Agravo de Instrumento – Decisão que deferiu pedido formulado pelos inventariantes, ora agravados, no sentido de que fosse deduzido, da base de cálculo do ITCMD, o valor da dívida do espólio – Impossibilidade da exclusão das dívidas do espólio da base de cálculo do imposto estadual – Norma do artigo 12 da LE nº 10705/00 que se aplica ao caso, não convencendo a tese de que mencionado dispositivo legal teria sido revogado pela LF nº 13105/15 – Recurso provido.


  
 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 3005699-86.2021.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante ESTADO DE SÃO PAULO, são agravados PAULO EDUARDO CAMPANELLA EUGENIO, JOAO PAULO CAMPANELLA EUGENIO e MARIA JOSE FERREIRA CAMPANELLA (ESPÓLIO).

ACORDAM, em 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, vencido o Segundo Juiz, que declarará.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COIMBRA SCHMIDT (Presidente) E MOACIR PERES.

São Paulo, 21 de março de 2022.

LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Agravo de Instrumento nº 3005699-86.2021.8.26.0000

Agravante: Estado de São Paulo

Agravados: Paulo Eduardo Campanella Eugenio, Joao Paulo Campanella Eugenio e Maria Jose Ferreira Campanella

Comarca: São Paulo

Voto nº 22701

AGRAVO DE INSTRUMENTO – Decisão que deferiu pedido formulado pelos inventariantes, ora agravados, no sentido de que fosse deduzido, da base de cálculo do ITCMD, o valor da dívida do espólio – Impossibilidade da exclusão das dívidas do espólio da base de cálculo do imposto estadual – Norma do artigo 12 da LE nº 10705/00 que se aplica ao caso, não convencendo a tese de que mencionado dispositivo legal teria sido revogado pela LF nº 13105/15 – Recurso provido.

Vistos, etc.

Cuida-se de agravo de instrumento interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo contra decisão que, nos autos de inventário deferiu pedido formulado pelos inventariantes, ora agravados, no sentido de que fosse deduzido, da base de cálculo do ITCMD, o valor da dívida do espólio. O pedido de concessão do efeito suspensivo foi indeferido. Veio contraminuta.

É o relatório.

Diga-se, inicialmente, que compete à Seção de Direito Público o julgamento das “ações e execuções de natureza fiscal ou parafiscal de interesse da Fazenda do Estado e de suas autarquias e contribuições sindicais”, nos termos da regra do artigo 3º, I.8, da Resolução nº 623/13 do Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça de São Paulo. Neste sentido, colhe a interpretação autêntica no sentido do reconhecimento da competência desta Seção de Direito Público:

Conflito negativo de competência. Ribeirão Preto. Mandado de segurança. ITCMD. Base de cálculo. Matéria eminentemente fiscal. Ausência de relação de direito sucessório. Objeto preponderante da ação que se insere na competência da Seção de Direito Público desta Corte. Inteligência do art. 3º, I, item I.8, da Resolução n. 623/2013, deste Tribunal de Justiça. Conflito procedente. Competência da 2ª Câmara de Direito Público, suscitada. (TJSP; Conflito de competência cível 0009186-18.2021.8.26.0000; Relator: Antonio Celso Aguilar Cortez; Órgão Julgador: Órgão Especial; Foro de Ribeirão Preto – 2ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 16/06/2021; Data de Registro: 17/06/2021)

Ao que se colhe da regra do artigo 12 da Lei Estadual nº 10705/00, “no cálculo do imposto, não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem as do espólio”.

E faz sentido, diante da descrição do fato gerador (art. 2º, I, da LE nº 10705/00), a referida disposição legal, havendo de se considerar, ainda, a norma do artigo 118, I, segunda parte, e II, da Lei Federal nº 5172/66. Nesse diapasão, colhe entendimento deste E. Tribunal de Justiça de São Paulo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – Inventário – Insurgência contra decisão que indeferiu o pedido de abatimento das dívidas incidentes sobre o imóvel da base de cálculo do ITCMD – Impossibilidade – Compensação vedada pela Lei Federal nº 10705/2000, artigo 12 – Decisão mantida – Recurso não provido. (5ª Câmara de Direito Privado, Recurso nº 2018893-73.2021.8.26.0000, Rel. Des. Erickson Gavazza Marques, j. 24/3/2021)

INVENTÁRIO – Recolhimento de ITCMD – Abatimento das dívidas existentes em nome do espólio da base de cálculo do tributo – Inadmissibilidade – Lei Estadual nº 10705/00, em seu artigo 12, que veda a exclusão das dívidas do espólio do cálculo do imposto – Direito tributário que é regido pelo princípio da legalidade (artigo 150, I, da Constituição da República) – Imposto Sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de competência atribuída aos Estados e ao Distrito Federal, de maneira que a Lei Estadual constitui instrumento idôneo para estabelecer o regramento pertinente à exação – Redução da base de cálculo do imposto que configura matéria reservada à lei, por força do artigo 150, § 6º, da Magna Carta – Exclusão das dívidas do espólio da base de cálculo do tributo que se revela inviável diante da inexistência de previsão legal – Decisão reformada – Recurso provido no ponto. (6ª Câmara de Direito Privado, Recurso nº 3000214-13.2018.8.26.0000, Rel. Des. Vito Guglielmi, j. 19/3/2018)

AGRAVO REGIMENTAL – Decisão proferida em agravo de instrumento – Ação de inventário – Incidência do ITMCD – Inventário com saldo negativo – Inexistência de transferência patrimonial – Falecido que deixou bens, dívidas e herdeiros – Aplicação da regra contida no artigo 12, da Lei 10705/00: “No cálculo do imposto, não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem as do espólio.” – Decisão mantida por seus próprios fundamentos – Agravo Regimental não provido. (5ª Câmara de Direito Privado, Recurso nº 2200465-06.2014.8.26.0000, Rel. Des. Edson Luiz de Queiróz, j. 18/3/2015)

Enfim, ao que se vê, as dívidas do espólio não interferem com o fato gerador, objeto da regra do artigo 2º, I, da Lei Estadual nº 10705/00.

Inegável que alguns julgamentos, particularmente nas Câmaras de Direito Público, orientam-se no sentido de que a norma do artigo 12 da LE nº 10705/00 teria sido tacitamente revogada pela regra dos artigos 1792 e 1997, ambos do Código Civil, porque incompatível com estas duas disposições. Entretanto, é bem de ver que, embora o pagamento do tributo se dê, no caso, porque houve a transmissão da propriedade, o fisco não atua como credor do espólio, tanto assim que o valor do tributo não consta das primeiras declarações, a que se refere a regra do artigo 620, IV, “f”, do Código de Processo Civil.

Nestes termos, dou provimento ao recurso.

LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA

Relator

VOTO Nº 34.698 (Processo digital)

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 3005699-86.2021.8.26.0053 de São Paulo

AGRAVANTE: ESTADO DE SÃO PAULO

AGRAVADOS: PAULO EDUARDO CAMPANELLA EUGÊNIO E OUTROS

DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO

Divergi da douta maioria, pois negava integral provimento ao recurso de agravo de instrumento, pelas razões a seguir expostas.

O art. 12 da Lei nº 10.705/2015 estabelece que no cálculo do referido imposto não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem as do espólio.

Entretanto, o dispositivo não se coaduna com o artigo 38 do Código Tributário Nacional, que prevê que a base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos.

Ademais, o artigo 12 da Lei nº 10.705/2015 deve ser analisado em conjunto com as disposições dos artigos 35, I, do Código Tributário Nacional e dos artigos 1.792 e 1.997 do Código Civil, que estabelecem:

“Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:

I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;

“Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados.

“Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube”.

Assim, o ITCMD deve incidir apenas sobre os bens transmitidos aos herdeiros, excluindo-se os valores utilizados para pagamento das dívidas do espólio.

Observa-se, portanto, que o artigo 12 da Lei Estadual nº 10.705/2000 é incompatível com normas federais posteriores, pois, nos termos do artigo 2º, § 1º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

A respeito do tema, já decidiu o Colendo E. Supremo Tribunal Federal:

“À luz das lições colacionadas, impõe-se a seguinte conclusão: se o imposto é sobre transmissão de patrimônio, a base de cálculo deve ser uma medida do patrimônio (que será o patrimônio transferido). Os impostos incidem sobre signos presuntivos de riqueza. O universo tributável deve corresponder à uma mensuração da riqueza auferida. Tributar fato alheio à riqueza, a título de imposto, importa em confisco. Se a base de cálculo não corresponde ao acréscimo no universo patrimonial daquele que figura como contribuinte, a conclusão é óbvia: a base de cálculo não se coaduna com a hipótese de incidência. Ao vedar as deduções, a lei estadual impede a tributação sobre a transmissão do patrimônio líquido (quantum efetivamente transmitido) e assim deforma a regra matriz de incidência. Não foi por outro motivo que esta Corte já se posicionou no sentido de que a base de cálculo é o montante líquido da herança” (AgRg no Agravo de Instrumento nº 733.976/RS, Relator Ministro Dias Toffoli, 1ª Turma, Data de Julgamento 11/12/2012).

Nesse sentido, este E. Tribunal de Justiça já decidiu:

“APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. Base de cálculo do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD). Artigo 12 da Lei Estadual nº 10.705/00 que determina a incidência do imposto sobre a integralidade do espólio, vedado o abatimento de dívidas. Impossibilidade. ITCMD que tem como fato gerador a transmissão dos bens e direitos aos herdeiros. Artigo 155,inciso I, da Constituição Federal e artigo 38 do Código Tributário Nacional. Apenas o patrimônio líquido que é transferido aos herdeiros. Capacidade contributiva. Hipótese de incidência do imposto que deve guardar relação com o acréscimo econômico ao patrimônio dos contribuintes. Incidência do ITCMD sobre o passivo do espólio que distorce a hipótese de incidência e a base de cálculo do imposto. Sentença mantida. Recurso voluntário e reexame necessário improvidos.” (Apelação nº 1001129-96.2020.8.26.0042; Comarca de Ribeirão Preto; 5ª Câmara de Direito Público; Relatora Maria Laura Tavares; Data de Julgamento 12.11.2021).

“Mandado de Segurança. ‘Imposto sobre Transmissão ‘Causa Mortis’ e Doação’ ITCMD (artigo 155, inciso I, da Constituição Federal, e Lei estadual nº 10.705, de 28 de dezembro de 2000). Impetrante que busca a declaração de inexigibilidade do ITCMD “causa mortis” sobre o valor venal de imóvel objeto de contrato de financiamento, com cláusula de alienação fiduciária, pendente de pagamento. Base de cálculo do ITCMD que deve corresponder aos bens efetivamente transmitidos, com a exclusão das dívidas do espólio. Inteligência dos artigos 1.792, 1.847 e 1.997, todos do Código Civil. Inaplicabilidade da regra contida no art. 12 da Lei Estadual nº 10.705/00, a qual conflita com as normas civis que regem a sucessão. Precedentes desta Corte. Sentença que concede a segurança. Reexame necessário, único interposto, improvido.” (Remessa Necessária Cível 1030698-46.2019.8.26.0053; Comarca de São Paulo; 11ª Câmara de Direito Público; Relator Aroldo Viotti;; Data do Julgamento: 09/06/2020).

Assim, era o caso de ser negado o recurso de agravo de instrumento, mantendo-se a r. decisão prolatada em primeiro grau.

Ante o exposto, negava provimento ao recurso de agravo de instrumento.

MOACIR PERES – – /

Dados do processo:

TJSP – Agravo de Instrumento nº 3005699-86.2021.8.26.0000 – São Paulo – 7ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Luiz Sergio Fernandes de Souza – DJ 04.04.2022

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito