STF mantém ato que anulou titularidade de cartórios em SC

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, negou provimento aos Recursos Extraordinários (RE) 336739 e 355856, em que dois titulares de cartórios em Santa Catarina contestavam ato do presidente do Tribunal de Justiça do estado que declarou a nulidade dos atos de efetivação em serventias. O ato de declaração de vacância das titularidades das serventias se deu com base na decisão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 363, que considerou inconstitucional o artigo 14 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição de Santa Catarina, com base no qual os recorrentes foram nomeados sem a realização de concurso público. De acordo com os autos, o TJ-SC anulou 141 atos de efetivação em serventias. O julgamento ocorreu na sessão realizada na tarde desta terça-feira (6).

No RE 336739, o recorrente pedia que fosse mantido como titular do 2º Ofício do Registro de Imóveis de Lages alegando que o ato do presidente do TJ-SC foi emitido sem que ele fosse ouvido, desrespeitando o princípio do contraditório. O relator, ministro Marco Aurélio, e a ministra Rosa Weber, votaram pelo provimento do recurso, entendendo que a decisão do STF eliminaria a norma impugnada, mas que as situações concretas deveriam ser examinadas caso a caso. O ministro Luiz Fux, seguido pelo ministro Dias Toffoli, votou pelo desprovimento, considerando que a competência para declarar a vacância é do TJ.

O julgamento, que estava suspenso aguardando a nomeação de novo ministro, foi retomado com o voto do ministro Roberto Barroso que, levando em consideração a decisão do Plenário pela exigibilidade de concurso público para provimento dos cargos, acompanhou a divergência e se posicionou pelo desprovimento do recurso. Segundo o ministro Barroso, o ato do presidente do TJ-SC apenas legitimou a decisão do STF.

Já o RE 355856, no qual a recorrente pleiteava a titularidade da Escrivania de Paz do Município de Ipira, sob a alegação de descumprimento do devido processo legal, estava suspenso por pedido de vista do ministro Ayres Britto (aposentado). Seu sucessor, ministro Barroso, votou pelo desprovimento do recurso com o mesmo argumento apresentado no caso anterior. Ficaram vencidos o relator, ministro Marco Aurélio, e a ministra Rosa Weber.

A notícia refere-se aos seguintes processos: RE 336739 e RE 355856.

Fonte: STF | 06/05/2014.

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DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO COMO MATÉRIA DE DEFESA DE NEGÓCIO JURÍDICO SIMULADO REALIZADO PARA OCULTAR PACTO COMISSÓRIO.

A prática de negócio jurídico simulado para encobrir a realização de pacto comissório pode ser alegada por um dos contratantes como matéria de defesa, em contestação, mesmo quando aplicável o CC/1916. Isso porque a jurisprudência do STJ, mesmo antes da vigência do CC/2002, entende que a simulação realizada com o propósito de afastar as vedações estabelecidas em lei – na hipótese, a proibição ao pacto comissório estabelecida pelo art. 765 do CC/1916 ­– configura nulidade e não anulabilidade, a despeito da redação do art. 104 do CC/1916: “Tendo havido intuito de prejudicar a terceiros, ou infringir preceito de lei, nada poderão alegar, ou requerer os contraentes em juízo quanto à simulação do ato, em litígio de um contra o outro, ou contra terceiros”. Além disso, o art. 145, V, do CC/1916 estabelece a nulidade do ato jurídico quando a lei taxativamente assim o declarar ou lhe negar efeito. Desse modo, a nulidade absoluta – simulação com o intuito de ocultar pacto comissório –, por se tratar de objeção substancial, é passível de pronunciamento ex officio pelo julgador, sendo desnecessária a sua veiculação por meio de ação própria ou reconvenção. Ademais, não é admissível a reconvenção quando o efeito prático almejado pelo seu manejo puder ser alcançado com a simples contestação, tendo em vista a ausência de interesse de agir. Precedentes citados: REsp 21.681-SP, Terceira Turma, DJ 3/8/1992; e REsp 784.273-GO, Terceira Turma, DJ 26/2/2007. REsp 1.076.571-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 11/3/2014.

Fonte: Informativo nº. 0538 do STJ | Período: 30 de abril de 2014.

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STJ: Não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula nº 332/STJ à união estável

Direito civil/constitucional – Direito de família – Contrato de locação – Fiança – Fiadora que convivia em união estável – Inexistência de outorga uxória – Dispensa – Validade da garantia – Inaplicabilidade da Súmula nº 332/STJ – 1. Mostra-se de extrema relevância para a construção de uma jurisprudência consistente acerca da disciplina do casamento e da união estável saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles – 2. Toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento, por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro, uma entidade familiar, dentre várias outras protegidas pela Constituição – 3. Assim, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável, também uma entidade familiar, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento (ato jurídico) e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica – 4. A exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por este aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável é justificável. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança – 5. Desse modo, não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula nº 332/STJ à união estável – 6. Recurso especial provido. 

EMENTA

DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO. FIANÇA. FIADORA QUE CONVIVIA EM UNIÃO ESTÁVEL. INEXISTÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA. DISPENSA. VALIDADE DA GARANTIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA N. 332/STJ. 1. Mostra-se de extrema relevância para a construção de uma jurisprudência consistente acerca da disciplina do casamento e da união estável saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles. 2. Toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento – por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro, uma entidade familiar, dentre várias outras protegidas pela Constituição. 3. Assim, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável – também uma entidade familiar -, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento – ato jurídico – e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica. 4. A exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por este aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável é justificável. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança. 5. Desse modo, não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula n. 332/STJ à união estável. 6. Recurso especial provido. (STJ – REsp nº 1.299.894 – Distrito Federal – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 28.03.2014)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo (Presidente), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 25 de fevereiro de 2014 (data do julgamento).

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO – Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Esther Costa Rebello opôs embargos do devedor em face de Linea G Empreendimentos de Engenharia, aduzindo que a embargada/exequente firmara contrato de locação de imóvel comercial com Valdemir Ribeiro Martins, figurando como fiadora do mencionado contrato. Diante do inadimplemento das parcelas mensais relativas a dezembro de 2006 a novembro de 2007, a embargada/exequente ajuizou execução contra a fiadora, tendo sido o imóvel residencial desta penhorado como garantia do juízo.

Nos embargos do devedor, a fiadora alegou, fundamentalmente, nulidade da fiança em razão da falta de outorga uxória, pois convivia em união estável com Carlos Levino Vilanova desde 1975.

O Juízo de Direito da 11º Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF rejeitou os embargos, afastando todas as teses de defesa da executada (fls. 159-162).

Porém, a sentença foi reformada em grau de apelação, em razão da falta de outorga do companheiro da executada à fiança por ela prestada:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TITULO EXTRAJUDICIAL. ENCARGOS LOCATÍCIOS. FIADOR. OUTORGA UXÓRIA. AUSÊNCIA. 1. Tendo sido acatados os embargos de terceiro opostos pelo companheiro da embargante, para declarar nula a fiança por ela prestada, eis que realizada sem a necessária outorga uxória, há de se julgar procedentes os embargos do devedor ora opostos pela fiadora, a fim de excluí-la da execução. 2. Em que pese o Superior Tribunal de Justiça entender não ser cabível à fiadora alegar a nulidade da fiança a que deu causa, ao companheiro é admitida a oposição de embargos de terceiro quando não prestou outorga uxória na fiança prestada por seu par. 3. É nula a fiança prestada sem a outorga uxória do cônjuge/companheiro da fiadora. 4. Recurso provido (fl. 214).

Opostos embargos de declaração (fls. 226-228), foram rejeitados (fls. 231-236).

Sobreveio recurso especial apoiado na alínea "c" do permissivo constitucional, no qual alegou a recorrente a validade da fiança recebida sem outorga uxória, porquanto seria impossível o credor saber que a fiadora vivia em união estável com seu companheiro.

A recorrente sustentou, ainda, que a fiadora, no contrato levado a juízo, deve responder pelas dívidas de locação até a efetiva entrega das chaves, tal como previsto no contrato.

Contra-arrazoado (fls. 284-304), o especial foi admitido (fls. 306-308).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. A controvérsia analisada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, e que foi devolvida a esta Corte, consiste em saber se é válida a fiança prestada durante união estável, sem a outorga do outro companheiro. Registro o teor da Súmula n. 332/STJ, editada depois de vários precedentes que analisaram a questão – sempre no âmbito do casamento:

Súmula n. 332: A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia.

3. De fato, já é conhecida a posição defendida pela majoritária doutrina – e por mim abraçada em mais de uma oportunidade nesta Casa – acerca da inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil de 2002, seja porque confere tratamento diferenciado entre casamento e união estável em matéria na qual se mostra injustificável tal distinção, seja porque, a propósito de disciplinar de modo diverso os dois institutos, acaba, de forma canhestra, conferido tratamento discriminatório aos filhos, a depender se são nascidos de casamento ou de união estável, o que conflita frontalmente com o art. 227, § 6º, da Constituição Federal.

O tema já foi submetido à Corte Especial, mas esta não conheceu do incidente por questões formais de admissibilidade (AI no REsp 1135354/PB, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/10/2012).

Posteriormente, outros dois recursos foram afetados para a Corte Especial: AI no REsp 1291636/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2013; AI no REsp 1318249/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2013, que pendem de julgamento.

O tema recebeu crivo positivo de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal:

UNIÃO ESTÁVEL – COMPANHEIROS – SUCESSÃO – ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL – COMPATIBILIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL ASSENTADA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca do alcance do artigo 226 da Constituição Federal, nas hipóteses de sucessão em união estável homoafetiva, ante a limitação contida no artigo 1.790 do Código Civil (RE 646721 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 10/11/2011).

3.1. Nessa esteira, cumpre para logo ressaltar, todavia, que nunca foi afirmada a completa e inexorável coincidência entre os institutos da união estável e do casamento.

Na verdade, apenas se afirmou que não há superioridade familiar do casamento ou predileção constitucional por este.

Nesse ponto, é bem verdade que, parte da doutrina – no que foi seguida, em alguma medida, pela jurisprudência – tenta justificar eventual tratamento diferenciado dado às uniões estáveis, comparativamente ao casamento, acionando-se a parte final do art. 226, § 3º, da Constituição Federal, verbis:

Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Afirma-se que união estável e casamento são entidades distintas, pois, caso se tratassem de entidades idênticas, não teria a Constituição previsto a possibilidade de conversão da união estável em casamento.

O mencionado dispositivo constitucional, segundo penso, consubstancia apenas uma fórmula de facilitação da conversão. A união estável pode – se assim desejarem os conviventes – converter-se em casamento. Cuida-se de comando direcionado ao legislador ordinário e aos agentes públicos para que, se for o desejo dos companheiros, não embaracem a conversão da união estável em casamento.

Penso que a parte final do § 3º do art. 226 da CF/1988 é simples constatação de que, natural e faticamente, em razão da informalidade dos vínculos, a união estável é mais fragilizada que o casamento e, por isso mesmo, propicia menos segurança aos conviventes.

Assim, é tão somente em razão da natural insegurança e fragilidade dos vínculos existentes na união estável, que a lei deve facilitar sua conversão em casamento, ciente o constituinte originário que é pelo casamento que o Estado melhor protege a família.

3.2. Na verdade, o que se mostra relevante para a construção de uma jurisprudência consistente acerca do tema é saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles, o que já foi por mim manifestado em voto proferido na citada AI no REsp 1.135.354/PB.

Nesse passo, toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento – por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo cartorário chamado "casamento civil".

Portanto, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável – também uma entidade familiar -, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento – ato jurídico – e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica.

De fato – sem que se pretenda enumerar à exaustão -, são vários os casos em que os efeitos decorrentes do instrumento formal do casamento justificam o tratamento distinto entre ele e a união estável.

São hipóteses que decorrem diretamente da solenidade e da publicidade do ato jurídico, atributos que perecem ser, "aos olhos do legislador, a forma de assegurar a terceiros interessados a ciência quanto a regime de bens, estatuto pessoal, patrimônio sucessório e assim por diante" (TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 4 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 409-410).

Assim, se alguém pretender negociar com pessoas casadas, é imperioso que saiba o regime de bens e, eventualmente, a projeção da negociação no patrimônio do consorte; a outorga uxória para a prestação de fiança também é hipótese que demanda "absoluta certeza, por parte dos interessados, quanto à disciplina dos bens vigente, segurança que só se obtém pelo ato solene do casamento" (TEPEDINO, Gustavo. Ibidem ).

4. Um dos paradigmas colacionados para o confronto – o qual, adiante-se, julgo apto à comprovação do dissídio – fornece bem a visão prática do que ora se afirma. Entendeu o julgado ser válida a hipoteca dada por um companheiro sem a outorga do outro (Resp 952141/RS, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/06/2007, DJ 01/08/2007).

O saudoso relator afirmou:

Era impossível que o banco exigisse do devedor a "outorga uxória", ou ato que o valha, pois não tinha como saber da existência da união estável.

Ora, garantir à recorrida o direito à meação é legitimar a atitude condenável de seu companheiro, que omitiu a existência da união estável.

A má-fé do devedor não pode prejudicar o credor, especialmente se este último não tem como se proteger.

[…]

A se admitir que a recorrida ponha a salvo sua meação, em prejuízo do banco recorrente, estaríamos estimulando a conduta desleal do devedor.

A possibilidade de fraudes seria enorme, até porque não é possível que o credor tenha ciência inequívoca da situação de fato em que se envolve o devedor.

A existência da união estável, embora tenha repercussão jurídica, é um fato da vida. Não há exigência de que seja registrada para que exista!

Com efeito, voltando ao exame do caso em julgamento, a exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por aquele aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável se justifica. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança.

Na mesma linha, não parece nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável, sem a outorga uxória do outro companheiro.

De resto, a celebração de escritura pública entre os consortes não afasta essa conclusão, porquanto não é ela própria o ato constitutivo da união estável. Presta-se apenas como prova relativa de uma união fática, que não se sabe ao certo quando começa nem quando termina.

Ademais, por não alterar o estado civil dos conviventes, para que dela tivesse conhecimento, o contratante deveria percorrer todos os cartórios de notas do Brasil, o que se mostra inviável e inexigível.

5. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para, julgando válida a fiança prestada, rejeitar os embargos do devedor.

Por consequência, condeno o embargante/recorrida ao pagamento de custas processuais e honorários de advogado, os quais ora fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base no art. 20, § 4º, do CPC.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA: Sr. Presidente, do mesmo modo, cumprimento o Sr. Ministro Relator e subscrevo integralmente o voto de S. Exa.

DOU PROVIMENTO ao recurso especial.

Fonte: STJ.

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