência digna – afigura-se evidente que a interpretação desse instituto jurídico deve ser invariavelmente restritiva.

Isso porque a razão de ser desse instituto que subverte a lógica hereditária, excluindo temporariamente um determinado bem imóvel da posse dos demais herdeiros que dele igualmente poderiam fazer uso e, inclusive, praticar atos de disposição, é a necessidade de o referido imóvel servir a um fim maior – a moradia do cônjuge ou companheiro sobrevivente.

Por esse motivo é que o legislador vedou, no art. 1.414 do CC/2002, que o titular do direito real de habitação alugue ou empreste o bem imóvel, limitando o exercício do direito à ocupação própria e de sua família.

A limitação estabelecida pela referida regra legal, contudo, não deve ser vista como a única existente no sistema jurídico, na medida em que a retirada do direito real de habitação de seu leito natural pode ocorrer por diversos meios e formas que não poderia o legislador previamente identificar, de modo que o fato de ser necessária a moradia deve ser considerado como critério essencial para a aferição da possibilidade de concessão do direito real de habitação ao cônjuge ou companheiro sobrevivente.

Tratando das hipóteses típicas e atípicas de extinção do direito real de habitação, inclusive tendo como base o direito comparado, Luciano Lopes Passarelli leciona:

E o desvio de finalidade? Ocasiona sua extinção? A Suprema Corte de Justicia do Uruguai decidiu pela extinção do direito real em face da circunstância de que a cônjuge-moradora vinha locando o imóvel para “temporadas de verão”, assentando que “la conducta de ésta, actuando en forma contraria a la previsión del art. 549 del C. Civ., y adquiriendo derechos usufructuarios a los que no se encuentra legalmente habilitada, se consolida en ejercicio abusivo del derecho real de habitación. Su conducta positiva debe ser calificada en supuesto de ilicitud (art. 540, 542, y conc. C. Civ.), por obrar contra derecho (antijuridicidad objetiva) que vulnera los derechos o intereses de los herederos forzosos del causante y que em consecuencia se transforma en causa general de extinción del derecho real, ya que a diferencia de lo propuesto por la a quo este se extingue por causas generales (ex. arts. 537, 542, 1.188, 1.215, y conc. C. Civ.) y no sólo por las especiales del art. 881.3, que debe ser amparada al producirse en actuación contra leyes prohibitivas y vulnerando la ratio o teleología del legado legal em análisis”.

Parece possível aplicar o mesmo raciocínio no direito brasileiro, no sentido de que o “desvio de finalidade” desnatura teleologicamente a ratio do instituto, destinado que é a amparar o cônjuge supérstite fornecendo-lhe uma moradia.

Ora, se o mesmo loca o imóvel, é sinal de que dele não necessita para morar e, portanto, poder-se-ia invocar o inc. IV do art. 1.410, pela evidente cessação do motivo que originou a constituição desse direito real.

E não é admissível argumento no sentido de que o cônjuge-supérstite possa estar necessitando dessa renda, porque o direito real não colima este objetivo e, se prosperar tal argumentação, haveria verdadeira transmudação em usufruto. (PASSARELLI, Luciano Lopes. O direito real de habitação no direito das sucessões in Revista de Direito Imobiliário: RDI, vol. 28, nº 59, São Paulo: Revista dos Tribunais, jul./dez. 2005, p. 108).

Embora não seja tecnicamente adequado cogitar de desvio de finalidade, instituto típico do direito administrativo e que possui significação própria e específica no ordenamento jurídico brasileiro, é possível examinar a questão relacionada a extinção do direito real de habitação em situações não expressamente previstas sob as óticas do abuso do direito e da interpretação teleológica da norma jurídica, tendo como fundamento o art. 187 do CC/2002 e o art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, que assim preceituam:

CC/2002

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

(…)

LINDB

Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Na hipótese, a moldura fática delineada pela sentença e pelo acórdão recorrido demonstra que a recorrida efetivamente possui um outro imóvel que poderia lhe servir de moradia.

Diante desse cenário, verifica-se que a manutenção do direito real de habitação quando inexistente risco à moradia da recorrida equivaleria a aquiescer com uma conduta que contraria frontalmente a razão de existir do instituto, admitindo que, às expensas exclusivamente dos demais herdeiros que serão privados do uso, fruição e disposição do bem provavelmente por um longo período, coloque-se a companheira sobrevivente em injustificável e desnecessária posição de vantagem em relação aos demais herdeiros.

Tratando especificamente da hipótese em exame, José Tadeu Neves Xavier ensina:

Entretanto, acreditamos que nem sempre esta solução parece ser a mais adequada, eis que o direito real de habitação somente encontra sentido quando incidente de forma a concretizar a sua função social, que como a própria dicção da figura já indica, destina-se a garantir o direito mínimo de moradia do viúvo. Em hipóteses como a ora tratada, em que o cônjuge ou convivente supérstite possui no seu patrimônio exclusivo bem capaz de atender a necessidade de moradia, caberia o afastamento do direito de habitação sobre o patrimônio deixado pelo de cujus, em detrimento de direito sucessório dos demais herdeiros. (XAVIER, José Tadeu Neves. O direito real de habitação na sucessão do companheiro in Revista de Direito Privado: RDPriv, vol. 15, nº 59, São Paulo: Revista dos Tribunais, jul./set. 2014, p. 286).

Respeitado o entendimento manifestado pelo e. Relator, em situações em que ambas as partes sofrerão prejuízos – na hipótese, a recorrida que não poderá usar com exclusividade àquela moradia específica na qual conviveu com o de cujus, mas que não ficará desamparada e sem lar; os herdeiros representados na figura do espólio recorrido, cujas situações não foram sequer apuradas e que estão sendo privados de usar o bem, como dele dispor – há que se fazer um firme juízo de ponderação, sopesando os interesses envolvidos.

E, diante da moldura acima apresentada, a conclusão a que se pode chegar é que a privação de uso e disposição imposta aos herdeiros é substancialmente mais gravosa do que a manutenção do direito real de habitação a quem possui outra moradia.

Forte nessas razões e rogando a mais respeitosa vênia ao e. Relator, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, a fim de afastar o direito real de habitação concedido à recorrida.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO MOURA RIBEIRO:

O cerne da controvérsia, como delimitou o e. Relator, consiste em definir se o reconhecimento do direito real de habitação para o cônjuge/companheiro sobrevivente, previsto no art. 1.831 do CC/02, pressupõe a inexistência de outros bens no patrimônio do (a) titular deste direito.

Após ouvir atentamente o voto do eminente Relator, Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, bem como o voto da Ministra NANCY ANDRIGHI, adianto-me que me alinho, ao primeiro, pelas razões a seguir.

Concluiu o e. Relator, a partir da interpretação do disposto nos arts. 1.831 do CC/02 e 7º da Lei nº 9.278/1996, que a única exigência que o legislador impôs para garantir ao cônjuge/companheiro viúvo o direito real de habitação seria que o imóvel destinado à residência do casal fosse o único daquela natureza a inventariar, não tendo como requisito, portanto, a existência de outros bens, seja de que natureza for.

Por sua vez, a e. Ministra NANCY ANDRIGHI, em seu voto-vista, assinalou que, da interpretação literal do art. 1.831 do CC/02, não se extrai a exigência de que a existência ou não da propriedade de outro imóvel pelo cônjuge sobrevivente seria condição para o direito real de habitação.

Em seguida, a e. Ministra NANCY ANDRIGHI fez um histórico e destacou as características principais do instituto jurídico do direito real de habitação, e, ao final, defendeu que o fim proposto pelo legislador para o instituto seria garantir o direito mínimo de moradia ao cônjuge/companheiro viúvo que não possuísse, ao tempo da abertura da sucessão, outro local para servir de moradia.

Como se vê, o ponto da divergência entre eles está, de um lado, de acordo com o e. Relator, que o cônjuge/companheiro sobrevivente tem direito real de habitação ao imóvel em que residia o ex-casal ao tempo da abertura da sucessão, independentemente da propriedade de outro imóvel a ser inventariado constante do monte-mor, enquanto que, de outro lado, a e. Ministra NANCY ANDRIGHI entende que o requisito é o desamparo do superstite, ou seja, que ele (a) não tenha outro lugar para morar.

Alinho-me, como já adiantei, à compreensão do Ministro RICARDO VILLAS BOAS CUEVA, que me impressionou com o argumento de que o objetivo da lei é o de permitir que o cônjuge/companheiro sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar que residia até o falecimento do cônjuge/companheiro, não apenas para concretizar o direito constitucional à moradia, mas principalmente por razões de ordem humanitária e social, pois não se poderia negar a existência de vínculo afetivo e psicológicoestabelecido entre eles com imóvel que escolheram para moradia (grifei).

O instituto em tela, como já dito, possui por escopo, além de garantir o direito fundamental à moradia protegido constitucionalmente (viés social), impedir que, ao tempo da abertura da sucessão, o cônjuge/companheiro viúvo seja afastado do imóvel eleito pelo casal para moradia e, ao meu ver, independentemente da existência de outros imóveis a inventariar ou ainda que existem outros de propriedade do titular do direito do instituto cujo alcance se discute.

Digo isso, porque nem do art. 1.831 do CC/02 e nem tampouco do art. 7º da Lei nº 9.287/96 se extrai a exigência legal de inexistência de outros bens imóveis de propriedade do cônjuge/companheiro falecido, pois a menção que a lei faz é unicamente à necessidade de que o imóvel tenha se destinado à residência do família, nada mais.

Assim, a melhor exegese do aludido dispositivo legal é no sentido de que é assegurado ao cônjuge sobrevivente o direito real de habitação sobre o imóvel que era utilizado pelo extinto casal para sua moradia, sendo este o único bem dessa espécie, não exigindo a lei que ele(a) estivesse em situação de desamparo ou não fosse proprietária de outro imóvel.

Nessa linha, a respeito do art. 1.831 do CC/02, colhe-se da doutrina de JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA e FÁBIO CALDAS DA ARAÚJO, que a interpretação literal do dispositivo restringe o reconhecimento do direito real de habitação, tornando-o oponível a terceiros somente quando o bem do casal seja o único, daquela natureza, a serpartilhado, ou seja, o único destinado à residência familiar (in Código Civil Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 1.095).

Os referidos autores acrescentaram, ainda, que o STJ foi além desta interpretação e reconheceu que o fundamental é o reconhecimento do direito real de habitação sobre o imóvel que era utilizado pelo casal como moradia, ainda que existente mais de um imóvel, ou mesmo mais de um domicilio. Eles citaram, nesse sentido,o Recurso Especial nº 1.220.838/PR, da Relatoria do Ministro SIDNEI BENETI, DJe de 27/6/2012.

MAURO ANTONINI, nesse mesmo sentido, citando JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA, ressalta que, no atual Código, porém, estendido esse direito a todos os regimes de bens, não há sentido, por exemplo, em negar o direito real de habitação ao casado pela separação de bens, se houver mais de um imóvel a inventariar e, com mais, razão deve lhe ser assegurada tal proteção se houver mais de um imóvel (in Código Civil Comentado. Coordenador Ministro Cezar Peluso. Barueri, SP: Editora Manole, 2007. p. 1.827).

Finalmente, até para fins de alinhamento da jurisprudência e para trilhar no caminho do cumprimento da missão constitucional do STJ de unificação da interpretação do direito federal faço menção, por oportuno, a precedente da Quarta Turma que, no julgamento do Recurso Especial nº 1.249.227/SC, da relatoria do Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, por unanimidade, entendeu que não havia que se falar em restrição ao direito real de habitação mesmo tendo a companheira sobrevivente adquirido outro imóvel residencial, no caso concreto com o produto de seguro de vida, e concedeu a ela tal direito, em relação ao imóvel que residia o casal quando do óbito.

Diante do exposto, rogando vênia à divergência, acompanho o Relator para NEGAR PROVIMENTO ao recurso especial.

É como voto. – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.582.178 – Rio de Janeiro – 3ª Turma – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJ 14.09.2018

Fonte: INR Publicações.

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Artigo: O REGISTRO TARDIO NO REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS: O PROVIMENTO Nº 28/CNJ E NOVAS CONSIDERAÇÕES – Por Letícia Franco Maculan Assumpção

*Isabela Franco Maculan Assumpção

**Letícia Franco Maculan Assumpção

Em 2008, a Lei nº 11.790, de 2 de outubro, alterou o art. 46 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a Lei de Registros Públicos, transferindo para o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais a atribuição de apreciar os pedidos de registro de nascimento feitos fora do prazo legal (os chamados registros tardios). As disposições da referida lei foram alteradas e complementadas pelo Provimento nº 28, de 05/02/2013, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Apesar de mais de cinco anos da publicação do Provimento, é importante retomar o assunto, para uniformização de procedimentos e também para que o tema se torne conhecido pela comunidade jurídica.

Relevante, também, esclarecer sobre alguns usos possíveis do procedimento do registro tardio, como o caso de pessoas cujo reconhecimento de filiação tenha sido feito no registro de casamento dos seus genitores, sem que fosse feito o registro de seu nascimento, no livro respectivo. Por fim, necessário esclarecer que o procedimento de registro tardio não pode ser utilizado para registro de nascimento de pessoas já falecidas.

1- A Lei nº 11.790/2008
Conforme a Lei nº 11.790, de 2 de outubro de 2008, para que seja realizado o registro tardio de nascimento não é necessária a autorização do Juiz competente para Registros Públicos, cabendo ao Oficial do Registro analisar o pedido do declarante de que seja feito o registro, sendo o requerimento de registro assinado pelo declarante e também por duas testemunhas. O Oficial de Registro Civil deve exigir prova suficiente caso suspeite da falsidade da declaração. Apresentadas as provas, o próprio Oficial as examinará e, considerando verdadeira a declaração, fará o registro. Somente nos casos em que o Oficial continuar suspeitando da falsidade da declaração, mesmo após apresentação de provas, deverá encaminhar os autos ao juízo competente, que é o Juiz da Vara de Registros Públicos, nas Comarcas onde houver, ou o Juiz de Direito, nas demais Comarcas, para que ele decida se o registro deverá ser feito ou não.

Para melhor compreensão, apresenta-se abaixo um paralelo entre a redação atual do art. 46, da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73), e a redação anterior à Lei nº 11.790, de 2 de outubro de 2008:

Redação anterior à
Lei nº 11.790/2008 Redação atual

Art. 46. As declarações de nascimento feitas após o decurso do prazo legal somente serão registradas mediante despacho do juiz competente do lugar da residência do interessado. (Redação dada pela Lei nº 10.215, de 2001)

§ 1º Será dispensado o despacho do Juiz, se o registrando tiver menos de doze anos de idade.

§ 2º Será dispensada de pagamento de multa a parte pobre (art. 30). (Revogado pela Lei nº 10.215, de 2001)

§ 3º O Juiz somente deverá exigir justificação ou outra prova suficiente se suspeitar da falsidade da declaração.

§ 4º Os assentos de que trata este artigo serão lavrados no cartório do lugar da residência do interessado. No mesmo cartório serão arquivadas as petições com os despachos que mandarem lavrá-los. Art. 46. As declarações de nascimento feitas após o decurso do prazo legal serão registradas no lugar de residência do interessado. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 1o O requerimento de registro será assinado por 2 (duas) testemunhas, sob as penas da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 2º (Revogado pela Lei nº 10.215, de 2001)

§ 3o O oficial do Registro Civil, se suspeitar da falsidade da declaração, poderá exigir prova suficiente. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 4o Persistindo a suspeita, o oficial encaminhará os autos ao juízo competente. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 5º Se o Juiz não fixar prazo menor, o oficial deverá lavrar o assento dentro em cinco (5) dias, sob pena de pagar multa correspondente a um salário mínimo da região.

A referida Lei nº 11.790, de 2 de outubro de 2008, trouxe inovações, mas também problemas, posto que passou a exigir duas testemunhas para qualquer registro fora do prazo legal, lembrando-se de que o prazo legal atualmente é de 60 (sessenta) dias para o pai ou a mãe e de 15 (quinze) dias para os demais declarantes, nos termos do disposto na Lei nº 13.112, de 30 de março de 2015, que alterou a redação do art. 52, da Lei de Registros Públicos . O problema é que é comum os genitores atrasarem um ou dois dias para fazer o registro e isso levava à exigência de duas testemunhas, o que dificultava o registro. Por outro lado, a falta de um procedimento para o registro tardio, principalmente no caso de criança maior de 12 (doze) anos e nos casos em que não era apresentada a DNV – Declaração de Nascido Vivo trazia diversas incertezas e também poderia deixar de garantir que fraudes fossem afastadas.

Em razão disso, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ publicou o Provimento nº 28, de 5 de fevereiro de 2013, que trouxe diversas inovações, tanto sobre registro tardio quanto sobre outras questões. O procedimento, apesar de ter sido publicado há mais de 5 (cinco) anos, ainda é desconhecido de grande parte da população e mesmo dos estudiosos do Direito, razão pela qual aqui são detalhadas suas disposições.

2- O Provimento nº 28, de 5 de fevereiro de 2013
Em resumo, o Provimento nº 28/CNJ estabeleceu o seguinte:
a) Sobre o registro tardio, o que mudou com o Provimento n° 28/CNJ:
a.1) Foi esclarecido que o novo procedimento de registro tardio não se aplica aos indígenas – tudo a respeito do indígena está hoje regulamentado pela Resolução Conjunta CNJ/CNMP nº 03, de 19/04/2012, DJ de 26/10/2012 .
a.2) Foi analisada a competência do Oficial para os casos de ausência de residência fixa: será competente o Oficial do local onde se encontrar o interessado (ex.: moradores de rua).
a.3) Foram criados dois procedimentos distintos pelo o Provimento n° 28/CNJ:
a.3.1) para o registro do menor de 12 anos, nos casos em que apresentada a DNV: foi simplificado o procedimento, ficando dispensado o requerimento do registro tardio e as testemunhas, sendo o registro feito como se no prazo estivesse, exceto no que se refere à competência do Oficial que, como determina a Lei de Registros Públicos, é o da residência do interessado;
a.3.2) para o menor de 12 anos, em que não seja apresentada a DNV, e para o maior de 12 anos: procedimento complexo, sendo obrigatório o requerimento, o comparecimento de duas testemunhas que conheçam o registrando, entrevista que deverá ser tomada a termo, certidão expedida pelo Oficial referente às provas apresentadas, despacho fundamentado do Oficial sobre a possibilidade ou não de ser feito o registro, entre outras exigências. O procedimento será melhor analisado abaixo.
a.4) Foram determinados requisitos para o requerimento do registro tardio do maior de 12 anos ou menor de 12, sem DNV:
a.4.1) O requerimento deverá conter: data e local do nascimento, sexo, nome, fato de ser gêmeo ou não, qualificação dos pais e dos avós, atestação de duas testemunhas com qualificação completa que serão entrevistadas, fotografia e impressão digital do registrando (vide modelo sugerido ao final). Não sendo possível a obtenção de tais informações ou a coleta de digital e ou recebimento da fotografia, ainda assim o registro poderá ser feito, mas a impossibilidade tem que ser justificada.
a.4.2) No requerimento de registro tardio é dispensado o reconhecimento de firma do interessado ou de seu representante legal, mas é obrigatório que o Oficial de Registro ou seu preposto certifique que as assinaturas do interessado, de seus pais, se presentes, e das testemunhas foram apostas em sua presença.
a.4.3) Nos casos da ausência dos dados dos pais, o registrando (ou pelo requerente do registro, caso o registrando não possa se manifestar) deverá indicar sobrenome para constar do registro (sobrenome esse que deve corresponder às afirmações por ele feitas sobre a sua família, se for o caso).
a.4.4) Na entrevista para o registro tardio deverá ser indagado, ao menos:
– Nacionalidade (se o registrando se expressa em português)
– Residência (se o registrando conhece os arredores)
– Razão para o registro ser tardio (representante legal)
– Veracidade das informações prestadas pelas testemunhas, se realmente conhecem o registrando, se tem idade compatível com os fatos narrados (devem ser preferidas as mais velhas que o registrando)
– Escolas e Postos de Saúde pelos quais o registrando passou
– Informações sobre os irmãos, se houver, e em que cartório foram registrados; Informações sobre casamento, se for casado, e em que cartório foi registrado; documentos de identidade, batismo, entre outros, para serem apresentados
OBS.: Outros documentos além dos exigidos podem ser juntados para reforçar o corpo de provas.
a.4.5) As entrevistas devem ser feitas em separado, tudo reduzido a termo, sendo ao fim assinado pelo Oficial (ou preposto) e pelo entrevistado. Sugere-se que as entrevistas sejam feitas com todo o cuidado, sendo preferencialmente realizadas pelo próprio Oficial.
a.5) Nos casos de suspeita do Oficial em relação à autenticidade do requerimento de registro, assim como de todas as declarações prestadas, poderá aquele exigir outras provas para seu convencimento.
a.6) Persistindo a suspeita, o Oficial promoverá os autos ao Juízo da Vara de Registros Públicos ou Vara Cível, onde não houver vara especializada, para que o Juiz determine seja feito o registro ou não.
a.7) Foi criada nova certidão: certidão de especificação das provas apresentadas, a ser expedida pelo Oficial do RCPN (art. 11, § 2º, do Provimento 28 do CNJ), ao fim do procedimento, devendo o Oficial certificar minuciosamente o ocorrido, decidindo pela lavratura ou não do registro tardio (espécie de despacho fundamentado).
a.8) Sendo feito o registro, o Oficial deve anotar no procedimento respectivo os dados do assento lavrado.
a.9) No caso de registro tardio de pessoa incapaz internada em hospital psiquiátrico, hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (HCTP), instituição de longa permanência (ILPI), hospital de retaguarda ou instituições, poderá o Ministério Público requerer o registro tardio diretamente ao Oficial de Registro competente, fornecendo os elementos necessários ao registro.
b) Sobre o registro de nascimento ocorrido sem assistência de médico ou de parteira, em que não seja, pois, apresentada a DNV ao Oficial, o que mudou com o Provimento n° 28/CNJ:
b.1) Sendo apresentado pedido de registro de nascimento de criança com menos de 3 anos de idade, nascida SEM ASSISTÊNCIA MÉDICA ou de PARTEIRA, a DNV, havendo demanda das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde, deve ser preenchida pelo Oficial.
– Lei 12.662/2012 – Lei da DNV: alterou art.54 da 6.015/73
• Nos nascimentos fruto de parto sem assistência de profissionais da saúde ou Parteiras tradicionais, a DNV será emitida pelos oficiais de registro civil que lavrarem o registro de nascimento, sempre que haja demanda das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde para que realizem tais omissões.
• O que se entende por “demanda”? (determinação da autoridade competente, em Minas Gerais não existe)

Havendo demanda das Secretarias de Saúde, a DNV será assinada pelo Oficial e pelo declarante, sendo obrigatória a presença de duas testemunhas. Sugere-se que seja utilizado o mesmo procedimento previsto para o registro tardio (entrevista, coleta de provas, pedido de digital e foto da criança, submeter ao juiz se houver dúvida etc).
b.2) Deverá ser expedida comunicação em 5 dias para o Ministério Público com os dados do registro do nascimento ocorrido sem a assistência de médico ou parteira e sem apresentação da DNV. Criado, pois, um novo relatório.
c) Sobre o registro de nascimento em geral, o que mudou:
c.1) Foi esclarecido que a filiação materna poderá ser estabelecida com o que constar da Declaração de Nascido Vivo – DNV, tendo em vista a aplicação da máxima de que a maternidade é sempre certa.
c.2) Não havendo DNV, a filiação materna será estabelecida somente com o comparecimento da mãe.
c.3) A filiação paterna constará do registro mediante reconhecimento expresso ou presunção legal. Para que haja a presunção legal de filiação, a certidão de casamento a ser apresentada deverá ter sido expedida depois do nascimento do registrando.
c.4) Para afastar a presunção de paternidade em relação ao marido, basta a declaração da mãe de que estava separada de fato do cônjuge ao tempo da concepção.
c.5) Duplicidade de registro – Art. 16 – cancelar o último registro, a requerimento do Juiz, Ministério Público ou qualquer interessado, dando-se ciência ao atingido.

3- Necessidade de procedimento uniforme para a Polícia Civil e para outros órgãos emissores de documentos de identificação de todo o Brasil
De nada adianta toda a cautela exigida e observada para o Registro Tardio pelos Registradores Civis das Pessoas Naturais se não forem tomadas cautelas para evitar o uso por terceiros de certidões de nascimento ao ser feita a carteira de identidade ou mesmo outros documentos de identificação, como carteira de trabalho. Assim, deve ser criado um procedimento único e nacional, de forma que somente seja expedida a carteira de identidade da criança ou adolescente mediante o comparecimento do genitor e apresentação de certidão de nascimento atualizada (expedida há no máximo 90 dias). No caso de adulto cujos genitores já tenham falecido, deve ser exigido que o adulto esteja acompanhado por duas testemunhas, de preferência irmãos ou parentes próximos, que atestem quem ele é, sob as penas da lei. O mesmo deve ser observado por qualquer órgão que expeça documentos de identificação.

4- Registro tardio de pessoa registrada no termo de casamento dos genitores
O Cartório do Registro Civil é um espaço onde a sociedade se revela de forma mais aberta e rápida. Neste artigo é apresentado um caso concreto que emocionou as autoras, tendo em vista tanto a situação da idosa, que se viu de repente sem o registro de nascimento que achava possuir, bem como em função do contexto histórico e legislativo que foi apresentado. A conclusão do caso, que foi muito satisfatória para a idosa, também impulsionou a redação do presente trabalho.

4.1 – A Constituição de 1988 e a Lei 8.560/92
Com a Constituição de 1988, foram fixados os princípios da igualdade dos filhos e da desvinculação de sua qualidade ao estado civil dos pais. Antes, havia clara discriminação entre os filhos, sendo que somente eram protegidos por lei aqueles concebidos na constância do casamento ou legitimados por casamento posterior:

Dispõe taxativamente o artigo 227, § 6º, que “os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção serão os mesmos direitos e qualificações proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.

Filho, a partir de então, representa termo uníssono, não influindo sequer a origem na sua conceituação e seus efeitos. Afasta-se, em última instância, a validade de quaisquer tratos pretensamente discriminatórios, tornando-se inconsistente, com isso, a tradicional distinção baseada na existência ou não de estruturação familiar e matrimonial entre os genitores. A partir de então, seguindo essa tendência baseada na atenção voltada à pessoa do filho, o estabelecimento da filiação é definido como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível.” (BARBOSA DE ALMEIDA e RODRIGUES JÚNIOR, 2010, p. 372)

A Lei 8.590/92, conhecida como “Lei do Reconhecimento de Paternidade”, alterou a Lei de Registros Públicos, concretizando a disposição constitucional de igualdade dos filhos. Sobre a Lei nº 8.560/92, bem ensinam Mário de Carvalho Camargo Neto e Marcelo Salaroli de Oliveira:

Em nenhum caso deve ser incluído no registro de nascimento a origem da filiação, seja esta decorrente do casamento, de reprodução assistida ou de reconhecimento no ato do registro.

No caso de reconhecimento posterior, seja espontâneo, judicial ou em decorrência de procedimento de averiguação oficiosa da indicação de suposto pai, a filiação será incluída no registro por meio de averbação, todavia, não deve constar qualquer informação quanto à sua origem nas certidões, as quais serão emitidas com o nome dos pais e dos avós nos campos adequados, sem qualquer observação ou indicação de que houve ato de reconhecimento.

[…]
Especificamente no que diz respeito ao registro de nascimento, a previsão está na Lei n. 8.560, art. 5º, que proíbe que conste de registro qualquer referência à natureza da filiação.

E quanto à certidão, o artigo 6º da mesma lei n. 8.560/92, veda que conste qualquer indício quanto à origem da filiação, ressalvando as autorizações e requisições judiciais. (CAMARGO NETO e SALAROLI DE OLIVEIRA, 2014, p. 160)

No que interessa para o presente artigo, a Lei 8.590/92, em seu art. 3º, estabeleceu ser vedado legitimar e reconhecer filho na ata do casamento, sendo ressalvado, no parágrafo único, o direito de averbar alteração do patronímico materno, em decorrência do casamento, no termo de nascimento do filho. No entanto, a Lei 8.590/92 não esclareceu como se deveria proceder em relação à transcrição daqueles registros de nascimento dos filhos, feitos no termo de casamento dos pais, para o livro de registro de nascimentos do mesmo cartório. Omitiu-se a lei nesse importante aspecto e hoje, passados mais de vinte anos da sua publicação, tal omissão ainda causa muitos problemas. Assim, a situação concreta que abaixo será descrita, é muito comum em todo o Brasil: a pessoa não tem o registro de nascimento, mas os dados relativos ao seu nascimento constam do registro de casamento dos seus pais.

4.2 – O caso concreto
Compareceu ao cartório do Barreiro, em Belo Horizonte, MG, uma senhora com aproximadamente 70 (setenta) anos de idade. Requereu que fosse feito registro de nascimento em seu nome, tendo em vista que todos os seus documentos foram retirados conforme reconhecimento de filiação feito no registro de casamento dos seus pais, logo, não possuía registro de nascimento, o que foi confirmado junto ao cartório respectivo, cuja Oficial informou o seguinte sobre a requerente: “está reconhecida como filha juntamente com os irmãos no ato de casamento dos pais, não tem como enviar segunda via de nascimento se a mesma não foi registrada em livro próprio.”

Foi realizada, então, a entrevista, na forma prevista no Provimento nº 28, do CNJ, sendo constatado que a registranda residia em Belo Horizonte desde 1976, aproximadamente. O nome dos seus pais eram os que constavam dos seus documentos, bem como o nome de seus avós. Foi verificado que ela conseguia se expressar perfeitamente no idioma nacional, como brasileira, e que conhecia bem tanto a localidade informada como de seu nascimento quanto a localidade declarada como de sua residência, ruas principais, prédios públicos, bairros, peculiaridades etc. Foi indagado se a registranda sabia ler ou escrever, tendo sido informado que sim. A registranda era solteira e tinha duas filhas, sendo que uma das filhas serviu como testemunha.

Foi a registranda indagada sobre o fato de já ter portado algum documento, como carteira de trabalho, título de eleitor, documento de identidade, e foi solicitada a apresentação desses documentos, tendo todos eles sido apresentados, conforme cópias que foram providenciadas e juntadas ao procedimento. Foi tirada a sua foto e a digital da registranda foi tomada no campo próprio do depoimento, requisitos previstos pelo Provimento nº 28, do CNJ. Apresentou certidões negativas de registro de nascimento de todos os cartórios de Belo Horizonte e também do local onde constava seu registro, no assento de casamento de seus pais.

Após entrevista, a Oficial entendeu que a registranda estava falando a verdade, os dados informados eram verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio. Tendo em vista ser a primeira situação de registro tardio de nascimento de pessoa que havia sido registrada no termo de casamento dos pais, a Oficial entendeu ser prudente a apresentação do procedimento de registro tardio à Juíza da Vara de Registros Públicos, apresentando a questão e solicitando autorização para a lavratura do registro, bem como sugerindo fosse fixado o mesmo entendimento para situações futuras, o que foi feito. A Juíza da Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte autorizou a lavratura do registro de nascimento tardio, bem como deferiu fossem feitos da mesma forma os futuros registros de nascimento tardios quando os dados respectivos constarem do registro de casamento dos pais.

4.3 O procedimento do registro tardio e a questão dos emolumentos
O procedimento do registro tardio demanda tempo, ao menos um dia de trabalho exclusivamente para esse fim, e envolve grandes responsabilidades, pois o Registrador Civil tem que estar convencido da veracidade das informações prestadas para que seja lavrado um registro tardio da forma correta. A Lei de Emolumentos de Minas Gerais, Lei nº 15.424/2004, já prevê pagamento pelo procedimento do registro tardio, estando, no entanto, sem eficácia por determinação da Corregedoria-Geral de Justiça no Aviso 25/CGJ-MG, de 2018, conforme nota constante da Tabela 6, item 15.

É importante que o legislador e as Corregedorias de Justiça se preocupem com a sustentabilidade do Registro Civil das Pessoas Naturais. Não é possível admitir que a desjudicialização continue a ser feita sem previsão de emolumentos para os atos respectivos, pois isso prejudica em muito a disponibilidade de funcionários para atendimento ao cidadão, principalmente tendo em vista a relevância dos atos referentes ao registro civil.

4.4 Sugestão de que o registro tardio se processe diretamente no cartório onde já se encontrava o registro original
Em casos como o acima mencionado, em que a pessoa já era registrada no termo de casamento dos pais, faltando apenas a transcrição para o livro de nascimento, como originalmente deveria ter sido feito, a certeza sobre o ato é assegurada mais facilmente, bastando a apresentação dos documentos de identificação da pessoa. Seria mais célere e de mais fácil comprovação documental se o procedimento de registro tardio ocorresse imediatamente quando constatado o problema, no próprio cartório onde já está o registro de casamento dos genitores do interessado. Para tanto, sugere-se que as Corregedorias-Gerais de Justiça ou o Conselho Nacional de Justiça discipline a questão.

5- O procedimento do Registro Tardio não pode ser usado para registrar pessoas já falecidas
O procedimento para o Registro Tardio feito administrativamente, perante o Registrador Civil das Pessoas Naturais do Cartório da residência dos genitores ou do próprio registrando, tem como objetivo facilitar o registro de pessoas cujo registro não tenha sido lavrado no prazo legal. Contudo, nos dias atuais, tem havido solicitação de registro tardio de pessoas já falecidas. Muitos descendentes de imigrantes aqui chegados no final dos 1800 e início dos 1900 têm buscado o reconhecimento da cidadania estrangeira, na condição de descendentes, sobretudo de descendentes de italianos e portugueses e têm tentado utilizar o registro tardio para suprir um registro de antepassados. Os interessados têm tentado esse caminho por dificuldade em localizar o registro de nascimento de seus antepassados, pelo fato de não possuírem informações precisas sobre o ato, como o local ou data onde foi realizado, ou mesmo por não terem sido feitos os registros. Contudo, como demonstraremos, o procedimento de registro tardio pela via administrativa previsto na Lei e no Provimento não pode ser usado para registro de pessoa já falecida.

5.1 – O procedimento de registro tardio pela via administrativa
Considerando as disposições do art. 52 da Lei de Registros Públicos, que trata do registro de nascimento, o declarante do nascimento pode ser:
1) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto;
2) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior, achando-se presente;
3) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior, os administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido o parto;
4) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe;
5) finalmente, as pessoas encarregadas da guarda do menor.

Observe-se que o os parágrafos do mesmo art. 52 esclarecem que, quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à casa do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do médico ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas pessoas que não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido. No caso de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de dúvida, poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para esclarecimento do fato.

A lei, portanto, ao mencionar o declarante, teve como foco o fato de o nascimento ter se dado há pouco tempo, posto que essa é a regra. A exceção é o registro tardio, ou seja, aquele feito fora do prazo legal, que é de 60 (sessenta) dias para os genitores e de 15 dias para os demais declarantes, nos termos do disposto na Lei nº 13.112, de 30 de março de 2015, que alterou a redação do art. 52, da Lei de Registros Públicos . O registro tardio está tratado no art. 46 da mesma lei, na redação dada pela Lei nº 11.790/2008 e ainda em vigor, devendo ser ressaltado que não há qualquer penalidade pela falta de observância do prazo para registro, apenas havendo uma alteração na competência para registrar, que passa a ser exclusiva do Oficial do cartório que serve à residência dos genitores ou do registrando, se maior.

Estudando o Provimento nº 28, de 5 de fevereiro de 2013, pode-se observar que o registro tardio de pessoa maior de 12 anos de idade somente poderá ser feito após entrevista com a pessoa, conforme art. 4º, abaixo reproduzido, com grifos nossos:

“Art. 4º. Se a declaração de nascimento se referir a pessoa que já tenha completado doze anos de idade, as duas testemunhas deverão assinar o requerimento na presença do Oficial, ou de preposto expressamente autorizado, que examinará seus documentos pessoais e certificará a autenticidade de suas firmas, entrevistando-as, assim como entrevistará o registrando e, sendo o caso, seu representante legal, para verificar, ao menos:

a) se o registrando consegue se expressar no idioma nacional, como brasileiro;
b) se o registrando conhece razoavelmente a localidade declarada como de sua residência (ruas principais, prédios públicos, bairros, peculiaridades etc.);
c) quais as explicações de seu representante legal, se for caso de comparecimento deste, a respeito da não realização do registro no prazo devido;
d) se as testemunhas realmente conhecem o registrando, se dispõem de informações concretas e se têm idade compatível com a efetiva ciência dos fatos declarados no requerimento, preferindo-se as mais idosas do que ele;
e) quais escolas o registrando já frequentou; em que unidades de saúde busca atendimento médico quando precisa;
f) se o registrando tem irmãos e, se positivo, em que cartório eles estão registrados; se o registrando já se casou e, se positivo, em que cartório; se o registrando tem filhos e, se positivo, em que cartório estão registrados;
g) se o registrando já teve algum documento, como carteira de trabalho, título de eleitor, documento de identidade, certificado de batismo, solicitando, se possível, a apresentação desses documentos”. (sem grifos no original)

Assim, há diversas informações que somente poderão ser prestadas pelo próprio registrando, maior de 12 (doze) anos de idade. Obviamente, pois, ele terá que estar presente para que ocorra o procedimento administrativo de registro tardio.

O provimento não trata da possibilidade de se fazer ou não o registro tardio de uma pessoa já falecida. Esta é, talvez, a maior demanda hoje existente, tendo em vista os crescentes casos de pedidos feitos por descendentes de imigrantes que pleiteiam a cidadania estrangeira e que não conseguiram localizar o registro de nascimento de um ascendente. Como proceder nesses casos? Seria possível proceder ao registro tardio de uma pessoa falecida? Entendemos que, pela via administrativa, não é possível, restando, assim, a via judicial.

Outro ponto a ser observado: os descendentes teriam legitimidade para o requerimento do registro tardio de seu ascendente? Entendemos que sim, eles têm essa legitimidade, mas o pedido deve ser feito ao Poder Judiciário. É majoritário o entendimento dos Tribunais que os descendentes têm legitimidade para o requerimento de retificações, suprimentos ou restaurações no registro civil, uma vez que o assentamento é público e o erro pode acarretar prejuízo ao interessado. Deve, contudo, o interessado comprovar seu interesse na retificação, suprimento ou registro tardio, apresentando, ainda, os documentos necessários para a comprovação do seu direito, bem como as provas necessárias para o convencimento do Juiz.

Conclusão
A possibilidade de se requerer o registro tardio de nascimento diretamente nas serventias extrajudiciais é um grande avanço em nossa legislação, o que vem enobrecer a classe dos registradores civis, trazendo grande dinamismo a procedimentos que, até então, só eram possíveis pela via judicial. O procedimento não é exclusivo para a situação de pessoa que nunca teve registro de nascimento, mas também pode ser utilizado para situações em que a pessoa tem documentos de identificação, mas o registro de nascimento foi perdido em inundações, incêndios, entre outros.

Uma hipótese interessante de registro tardio de nascimento foi apresentada no presente artigo: pessoa que não possui registro de nascimento porque a menção a seu nascimento consta apenas no termo de casamento de seus pais. Apesar de a Lei nº 8.560/93 vedar essa legitimação, que era comum anteriormente à Constituição da República de 1988, a referida lei não regulamentou o procedimento para registrar o nascimento dessas pessoas que, por equívoco, somente têm uma certidão do termo de casamento dos pais, onde constam os dados do seu nascimento. Assim, o procedimento previsto no Provimento nº 28/CNJ é uma opção fácil e ágil para dar solução ao problema.

No entanto, a via administrativa, prevista na Lei de Registros Públicos e regulamentada no Provimento nº 28/CNJ, não poderá ser utilizada para o registro de ascendentes já falecidos. Os descendentes têm legitimidade para o requerimento do registro tardio de seus ascendentes, na via judicial, demonstrando que o registro não foi localizado e ainda fundamentando o seu interesse no registro.
_______________________________________________________________
Modelo de procedimento de registro tardio de pessoa que tem documentos

Apresenta-se, abaixo, modelo de procedimento para registro tardio em situação muito comum: a pessoa já tem todos os documentos de identificação, que foram feitos com fundamento em certidão de nascimento. No entanto, ao solicitar a segunda-via da certidão, a pessoa descobre que não consta seu registro no livro. Uma solução viável, então, é o procedimento de registro tardio, apesar de ser também possível a reconstituição do registro perante o mesmo cartório onde originalmente deveria ter sido feito o registro. A reconstituição não tem sido muito utilizada, pois, o procedimento do registro tardio é regulamentado pelo CNJ e dá solução no caso em que a pessoa não mais reside no local onde nasceu.

Os motivos para a inexistência do registro no livro são diversos. Pode ser que, na época em que foi declarado nascimento, não tenha sido feito o registro no livro, pois era comum que primeiro fosse feita a certidão, para que depois os dados fossem copiados no livro. Muitas vezes, no entanto, se esquecia de fazer o registro no livro. Hoje, com os registros feitos mediante sistema informatizado, os riscos desse tipo de erro diminuíram muito. Há também a situação, tratada no presente artigo, da pessoa que era reconhecida no termo de casamento dos genitores, mas cujo registro de nascimento não era lavrado. Há outros motivos também para a perda do registro no livro, como: enchentes, incêndios.

Como o registro tardio de pessoas que já têm documentos de identificação é o mais comum atualmente, o modelo que se apresenta é esse, podendo ser, entretanto, alterado para outras situações:

MODELO DE PROCESSO DE REGISTRO TARDIO COMPLETO
Ilma. Sra. Oficial do Registro Civil do Cartório xxxxxxxxxxx

Eu, xxxxxx, identidade , CPF, de profissão xxx, com endereço xxxxxxxxxxx, venho requerer seja feito REGISTRO DE NASCIMENTO EM MEU NOME, tendo em vista que eu tinha minha certidão de nascimento, fornecida pelo Cartório de Registro Civil de xxxxxxxxxxxx, mas, quando fui solicitar a segunda via da certidão, foi declarado pelo Cartório, conforme certidão anexa, que NÃO HÁ REGISTRO DE NASCIMENTO CORRESPONDENTE À MINHA CERTIDÃO. Tenho todos os meus documentos, mas não tenho o meu registro e estou precisando de segunda via da certidão.

Informo que resido em xxxxxxxxxxxxxxx, razão pela qual o novo registro seja feito nesta Cidade. Meus telefones são os seguintes xxxxxxxxxxxxxx

Para os devidos fins, declaro que sou do sexo feminino, nascida em xxxxxxx, às xxxxxxxxxx horas, em xxxxxxxxxxxxxxxx. Não possuo DNV.

Sou filha de xxxxxxxxx e de xxxxx, sendo avós paternos xxxxxxxxx e de xxxxx e são avós maternos xxxxxxxxx e de xxxxx.

Minha mãe era brasileira, casada, do lar, natural de xxxxxxxxxxx, e já é falecida.

Meu pai era brasileiro, casado, de profissão xxxxxxxxxxxxxx e também já é falecido.

Solicito, respeitosamente, a V.Sa. que registre o nascimento, para o que oferece as testemunhas abaixo qualificadas que confirmam, sob responsabilidade civil e criminal, a veracidade das informações acima prestadas.

Termos em que pede e espera deferimento.

Local e data.

ASSINATURA DO DECLARANTE/REGISTRANDO E DIGITAL – JUNTAR FOTO

TOMAR TAMBÉM DEPOIMENTO DE DUAS TESTEMUNHAS (SE PESSOA MAIOR DE 12 ANOS OU SEM DNV)

E, AO FINAL, FAZER CONSTAR:

NOME COMPLETO DA 1ª TESTEMUNHA: xxxxxxxxxxxx
Identidade: xxxxxxxxxxx
CPF xxxxxxxxxxxxxx
Profissão xxxxxxxxxxx
Estado civil xxxxxxxxxxxx
endereço: XXXXXXXXXX
Data de nascimento: xxxxxxxxxxxx
Nacionalidade: brasileira
ASSINATURA DA 1ª TESTEMUNHA

NOME COMPLETO DA 2ª TESTEMUNHA: xxxxxxxxxxxx
Identidade: xxxxxxxxxxx
CPF xxxxxxxxxxxxxx
Profissão xxxxxxxxxxx
Estado civil xxxxxxxxxxxx
endereço: XXXXXXXXXX
Data de nascimento: xxxxxxxxxxxx
Nacionalidade: brasileira
ASSINATURA DA 2ª TESTEMUNHA

_______________________________________________________________
DESPACHO DA OFICIAL Certifico a autenticidade das firmas do(a) declarante e das testemunhas, que foram lançadas em minha presença.
Tendo em vista os documentos apresentados, bem como os depoimentos do declarante e das testemunhas, ENTENDO QUE DEVE SER FEITO O REGISTRO DE xxxxxxxxxxxxxxxx

Loca e data

NOME E ASSINATURA DO REGISTRADOR

_______________________________________________________________

CERTIDÃO DE ENTREVISTA PARA REGISTRO TARDIO, NOS TERMOS DETERMINADOS PELO PROVIMENTO Nº 28/CNJ

Certifico, nos termos do determinado expressamente pelo Provimento nº 28/CNJ, que entrevistei em XXXXXXXXXXXXXXXX o registrando e as testemunhas abaixo, nos termos seguintes:

1) ENTREVISTA COM A REGISTRANDA: CERTIFICO QUE EM XXXXXXXXXXX, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA RESPONSABILIDADE A REGISTRANDA XXXXXXXXXXXXXX, sexo feminino, que informou não ser gêmea. Informou, ainda, que reside na XXXXXXXXXXXX, telefones XXXXXXXXXXXXXXXX. Para os devidos fins, declarou ser do sexo feminino, nascida em 14 XXXXXXXXXX, às xxx horas, em xxxxxxxxxxxxxx. Não possui DNV.

É filha de XXXXX e XXXXXXXXX, sendo avós paternos de XXXXX e XXXXXXXXX e são avós maternos de XXXXX e XXXXXXXXX.

Foi verificado que a registranda consegue se expressar perfeitamente no idioma nacional, como brasileira, e que não conhece bem a localidade informada como de seu nascimento, por já ter saído de lá há muito tempo, mas conhece a localidade declarada como de sua residência, ruas principais, prédios públicos, bairros, peculiaridades etc. Foi indagado se a registranda sabe ler ou escrever, tendo sido informado que sim. Foi questionado sobre quais escolas o registrando já frequentou, tendo informado que quando pequena estudou em xxxxxxxxxx, em escola xxxxxxxxxxxxx, escola pública; em que unidades de saúde busca atendimento médico quando precisa, tendo sido respondido que usava o Posto de Saúde nos lugares onde residia, sendo que mudava muito. Declarou, ainda, que, quando veio para Belo Horizonte há aproximadamente xxxxxxxxx anos e aqui não mais estudou.

Foi a registranda questionada se tem irmãos e, se positivo, em que cartório eles estão registrados, tendo sido informado que sim, tem xxxxxxxxirmãos, sendo que não tem certeza, mas acha que foram registrados no Cartório xxxxxxxxxxxxxxxx.

Foi questionado se a registranda já se casou e ela informou que não, mas que viveu em união estável com xxxxxxxxxxx por aproximadamente xx anos, agora já falecido.

Foi indagado se a registranda tem filhos e respondeu que sim, tem xxxxxxxxxx. Um dos filhos vai ser testemunha deste registro tardio.

Foi a registranda indagada sobre o fato de já ter portado algum documento, como carteira de trabalho, título de eleitor, documento de identidade, certificado de batismo, e foi solicitada a apresentação desses documentos, tendo sido informado que possui todos os documentos, cuja cópia está anexa à presente.

A registranda apresentou a foto anexa, pela qual é possível reconhecê-la e que confere com as fotos constantes nos documentos de identidade apresentados.

Foi retirada a digital da registranda.

A Oficial entende, após entrevista, que a registranda está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

ENTREVISTA COM DUAS TESTEMUNHAS
1ª TESTEMUNHA

CERTIFICO QUE EM xxxxxxxxxxx, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA A TESTEMUNHA xxxxxxxxxxxxxx, Identidade: xxxxxxxx, CPF xxxxxxxxxxxx, Profissão Motorista, Estado civil Divorciado, endereço: xxxxxxxxxxxxxx, Data de nascimento: xxxxxxxxxxxxxxx, Nacionalidade: brasileira, que declarou conhecer a registranda desde que nasceu, por ser seu filho mais velho.

A testemunha confirmou as informações quanto à data de nascimento da registranda. Confirmou, ainda, o endereço da registranda.

Confirmou os nomes dos avós.

A testemunha deu as seguintes explicações a respeito da não realização do registro: disse que em xxxxxxxxxxxxx é comum ocorrer desaparecimento de registros.

Confirmou que a registranda é solteira, mas viveu em união estável com xxxxxxxxxx, que faleceu há aproximadamente 6 (seis) anos.

Confirmou que o registrando tem todos os documentos, mas que, quando foi pedir a segunda-via da certidão, não localizou o registro.

Foi verificado se a testemunha realmente conhece o registrando, se dispõe de informações concretas e se têm idade compatível com a efetiva ciência dos fatos declarados no requerimento, tendo sido constatado que sim.

A Oficial entende, após entrevista, que a testemunha está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

2ª TESTEMUNHA
CERTIFICO QUE EM xxxxxxxxxxx, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA A TESTEMUNHA xxxxxxxxxxxxxx, Identidade: xxxxxxxx, CPF xxxxxxxxxxxx, Profissão xxxxxxx, Estado civil xxxxxx, endereço: xxxxxxxxxxxxxx, Data de nascimento: xxxxxxxxxxxxxxx, Nacionalidade: brasileira, que declarou conhecer a registranda desde que nasceu, por ser seu filho mais velho.

A testemunha confirmou as informações quanto à data de nascimento da registranda. Confirmou, ainda, o endereço da registranda.

Confirmou os nomes dos avós.

A testemunha deu as seguintes explicações a respeito da não realização do registro: disse que em xxxxxxxxxxxxx é comum ocorrer desaparecimento de registros.

Confirmou que a registranda é solteira, mas viveu em união estável com xxxxxxxxxx, que faleceu há aproximadamente 6 (seis) anos.

Confirmou que o registrando tem todos os documentos, mas que, quando foi pedir a segunda-via da certidão, não localizou o registro.

Foi verificado se a testemunha realmente conhece o registrando, se dispõe de informações concretas e se têm idade compatível com a efetiva ciência dos fatos declarados no requerimento, tendo sido constatado que sim.

A Oficial entende, após entrevista, que a testemunha está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

RELAÇÃO DOS DOCUMENTOS APRESENTADOS (ANEXOS À PRESENTE):

1) DOCUMENTOS DO REGISTRANDO:

– certidão de nascimento nº xxxxxxxxx, expedida pelo Cartório xxxxxxxxxxx, em péssimo estado de conservação, mas legível.

– carteira de trabalho

– identidade e cpf

– cartão do PIS

– certidão negativa de registro da registranda expedida pelo Cartório do Distrito de xxxxxxxx

– certidões negativas de todos os cartórios de registro civil das pessoas naturais de Belo Horizonte

2) DOCUMENTOS DAS TESTEMUNHAS:

– carteira de habilitação
– carteira de identidade
Todo o acima exposto é verdade, do que dou fé.

Local e data

NOME E ASSINATURA DO REGISTRADOR

Referências
ASSUMPÇÃO, Letícia Franco Maculan. LEI Nº 13.112/2015: NA PRÁTICA NADA MUDOU QUANTO AO DIREITO DA MÃE. Disponível em colegioregistralmg.org.br. Acesso em 14 out. 2018.
ASSUMPÇÃO, Letícia Franco Maculan; DE SOUZA, Stanley Savoretti. O procedimento do Registro Tardio não pode ser usado para registrar pessoas já falecidas. Disponível em http://www.colegioregistralmg.org.br/pdf/o-procedimento-do-registro-tardio-no-pode-ser-usado-para-registrar-pessoas-j-fa.pdf. Acesso em 14 out. 2018.
BRASIL. nº Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Disponível em www.planalto.gov.br. Acesso em 16 out. 2018.
BRASIL. nº Lei nº 11.790, de 2 de outubro de 2008. Disponível em www.planalto.gov.br. Acesso em 16 out. 2018.
BRASIL. nº 13.112, de 30 de março de 2015. Disponível em www.planalto.gov.br. Acesso em 16 out. 2018.
BARBOSA DE ALMEIDA, Renata; RODRIGUES JÚNIOR, Walsir Edson. Direito Civil Famílias. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010. 634p.
CAMARGO NETO, Mario de Carvalho; SALAROLI DE OLIVEIRA, Marcelo. Registro Civil de Pessoas Naturais: Parte geral e Registro de nascimento. São Paulo: Saraiva, 2014. 260p.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Provimento nº 28, de 5 de fevereiro de 2013. Disponível em http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2421. Acesso em 16 out. 2018.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução Conjunta nº 3, de 19/04/2012. Disponível em http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=238. Acesso em 16 out. 2018.

*Isabela Franco Maculan Assumpção é graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais e mestranda em Direito. É Oficial Substituta no Cartório de Registro Civil e de Notas do Distrito do Barreiro, em Belo Horizonte, MG. Autora de diversos artigos na área do Direito Civil e Direito Notarial.

**Letícia Franco Maculan Assumpção é graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1991), pós-graduada, mestre e doutoranda em Direito. Foi Procuradora do Município de Belo Horizonte e Procuradora da Fazenda Nacional. Aprovada em concurso, desde 1º de agosto de 2007 é Oficial do Cartório de Registro Civil e de Notas do Distrito de Barreiro, em Belo Horizonte, MG. É autora de diversos artigos na área de Direito Tributário, Direito Administrativo, Direito Civil e Direito Notarial, publicados em revistas jurídicas, e dos livros “Função Notarial e de Registro”, “Casamento e Divórcio em Cartórios Extrajudiciais do Brasil”, sendo coautora do livro “Usucapião Extrajudicial”. É professora e coordenadora da pós-graduação em Direito Notarial e Registral do Centro de Direito e Negócios – CEDIN.

Fonte: CNB/CF | 17/10/2018.

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