Administrativo – Concurso público – Serventia extrajudicial – Candidata em segunda colocação – Direito à outorga de delegação vaga – Inexistência – Certame – Expiração – 1. A Resolução nº 81/2009, do CNJ, dispondo sobre as serventias extrajudiciais, estabelece que “os concursos serão concluídos impreterivelmente no prazo de doze meses, com a outorga das delegações. O prazo será contado da primeira publicação do respectivo edital de abertura do concurso, sob pena de apuração de responsabilidade funcional” (art. 2º, §1º) – 2. Em relação ao caso concreto, porém, o prazo regular de 12 meses não foi atendido, uma vez que o certame é de 2008, antecedendo, pois, a referida norma – 3. Uma vez que não se aplicava o critério da mencionada resolução do CNJ, e diante da omissão no edital quanto ao início da contagem do prazo de validade do concurso, valeria, como de regra, a homologação do certame como o dies a quo. Precedente – 4. Não havendo também previsão expressa de prazo certo de validade do concurso no edital, prevaleceria, igualmente, a regra em caráter geral, ou seja, até dois anos, prorrogáveis por igual período (art. 37, III, da CF) – 5. No caso, a pretensão da parte impetrante não merece acolhimento, em razão de dois fundamentos principais: primeiro porque o concurso já havia perdido a validade; e segundo porquanto existia regra do edital determinando que após a regular outorga da delegação, futura vacância seria preenchida mediante a edição de novo certame – 6. Recurso ordinário não provido.


RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 45.911 – TO (2014/0157865-8)

RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA

RECORRENTE : CRISTINA EMÍLIA FRANÇA MALTA

ADVOGADO : SÔNIA MARIA FRANÇA – TO000007B

RECORRIDO : ESTADO DO TOCANTINS

PROCURADOR : DRAENE PEREIRA DE ARAUJO SANTOS E OUTRO(S) – TO004122B

EMENTA

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. CANDIDATA EM SEGUNDA COLOCAÇÃO. DIREITO À OUTORGA DE DELEGAÇÃO VAGA. INEXISTÊNCIA. CERTAME. EXPIRAÇÃO.

1. A Resolução n. 81/2009, do CNJ, dispondo sobre as serventias extrajudiciais, estabelece que “os concursos serão concluídos impreterivelmente no prazo de doze meses, com a outorga das delegações. O prazo será contado da primeira publicação do respectivo edital de abertura do concurso, sob pena de apuração de responsabilidade funcional” (art. 2º, §1º).

2. Em relação ao caso concreto, porém, o prazo regular de 12 meses não foi atendido, uma vez que o certame é de 2008, antecedendo, pois, a referida norma.

3. Uma vez que não se aplicava o critério da mencionada resolução do CNJ, e diante da omissão no edital quanto ao início da contagem do prazo de validade do concurso, valeria, como de regra, a homologação do certame como o dies a quo. Precedente.

4. Não havendo também previsão expressa de prazo certo de validade do concurso no edital, prevaleceria, igualmente, a regra em caráter geral, ou seja, até dois anos, prorrogáveis por igual período (art. 37, III, da CF).

5. No caso, a pretensão da parte impetrante não merece acolhimento, em razão de dois fundamentos principais: primeiro porque o concurso já havia perdido a validade; e segundo porquanto existia regra do edital determinando que após a regular outorga da delegação, futura vacância seria preenchida mediante a edição de novo certame.

6. Recurso ordinário não provido.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 02 de março de 2021 (Data do julgamento).

MINISTRO GURGEL DE FARIA

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de recurso ordinário interposto com fundamento no art. 105, II, “b”, da CF contra acórdão do TJTO, que denegou a segurança, nos seguintes termos (e-STJ fls. 122/149):

MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA ATIVIDADE NOTORIAL E DE REGISTRO. RENÚNCIA DA CANDIDATA APROVADA EM 1º LUGAR. OUTORGA DA DELEGAÇÃO. PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME EXPIRADO. PROCESSO INSTAURADO PERANTE O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA QUE ENTENDEU TER A VACÂNCIA DO CARGO OCORRIDO APÓS TER EXPIRADO O PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. ORDEM DENEGADA. DECISÃO UNÂNIME. 1– O Edital nº. 1 do Concurso Público 3/2008– TJ/TO, de 2 de dezembro de 2008, estabelece no artigo 4.1.7. que não ocorrendo a posse ou exercício dentro dos prazo marcados, a delegação será tornada sem efeito, independentemente da expedição de qualquer ato,devendo ser realizado novo concurso, e no item 18.8, que o prazo de validade do presente concurso público expira com a expedição do ato de delegação ao candidato classificado. 2– A Constituição Federal de 1998 em seu artigo 37, inciso III, in verbis, estabelece que o prazo de validade do concurso público será de 02 (dois) anos, podendo tal prazo ser prorrogado por igual período por uma única vez. 3– O concurso em comento teve seu resultado final proclamado e homologado na Primeira Sessão Ordinária da Comissão de Seleção e Treinamento, realizada em 03 de fevereiro de 2010, e na mesma data o Edital de Homologação foi publicado no Diário da Justiça nº. 2355, dessa forma, com base no artigo 37, III, da Constituição Federal, a validade do concurso expirou em 03.02.2012, não havendo expressamente no edital, prorrogação do prazo de validade do concurso. 4– O Edital nº. 27, de convocação dos candidatos aprovados, classificados e habilitados estabelece no item 9.2 que não ocorrendo cumprimento dos atos mencionados nos item 9. e 9.1. deste edital [posse e exercício], serão nulos os atos de 1 ESTADO DO TOCANTINS TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE Des. JACQUELINE ADORNO outorga e de investidura e posse. A serventia será outorgada aos próximos candidatos que a escolheram, observando a ordem de classificação da escolha; não havendo escolhas subsequentes à primeira, a respectiva serventia será objeto de escolha disponível aos candidatos que obtiveram classificações posteriores à do candidato cujos atos não foram consumados, e o item 9.3. que, ocorrendo vacância após o ato de investidura e entrada em exercício o preenchimento da referida serventia será objeto do próximo concurso, ainda que tenham ocorrido outras escolhas inerentes à mesma serventia. 5– A vacância da Serventia de Oficial de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos, Protestos e Tabelionato de Notas de Paraíso do Tocantins – TO, bem como o pedido de outorga da mesma pela impetrante, ocorreu em data posterior ao período de validade do concurso em comento, que expirou em 03.02.2013. 6– O Conselho Nacional de Justiça ao apreciar o Procedimento de Controle Administrativo nº 002023– 89.2013.2.00.0000, proposto pela impetrante, entendeu que a vacância do cargo ocorreu após ter expirado o prazo de validade do concurso, dois anos, que deve ser contado a partir da homologação do resultado final, porque é este ato que declara a regularidade do concurso e consolida a relação de candidatos aprovados, que podem, a partir de então, ser nomeados. A homologação é, portanto, o marco inicial de validade do concurso, contando-se daí o prazo constitucional. 7– Com relação ao pedido de caso denegada a liminar, fossem depositados em Juízo, os valores recebidos pelo Oficial Interino na Serventia em questão, que ultrapassem o teto do funcionalismo público, a Presidente deste Tribunal de Justiça/TO, em seus informes, asseverou a impossibilidade de tal pleito, tendo em vista que, esses valores são repassados diretamente ao FUNJURIS. 8– Quanto a alegação de estar sendo preterida, por um Oficial Interino, conforme bem colocado pela douta Procuradoria Geral de Justiça, não existe preterição neste momento. A ora impetrante não é uma opção para ocupar o cargo, neste caso sim, este Egrégio Tribunal estaria agindo de forma ilegal e até imoral, se outorgasse a delegação da serventia a pessoa aprovada em concurso público que perdeu sua validade. 9– Ordem denegada. Decisão unânime.

Aduz a recorrente que obteve aprovação em concurso público para provimento de vagas nas titularidades de serviços notariais e de registros do Estado do Tocantins, na modalidade de ingresso por provas e títulos.

A primeira escolha ficou a cargo da candidata aprovada em primeiro lugar no certame, que renunciou expressamente a serventia.

Diante da renúncia, a primeira colocada requereu ao TJ/TO um pedido de outorga da delegação para a serventia escolhida, o qual foi indeferido, sob o argumento de que o concurso não era mais válido.

Sustenta que o concurso somente expiraria em 26.09.2013, após dois anos do ato de delegação à candidata que escolheu, em primeiro lugar, a serventia extrajudicial de Paraíso do Tocantins/TO, sendo justo, portanto, a concessão do título de outorga à parte recorrente.

Pleiteia a concessão de liminar para determinar a imediata concessão do título de outorga de delegação do Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos, Protestos, Tabelionato e 2ª Notas de Paraíso do Tocantins/TO.

Contrarrazões (e-STJ fls. 186/194)

Parecer do MPF opinando pelo não provimento do recurso (e-STJ fls. 214/219).

VOTO

Adianto que o recurso não merece guarida.

Transcrevo, inicialmente, excerto da manifestação do órgão ministerial, que bem situa a controvérsia, auxiliando no desenvolvimento da fundamentação jurídica:

A candidata obteve aprovação em 13º lugar no concurso público para provimento de vagas na titularidade de serviços notariais e de registro do Estado de Tocantins – Edital nº 1 do Concurso Público nº 3/2008 – TJ/TO, o qual ofereceu 77 vagas para o ingresso por provas e títulos, tendo escolhido em 2º lugar a Serventia de Oficial de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos, Protesto e Tabelionato de Notas de Paraíso do Tocantins – fls. 31/33 e 42/61.

A primeira publicação do edital de abertura ocorreu em 04/12/2008 e a homologação do resultado em 03/02/2010, conforme consulta efetuada no sítio da Fundação Universa (http://inscricao.universa.org.br/).

O título de outorga de delegação da candidata que escolheu a serventia em 1º lugar foi publicado no Diário de Justiça Eletrônico em 29/09/2011, a investidura ocorreu em 02/10/2011 e a renúncia se deu 09/01/2013 – fls. 34/37.

Daí a impetração do writ, para assegurar o direito a ser nomeada, ao argumento de que o prazo de validade do certame é de 2 anos contados da expedição do ato de delegação, conforme o art. 37, III, da CF, e o edital – fls. 7/29.

A segurança foi denegada sob o fundamento de que o prazo de validade do concurso já estava expirado quando houve a renúncia da titular da serventia porque o seu termo inicial é a data da homologação do resultado, em 03/02/2010, sendo o termo final 03/02/2012 – fls. 122/132.

A impetrante defende que o termo inicial para contagem da validade do concurso ocorreu em 2011, data da outorga de delegação da candidata que escolheu a serventia em 1º lugar, e não da homologação do certame (em 2010).

Complementa afirmando que o art. 37, III, da CF, garante a validade do concurso por dois anos, depois de deflagrado o prazo, pelo que, quando a primeira colocada pugnou renúncia da delegação, o concurso ainda não teria expirado, ostentando então a recorrente, como segunda colocada, direito líquido e certo à outorga dessa delegação.

Argumenta que a previsão do item 18.8 do edital alicerça sua pretensão, pois prevê que “o prazo de validade do presente concurso expira com a expedição do ato de delegação ao candidato classificado”.

Afirma que não havendo previsão expressa no edital sobre o início da contagem do prazo de validade do concurso, deve a regra transcrita figurar como dies a quo, ao invés da homologação do certame.

Entendo que tais fundamentos não podem ser acolhidos.

A previsão editalícia mencionada, antes de robustecer direito líquido e certo da impetrante, esmorece a pretensão autoral.

É que ao invés de fixar o termo inicial da contagem do prazo de validade do concurso, ela impõe, a bem da verdade, o que seria o dies ad quem do certame.

Aliás, se prevalecesse a tese da demandante, estaria a admitir que o Tribunal, querendo, poderia perpetuar ilimitadamente a validade do concurso, já que se a outorga do ato de delegação deflagaria o início e não o final do prazo, o controle da validade ficaria ao exclusivo critério da Administração, ao invés da norma constitucional (art. 37, III, da CF).

Na realidade, a rigor, os concursos para provimento de unidades de serviço extrajudiciais atualmente têm prazo certo para iniciar e concluir com a outorga de todas as delegações. Isso porque a Resolução n. 81, de 09/06/2009, do CNJ, estabelece que “os concursos serão concluídos impreterivelmente no prazo de doze meses, com a outorga das delegações. O prazo será contado da primeira publicação do respectivo edital de abertura do concurso, sob pena de apuração de responsabilidade funcional” (art. 2º, §1º).

Em relação ao caso concreto, o prazo regular de 12 meses não foi atendido, uma vez que o certame é de 2008, antecedendo, pois, a referida norma.

Com efeito, uma vez que não se aplicava o critério da mencionada resolução do CNJ, e diante da omissão no edital quanto ao início da contagem do prazo de validade do concurso, valeria, como de regra, a homologação do certame como o dies a quo (RMS 33.719/SP, rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/06/2013, DJe 12/06/2013).

A homologação do resultado final é o ato por meio do qual a Administração conclui a análise da legalidade do processo seletivo (AgRg no RMS 24.122/DF, rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 13/12/2013), corroborando a correção do procedimento, somente a partir de então pode cogitar prazo de validade.

Não havendo também previsão expressa de prazo certo de validade do concurso no edital, prevaleceria, igualmente, a regra em caráter geral, ou seja, até (não exatamente) dois anos (art. 37, III, da CF).

Importante destacar que a matéria em questão foi levada ao CNJ, o qual expressamente registrou que (e-STJ f. 98):

O Edital n. 27, de convocação dos candidatos aprovados, classificados e habilitados, determinou:

9.2 Não ocorrendo cumprimento dos atos mencionados nos itens 9 e 91 deste edital [posse e exercício], serão nulos os atos de outorga e de investidura e posse. A serventia será outorgada aos próximos candidatos que a escolheram, observando a ordem de classificação da escolha; não havendo escolhas subsequentes à primeira, a respectiva serventia será objeto de escolha disponível aos candidatos que obtiveram classificações posteriores à do candidato cujos atos não foram consumados.

93. Ocorrendo vacância após o ato de investidura e entrada em exercício, o preenchimento da referida serventia será objeto do próximo concurso, ainda que tenham ocorrido outras escolhas inerentes à mesma serventia.

Assim, temos que a interpretação sistemática dos parâmetros acima mencionados se resume no seguinte:

1. O termo inicial da contagem da validade do certame iniciaria com a homologação;

2. A partir de então o concurso teria validade de até dois anos (prorrogáveis);

3. Entretanto, nesse ínterim, o prazo de validade do presente certame expiraria com a expedição do ato de delegação ao candidato classificado;

4. O ato de outorga da delegação só seria assim considerado com a efetiva investidura do candidato em primeiro lugar, e, caso aquela não ocorresse, a serventia seria outorgada aos próximos concorrentes por ordem de classificação; e

5. Por fim, se a vacância se operasse após a regular investidura de algum candidato, a referida serventia vaga seria objeto de novo concurso.

Com efeito, a pretensão da parte impetrante não merece acolhimento, em razão de dois fundamentos principais: primeiro porque o concurso já havia perdido a validade; e, segundo, porque existia regra do edital determinando que após a regular outorga da delegação, futura vacância seria preenchida mediante a edição de novo certame.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

É como voto. – – /

Dados do processo:

STJ – RMS nº 45.911 – Tocantins – 1ª Turma – Rel. Min. Gurgel de Faria – DJ 07.04.2021

Fonte: INR Publicações

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Agravo Interno em Recurso Especial – Direito civil – Negócio jurídico – Compra e venda – União estável – Outorga uxória – Imprescindível publicidade ou caracterização de ma-fé – Decisão monocrática agravada mantida – 1. Necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável, tendo em vista que o regime da comunhão parcial de bens foi estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96 – 2. Invalidação de atos de alienação praticado por algum dos conviventes sem autorização do outro, dependente de constatar se existia: (a) publicidade conferida a união estável, mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, a época em que firmado o ato de alienação, ou (b) demonstração de má-fé do adquirente – 3. No caso, nem foi apontada a configuração de má-fé, nem existia qualquer publicidade formalizada da união estável na época em que firmado o contrato de alienação, de modo que não pode ser invalidado com base na ausência de outorga da convivente, ora recorrida – 4. Agravo interno não provido.


AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1659314 – PR (2017/0053194-8)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

AGRAVANTE : EUNICE FÁTIMA MAKIMOVIZ

ADVOGADOS : ROSANA SILVEIRA VAZ BORDIGNON – PR019307

KELLI BERNADETE MATIEVICZ BENITES – PR028086

ÉVERTON BERNARDI – PR038327

AGRAVADO : MARCOS ROBERTO ABATI

ADVOGADOS : GUILHERME BROTO FOLLADOR E OUTRO(S) – PR040517

MARINA KUJO MONTEIRO – PR072237

INTERES. : LEANDRO DALPASQUALE REFFATTI

EMENTA

AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. NEGÓCIO JURÍDICO. COMPRA E VENDA. UNIÃO ESTÁVEL. OUTORGA UXÓRIA. IMPRESCINDÍVEL PUBLICIDADE OU CARACTERIZAÇÃO DE MA-FÉ. DECISÃO MONOCRÁTICA AGRAVADA MANTIDA.

1. Necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável, tendo em vista que o regime da comunhão parcial de bens foi estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96.

2. Invalidação de atos de alienação praticado por algum dos conviventes sem autorização do outro, dependente de constatar se existia: (a) publicidade conferida a união estável, mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, a época em que firmado o ato de alienação, ou (b) demonstração de má-fé do adquirente.

3. No caso, nem foi apontada a configuração de má-fé, nem existia qualquer publicidade formalizada da união estável na época em que firmado o contrato de alienação, de modo que não pode ser invalidado com base na ausência de outorga da convivente, ora recorrida.

4. Agravo interno não provido.

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Licenciado o Sr. Ministro Marco Buzzi.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Brasília, 08 de março de 2021.

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

RELATÓRIO

1. Trata-se de agravo interno interposto por EUNICE FÁTIMA MAKIMOVIZ em face de decisão da minha lavra, assim sintetizada:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. NEGÓCIO JURÍDICO. COMPRA E VENDA. UNIÃO ESTÁVEL. OUTORGA UXÓRIA. IMPRESCINDÍVEL PUBLICIDADE OU CARACTERIZAÇÃO DE MA-FÉ.

1. Necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável, tendo em vista que o regime da comunhão parcial de bens foi estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96.

2. Invalidação de atos de alienação praticado por algum dos conviventes sem autorização do outro, dependente de constatar se existia: (a) publicidade conferida a união estável, mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, a época em que firmado o ato de alienação, ou (b) demonstração de má-fé do adquirente.

3. No caso, nem foi apontada a configuração de má-fé, nem existia qualquer publicidade formalizada da união estável na época em que firmado o contrato de alienação, de modo que não pode ser invalidado com base na ausência de outorga da convivente, ora recorrida.

4. Recurso especial provido.

A parte agravante sustenta não ser possível exigir publicidade formalizada da união estável, se a legislação que a regulamenta não impõe tal ônus.

Defende ser incontroverso que o imóvel cuja alienação se objetiva anular pertencia ao casal, sendo evidente que sua metade pertence a ora recorrente, visto que comprado o imóvel enquanto vivia em união estável.

Argumenta não ser possível alegar desconhecimento da união estável em uma pequena cidade interiorana; que os elementos dos autos demonstram que era de conhecimento do ora recorrido que o vendedor do imóvel vivia em união estável.

É o relatório.

VOTO

2. Sem razão a parte agravante.

De acordo com a jurisprudência desta Corte, a necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável é consectário do regime da comunhão parcial de bens, estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96.

Entende-se, contudo, que é necessário preservar o adquirente de boa-fé, sempre presumida, tendo em vista a preponderante informalidade no vínculo da união estável, que não exige qualquer documento, caracterizando-se apenas pela convivência pública, contínua e duradoura.

Por conclusão, a invalidação de atos de alienação praticado por algum dos conviventes sem autorização do outro deverá observar se existia, a época em que firmado o ato de alienação, publicidade conferida a união estável mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou mediante demonstração de má-fé do adquirente.

Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA C.C. CANCELAMENTO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. 1. ALIENAÇÃO DE BENS IMÓVEIS ADQUIRIDOS DURANTE A CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL. ANUÊNCIA DO OUTRO CONVIVENTE. OBSERVÂNCIA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.647, I, E 1.725 DO CÓDIGO CIVIL. 2. NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO SEM A AUTORIZAÇÃO DE UM DOS COMPANHEIROS. NECESSIDADE DE PROTEÇÃO DO TERCEIRO DE BOA-FÉ EM RAZÃO DA INFORMALIDADE INERENTE AO INSTITUTO DA UNIÃO ESTÁVEL. 3. CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CONTRATO DE CONVIVÊNCIA REGISTRADO EM CARTÓRIO, BEM COMO DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ DOS ADQUIRENTES. MANUTENÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS QUE SE IMPÕE, ASSEGURANDO-SE, CONTUDO, À AUTORA O DIREITO DE PLEITEAR PERDAS E DANOS EM AÇÃO PRÓPRIA. 4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

1. Revela-se indispensável a autorização de ambos os conviventes para alienação de bens imóveis adquiridos durante a constância da união estável, considerando o que preceitua o art. 5º da Lei n. 9.278/1996, que estabelece que os referidos bens pertencem a ambos, em condomínio e em partes iguais, bem como em razão da aplicação das regras do regime de comunhão parcial de bens, dentre as quais se insere a da outorga conjugal, a teor do que dispõem os arts. 1.647, I, e 1.725, ambos do Código Civil, garantindo-se, assim, a proteção do patrimônio da respectiva entidade familiar.

2. Não obstante a necessidade de outorga convivencial, diante das peculiaridades próprias do instituto da união estável, deve-se observar a necessidade de proteção do terceiro de boa-fé, porquanto, ao contrário do que ocorre no regime jurídico do casamento, em que se tem um ato formal (cartorário) e solene, o qual confere ampla publicidade acerca do estado civil dos contratantes, na união estável há preponderantemente uma informalidade no vínculo entre os conviventes, que não exige qualquer documento, caracterizando-se apenas pela convivência pública, contínua e duradoura.

3. Na hipótese dos autos, não havia registro imobiliário em que inscritos os imóveis objetos de alienação em relação à copropriedade ou à existência de união estável, tampouco qualquer prova de má-fé dos adquirentes dos bens, circunstância que impõe o reconhecimento da validade dos negócios jurídicos celebrados, a fim de proteger o terceiro de boa-fé, assegurando-se à autora/recorrente o direito de buscar as perdas e danos na ação de dissolução de união estável c.c partilha, a qual já foi, inclusive, ajuizada.

4. Recurso especial desprovido.

(REsp 1592072/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 18/12/2017)

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PATRIMONIAL DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO. NECESSIDADE DE CONSENTIMENTO DO COMPANHEIRO. EFEITOS SOBRE O NEGÓCIO CELEBRADO COM TERCEIRO DE BOA-FÉ.

1. A necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável é consectário do regime da comunhão parcial de bens, estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96, Precedente.

2. Reconhecimento da incidência da regra do art. 1.647, I, do CCB sobre as uniões estáveis, adequando-se, todavia, os efeitos do seu desrespeito às nuanças próprias da ausência de exigências formais para a constituição dessa entidade familiar.

3. Necessidade de preservação dos efeitos, em nome da segurança jurídica, dos atos jurídicos praticados de boa-fé, que é presumida em nosso sistema jurídico.

4. A invalidação da alienação de imóvel comum, realizada sem o consentimento do companheiro, dependerá da publicidade conferida a união estável mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou pela demonstração de má-fé do adquirente.

5. Hipótese dos autos em que não há qualquer registro no álbum imobiliário em que inscrito o imóvel objeto de alienação em relação a co-propriedade ou mesmo à existência de união estável, devendo-se preservar os interesses do adquirente de boa-fé, conforme reconhecido pelas instâncias de origem.

6. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

(REsp 1424275/MT, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2014, DJe 16/12/2014)

3. Ao analisar a demanda, a Corte de origem consignou:

Quanto ao mérito da causa, o Apelante alega que “não restou comprovado nos autos qualquer elemento capaz de demonstrar a possibilidade de anulação do negócio jurídico realizado, ao contrário, restou evidente que a apelada e o segundo requerido jamais estiveram separados, e agiram conjuntamente, ela propondo a ação e ele sendo revel, no único objetivo de prejudicar o adquirente do imóvel’ (f. 196).

Argumenta que o próprio Juízo de origem, em sentença, teria reconhecido que os argumentos deduzidos na petição inicial, quanto à nulidade do negócio jurídico por ausência de outorga uxória, não teriam fundamento, já que na hipótese a validade do contrato não estaria condicionada à autorização da Companheira do primeiro Réu.

Diz que o Juízo de origem não poderia, “de forma inovadora nos autos”, reconhecer a impossibilidade de o primeiro Requerido negociar a integralidade do imóvel, já que teria direito somente a 50% (cinquenta por cento do bem) por tê-lo adquirido quando já existia a união estável em questão. Afirma que não prosperam os fundamentos da sentença, “uma vez que a procuração conferida pelos proprietários registrais do imóvel unicamente ao Sr. Leandro, lhe davam poderes para negociar 100% (cem por cento) do imóvel, não havia nenhuma restrição ou ressalva, pelo que o mesmo poderia sim vender todo o imóvel’. Diz que “não bastasse isso, a união estável e a aquisição do bem da Apelada e do segundo requerido em momento algum foi objeto de discussão nos autos” (f. 198).

Alega que “o fato de o autor conviver em união estável e a possível participação de sua companheira na aquisição do imóvel e percentual de cada cônjuge não são objetos da presente ação, devendo ser discutida em autos próprios e a Apelada devidamente indenizada, caso seja reconhecia a união estável e ainda o efetivo prejuízo da mesma” (f.198).

Requer, portanto, a reforma da sentença para que seja afastada a nulidade reconhecida pelo Juízo de origem.

Razão, contudo, não lhe assiste.

Inicialmente, conforme já consignado quando analisada a preliminar referente à prolação de sentença extra petita, incumbe ao juiz declarar, inclusive de ofício, a nulidade absoluta de negócios jurídicos (art. 168, par. único, CC), razão pela qual inexiste irregularidade, nesse sentido, no presente caso.

Assim, tendo em vista que se mostra impossível alienar objeto que não lhe pertence, o negócio jurídico celebrado entre os Requeridos é nulo em relação à cota parte da Autora, conforme determina o art. 166, II, do Código Civil, razão pela qual acertada a decisão do juízo de origem ao pronunciar a nulidade parcial de ofício.

Igualmente, quanto ao reconhecimento da união estável na presente demanda, inexiste qualquer irregularidade.

Isto porque, apesar de a união estável não ter sido reconhecida por sentença em ação específica para tal finalidade, o juízo de origem verificou, da análise dos elementos constantes dos autos, inclusive dos testemunhos prestados durante a audiência de instrução e julgamento, e da certidão de nascimento de f. 12, que o casal viva em união estável durante a época de aquisição do imóvel, já que presentes os requisitos previstos no art. 1.723 do Código Civil’.

Cabe ressaltar que o instituto da união estável é um fato social, cuja configuração demanda a existência de convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família, mas dispensa declaração judicial para seu reconhecimento e início da produção dos efeitos legais correspondentes.

Com efeito, a ação de reconhecimento de união estável tem cunho meramente declaratório, já que o instituto se aperfeiçoa com o preenchimento dos requisitos exigidos em lei, a partir de quando passa a gerar os efeitos legais.

Confira-se, sobre o tema, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

(…)

Observa-se, assim, que a Autora não buscou através da presente ação, especificamente, o reconhecimento da união estável, mas apontou a existência de referido laço como componente da causa de pedir deduzida na petição inicial, razão pela qual mostra-se regular o seu reconhecimento da fundamentação da sentença para embasar a conclusão lançada na parte dispositiva.

Convém ressaltar que durante a audiência de instrução e julgamento as testemunhas foram inquiridas, inclusive pelo patrono do Autor, quanto à publicidade da relação mantida pelo casal à época na aquisição do imóvel, situação em que se buscava verificar a presença (ou não) dos requisitos necessários à configuração da união estável. Frise-se, nesse ponto, que tanto o Sr. Norton Luiz Gasparotto como a Sra. Romelania de Fátima Baggio Amadori afirmaram, peremptoriamente, que reconheciam a Autora e o segundo Requerido como casal, que sabiam que ambos já residiam juntos antes da aquisição do imóvel em questão e que a Autora estava grávida.

Assim, inexiste qualquer irregularidade no reconhecimento, pelo Juízo de origem, da união estável alegada pela Autora, até porque esta, na petição inicial, fundou o direito que alegava ter em referida situação fática, a qual acabou sendo confirmada após a instrução do processo.

O Apelante impugna, ainda, a forma como ocorreu a aquisição do imóvel por parte da Apelada, já que ao invés de ter sido celebrado formalmente contrato de compra e venda, houve tão somente a outorga de procuração em causa própria ao segundo Requerido, instrumento em que o mandatário foi qualificado como solteiro.

Afirma, desta forma, que o segundo Requerido detinha poderes sobre a integralidade do imóvel objeto da procuração, razão pela qual inexistira a nulidade reconhecida pelo Juízo de origem.

Razão, contudo, não lhe assiste.

Veja-se, inicialmente, que apesar de não ter ocorrido a formalização por instrumento público, resta inequívoca a celebração de contrato de compra e venda entre os responsáveis pela construção do imóvel (Senhores Hermes Rigo e Norton Luiz Gasparotto) e a Autora/Apelada e o segundo Requerido.

O Sr. Norton Luiz Gasparotto, construtor e proprietário anterior do imóvel, arrolado como testemunha, confirmou em seu depoimento a celebração do negócio, esclarecendo que o pagamento foi realizado através de uma entrada e do parcelamento do saldo, conforme demonstram os recibos de fs. 22/25. Afirmou, ainda, que a quitação do preço do imóvel se deu através da entrega de um veículo, então de propriedade da Autora/Apelada (f. 28). Disse, ainda, que foi outorgada procuração em causa própria (CC, art. 6854) em favor do Sr. Leandro Dalpasquale Reffatti (segundo Requerido), para que este realizasse a transferência da propriedade do bem.

Desta forma, apesar da regra prevista no art. 401 do Código de Processo Civil, pela qual a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos contratos cujo valor não exceda o décuplo do maior salário mínimo vigente no país, constam dos autos elementos suficientes à comprovação da negociação, existindo, inclusive, começo de prova por escrito, nos termos do art. 402, I, do CPC:

(…)

No caso dos autos, diante do depoimento prestado pelas testemunhas, inclusive por um dos construtores do imóvel, confirmando a venda do bem ao casal, bem como dos documentos carreados aos autos, destacadamente os recibos e a procuração em causa própria outorgada ao Sr. Leandro Dalpasquale Reffatti, resta suficientemente configurada a celebração do contrato de compra e venda.

Por outro lado, diante a demonstração de que a Autora e o segundo Requerido encontravam-se em união estável à época da aquisição, incidem sobre o caso as regras do regime de comunhão parcial de bens, nos termos dos artigos 1.725 e 1.658, ambos do Código Civil6.

Desta forma, conforme bem consignado pelo juízo de origem em sentença, “o direito do transmitente Leandro Dalpasquale Reffatti, representado na procuração com base na qual foi transmitido o imóvel a Marcos Roberto Abati, se limitava à quota parte de 50% do bem”, já que “o direito nela consignado não pertencia, no mundo dos fatos, exclusivamente ao segundo réu/transmitente”.

Assim, como não se pode transmitir mais direitos do que se possui, correta a conclusão alcançada pelo Juízo de origem quanto à nulidade do negócio jurídico em relação à transferência de 50% do imóvel (quota parte da autora), remanescendo válida a transmissão da quota restante.

(…)

Desta forma, confirma-se a sentença em que se declarou a nulidade da transferência de 50% do imóvel, realizada em favor de Marcos Roberto Abati, preservando-se por um lado a sua propriedade em relação à quota parte remanescente (50%) e, por outro, a meação da Autora. (fls. 291-300 e– STJ) [grifos nossos]

Entendeu que (a) deveria ser reconhecida nulidade da venda do imóvel feita por uma das partes recorridas, porque esta não poderia dispor de parcela de bem que não lhe pertencia; (b) que ficou configurada nestes autos, apesar da falta de oficialização, o fato social união estável; (c) que a existência de união estável existente na época da alienação do bem que se objetiva anular determinava a necessidade de autorização de ambos companheiros.

Está, assim, em dissonância com o entendimento desta Corte, pois desconsiderou que a época em que firmado o contrato inexistia qualquer publicidade formalizada da união estável, tampouco apontou a configuração de má-fé da parte recorrente.

4. Anote-se, neste ponto, que a boa-fé se presume, sendo que no caso dos autos, inclusive foi reconhecida a do comprador ora recorrido pela sentença, como se observa:

Outrossim, o exame dos autos revela que a transferência do apartamento foi realizada pelo réu Leandro Dalpasquale Reffatti, com base em procuração outorgada pelos proprietários registrais, na qual constava a qualificação do mandatário como solteiro.

Nesse contexto, em que pese à ausência de outorga uxória da autora, não se pode reputar como nulo o negócio jurídico, eis que realizado de boa –fé pelo primeiro réu, para quem foi suprimida a informação sobre a existência de união estável pelo mandatário (segundo réu), o qual, este sim, desviou-se reprovavelmente dos deveres éticos que devem permear as relações negociais (art. 422, do Código Civil). (fls. 181-182 e-STJ)

De outro lado, não fora questionada a boa-fé pela parte ora recorrente por meio da apelação apresentada ou das contrarrazões a apelação.

Ademais, a parte recorrida ainda suscitou expressa manifestação pelo tribunal de origem acerca da boa-fé, tendo o tribunal de origem entendido que ao terceiro prejudicado “caberia pleitear a reparação do prejuízo sofrido, caso reste demonstrado, o que, entretanto, não pode ser aferido neste processo” (fl. 314 e-STJ)

Nesse contexto, inviável nesta sede recursal passar ao exame dos autos autos para afastar presunção legal não questionada pela parte interessada até então nem afastada no curso deste processo.

Dessa forma, o contrato firmado pela parte recorrente e um dos conviventes não pode ser invalidado com base na ausência de outorga da convivente, ora recorrida.

5. Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É o voto. – – /

Dados do processo:

STJ – AgInt no REsp nº 1.659.314 – Paraná – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 07.04.2021

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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