CSM/SP: Registro de imóveis – Apelação – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de carta de sentença notarial – Promessa de doação constante de separação consensual homologada judicialmente – Necessidade de lavratura de escritura pública – Desprovimento do recurso.


  
 

Apelação n° 1002967-74.2019.8.26.0506

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1002967-74.2019.8.26.0506
Comarca: RIBEIRÃO PRETO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1002967-74.2019.8.26.0506

Registro: 2020.0000211826

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1002967-74.2019.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante MÁRCIO FERNANDES SILVA, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE).

São Paulo, 16 de março de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1002967-74.2019.8.26.0506

Apelante: Márcio Fernandes Silva

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto

VOTO Nº 31.114.

Registro de imóveis – Apelação – Dúvida julgada procedente – Negativa de registro de carta de sentença notarial – Promessa de doação constante de separação consensual homologada judicialmente – Necessidade de lavratura de escritura pública – Desprovimento do recurso.

1. MARCIO FERNANDES SILVA interpõe apelação contra a r. sentença de fl. 113/124, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 1º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto, São Paulo, para o fim de manter a recusa de acesso do título – carta de sentença notarial expedida pelo 1º Tabelião de Notas e Protestos de Limeira/SP, extraída da ação de separação judicial consensual, autos do processo n.º 1957/1992, que tramitou perante a 6ª Vara Cível de Ribeirão Preto – ao sistema registrário.

A Nota de Devolução indicou como motivos de recusa do ingresso do título (fl. 08):

“Trata-se de carta de sentença notarial, extraída dos autos da ação de separação judicial consensual do casal José Pereira Viana e Zenaide Gonçalves Dias Viana, conforme processo n.º 1.957/92 da 6ª Vara Cível desta Comarca, cuja qualificação resultou na seguinte exigência a saber:

Conforme acordo feito pelo extinto casal, constante das fls. 02 e 03v da carta de sentença, a nua propriedade do prédio n.º 1.365 da Rua Maracajú, matriculado sob n.º 64.061 nesta serventia, será doada por escritura pública aos filhos Henrique Gonçalves Dias Viana; Erica Gonçalves Dias Viana e Helton Gonçalves Dias Viana, com reserva de usufruto vitalício em favor da cônjuge varoa Zenaide Gonçalves Dias.

Portanto, necessária se faz a apresentação da escritura lavrada em cumprimento ao acordo possibilitando a transferência do imóvel”.

O Apelante, por seu turno, sustenta que o acordo foi homologado judicialmente por sentença transitada em julgado e que a carta de sentença é apta ao registro; preclusão quanto à cobrança do tributo; e, aplicabilidade do princípio da cindibilidade, pugnando, ao final, pelo provimento do recurso.

A D. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo desprovimento da Apelação (fl. 196/198).

É o relatório.

2. De proêmio, cumpre frisar que os títulos judiciais também não escapam ao crivo da qualificação registral, de modo que o registrador deverá examinar se estão atendidos os princípios registrais pertinentes ao caso, para seu perfeito ingresso no fólio real.

Pois bem.

Consoante se infere da cláusula denominada “dos bens” da exordial da ação de separação judicial consensual de Zenaide Gonçalves Dias Viana e José Pereira Viana (fl. 38/43):

“o casal possui um imóvel residencial, que ficará inteiramente para a esposa e filhos”.

Na mesma petição, contudo, foi incluída expressamente a seguinte cláusula:

“Em tempo: Fica retificada a cláusula acerca da partilha do único bem imóvel. Este ficará pertencendo unicamente aos filhos do casal, na sua nua propriedade. Quanto ao usufruto do imóvel ficará para a requerente unicamente, devendo a escritura respectiva ser outorgada em 60 dias” (fl. 43).

O acordo foi homologado judicialmente em 22 de dezembro de 1992 (fl. 58) e o trânsito em julgado foi certificado em 17 de março de 1993 (fl. 62).

A questão cinge-se, pois, à possibilidade de registro da referida carta de sentença sem a necessidade da lavratura de escritura pública de doação.

Não se ignora a existência de precedentes deste Conselho Superior da Magistratura no sentido de ser dispensada a lavratura do ato notarial quando a avença já passou pelo crivo do Poder Judiciário.

É o que se observa do teor da ementa da

Apelação n.º 1000762-62.2014.8.26.0663, cujo relator foi o então Corregedor Geral da Justiça, Manoel de Queiroz Pereira Calças:

“Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente, impedindo-se o registro de Carta de Sentença, oriunda de separação judicial, com doação de imóvel a filha menor – Desnecessidade de escritura pública – Precedentes – Desnecessidade de aceitação da donatária (art. 543 do Código Civil) – Não incidência de emolumentos, por haver gratuidade expressamente exposta no título – Necessidade, contudo, de recolhimento dos tributos – Dúvida prejudicada e recurso não conhecido.”

Contudo, o caso em análise é diverso.

Isto porque o acordo homologado judicialmente prevê expressamente a necessidade de lavratura de escritura pública para a doação do bem, vinculando, assim, a transmissão do domínio à lavratura do ato notarial.

Trata-se, em realidade, de promessa de doação, não havendo, pois, título hábil a registro.

Neste sentido:

“FORMAL DE PARTILHA – Partilha incompatível com o instrumento particular de cessão de direitos hereditários, também homologado nos autos do inventário, porque este incluiu herdeira que, posteriormente, renunciou a seu quinhão hereditário – Homologação de cessão de direitos hereditários que previa lavratura de escritura pública para formalizar a permuta de imóveis – Partilha registrada e cessão de direitos hereditários recusada – Princípio da continuidade – Dúvida julgada procedente Recurso não provido”. (APELAÇÃO CÍVEL: 0003920-58.2015.8.26.0615, RELATOR: MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS).

Além disso, não se observa da carta de sentença notarial a qualificação completa dos donatários do imóvel, tampouco o valor pelo qual o bem teria sido transferido aos filhos dos separandos, em desacordo com o que dispõe o Art. 176, §1º, III, 2 e 5, da Lei n.º 6015/73, de modo que não colhe o alegado princípio da cindibilidade.

A pretensão de registro apenas da doação direta aos filhos, sem registro do usufruto uma vez ser a usufrutuária já falecida, como pretende o recorrente, ademais, burlaria o princípio da continuidade registrária.

Ainda que assim não fosse, certo é que o Registrador sustenta que o original da certidão de óbito da falecida usufrutuária não foi apresentado, o que impede a averbação do óbito e eventual análise da extinção do usufruto.

Ultrapassados estes pontos, a observação do Registrador no sentido de que seria necessária a apresentação do comprovante de recolhimento do imposto de transmissão, constante apenas da petição de suscitação da dúvida, é decorrência da nota devolutiva de fl. 08 e da Lei n.º 6.015/73.

Constitui, pois, dever do Registrador a fiscalização do regular recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados, sob pena de responsabilização pessoal.

É o que dispõe o Art. 289 da Lei n° 6.015/73:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode, inclusive, levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do Art. 134, VI, do Código Tributário Nacional.

Vale destacar, no ponto, precedente deste Conselho Superior da Magistratura:

“Registro de Imóveis – Formal de Partilha Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias, o que não ocorreu em relação a todos os herdeiros – Ausência de discussão quanto ao acerto do cálculo, mas sim ao não recolhimento do tributo, mesmo em valor supostamente inferior ao devido – Cindibilidade do título Impossibilidade – Indeterminação do que tenha sido partilhado e a quem – Recurso desprovido.” (Apelação nº 1000506-36.2018.8.26.0128, Geraldo Francisco Pinheiro Franco).

Por esta razão, também, o registro da carta de sentença notarial encontra óbice.

3. Ante o exposto, nego provimento à apelação.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (DJe de 14.04.2020 – SP)

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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