1ª VRP/SP: Inexigibilidade de apresentação da CND.

Processo 1002859-36.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1002859-36.2018.8.26.0100

Processo 1002859-36.2018.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – Banco do Brasil S/A – Vistos.Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento do Banco do Brasil, diante da negativa em se proceder ao registro da cédula de crédito bancário emitida por Telemática Sistemas Inteligentes LTDA, pela qual ICA Telecomunicações LTDA deu em hipoteca os imóveis objeto das matrículas nº 87.742 e 87.743 ao Banco do Brasil S/A.O óbice registrário refere-se à necessidade da apresentação de prova de regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional, nos termos do artigo 47, I, b, da Lei nº 8.212/91 da empresa ICA Telecomunicações LTDA, nos termos da Portaria conjunta PGFN/RFB nº 1.751 de 02/10/2014. Na peça vestibular, o Registrador declara ter ciência da atual jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corregedoria Permanente no tocante a necessidade da apresentação das Certidões Negativas (item 119.1, do Cap. XX, das Normas Extrajudiciais de Serviço) e assevera que a matéria ainda enseja a controvérsia, tendo em vista que existe entendimento no sentido em que a alínea b, inciso I, do artigo 47, da Lei Federal nº 8.212/91, estaria em vigor, por não ter sido expressamente declarada inconstitucional. Juntou documentos às fls.04/89.O suscitado apresentou impugnação às fls.90/98. Insurge-se do óbice imposto sob o argumento de que o STF reconheceu a inconstitucionalidade da comprovação da quitação de créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias compulsórias quando do registro na Serventia de imóveis dos negócios jurídicos realizados. Apresentou documentos às fls.105/128.O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls.131/132).É o relatório.Passo a fundamentar e a decidir. Cumpre primeiramente consignar que acompanho o entendimento do MM Juiz Josúe Modesto Passos, que em decisão proferida à frente desta 1ª Vara de Registros Públicos, declarou que, no que diz respeito à sua convicção pessoal, “no juízo administrativo não cabe aplicar a inconstitucionalidade declarada sobre a Lei 7.711, de 22 de setembro de 1988, art. 1º, I, III e IV, e §§ 11º-3º (cf. ações diretas de inconstitucionalidade 173-6 e 394-1) para, por identidade de razão, dar por inconstitucional a Lei 8.212/1991, art. 47, I, b. Além disso, na arguição 0139256-75.2011.8.26.0000 foi declarada apenas a inconstitucionalidade da Lei 8.212/1991, art. 47, I, d, e – repita-se – na via administrativa não há estender a eficácia dessa decisão também para o art. 47, I, b. Finalmente, as NSCGJ, II, XIV, 59.2, são de alcance algo duvidoso, porque dispensam os tabelionatos (frise-se) de exigir as certidões para a lavratura de escrituras públicas de negócios jurídicos concernentes a direitos reais imobiliários, é verdade; porém, as próprias NSCGJ não puseram dispensa semelhante em favor dos ofícios de registro de imóveis, mesmo na redação dada pelo Provimento CG 37, de 26 de novembro de 2013, em vigor a partir de 28 de janeiro de 2014”.De resto, já decidiu o E. Tribunal de Justiça (apelação 0015621-88.2011.8.26.0604 – Sumaré, 11ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Ricardo Dip, j. 22.01.2013):”Nesse quadro, avista-se, com efeito, que a exigência, na espécie, de apresentação de certidões negativas para que a carta de adjudicação acedesse ao fólio real tem por fundamento a Lei nº 8.212/1991, e, embora a Lei nº 7.711/1988 também verse a necessidade de apresentação das aludidas certidões, o fato é que a Registradora imobiliária, na qualificação do título apresentado a registro, adstrita ao princípio da legalidade, tomou amparo na Lei nº 8.212. À falta de declaração judicial expressa de que a Lei nº 8.212/1991 padeça de inconstitucionalidade, não pode o Registrador de imóveis estender-lhe a fulminação que afligiu a Lei nº 7.711/1988. Frise-se, além disso, que o art. 48 da Lei nº 8.212, de 1991, enuncia que o registrador é solidariamente responsável pela prática de atos com inobservância de seu art. 47: “Art. 48. A prática de ato com inobservância do disposto no artigo anterior, ou o seu registro, acarretará a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que lavrar ou registrar o instrumento, sendo o ato nulo para todos os efeitos. (…) § 3º O servidor, o serventuário da Justiça, o titular de serventia extrajudicial e a autoridade ou órgão que infringirem o disposto no artigo anterior incorrerão em multa aplicada na forma estabelecida no art. 92, sem prejuízo da responsabilidade administrativa e penal cabível.”Note-se que nesse aresto ficou aventada a possibilidade de a corregedoria permanente (e, por maior força de razão, a Corregedoria Geral) dispensar as certidões, mas somente nos casos de difficultas praestandi, de absoluta impossibilidade de satisfazer a exigência (Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – LRP/1973, art. 198, verbis “ou não a podendo satisfazer”) – e não de modo geral e abstrato.” Feitas essas observações, é necessário, porém observar que, justamente porque aqui se trata de um juízo administrativo, não há liberdade senão para cumprir o que tenham decidido as autoridades superiores, i. e., a Corregedoria Geral da Justiça (CGJ) e o Conselho Superior da Magistratura (CSM) – as quais, é bom ver, desde o julgamento da Apel. Cív. 0003435-42.2011.8.26.0116, em 13.12.2012 (DJ 30.01.2013), mandam que se dispensem as certidões negativas de dívidas tributárias federais e previdenciárias federais. Nesse sentido, confiram-se: (a) para a CGJ: Proc. 62.779/2013, j. 30/07/2013, DJ 07/08/2013; e Proc. 100.270/2012, j. 14/01/2013 (b) para o CSM: as Ap. Cív. 0015705-56.2012.8.26.0248, j. 06.11.2013, DJ 06.11.2013; 9000004-83.2011.8.26.0296, j. 26.09.2013, DJ 14.11.2013; 0006907- 12.2012.8.26.0344, 23.05.2013, DJ 26.06.2013; 0013693-47.2012.8.26.0320, j 18.04.2013, DJ 24.05.2013; 0019260- 93.2011.8.26.0223, j. 18.04.2013, DJ 24.05.2013; 0021311-24.2012.8.26.0100, j. 17.01.2013, DJ 21.03.2013; 0013759- 77.2012.8.26.0562, j. 17.01.2013, DJ 21.03.2013; 0018870-06.2011.8.26.0068, j. 13.12.2012, DJ 26.02.2013; 9000003-22.2009.8.26.0441, j. 13.12.2012, DJ 27.02.2013; 0003611-12.2012.8.26.0625, j. 13.12.2012, DJ 01.03.2013; e 0013479-23.2011.8.26.0019, j. 13.12.2012, DJ 30.01.2013.Ressalto ainda que, em recente decisão proferida pelo Conselho Nacional de Justiça, nos autos do pedido de providências nº 000123082-.2015.2.00.0000, formulado pela União/AGU, foi determinado aos cartórios de imóveis que deixem de exigir a certidão negativa de débito previdenciário:”CNJ: Pedido de Providências Provimento do TJ-RJ que determinou aos cartórios de registro de imóveis que deixem de exigir a certidão negativa de débito previdenciária (CND) Pedido formulado pela UNIÃO/AGU para a suspensão cautelar e definitiva dos efeitos do Provimento n. 41/2013, além da instauração de reclamação disciplinar contra os magistrados que participaram da concepção e realização do ato e ainda, que o CNJ expeça resolução ou recomendação vedando a todos os órgãos do Poder Judiciário a expedição de normas de conteúdo semelhante ao editado pela requerida Provimento CGJ n. 41/2013 editado pelo TJRJ está de acordo com a interpretação jurisprudencial do STF Ressalte-se que não houve qualquer declaração de inconstitucionalidade dos artigos 47 e 48 da Lei n. 8.212/91, mas sim fixação de norma de competência da Corregedoria Geral de Justiça local para regulamentar as atividades de serventias extrajudiciais vinculadas ao Tribunal de Justiça Pedido de providências improcedente”De acordo com o Acórdão:”… Ao contrário do que afirma a Advocacia-Geral da União, verifica-se que o Provimento CGJ n. 41/2013 editado pelo TJRJ está de acordo com a interpretação jurisprudencial do STF acerca da aplicabilidade dos artigos 47 e 48 da Lei n. 8.212/91 ao dispensar a exigência de apresentação de CND para o registro de imóveis. Confira-se:RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO TRIBUTÁRIO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CLÁUSULA DA RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL PLENO DO STF. RESTRIÇÕES IMPOSTAS PELO ESTADO. LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL. MEIO DE COBRANÇA INDIRETA DE TRIBUTOS. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte, agora reafirmada em sede de repercussão geral, entende que é desnecessária a submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em Súmula deste Tribunal, nos termos dos arts. 97 da Constituição Federal, e 481, parágrafo único, do CPC. 2. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente entendido que é inconstitucional restrição imposta pelo Estado ao livre exercício de atividade econômica ou profissional, quanto aquelas forem utilizadas como meio de cobrança indireta de tributos. 3. Agravo nos próprios autos conhecido para negar seguimento ao recurso extraordinário, reconhecida a inconstitucionalidade, incidental e com os efeitos da repercussão geral, do inciso III do §1º do artigo 219 da Lei 6.763/75 do Estado de Minas Gerais. (ARE 914045 RG, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgado em 15/10/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL MÉRITO DJe-232 DIVULG 18-11-2015 PUBLIC 19-11-2015 )Cabe salientar que a exigência da certidão negativa de débitos previdenciários deve ser analisada pelo oficial do registro de imóveis nos termos do próprio artigo 48 da Lei n. 8.212/91 que assim dispõe: “a prática de ato com inobservância do disposto no artigo anterior, ou o seu registro, acarretará a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que lavrar ou registrar o instrumento, sendo o ato nulo para todos os efeitos”. (Corregedor Nacional de Justiça: Ministro João Otávio de Noronha, assinado eletronicamente em 22.09.2016). Assim, esta Corregedoria Permanente não pode senão afastar o óbice levantado pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, para que se proceda ao registro.Diante do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento do Banco do Brasil, e consequentemente determino o registro do título apresentado.Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.P.R.I.C. – ADV: FLAVIO CRAVEIRO FIGUEIREDO GOMES (OAB 256559/SP), GLAUBER ROCHA ISHIYAMA (OAB 265127/SP) (DJe de 14.03.2018 – SP)

Fonte: DJE/SP | 14/03/2018.

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1ª VRP/SP. RCPJ. As Organização Religiosa. não estão restritas as atividades de culto e liturgia, podendo prestar assistência a seus membros.

Processo 1122828-79.2017.8.26.0100 – Dúvida – Registro civil de Pessoas Jurídicas – 1º Oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital de São Paulo – Igreja Evangélica Verbo da Vida São Paulo – Chacara Santo Antônio – Esdras da Silva – Vistos.Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, a requerimento de Igreja Evangélica Verbo da Vida São Paulo Chácara Santo Antônio, após negativa em registrar Ata da Assembleia de Constituição da Entidade.O Oficial entende que deve constar no estatuto a antecedência e a forma de materialização do edital de convocação para as assembleias; o modo de instalação e deliberação da assembleia geral; os requisitos para recomposição dos órgãos diretivos em caso de renúncia, falecimento ou destituição; as condições para destituição de administradores e para a dissolução social da entidade e a forma de aprovação das contas da entidade. Aduz que o entendimento na jurisprudência paulista é no sentido de que a “liberdade de organização é restrita às finalidades de culto e liturgia, porém, quanto ao cumprimento das exigências legais, não há previsão de dispensa”. Juntou documentos às fls. 06/87. Foi apresentada impugnação às fls. 93/96, com documentos à fls. 97. Aduz o representante da Igreja que o Código Civil concede liberdade e autonomia para que a organização religiosa se organize da forma que melhor incorpora seus princípios, conforme art. 44, §1º. Alega que os dispositivos elencados pelo Oficial não dizem respeito às organizações religiosas, mas às associações privadas, o que não é o caso da Igreja.O Ministério Público, às fls. 103/105, opinou pela procedência da dúvida.É o relatório. Passo a fundamentar e decidir.Primeiramente, cumpre salientar que a pessoa jurídica não pode ser qualificada como organização religiosa, como consta no art.1º do estatuto da entidade. Isso se dá, sobretudo, devido à redação do artigo 16, de seu estatuto:”Art. 16. A IEVV poderá, também, instituir centros de treinamento bíblico, escolas, livrarias, orfanatos, abrigos para crianças e adolescentes, abrigos para idosos, centros de reabilitação para dependentes químicos, outras ações de cunho social, além de desempenhar outras atividades meio, tendo sempre como base os fundamentos da Palavra de Deus e os princípios de fé elencados neste estatuto. §1.º Será decidida pela Diretoria da IEVV, sempre em parceria com o MVV, o formato e a natureza jurídica mais adequados para o desempenho das atividades meio acima mencionadas. §2. º Qualquer resultado financeiro advindo dessas atividades suprarreferidas deve ser revertido para a IEVV e empregado na consecução das finalidades elencadas nos incisos do Art. 4º do Estatuto” (grifo nosso)Vê-se que a entidade prevê em seu estatuto prestação de serviços a terceiros que não são membros da crença. Esta peculiaridade é importante, sobretudo diante da atual jurisprudência da E. Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo.CGJSP – PROCESSO:54.191/2015 Relator:Elliot Akel”Ora, aqui a situação é completamente diferente. A recorrente prestará assistência material não a terceiros, mas, somente, a seus próprios membros, que não são associados, mas clérigos, exclusivamente. Isso não desvirtua, absolutamente, a natureza de organização religiosa da recorrente, nem lhe dá feição mista.A prestação de assistência material aos seus clérigos – Bispos, Sacerdotes Católicos e Diáconos da Igreja Católica Apostólica Romana – é inerente aos próprios fins da organização religiosa. Trata-se dos meios para que se alcance o fim de propagação da fé.Repita-se: nem a assistência material será prestada a terceiros, nem os membros podem associar-se como se daria numa associação qualquer. Membros, aqui, são apenas os clérigos, assim reconhecidos pela Igreja Católica Apostólica Romana.” (grifo nosso)Como complemento, dois excertos doutrinários:”6. Sociedades e associações pias ou morais. – O fato de ter nome de santo, ou aludir a alguma religião o nome da associação pia, ou moral, não a faz sociedade ou associação religiosa. Sociedade religiosa é a que se dedica ao culto. Se, ao lado do culto, pratica beneficência, ou ensino moral ou assistência moral, é mista. Se o culto é secundário, cessa qualquer caracterização como sociedade ou associação religiosa”(Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado: Parte Geral Introdução Pessoas físicas e jurídicas. 2.ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954. t 1, p. 324, §82, 6).”A CF, art. 5º, VI, assegura a liberdade de exercício de cultos religiosos e garante, na forma da lei, “a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.Vê-se que a liberdade de organização religiosa está limitada às finalidades de culto e liturgia.Somente para esses fins pode ser considerada organização religiosa e assim registrada. Se a comunidade religiosa desenvolve outras atividades, de caráter econômico, como instituições educacionais ou empresariais, estas não se consideram incluídas no conceito de “organizações religiosas” para os fins da Constituição e do CC, pois não destinadas diretamente para culto ou liturgia. Essas outras atividades deverão ser organizadas sob outras formas de personalidade jurídica (…), ainda que seus resultados econômicos sejam voltados para dar sustentação a projetos desenvolvidos pela respectiva comunidade religiosa”(g.n.) (Paulo Lôbo, Direito Civil: parte geral. 3.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 186-187). Conclui-se que as recentes decisões elencadas modificam o entender anterior da doutrina e jurisprudência ao dizer que as organizações religiosas não estão restritas as atividades de culto e liturgia, podendo prestar assistência a seus membros.Se a princípio, a assistência prevista pelo estatuto diz respeito aos preceitos religiosos da igreja, uma vez que este é aplicado a terceiros, a possibilidade de ser caracterizada como organização religiosa fica afastada diante da atual jurisprudência, que deve ser considerada ao interpretar o texto legal correspondente a tais organizações, expresso pelo MMº Juiz Josué Modesto Passos no Processo nº 0015547-23.2013 desta Vara:”O problema posto pela má técnica da Lei n. 10.825/03, que inseriu na lei um termo (“organização religiosa”) sem dar-lhe uma definição, está em saber onde inserir a pessoa jurídica que, criada e mantida com os fins últimos de dar culto e propagar a fé, desempenhe também outras atividades, como sucede com a requerente”Ademais, o rol de pessoas jurídicas de direito privado previsto no art. 44 do Código Civil não é exaustivo, conforme o enunciado da III Jornada de Direito Civil: “144 Art. 44: A relação das pessoas jurídicas de direito privado constante do art. 44, incs. I a V, do Código Civil não é exaustiva.”Assim, podemos entender que também é possível a pessoa jurídica “associação religiosa”, voltada para as entidades que além do culto e baseada em princípios religiosos, prestam assistência a terceiros, sendo assim, nas palavras de Pontes de Miranda, “associações mistas”.Com a análise dos documentos apresentados, fica claro que a Igreja Evangélica Verbo da Vida presta serviços religiosos. Porém, isso não exclui as palavras do estatuto, que claramente preveem o serviço filantrópico a pessoas que não necessariamente estão ligadas à fé cristã, constituindo uma associação religiosa.Quanto aos óbices apresentados pelo Oficial, ressalto que esse tem autonomia para qualificar os títulos apresentados. Segundo Flauzilino Araújo dos Santos ao abordar acerca do princípio da legalidade, no Registro de Imóveis, elucida que tal princípio diz respeito ao comportamento do Registrador, ao permitir o acesso ao álbum registral apenas para os títulos juridicamente válidos para esse fim e que reúnam os requisitos legais para sua registrabilidade e a conseqüente interdição provisória daqueles que carecem de aditamentos ou retificações e definitiva, daqueles que possuem defeitos insanáveis. Essa subordinação a pautas legais previamente fixadas para manifestação de condutas que criem, modifiquem ou extingam situações juridicamente postas não é exclusiva da temática registral, mas resulta da própria aspiração humana por estabilidade, confiança, paz e certeza de que todo o comportamento para obtenção de um resultado regulamentado para a hipótese terá a legalidade como filtro, vetor e limite. Nesse sentido, correto o Registrador ao aludir que o §1º do art. 44 do Código Civil não afasta esta possibilidade ao limitar a intervenção estatal nas entidades religiosas. Nesse sentido, o enunciado 143 da III Jornada de Direito Civil:”143 Art. 44: A liberdade de funcionamento das organizações religiosas não afasta o controle de legalidade e legitimidade constitucional de seu registro, nem a possibilidade de reexame, pelo Judiciário, da compatibilidade de seus atos com a lei e com seus estatutos. “No que tange ao registro de seus atos constitutivos ou demais atos, não há previsão legal de dispensa das regras previstas pelo art. 46 do Código Civil e, por analogia, aos dispositivos estabelecidos para as associações.No caso em análise, conforme os documentos de fls. 12/53, o estatuto da entidade nada menciona sobre as hipóteses e exigências dos artigos 46, inciso IV; 54, incisos V, VI e VII; 59, inciso I e parágrafo único; 60 e 61; todos do Código Civil.Diante de todo o exposto, os interessados poderão superar os óbices ao adequarem-se à modalidade de associação, realizando as alterações necessárias no estatuto da entidade. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, a requerimento de Igreja Evangélica Verbo da Vida São Paulo Chácara Santo Antônio, no sentido de manter todos os óbices impostos pelo Oficial.Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.Oportunamente, arquivem-se os autos.P.R.I.C. – ADV: EVANDRO BARBOSA LIMA (OAB 170016/SP) (DJe de 14.03.2018 – SP)

Fonte: DJE/SP | 14/03/2018.

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EMOLUMENTOS – USUCAPIÃO – JUSTIÇA GRATUITA – REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO – IMPUGNAÇÃO PELO OFICIAL.

Embora o oficial não tenha legitimidade para impugnar o benefício, havendo cabal demonstração de que o beneficiário não necessita do favor legal, o juiz pode indeferir a concessão. É uma obrigação legal do registrador apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial.

TJSP – AGRAVO DE INSTRUMENTO: 2155965-44.2017.8.26.0000
LOCALIDADE: Piracaia DATA DE JULGAMENTO: 31/01/2018 DATA DJ: 06/03/2018
RELATOR: Miguel Brandi
LEI: LO – Novo CPC – 13.105/15 ART: 99 PAR: 2

AGRAVO DE INSTRUMENTO Usucapião – Justiça Gratuita – Revogação do benefício – Insurgência da autora – Alegação de que a oficial de registro de imóveis não tem legitimidade para impugnar o favor legal – Descabimento – De fato, não tem legitimidade a cartorária para impugnar a benesse, contudo os documentos que juntou demonstram que a autora não necessita do benefício Obrigação do registrador, delegado do serviço público, de apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial – Art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC que  autoriza o indeferimento da concessão do benefício legal quando houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, independentemente da questão da legitimidade – Agravante que pouco faz para justificar sua pretensão e demonstra desapreço pela prestação do serviço judicial – AGRAVO DESPROVIDO.

ÍNTEGRA

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2155965-44.2017.8.26.0000, da Comarca de Piracaia, em que é agravante INES GUIMARAES GONCALVES DE GODOY, são agravados ADRIANA GONÇALVES GODOY GALDINO, DORIVAL DONIZETTI TURELA, FERNANDA GONÇALVES DE GODOY SIQUEIRA, BENEDITO APARECIDO SIQUEIRA e RENATA GONCALVES DE GODOY.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores MIGUEL BRANDI (Presidente), LUIS MARIO GALBETTI E MARY GRÜN.

São Paulo, 31 de janeiro de 2018.

Miguel Brandi Relator

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº: 2017/25550

AGRV.Nº: 2155965-44.2017.8.26.0000 COMARCA: PIRACAIA

AGTE.   : INES GUIMARÃES GONÇALVES DE GODOY AGDO.          : ADRIANA GONÇALVES GODOY GALDINO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Usucapião – Justiça Gratuita – Revogação do benefício – Insurgência da autora – Alegação de que a oficial de registro de imóveis não tem legitimidade para impugnar o favor legal – Descabimento – De fato, não tem legitimidade a cartorária para impugnar a benesse, contudo os documentos que juntou demonstram que a autora não necessita do benefício Obrigação do registrador, delegado do serviço público, de apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial – Art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC que  autoriza o indeferimento da concessão do benefício legal quando houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, independentemente da questão da legitimidade – Agravante que pouco faz para justificar sua pretensão e demonstra desapreço pela prestação do serviço judicial – AGRAVO DESPROVIDO.

Agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, tirado em ação de usucapião ajuizada pela agravante em face dos agravados, em que, pela decisão de fls. 11/15 do agravo (fls. 165/169 do principal), restou revogado o benefício da Justiça Gratuita.

Sustenta a agravante, em síntese, que o pagamento das custas processuais da Ação de Usucapião atinge a importância R$ 8.772,61 e que comprovou que recebe pequenos rendimentos. Frisa que a Oficial Registradora da Comarca de Piracaia não tem legitimidade para requerer a revogação dos benefícios da assistência judiciária gratuita, pois não é parte nem tampouco terceira interessada. Pede atenção para o teor  da documentação de fl. 103. Afirma que o fato de possuir patrimônio imobiliário não é sinônimo de que tenha rendimentos suficientes para o pagamento das custas processuais. Frisa que recebeu os imóveis de herança e doação avoenga e que se aposentou como professora nível I do Estado de São Paulo. Anota que o pagamento da perícia judicial atinge a importância de R$6.300,00.

Despacho inicial às fls. 19/20, concedendo efeito suspensivo e determinando que a agravante junte documentos (comprovantes de proventos de aposentadoria).

Petição da agravante juntando os documentos exigidos (fl. 23). Documentação que revela que a recorrente aufere R$1.964,57 por mês (comprovantes de junho a agosto de 2017).

Breve relato.

O agravo não merece provimento.

Na ação de usucapião promovida pela insurgente (viúva, professora aposentada, titular de inúmeros imóveis), a Oficial do Registro de Imóveis, ao prestar informações sobre a viabilidade da demanda, representou com relação ao benefício da AJ concedido à autora.

Depois de informações, manifestação da interessada e nova manifestação da registradora, o benefício foi revogado (fls. 11/15 eTJ).

Pois bem.

De fato, a Oficial do Cartório de Registro de Imóveis não tem, com arrimo no art. 100 do CPC, citado pelo juiz de origem na decisão ora recorrida, legitimidade para impugnar, ainda que sob o título de representação, a Justiça Gratuita concedida.

Com efeito, como salientei à fl. 20, “o art. 996, parágrafo primeiro do CPC, que apresenta modificação pequena em relação ao que dispunha o art. 499, parágrafo único do CPC/1973, ao definir terceiro interessado em recorrer, diz cumprir ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como  substituto processual.

O mero interesse econômico nas custas que poderão ser exigidas da interessada se a ação for julgada procedente e quando apresentado a registro o respectivo mandado, e que estaria a agravante isenta se mantido o benefício da AJ (art. 98, IX do CPC), não parece, nesta primeira análise do caso, confundir-se com interesse jurídico, na expressão emprestada do dispositivo do CPC antes anotado.”.

Contudo, a revogação deve ser mantida com fulcro no art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC (o juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade).

Independentemente da representação, e tendo em vista a finalidade da Justiça Gratuita e que todos devem zelar pela observância da legalidade e pela boa gestão do patrimônio público, não é possível ignorar os documentos amealhados pela Cartorária.

Com efeito, como bem resumiu o juiz de origem, “a autora apresenta patrimônio incompatível com a benesse da assistência judiciária gratuita. Segundo a Oficiala, que goza de fé pública, a autora é proprietária registrária, ao menos na proporção de 50% (cinquenta por cento), de 13 (treze) imóveis, perfazendo, assim, um patrimônio aproximado a R$ 2.300.000,00. Tais alegações são corroboradas pelos termos de pagamento da meação homologado no inventário dos bens deixados pelo falecimento de Doracy Augusto de Godoy, distribuídos sob n. 0000006-64.2013.8.26.0450, em que 10 (dez) imóveis foram partilhados àquela época (agosto de 2014).”.

É certo que tem proventos mensais de aposentadoria na ordem de R$1.964,57, contudo, mesmo auferindo esse pequeno valor, consegue manter inúmeros imóveis (pagando tributos, realizando a limpeza e a manutenção dos diferentes tipos de imóveis e etc.), o que indica que provavelmente tem outras fontes de renda (como aluguéis) ou valores depositados em contas bancárias que lhe dão rendimentos.

Além disso, segundo o plano de partilha da herança deixada pelo ex-cônjuge da agravante, por ela apresentado, não teve a recorrente dificuldade alguma em “repor” a diferença de R$13.748,18 em favor das demais herdeiras.

Enfim, o recurso pouco faz para justificar a pretensão de manter os benefícios da Justiça Gratuita, explicando, por exemplo, como a recorrente administra tantos imóveis com tão pouco, o que beira à litigância de má-fé, e demonstra desapreço por todos os profissionais que trabalham ou trabalharão neste processo, e que devem ser remunerados, pela Fazenda Pública, responsável direta pelo custeamento da prestação dos serviços judiciários, e pelo contribuinte, responsável indireto pelo custeamento do Poder Judiciário.

O recurso, em suma, limita-se a levantar questões formais e a dar valor absoluto ao documento que comprova o valor de sua aposentadoria.

Por todo o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao agravo.

MIGUEL BRANDI

Relator

Fonte: IRIB | 14/03/2018.

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