ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado INSTITUTO ROGACIONISTA SANTO ANIBAL.
ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao apelo e ao reexame necessário. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ENCINAS MANFRÉ (Presidente) e CAMARGO PEREIRA.
São Paulo, 30 de abril de 2019.
MAURÍCIO FIORITO
RELATOR
Assinatura Eletrônica
Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053
Apelante: Estado de São Paulo
Apelado: Instituto Rogacionista Santo Anibal
Comarca: São Paulo
Voto nº 15545
APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA – TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – ITCMD – ENTIDADE ASSISTENCIAL SEM FINS LUCRATIVOS – Pretensão ao reconhecimento de imunidade tributária referente a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel art. 150, inciso VI, “b”, da Constituição Federal c.c. art. 14 do Código Tributário Nacional – A imunidade conferida às entidades sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais – Precedentes do STF e do STJ – Sentença de procedência mantida – Reexame necessário e recurso improvidos.
Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação do Estado de São Paulo em face de sentença que, em ação ordinária[1] movida pelo Instituto Rogacionista Santo Anibal, objetivando o reconhecimento de imunidade tributária em relação ao ITCMD incidente sobre imóvel deixado em testamento, julgou procedente o pedido para “o fim de reconhecer a inexistência de relação jurídicotributária entre as partes no que concerne a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel”, e condenar o apelante ao pagamento das custas, despesas e verba honorária de 10% do valor da causa (fls. 140/146).
Pugna o apelante pela reforma do julgado, sustentando, em síntese, que a imunidade tributária é ato vinculado da Administração Pública, concedido se atendidos os requisitos da lei, nos termos dos artigos 146, II, e 150, VI, “c” (fls. 150/163).
O recurso foi respondido (fls. 167/173).
O recurso foi distribuído em 14/05/2018 ao des. Kleber Leyser de Aquino e, em virtude de sua promoção, os autos foram redistribuídos e vieram conclusos a este magistrado em 25/02/2019, de acordo com o despacho proferido pela Presidência de Direito Público deste TJSP publicado em 13/02/2019.
É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO.
A sentença não comporta reparos.
Trata-se de ação ordinária ajuizada pelo Instituto Rogacionista Santo Anibal objetivando o reconhecimento de imunidade tributária de ITCMD sobre imóvel deixado em testamento por Maria Tereza Roque (fls. 42/45).
O artigo 150, inc. VI, alínea “c”, da Constituição Federal estabelece a imunidade da instituição de impostos sobre:
c – patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sociais dos trabalhadores, das instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.
A regulamentação da norma constitucional é feita pelo Código Tributário Nacional, no concernente à limitação da competência tributária, nos seguintes termos:
Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – instituir ou majorar tributos sem que a lei o estabeleça, ressalvado, quanto à majoração, o disposto nos artigos 21, 26 e 65;
II – cobrar imposto sobre o patrimônio e a renda com base em lei posterior à data inicial do exercício financeiro a que corresponda;
III – estabelecer limitações ao tráfego, no território nacional, de pessoas ou mercadorias, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais;
IV – cobrar imposto sobre:
a) o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;
d) papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros.
§ 1º O disposto no inciso IV não exclui a atribuição, por lei, às entidades nele referidas, da condição de responsáveis pelos tributos que lhes caiba reter na fonte, e não as dispensa da prática de atos, previstos em lei, assecuratórios do cumprimento de obrigações tributárias por terceiros.
§ 2º O disposto na alínea a do inciso IV aplica-se, exclusivamente, aos serviços próprios das pessoas jurídicas de direito público a que se refere este artigo, e inerentes aos seus objetivos.
Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;
II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou-se no sentido ‘de que o art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal assegura a imunidade tributária quanto ao patrimônio e renda de entidades de assistência social que não tenham fins lucrativos.’ (ARE 1115724 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 26-06-2018 PUBLIC 27-06-2018).
Ainda: “A imunidade conferida às entidades de educação sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais.” (ARE 933174 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 31/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-122 DIVULG 13-06-2016 PUBLIC 14-06-2016).
Na mesma linha, sedimentou o STJ o entendimento no sentido de que a “A incidência da norma imunizante constante no art. 150, VI c da CF/88 e 9o., IV c do CTN, além dos requisitos do art. 14 do CTN, deve levar em consideração a interpretação teleológica do dispositivo normativo, de modo a alcançar a diretriz hermenêutica que, de maneira firme e exata, salvaguarde, efetive e densifique o princípio, o valor ou a liberdade albergada pelo dispositivo. (…) A imunidade tributária conferida às instituições de assistência social sem fins lucrativos leva em consideração seu propósito elementar de servir à coletividade, colaborando com o Poder Público no exercício de funções precipuamente estatais e suprindo, dessa forma, as deficiências prestacionais.” (AgRg no AREsp 187.172/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 27/02/2014).
A respeito, assevera Leandro Paulsen que “as imunidades genéricas aplicam-se a quaisquer impostos relativos às entidades imunes enquanto organizadas e voltadas ao exercício de suas atividades típicas. Todo rol dos impostos previstos nos arts. 153, 155 e 156 está abrangido, conforme a jurisprudência do STF.” (Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e da Jurisprudência, 16ª Edição, Editora Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2014, p. 243).
Resta claro, portanto, que a imunidade tributária incide sobre o patrimônio, a renda ou serviços das entidades fixadas na norma constitucional, atendidos os requisitos legais, notadamente quanto à vinculação daqueles às suas atividades essenciais.
Pois bem.
De acordo com a documentação trazida aos autos, a entidade é associação civil de caráter assistencial e educacional, sem fins econômicos e lucrativos, e obteve, no âmbito federal, a renovação da certificação de entidade beneficente de assistência social, com validade entre 17 de abril de 2.010 e 16 de abril de 2.015 (fl. 49).
Consta, ainda, de seu estatuto social e de suas demonstrações contáveis dos exercícios de 2015 e 2016, a destinação integral de suas rendas na execução de suas finalidades, sem distribuição de lucros ou vantagens a seus dirigentes (fls. 13; 28; 67/91).
Portanto, a impetrante faz jus à imunidade tributária prevista constitucionalmente, nos termos do art. 150, inc. VI, c, §4º, da CF.
No mais, o fato de o certificado federal de entidade beneficente de assistência social estar expirado – validade de 17/04/2010 a 16/04/2015 à época do requerimento administrativo de imunidade (18/11/2015), não obsta o reconhecimento da imunidade tributária no caso em questão, tendo em vista que a transmissão da herança, segundo o artigo 1784 do Código Civil, ocorre no momento da morte do de cujus (fls. 46/49).
Assim, a aferição dos requisitos legais para o reconhecimento da imunidade deve ser feita na data do falecimento (19/02/2013), momento em que a certificação federal estava vigente, a demonstrar o cumprimento dos requisitos legais.
A respeito, como bem ressaltado na sentença, “considerando que o fato gerador da hipótese tributária tratada nos presentes autos corresponde justamente à transmissão de bem imóvel por meio de sucessão testamentária, revela-se evidente que a aferição dos requisitos necessários ao reconhecimento de eventual imunidade igualmente deve remeter a este mesmo e exato momento” (fl. 144).
Com isso, conclui-se que a entidade comprovou o preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 150, VI, c, da CF/88 e 9º, IV, c, e 14, do CTN, impondo-se o reconhecimento de sua imunidade tributária nos autos do processo de inventário da de cujus Maria Tereza Roque.
Feitas essas considerações, sendo inafastável a imunidade tributária, merece ser mantida integralmente a r. sentença, por seus próprios fundamentos.
DECIDO.
Ante o exposto, e pelo meu voto, nego provimento ao reexame necessário e ao recurso voluntário.
MAURICIO FIORITO
Relator
Notas:
[1] Valor da causa em 04/10/2017: R$ 10.000,00. – – /
Dados do processo:
TJSP – Apelação Cível nº 1047281-77.2017.8.26.0053 – São Paulo – 3ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Maurício Fiorito
Fonte: DJe/SP de 06.05.2019
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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