ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1125618-89.2024.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante EDSON BAFFA DA CUNHA, é apelado O JUIZO.
ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores RAMON MATEO JÚNIOR (Presidente) E COSTA NETTO.
São Paulo, 18 de fevereiro de 2025.
VITO GUGLIELMI
Relator(a)
VOTO Nº 64.448
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1125618-89.2024.8.26.0100
RELATOR : DESEMBARGADOR VITO GUGLIELMI
APELANTES : EDSON BAFFA DA CUNHA
APELADO : O JUÍZO
COMARCA : SÃO PAULO / SANTO AMARO – 14ª VARA CÍVEL
REGISTRO CIVIL. RETIFICAÇÃO. PRETENDIDA EXCLUSÃO DE SOBRENOME PATERNO. DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA ABSTRATA DE CONSTRANGIMENTO PELO USO DO NOME DE FAMÍLIA ‘DA CUNHA’. PRECEDENTES DO TJSP. CASO EM QUE A SUPRESSÃO IMPLICARIA PREJUÍZO À ANCESTRALIDADE DO REQUERENTE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Trata-se de apelo, tempestivo e bem processado, interposto contra sentença que julgou improcedente a ação de retificação de registro civil proposta por Edson Baffa da Cunha.
Busca o demandante a exclusão do patronímico do pai biológico “Da Cunha”, para fins de obtenção de cidadania portuguesa.
Quando da prolação da sentença (fls. 59/61), considerou o magistrado monocrático que a pretensão do autor, ao tentar alterar o sobrenome de ascendente sem repercussão em todos os descendentes que possuem o sobrenome respectivo, viola o princípio da continuidade e da uniformidade registral. Ponderou, ainda, que a pretensão da autora não trata da usual hipótese de erro na grafia de sobrenome estrangeiro, mas sim em remover o sobrenome “DA CUNHA” de seus ascendentes que, embora de origem desconhecida, não detém erro evidenciado, para que seja justificável a flexibilização do registro civil. De conseguinte, julgou improcedente o pedido.
Opostos embargos de declaração (fls. 64/67), que foram parcialmente acolhidos (fls. 72/73).
Inconformado, recorre o demandante (fls. 76/90). Alega que o sobrenome “DA CUNHA” surgiu no nome de seu avô, Victorino Barbosa, sem qualquer explicação de fato. Além de não ser o sobrenome de nenhum de seus pais, também não pertencia à sua esposa, não havendo qualquer explicação fática para o acréscimo desse sobrenome após a vida adulta. Pondera que foi demonstrado, por meio da certidão portuguesa do assento de nascimento de Victorino Barbosa, a não existência do sobrenome “DA CUNHA”, nem em seu nome, nem em nome de seus pais. Conclui pela reforma.
Recurso processado à fl. 94.
Manifestação do Ministério Público, reiterando a ausência de interesse no feito (fls. 56/57 e 97).
É o relatório.
2. Cuida-se de ação de retificação de registro civil julgada improcedente. Sobreveio, então, o recurso de apelação ora em apreço, o qual, sem embargo das razões expostas, não está a comportar provimento.
Malgrado a própria Lei de Registros Públicos, nos seus artigos 56 a 58, assente o caráter definitivo do nome – a incluir tanto o prenome, quanto os patronímicos ou apelidos de família (cf.: W. CRUZ SWENSSON et al., Lei de Registros Públicos Anotada, 4ª Ed., São Paulo, Juarez de Oliveira, 2006, p. 148) –, passou-se a reconhecer, em tempo mais recente, a possibilidade de sua alteração, desde que justificada.
Aliás, na realidade, a tendência à constituição de exceções casuísticas à imutabilidade do nome vinha desde R. LIMONGI FRANÇA (Do Nome Civil das Pessoas Naturais, 2ª Ed., São Paulo, RT, 1964, p. 252) que já alertava, no mesmo sentido, que para a admissão dessas alterações “é mister que concorram razões não só de utilidade como de conveniência evidente, e ainda, é claro, que o pedido de modificação não esconda intuito fraudulento”.
Logo, do panorama brevemente delineado pela doutrina, vê-se que, fundamentalmente, resguardada a inalterabilidade relativa do nome, eventuais modificações devem ser devidamente circunstanciadas, cabendo ao juízo competente, pois, a avaliação do mérito das justificativas apresentadas, em atenção, inclusive, à necessária inexistência de eventual lesão ao interesse de terceiros como decorrência da alteração pleiteada.
Pois bem. No caso dos autos, conquanto não se vislumbre, a princípio, eventuais prejuízos a terceiros; não só não se antevê, em abstrato, a possibilidade de qualquer constrangimento decorrente do uso do sobrenome, como a pretensão veiculada, ao limitar-se a pedido de exclusão do patronímico paterno, acarreta prejuízo à ancestralidade e à identificação do tronco familiar do requerente.
Assim, é de se ver que a singela supressão do nome “da Cunha” acarretaria evidente prejuízo à identificação familiar do autor. Aliás, “homonímia” seria muito mais frequente em caso de supressão do patronímico, uma vez que se trata de elemento constitutivo de sua identidade.
Lembre-se, na esteira do que já se consolidou, que “transcendendo a mera individualidade, é o patronímico indisponível, exigindo a lei que, em caso de alteração, não venha a ser prejudicado, como irremediavelmente ocorrerá com a supressão. O indivíduo não pode dispor daquilo que pertence a todo o grupo familiar, como entidade” (TJSP, Ap. Cível nº. 218.916-1, 4ª Câmara Civil, Rel. Cunha Cintra, j. 01.12.1994).
Daí que, não se verificando a existência em abstrato de possível constrangimento pelo uso do sobrenome, e dado o prejuízo à identificação familiar com sua supressão, a improcedência do pedido formulado era mesmo de rigor.
Nada mais é preciso dizer.
3. Nestes termos, nega-se provimento ao recurso.
Vito Guglielmi – Relator
Dados do processo:
TJSP – Apelação Cível nº 1125618-89.2024.8.26.0100 – São Paulo – 6ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Vito Guglielmi
Fonte: DJE/SP 14.03.2025.
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.