CSM/SP: Registro de imóveis – Negativa de Registro de Escritura Pública de venda e compra – Menção expressa e pormenorizada, na própria escritura, relativa ao pagamento do imposto e do documento apresentado para lavratura do ato – Suficiência assentada – Exigência de apresentação de prova do pagamento de ITBI afastada – Partes individualizadas na escritura – Perfeita identificação daqueles que estão transmitindo e adquirindo direito no registro de imóveis – Ofensa ao princípio da especialidade subjetiva não configurada – Exigência de apresentação de cópias autenticadas dos documentos pessoais das partes afastada – Irregularidade na representação dos vendedores – Óbice mantido – Apelação não conhecida, em parte, e na parte conhecida, não provida.

Apelação Cível nº 1003663-13.2023.8.26.0590

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1003663-13.2023.8.26.0590
Comarca: SÃO VICENTE

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1003663-13.2023.8.26.0590

Registro: 2024.0000307943

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1003663-13.2023.8.26.0590, da Comarca de São Vicente, em que é apelante ANDREA BALBINA MORAIS, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO VICENTE.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Não conheceram, em parte, a apelação; na parte conhecida, negaram provimento, com observação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 5 de abril de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1003663-13.2023.8.26.0590

APELANTE: Andrea Balbina Morais

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Vicente

VOTO Nº 43.309

Registro de imóveis – Negativa de Registro de Escritura Pública de venda e compra – Menção expressa e pormenorizada, na própria escritura, relativa ao pagamento do imposto e do documento apresentado para lavratura do ato – Suficiência assentada – Exigência de apresentação de prova do pagamento de ITBI afastada – Partes individualizadas na escritura – Perfeita identificação daqueles que estão transmitindo e adquirindo direito no registro de imóveis – Ofensa ao princípio da especialidade subjetiva não configurada – Exigência de apresentação de cópias autenticadas dos documentos pessoais das partes afastada – Irregularidade na representação dos vendedores – Óbice mantido – Apelação não conhecida, em parte, e na parte conhecida, não provida.

Trata-se de apelação interposta por andrea balbina morais alves contra a r. Sentença proferida pelo mm. Juiz corregedor permanente do oficial de registro de imóveis, títulos e documentos e civil de pessoa jurídica de são vicente/sp, que manteve a recusa de registro de escrituras públicas de venda e compra tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 66.932 junto à referida serventia extrajudicial (fls. 79/82).

Em síntese, sustenta a apelante que, na escritura de venda e compra lavrada em 28 de dezembro de 1987, consta a qualificação completa das partes, nela figurando como outorgantes vendedores Eny Alcoforado Pereira e Valério Teófilo Pereira, representados por seu procurador, Sérgio Vicente, e como outorgados compradores Haroldo de Campos e Ida Lourdes de Oliveira Campos, com a indicação da nacionalidade, profissão e o número do registro geral de todos, o que torna desnecessária a apresentação de cópias de seus respectivos documentos de identificação pessoal. Alega que os outorgados vendedores Eny Alcoforado Pereira e Valério Teófilo Pereira estão regularmente representados por Sérgio Vicente, certo que, em consonância com o princípio da verdade notarial, as escrituras gozam de fé pública e presunção de legitimidade. Ante o que ficou expressamente consignado na escritura pública lavrada, afirma que está comprovado o pagamento do ITBI incidente na hipótese concreta. Por fim, diz que não há ofensa ao princípio da especialidade subjetiva e que, uma vez registrada a referida escritura pública de compra e venda, não subsistiria o óbice apresentado em relação ao registro da escritura pública de compra e venda lavrada em 02 de abril de 1997 (fls. 113/128).

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 140/141).

Nos termos da r. decisão (fls. 147), os autos foram redistribuídos a este Colendo Conselho Superior da Magistratura.

É o relatório.

Apresentadas a registro a escritura pública de venda e compra datada de 28/12/1987, lavrada pelo 2º Tabelião de Notas da Comarca de São Vicente/SP, no Livro 514, fls. 143, em que figuram como outorgantes vendedores Eny Alcoforado Pereira e seu marido Valério Teófilo Pereira, representados por Sérgio Vicente, e como outorgados compradores Haroldo de Campos e sua mulher Ida Lourdes de Oliveira Campos (fls. 23/25), bem como a escritura pública de venda e compra datada de 02/04/1997, lavrada pelo 1º Tabelião de Notas da Comarca de São Vicente/SP, no Livro 615, fls. 159, em que figuram como outorgantes vendedores Haroldo de Campos e sua mulher Ida Lourdes de Oliveira Campos e como outorgados compradores Andrea Balbina Morais Alves, ora apelante, e seu marido Henrique Rosa Alves (fls. 26/28), o Oficial de Registro emitiu duas notas devolutivas, cada qual referente a um dos títulos prenotados.

Ora, uma vez prenotada a primeira escritura de venda e compra sob nº 514.918, os demais títulos que ingressaram posteriormente na serventia extrajudicial deveriam obedecer ao disposto no item 37 e no item 45.2, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça quanto à fila de precedência. Ou seja, a qualificação da segunda escritura de venda e compra subordinava-se ao resultado do procedimento de registro da primeira, que gozava de prioridade.

Destarte, a dúvida suscitada em relação às exigências formuladas para registro do título prenotado sob nº 514.919 está prejudicada e a apelação, nesse ponto, não merece ser conhecida, cabendo ao Oficial prosseguir na qualificação registral após o resultado da dúvida suscitada em relação às exigências formuladas para registro do título prenotado com prioridade.

Com relação à escritura pública de venda e compra prenotada sob nº 514.918, o Oficial expediu nota devolutiva com as seguintes exigências:

“1) Apresentar, na via original ou em cópia autenticada, a guia do ITBI e seu respectivo comprovante de recolhimento;

2) Apresentar cópia(s) autenticada(s) do(s) documento(s) de identificação pessoal que contenha(m) os números de RG e CPF, com relação aos vendedores ENY ALCOFORADO PEREIRA e s/m VALÉRIO TEÓFILO PEREIRA, bem como dos compradores HAROLDO DE CAMPOS e s/m IDA LOURDES DE OLIVEIRA CAMPOS;

3) Apresentar certidão da procuração que outorgou poderes à SERGIO VICENTE, tendo em vista que não foi mencionado o livro e as folhas, nem mesmo o tabelionato que a lavrou.”

O MM. Juiz Corregedor Permanente, acertadamente, afastou a primeira exigência, pois a Lei nº 6.015/73 dispõe apenas que o Registrador deve fiscalizar a ocorrência de pagamento dos impostos. De fato, dispõe o art. 289:

“No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

No caso em apreço, consta da escritura pública expressa menção ao recolhimento do ITBI, com descrição detalhada dos dados da guia de recolhimento, valor e local de pagamento (fls. 23/24), o que é suficiente para o atendimento do quanto exigido no artigo de lei acima transcrito. Ademais, o ato foi lavrado ainda no ano de 1987 e a parte não pode sofrer as consequências da ausência de arquivamento do original da guia de recolhimento exigida. Ou seja, trata-se de óbice intransponível e que, portanto, merece ser afastado.

Em caso semelhante, assim decidiu, recentemente, este C. Conselho Superior da Magistratura:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA –  PRETENSÃO DE REGISTRO DE ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E COMPRA DE IMÓVEL – EXIGÊNCIA DO REGISTRADOR PELA APRESENTAÇÃO DA GUIA ITBI – EXISTÊNCIA DE MENÇÃO EXPRESSA E PORMENORIZADA NA PRÓPRIA ESCRITURA A RESPEITO DA LIQUIDAÇÃO DO TRIBUTO E DO DOCUMENTO QUE A COMPROVOU – SUFICIÊNCIA ASSENTADA – EXIGÊNCIA AFASTADA – RECURSO PROVIDO.” (TJSP; Apelação Cível 1001306-66.2023.8.26.0103; Relator (a): Francisco Loureiro(Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Caconde – Vara Única; Data do Julgamento: 01/03/2024; Data de Registro: 05/03/2024).

Também o segundo óbice não merece subsistir, pois na escritura de venda e compra lavrada em 28 de dezembro de 1987, as partes foram assim qualificadas:

Como Outorgantes Vendedores, ENY ALCOFORADO PEREIRA, do lar, RG nº 2.672.921-SSP/SP, e seu marido, VALÉRIO TEÓFILO PEREIRA, estivador, RG nº 2.678.659-SSP/SP, ambos brasileiros, casados sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6515/77, possuidores do CIC nº 160.649.338/87, residentes em Santos, deste Estado, à Rua Alfredo Porchat nº 36; neste ato representados por seu procurador, SÉRGIO VICENTE, brasileiro, casado, comerciante, RG nº 3.284.264-SSP/SP, residente nesta cidade, à Rua Frei Gaspar nº 1715; nos termos da procuração arquivada nestas notas, na pasta 28, sob o nº 110; e, como outorgado comprador, HAROLDO DE CAMPOS, brasileiro, militar, portador do RG nº 142.026-SSP/SP, e CIC nº 215.596.278-91, casado sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6515/77, com Dª. IDA LOURDES DE OLIVEIRA CAMPOS, brasileira, do lar, RG nº 3.867.079-SSP/SP, residente nesta Cidade, no local do imóvel;” (fls. 23).

Por outro lado, na matrícula nº 66.932 do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de São Vicente/SP (fls. 51/54) assim consta:

R.1/Matrícula 66.932 PELA ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E COMPRA, lavrada aos 29/Novembro/1979, nas Notas do 2º Escrivão de São Vicente, livro 336, fls. 11, os proprietários VENDERAM o imóvel, pelo preço de CR$ 26.262,00, a ENY ALCOFORADO PEREIRA, do lar, RG nº 2.672.921, casada sob o regime de comunhão de bens e por quem é assistida neste ato, VALÉRIO TEÓFILO PEREIRA, estivador, RG nº 2678659, ambos brasileiros, residentes em Santos, à rua Alfredo Porchat, nº 36, CIC 160.649.338/87, em conjunto.”

A exigência de apresentação dos documentos pessoais das partes fundamenta-se no princípio da especialidade subjetiva, que visa identificar e individualizar aquele que está transmitindo ou adquirindo algum direito no registro de imóveis, tornando-o inconfundível com qualquer outra pessoa.

Nesse sentido, a ausência de apresentação de cópia autenticada dos documentos de identificação pessoal das partes que lavraram a escritura pública violaria, a priori, o princípio da especialidade subjetiva, pois haveria, eventualmente, dúvida em relação à identidade delas.

Todavia, possível a mitigação deste princípio em hipóteses excepcionais, quando ausente incerteza em relação à qualificação das partes, tal como ocorre no caso em comento, em que, a despeito da ausência do CPF, há perfeita identidade entre os dados constantes da matrícula e aqueles inseridos na escritura pública lavrada.

Sendo assim, é possível afastar a exigência de apresentação de cópia dos documentos pessoais dos vendedores Eny Alcoforado Pereira e Valério Teófilo Pereira, bem como dos compradores Haroldo de Campos e Ida Lourdes de Oliveira Campos, pois suficiente e plena a identificação das partes trazida na escritura de venda e compra, como disposto no art. 176, §1º, inciso II, 4, a e inciso III, 2, da Lei nº 6.015/1973.

A despeito disso, o caso era mesmo de negativa de registro da escritura pública de venda e compra.

Assim se afirma, pois os outorgantes vendedores, Eny Alcoforado Pereira e Valério Teófilo Pereira, estavam representados, no ato, por seu procurador Sérgio Vicente, sem que, no entanto, na escritura tenha havido menção ao livro, folhas e Tabelião que lavrou a procuração. E muito embora esteja constando, na escritura, que essa procuração encontra-se arquivada na serventia, o fato é que o documento a fls. 42 confirma que não foi localizada.

Nesse cenário, é possível concluir que há irregularidade na representação dos vendedores, pois não comprovada a outorga de procuração na forma do art. 657 do Código Civil, segundo o qual o mandato está sujeito à forma exigida em lei para o ato a ser praticado. A propósito, o item 131 do Capítulo XIV, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, estabelece que: “A procuração outorgada para a prática de atos em que exigível o instrumento público também deve revestir a forma pública”.

Em outras palavras, a representação dos vendedores mostra-se irregular, não podendo ser aceita eventual procuração particular para fins de transferência de domínio de imóvel, cujo valor venal (Cz$ 151.215,39), quando da lavratura do ato, superava trinta vezes o salário mínimo da época (CZ$ 3.600,00).

Ante o exposto, pelo meu voto, dou por prejudicada a dúvida suscitada em relação ao título prenotado sob nº 514.919 e, por conseguinte, não conheço, em parte, a apelação interposta. Na parte conhecida, nego provimento à apelação, mantendo a procedência da dúvida suscitada em relação ao título prenotado sob nº 514.918.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 16.04.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP

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CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura de compra e venda – Recusa do registro – Averbação de separação judicial que não deixa claro a quem o imóvel ora alienado foi atribuído – Omissão que não impede o ingresso do título – Inteligência da nota ao item 9, B, 14, do Capítulo XX das NSCGJ – Comprovação, ademais, que houve a partilha igualitária do bem por ocasião da separação judicial – Dúvida julgada improcedente – Recurso provido.

Apelação Cível nº 1004310-41.2022.8.26.0655

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1004310-41.2022.8.26.0655
Comarca: VÁRZEA PAULISTA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1004310-41.2022.8.26.0655

Registro: 2024.0000299116

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004310-41.2022.8.26.0655, da Comarca de Várzea Paulista, em que é apelante INÊZ DONIZETE DE SOUZA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE VÁRZEA PAULISTA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 5 de abril de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1004310-41.2022.8.26.0655

APELANTE: Inêz Donizete de Souza

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Várzea Paulista

VOTO Nº 43.308

Registro de imóveis – Escritura de compra e venda – Recusa do registro – Averbação de separação judicial que não deixa claro a quem o imóvel ora alienado foi atribuído – Omissão que não impede o ingresso do título – Inteligência da nota ao item 9, B, 14, do Capítulo XX das NSCGJ – Comprovação, ademais, que houve a partilha igualitária do bem por ocasião da separação judicial – Dúvida julgada improcedente – Recurso provido.

Trata-se de apelação interposta por Inês Donizete de Souza contra a r. sentença de fls. 136/138, que, mantendo as exigências do Oficial, negou acesso ao registro imobiliário de escritura de compra e venda do imóvel matriculado sob nº 16.794 no 2º Registro de Imóveis e Anexos de Jundiaí (fls. 98/100).

Alega a apelante, em resumo: que o bem alienado foi devidamente partilhado, de forma que não há mais mancomunhão; e que mesmo que a averbação da separação seja lacunosa, o registro da escritura de compra e venda é possível. Pede, ao final, o provimento da apelação, para determinar o registro do título. Subsidiariamente, requer que se determine que o Oficial do 2º Registro de Imóveis de Jundiaí acrescente a informação omitida (fls. 144/155).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 168/175).

É o relatório.

Tratam os autos da negativa de registro de escritura de compra e venda, por meio da qual a apelante e seus dois filhos venderam o imóvel objeto da matrícula nº 16.794 do 2º Registro de Imóveis de Jundiaí a Daniel Gabriel de Moura.

O Oficial de Registro de Imóveis de Várzea Paulista, cuja circunscrição imobiliária passou a abranger o bem em questão, negou o registro do título, forte no argumento de que a averbação da separação judicial da apelante e de seu ex-marido não deixa claro a quem o imóvel alienado foi atribuído.

A exigência foi mantida pelo MM. Juíza Corregedora Permanente que sentenciou o procedimento de dúvida (fls. 136/138).

O caso, entretanto, permite o afastamento do óbice ao registro do título.

De acordo com a matrícula nº 16.794 do 2º Registro de Imóveis de Jundiaí, o imóvel nela descrito foi adquirido por Décio Pereira da Rosa, que era solteiro à época (cf. R.2 da matrícula nº 16.794 – fls. 99). Décio casou-se com a ora apelante sob o regime da comunhão universal de bens (cf. Av. 3 da matrícula nº 16.794 – fls. 99) e dela se separou, sem que a inscrição respectiva revelasse de que forma o bem foi partilhado (cf. Av. 4 da matrícula nº 16.794 – fls. 99). Finalmente, de acordo com o R.5 da matrícula nº 16.794 (fls. 99/100), 50% do imóvel foi vendido por Décio aos dois filhos do casal, cada um ficando com 25% do bem.

Consoante nota ao item 9, b, 14, do Capítulo XX das NSCGJ:

A escritura pública de separação, divórcio e dissolução de união estável, a sentença de separação judicial, divórcio, nulidade ou anulação de casamento será objeto de averbação, quando não decidir sobre a partilha de bens dos cônjuges, ou apenas afirmar permanecerem estes, em sua totalidade, em comunhão, atentando-se, neste caso, para a mudança de seu caráter jurídico, com a dissolução da sociedade conjugal e surgimento do condomínio ‘pro indiviso‘ “. Ou seja, embora lacunosa, a Av.4 da matrícula nº 16.794 (fls. 99) deve ser interpretada no sentido de que a separação judicial deu início a um condomínio pro indiviso entre os cônjuges, cada um deles permanecendo com 50% do bem.

E no caso dos autos, não se trata de mera presunção que decorre da nota acima transcrita. Isso porque há documentos nos autos que comprovam cabalmente que na ação de separação judicial, que tramitou perante Vara Única da Comarca de Camanducaia/MG, o bem matriculado sob nº 16.794 no 2º Registro de Imóveis de Jundiaí foi partilhado igualmente entre os ex-cônjuges (cf. carta de sentença extraída da ação de separação judicial – fls. 62/96 e 68).

Percebe-se, dessa maneira, que, a partir da separação, a apelante e seu ex-marido passaram a ter cada um 50% do imóvel.

Como Décio vendeu sua metade do imóvel (fls. 99/100), a apelante permaneceu com 50% do bem e cada um de seus dois filhos passaram a ser titulares da fração ideal correspondente a 25%.

Aliás, se houve o registro da compra e venda de Décio aos dois filhos do casal, já se reconheceu, em anterior qualificação, que o imóvel era comum, convertida apenas a comunhão em condomínio.

Nessa ordem de ideias, viável a abertura de nova matrícula no Registro de Imóveis de Várzea Paulista, cuja circunscrição imobiliária passou a abranger o bem em questão, com o registro da escritura copiada a fls. 40/44, por meio da qual a apelante e seus filhos venderam a integralidade do bem a Daniel Gabriel de Moura.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para julgar improcedente a dúvida e determinar a abertura de nova matrícula, com o registro da escritura de compra e venda.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 16.04.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP

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CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida registral julgada procedente – Legitimidade para requerer a suscitação da dúvida – Expressão “interessado” utilizada pelo art. 198 da LRP que não se confunde com apresentante, nem com parte do negócio jurídico cuja inscrição é pleiteada – Escritura de Compra e Venda de fração ideal correspondente a 0,1% do imóvel – Ausência de registro de instituição de condomínio edilício – Indícios de formação de condomínio voluntário como negócio jurídico indireto em fraude à lei da existência de condomínio edilício e de incorporação imobiliária – Óbice que encontra amparo no item 166 do Capítulo XX das NSCGJ – Recurso não provido.

Apelação Cível nº 1010138-43.2023.8.26.0506

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1010138-43.2023.8.26.0506
Comarca: RIBEIRÃO PRETO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1010138-43.2023.8.26.0506

Registro: 2024.0000299112

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1010138-43.2023.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante JOSE ALFREDO PEDRESCHI MONTEIRO, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 5 de abril de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1010138-43.2023.8.26.0506

APELANTE: Jose Alfredo Pedreschi Monteiro

APELADO: 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto

VOTO Nº 43.305

Registro de imóveis  Dúvida registral julgada procedente – Legitimidade para requerer a suscitação da dúvida  Expressão “interessado” utilizada pelo art. 198 da LRP que não se confunde com apresentante, nem com parte do negócio jurídico cuja inscrição é pleiteada  Escritura de Compra e Venda de fração ideal correspondente a 0,1% do imóvel  Ausência de registro de instituição de condomínio edilício  Indícios de formação de condomínio voluntário como negócio jurídico indireto em fraude à lei da existência de condomínio edilício e de incorporação imobiliária  Óbice que encontra amparo no item 166 do Capítulo XX das NSCGJ  Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por José Alfredo Pedreschi Monteiro contra a r. sentença de fls. 73/75, proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do 1º Registro de Imóveis de Ribeirão Preto, que, mantendo as exigências do Oficial, negou o registro na matrícula nº 63.874 daquela serventia de escritura de compra e venda.

Alega o apelante, em síntese: que sobre o imóvel objeto da matrícula nº 63.874 foi construído um centro comercial e que frações ideais relativas ao empreendimento já foram alienadas anteriormente; que como não há uso individualizado do imóvel, não há condomínio edilício; que o registro da escritura não descumpre a legislação relativa ao parcelamento do solo; e que na qualidade de representante da empresa vendedora, tem legitimidade para suscitar dúvida e recorrer da sentença prolatada (fls. 88/92).

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 115/117).

É o relatório.

De início, considerando que a MM. Juíza Corregedora Permanente entendeu que o apelante não tinha legitimidade para requerer a suscitação da dúvida (fls. 74), necessária a análise dessa questão preliminar.

Nesse ponto, sem razão a MM. Juíza de primeiro grau.

Com efeito, o inciso VI do art. 198 da Lei nº 6015/73 preceitua que a suscitação da dúvida pode ser pleiteada pelo “interessado”, nomenclatura genérica que vai além tanto do apresentante do título, como dos participantes de eventual negócio jurídico cujo registro se pleiteia.

Já o art. 202 da Lei nº 6.015/73 é ainda mais abrangente ao tratar da legitimidade para a interposição de apelação contra a sentença prolatada em procedimento de dúvida:

“Da sentença, poderão interpor apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado”.

O apelante, sócio da pessoa jurídica vendedora do bem, é inegavelmente interessado no registro da escritura de cuja lavratura participou e que assinou na presença do tabelião (fls. 9/12).

No mérito, sem razão o apelante.

Tratam os autos da negativa de registro de escritura de compra e venda, por meio da qual Pedreschi Monteiro Engenharia e Construção Ltda., titular da fração ideal de 59,6% do imóvel matriculado sob nº 63.874 do 1º Registro de Imóveis de Ribeirão Preto, vendeu a Carlos Abud Ristum a fração ideal correspondente a 0,1%.

A desqualificação, confirmada pela Corregedoria Permanente, baseia-se na suspeita de que a pretensão envolve a “formação de condomínio edilício sem o necessário registro da instituição e especificação” (fls. 4).

E a recusa à inscrição está correta.

Preceitua o item 166 do Capítulo XX das NSCGJ:

É vedado o registro de alienação voluntária de frações ideais com localização, numeração e metragem certas, ou a formação de condomínio voluntário, que implique fraude ou qualquer outra hipótese de descumprimento da legislação de parcelamento do solo urbano, de condomínios edilícios e do Estatuto da Terra. A vedação não se aplica à hipótese de sucessão causa mortis” (grifei).

No caso, a venda de uma fração ideal de apenas 0,1%, por quem é proprietário de fração ideal de 59,6% de imóvel cuja área é de 16.070 m² (fls. 21/22), alienação essa feita em favor de pessoa física sem nenhuma relação com os demais coproprietários, efetivamente levanta suspeitas de que há condomínio edilício de fato que não foi instituído formalmente perante o registro imobiliário.

A averbação da construção de um centro comercial sobre o imóvel (cf. Av.6 da matrícula nº 63.874 – fls. 23), ao invés de fortalecer, enfraquece a tese recursal, pois reforça a suspeita de que há condomínio edilício informal no imóvel.

Decisão no sentido de permitir o registro, sob o argumento de que atos anteriores semelhantes foram inscritos, serviria de incentivo justamente à prática que se quer evitar, qual seja, a negociação de frações ideais mínimas antes do registro da instituição de condomínio.

E embora haja inscrições na matrícula nº 63.874 concernentes à venda de pequenas frações ideais do bem a terceiros, essas ocorrências são poucas (apenas seis relativas a frações ideais inferiores a 1% – R.17, R.18, R.19, R.20, R.22 e R.26 – fls. 28/34) e antigas (última prenotação de dezembro de 2012 – R.26 – fls. 33/34).

Nota-se, assim, que a desqualificação do título encontra amparo nas NSCGJ, pois visa evitar o uso do condomínio voluntário como forma de esconder um condomínio edilício, que se distingue pela coexistência de partes exclusivas e partes comuns (art. 1.332 do Código Civil).

O caso em exame é típico de negócio jurídico indireto em fraude à lei. O negócio indireto se verifica “quando as partes recorrem, concretamente, a um negócio determinado, para obter, através do mesmo, resultado diverso daquele típico da estrutura do próprio negócio; as partes visam, assim, um escopo que não é típico do próprio negócio” (Alvino Lima, A Fraude no Direito Civil, Editora Saraiva, 1.965, p. 80).

O negócio indireto em si é válido. Não o é, porém, quando celebrado em fraude à lei, com o escopo de driblar norma cogente, tal como ocorre no caso concreto.

Há interesse público e proteção de normas imperativas na alienação de frações ideais durante a construção do empreendimento imobiliário subordinada ao prévio registro da incorporação (L.4.591/64) e após a conclusão da construção, ao registro da instituição de condomínio edilício (arts. 1.331 e seguintes do Código Civil).

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 16.04.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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