Registro de Imóveis – Procedimento administrativo – Registro de Carta de Arrematação expedida pela Justiça do Trabalho que foi realizado mediante ordem judicial – Pedido de providências – Qualificação limitada à verificação da competência do Juízo que expediu a carta de arrematação e prolatou a ordem de registro – Cópias da ação trabalhista que demonstram, ademais, que naquele feito foi determinada a comunicação da arrematação ao Juízo Federal em que o imóvel foi objeto de anteriores penhoras em ações movidas pela União e pelo INSS, bem como foi determinada a intimação da cônjuge do sócio da executada que figurava como coproprietária do imóvel arrematado – Recurso da arrematante provido para reformar a r. decisão que julgou o procedimento como dúvida – Determinação, porém, de comunicação do registro à Prefeitura Municipal para que tenha ciência da transmissão da propriedade do imóvel, uma vez que o título não foi instruído com a prova do recolhimento do ITBI.


  
 

Número do processo: 0014601-07.2010.8.26.0278

Ano do processo: 2010

Número do parecer: 333

Ano do parecer: 2018

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 0014601-07.2010.8.26.0278

(333/2018-E)

Registro de Imóveis – Procedimento administrativo – Registro de Carta de Arrematação expedida pela Justiça do Trabalho que foi realizado mediante ordem judicial – Pedido de providências – Qualificação limitada à verificação da competência do Juízo que expediu a carta de arrematação e prolatou a ordem de registro – Cópias da ação trabalhista que demonstram, ademais, que naquele feito foi determinada a comunicação da arrematação ao Juízo Federal em que o imóvel foi objeto de anteriores penhoras em ações movidas pela União e pelo INSS, bem como foi determinada a intimação da cônjuge do sócio da executada que figurava como coproprietária do imóvel arrematado – Recurso da arrematante provido para reformar a r. decisão que julgou o procedimento como dúvida – Determinação, porém, de comunicação do registro à Prefeitura Municipal para que tenha ciência da transmissão da propriedade do imóvel, uma vez que o título não foi instruído com a prova do recolhimento do ITBI.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

1. Trata-se de recurso interposto por Washington Rosário de Alencar e Comercial Construções e Serviços Blanchard Ltda. contra r. decisão do MM. Juiz Corregedor Permanente que em pedido de providências formulado pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itaquaquecetuba determinou a recusa do registro da Carta de Arrematação n° 20/2009 que foi expedida no Processo n° 1.373/2005 da 1ª Vara do Trabalho de Itaquaquecetuba.

Os recorrentes, em preliminar, arguiram a nulidade do procedimento porque não foram previamente citados, o que impediu o exercício do contraditório e da ampla defesa. Ademais, somente a empresa arrematante, Comercial, Construções e Serviços Blanchard Ltda. tem legitimidade para a ação. No mais alegaram que existe coisa julgada porque o Juízo do Trabalho determinou o registro da carta de arrematação por meio de ordem que não pode ser modificada pelo Juiz Corregedor Permanente, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Asseveraram que a carta de arrematação foi expedida pela autoridade competente e que a arrematação não era impedida pelas penhoras que incidiam sobre o imóvel por se tratar de forma originária de aquisição da propriedade. Aduziram que o pagamento do ITBI e dos emolumentos foi comprovado na ação trabalhista. Esclareceram que o imóvel foi vendido depois da arrematação e que a vedação do registro impedirá a transmissão da propriedade ao seu adquirente.

A douta Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo reconhecimento da competência da Corregedoria Geral da Justiça, por não se tratar de procedimento de dúvida, e pela determinação de cancelamento do registro da carta de arrematação (fls. 901/903).

Opino.

2. Em atendimento ao que foi requerido às fls. 117, foi determinada, às fls. 118, intimação dos anteriores proprietários, Gilmar Ferreira de Souza e Maria Guerra de Souza, assim como do arrematante do imóvel, sendo as intimações realizadas pelo Correio exceto no que tange à Gilmar que não recebeu a correspondência que lhe foi encaminhada (fls. 124/126).

O recorrente Washington Rosário de Alencar interveio no procedimento de forma voluntária, sem ser intimado para tal finalidade, razão pela qual não tem interesse para alegar ilegitimidade de parte.

Ademais, o presente procedimento tem natureza puramente administrativa, motivo pelo qual o Código de Processo Civil é aplicável somente de forma supletiva.

Diante disso, em relação a Washington não há que se falar em ilegitimidade de parte para recorrer.

3. Cuida-se de procedimento instaurado mediante comunicação ao MM. Juiz Corregedor Permanente, pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itaquaquecetuba, de que em 3 de setembro de 2010 promoveu o registro da Carta de Arrematação n° 20/2009, expedida pela 1ª Vara do Trabalho de Itaquaquecetuba na Reclamação Trabalhista n° 01373200534102000 (1.373/2005).

Informou que a Carta de Arrematação foi inicialmente apresentada para registro em 27 de outubro de 2009 e teve qualificação negativa, com expedição de nota de devolução, porque:

a) o imóvel arrematado, objeto da matrícula n° 3.435, foi penhorado em favor da União e do INSS, o que o tornou indisponível;

b) na carta de arrematação constou como executado Gilmar Ferreira de Souza, sem referência à sua esposa, Maria Guerra de Souza, e sem os demais dados de qualificação dos proprietários do imóvel;

c) na Carta de Arrematação o imóvel é descrito como tendo duas construções que não estavam averbadas, não sendo apresentados o “habite-se” expedido pela Prefeitura do Município e a Certidão Negativa de Débitos expedida pelo INSS;

d) o arrematante não estava qualificado de forma completa (fls. 02/03).

Esclareceu que a Carta de Arrematação foi novamente protocolada com aditamento consistente em ordem do Juízo do Trabalho, que a expediu, para que o registro fosse efetuado no prazo de 48 horas, independentemente de retificação do título, sob pena de caracterização de crime de desobediência (fls. 03).

Disse que em razão disso promoveu o registro da Carta de Arrematação que, porém, continuou não atendendo aos requisitos para a prática do ato, razão pela qual comunicou os fatos ao MM. Juiz Corregedor Permanente visando a adoção de eventuais providências cabíveis (fls. 02/08).

4. A r. decisão recorrida julgou o procedimento como se consistente em dúvida imobiliária, o que fez para manter negativa de registro do título (fls. 91/91-A e verso).

Entretanto, promovido o registro da carta de arrematação, resta verificar se é passível de cancelamento por nulidade de pleno direito (art. 214 da Lei n° 6.015/73).

A declaração da nulidade de registro depende da observação do contraditório e ampla defesa, como previsto no parágrafo 1º do art. 214 da Lei n° 6.015/73: “§1°_A nulidade será decretada depois de ouvidos os atingidos”.

Esse requisito encontra-se, agora, atendido com as intimações dos anteriores proprietários do imóvel e de seu arrematante.

Por essa razão, embora a decisão recorrida não tenha determinado o cancelamento do registro da carta de arrematação, neste caso concreto mostra-se possível a apreciação da matéria desde logo.

5. A certidão de fls. 42/43 demonstra que o imóvel objeto da matrícula n° 3.435 do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Itaquaquecetuba, que era de propriedade de Gilmar Ferreira de Souza e Maria Guerra de Souza, foi penhorado e arrematado em ação trabalhista movida contra a empresa Fundações Ferreira de Souza S/C Ltda., com registro da Carta de Arrematação em 3 de setembro de 2010 (R.3, fls. 43 e verso).

O registro da Carta de Arrematação, como se verifica às fls. 44, 375, 377, 539 e 540, foi promovido por determinação do E. Juízo da ação trabalhista que, na esfera jurisdicional, afastou os óbitos opostos pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis ao decidir:

“A Carta de Arrematação foi expedida com os dados constantes nos autos, razão porque não há o que ser retificado.

Expeça-se oficio ao Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos Civil de Pessoa Jurídica e Civil de Itaquaquecetuba, para que averbe a carta de arrematação n° 20/2009 no imóvel matriculado sob nº 3.435, no prazo de 48 horas, alertando-o que não lhe compete questionar a ordem deste juízo.

Desentranhe-se a Carta de Arrematação de fls. 79 e encaminhe-a juntamente com o oficio.

Em caso de omissão, será oficiado o Ministério Público Federal para apuração de eventual crime de desobediência.

Nada Mais” (fls. 540).

Apesar de não indicar de forma específica as razões do afastamento dos óbices opostos ao registro, a r. decisão do MM. Juiz do Trabalho é expressa no sentido de que não eram impeditivos do registro e prevalece porque foi prolatada na esfera jurisdicional, sobrepondo-se, portanto à qualificação realizada em atividade administrativa. Nesse sentido são os precedentes recentes desta Eg. Corregedoria Geral da Justiça como se verifica no r. parecer apresentado pela MM. Juíza Assessora da Corregedoria, Dra. Tatiana Magosso, no Recurso Administrativo n° 1045301-51.2017.8.26.0100, que foi aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, o Desembargador Pereira Calças, em 29/11/2017:

“Em que pesem os argumentos do recorrente, não se cuida de endossar qualquer ilegalidade e tampouco qualquer ato criminoso nesta esfera administrativa.

Cuida-se de verificar, objetivamente, se a conduta do Registrador implicou ou não inobservância das normas vigentes. E a resposta é negativa.

O atento registrador, quando prenotou a carta de sentença expedida em ação de adjudicação compulsória, procedeu à qualificação do título judicial, recusando o registro a teor de haver ofensa ao princípio da continuidade (nota de devolução de fls. 128/129).

Entretanto, deparou-se com a reapresentação do título, desta vez acompanhado de ordem judicial expressa no sentido de que o registro deveria ser realizado, sob pena de multa diária (fls. 130).

Sobre o tema, confira-se brilhante exposição do i. magistrado Gustavo Henrique Bretas Marzagão, em parecer aprovado pelo em. desembargador Hamilton Elliot Akel, nos autos do Proc. CG n. 167.709/2013:

“Distinguem-se título e ordem judicial.

O título judicial, embora com alguma mitigação (CSM: Apelação Cível n° 1025290-06.2014.8.26.0100, relator Des. Elliot Akel), também se sujeita à qualificação do registrador. Já a ordem judicial, salvo hipóteses excepcionais de patente ilegalidade, tem de ser necessariamente cumprida, sob pena de desobediência.

Assim, ao receber um título judicial (formal de partilha, certidão de penhora, carta de arrematação), o registrador – respeitados alguns limites como, por exemplo, a não incursão no mérito judicial – é livre para qualificá-lo negativamente sem que isso configure descumprimento de ordem judicial.

Todavia, se o MM. Juízo que expediu o título examinar e afastar a recusa do registrador e, ato contínuo, determinar-lhe a ingresso no registro de imóveis, o que antes era um título torna-se uma ordem judicial, cujo cumprimento não pode ser postergado, sob pena de desobediência” (CGJSP: 12.566/2013, DJ: 07/03/2013, Relator: José Renato Nalini).

Exatamente a hipótese do caso em exame, em que, após qualificação negativa do título judicial, sobreveio decisão judicial que afastou as razões do Registrador e determinou o ingresso registral.

Com o advento da ordem judicial, superada a fase de qualificação do título, não restando outra alternativa ao Registrador que não cumpri-la e, assim, promover o registro do título.

Não se ignoram as nulidades decorrentes de possível prática delitiva. Entretanto, a questão deverá ser solucionada na esfera adequada, ou seja, mediante recurso perante o Tribunal de Justiça local, tirado da decisão que ensejou o registro, sem prejuízo de eventual ação autônoma. De qualquer forma, na esfera administrativa não há nenhuma outra providência a ser tomada, não sendo possível falar sequer em bloqueio da matrícula nesta sede, uma vez que o registro foi decorrente do estrito cumprimento de ordem judicial.

Desse modo, eventual impugnação ao registro da carta de arrematação, visando sua anulação ou outra providência, deverá ser promovida por meio de ação própria.

6. Por outro lado, em relação aos óbices apontados verifica-se que o MM. Juiz do Trabalho determinou a comunicação da arrematação ao Juízo das Execuções Fiscais movidas pela União e pelo INSS (fls. 42-verso e 82/84) e que não foi promovida a averbação das construções existentes no terreno, das quais não foram apresentados o “habite-se” e a certidão negativa de débitos do INSS (fls. 43-verso).

Resta, entretanto, a obrigação do Oficial de Registro de Imóveis fiscalizar o recolhimento do Imposto de Transmissão “inter vivos” – ITBI, pois a guia não acompanhou a carta de arrematação.

Por esse motivo, deverá o Oficial de Registro de Imóveis comunicar o registro da Carta de Arrematação à Prefeitura do Município de Itaquaquecetuba, esclarecendo que o fez por ordem da Justiça do Trabalho, para que o Município adote as providências que forem cabíveis em relação ao referido imposto.

Por fim, não havendo decisão da Justiça do Trabalho, pode o Oficial de Registro de Imóveis promover pelas vias próprias a cobrança dos emolumentos que forem devidos, na forma da Lei Estadual n° 11.331/2002, pelo registro da carta de arrematação, pois esses emolumentos não se confundem com as custas processuais pagas pelo arrematante na ação trabalhista.

7. Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de dar provimento ao recurso para afastar a r. decisão relativa à recusa do registro do título, com determinação para que o Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itaquaquecetuba comunique o registro da Carta de Arrematação, feito por ordem da Justiça do Trabalho, à Prefeitura do Município de Itaquaquecetuba para que possa adotar as providências que entender cabíveis em relação ao recolhimento do Imposto de Transmissão “inter vivos” – ITBI.

Sub censura.

São Paulo, 15 de agosto de 2018.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria por seus fundamentos, que adoto, e nego provimento ao recurso com determinação para que o Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itaquaquecetuba comunique o registro da Carta de Arrematação, feito por ordem da Justiça do Trabalho, à Prefeitura do Município de Itaquaquecetuba para que possa adotar as providências que entender cabíveis em relação ao recolhimento do Imposto de Transmissão “inter vivos” – ITBI. Competirá ao MM. Juiz Corregedor Permanente dar ciência do parecer, e desta decisão, ao Sr. Oficial de Registro de Imóveis. Intimem-se. São Paulo, 16 de agosto de 2018. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: BENCE PAL DEAK, OAB/SP 95.409 e VERUSCA SEMINATE LOURENÇO, OAB/SP 254.144.

Fonte: INR Publicações

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