1VRP/SP: Registro de Imóveis. Alienação Fiduciária. Necesssidade de poderes expressos e especiais. Processo 1020060-70.2020.8.26.0100


  
 

Dúvida – Notas – Joiceane Gonzaga dos Santos – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Joiceane Gonzaga dos Santos, diante da negativa em se proceder ao registro do instrumento particular de compra e venda com alienação fiduciária em garantia, referente ao imóvel matriculado sob nº 64.155. O óbice registrário refere-se ao fato da procuração ser confeccionada de forma genérica, ou seja, não há informação de que o outorgante confere poderes específicos e expressos para a representar, adquirir e dar em garantia por alienação fiduciária o imóvel mencionado. Juntou documentos às fls.05/58. A suscitada não apresentou impugnação, conforme certidão de fl.59. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.62/63). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o Registrador, bem como a D. Promotora de Justiça. A questão a ser analisada na presente hipótese envolve a representação processual outorgada por Enanes Correia dos Santos a Joiceane Gonzaga dos Santos (fl.36). No referido instrumento não constou a informação de que o outorgante confere poderes especiais e expressos para sua representante adquirir e dar em garantia por alienação fiduciária o imóvel objeto da matrícula nº 64.155: “… bem como poderes para comprar quaisquer imóveis em todo território nacional em nome do outorgante, podendo assinar contratos e tudo que for relativo a compra de imóveis, podendo, para tanto, pagar o preço, receber quitação, assinar escrituras públicas e contratos de qualquer natureza públicos ou privados, fazer financiamentos imobiliários, inclusive junto à Caixa Econômica Federal, assinado tudo que for preciso, podendo dita procuradora transmitir domínio, direito, ação e posse, responder pela evicção de direito, liquidar dívidas hipotecárias, fiduciárias e tributos fiscais que incidam sobre o dito imóvel, ajustar o preço de venda, da cessão ou valor da hipoteca/alienação, receber, passar recibo e dar quitação total e irrevogável do preço ou valor, assinar opção de compra e venda, assinar e endossar cheques, dar,se necessário, referido imóvel em garantia de alienação fiduciária ou hipotecária do mútuo a ser contraído perante os bancos acima mencionados, combinar cláusulas e condições, assinando os contratos necessários, inclusive de rerratificação, pagar taxas e impostos, promover registros, averbações, cancelamentos e matrículas, prestar as declarações exigidas pelo decreto n° 93.240/86; enfim, praticar todos os atos necessários para o bom e fiel cumprimento do presente mandato, podendo substabelecer”. O artigo 661, § 1º do Código Civil estabelece que: “Art. 661: O mandato em termos gerais só confere poderes de administração. § 1º Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos”. Aqui cabe fazer uma distinção entre poderes expressos e especiais: Maria Helena Diniz (Curso e direito brasileiro, v.3. São Paulo, editora: Saraiva, 2002, p. 336), menciona que: “mandato expresso, específico daqueles casos que exigem procuração contendo poderes especiais (CC, art. 661, p. Io), pois a manifestação desses poderes deverá revelar-se de modo inequívoco”. “mandato com poderes especiais, se envolver atos de alienação ou disposição, exorbitando dos poderes de administração ordinária (CC, art.661,p. 1° e 2°)”. Assim, os poderes especificos são utilizados para além da administração ordinária (poderes especiais) e declarados de modo inequívoco (poderes expressos), razão pela qual a procuração abrangendo poderes especificos é cumulada com poderes expressos. Daí que para alienar ou onerar bens imóveis, a norma é clara ao exigir representação processual com poderes especiais e expressos, sendo certo que a procuração apresentada constou poderes expressos, porém não especiais. Tal questão foi objeto de análise pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura: “REGISTRO DE IMÓVEIS – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL SACADA POR MEIO DE REPRESENTAÇÃO – EXISTÊNCIA DE PODERES EXPRESSOS MAS NÃO ESPECIAIS – ART. 661, P. 1º, DO CÓDIGO CIVIL – EXIGÊNCIA DE PODERES EXPRESSOS E ESPECIAIS – RECURSO NÃO PROVIDO” (Processo nº 0024552-06.2012.8.26.0100, Rel: Drº José Renato Nalini, Data de Julgamento: 07/02/2013, Data de Publicação:02/04/2013). Confira-se do corpo do Acórdão: “… Note-se que a lei menciona os poderes como sendo especiais E expressos, ou seja, as duas hipóteses cumulativamente. E há distinção entre ambas. Assim são os ensinamentos de Pontes de Miranda: Mandato expresso e mandato com poderes especiais são conceitos diferentes. E expresso o mandato em que se diz: “com poderes para alienar, hipotecar, prestar fiança”. Porém não é especial. Por conseguinte, não satisfaz as duas exigências do art. 1.295, § 1º, do Código Civil (atual 661, § 1º) que fala de “poderes especiais e expressos”. Cf. o Código Comercial, art. 134, “in fine”, poderes expressos são os poderes que foram manifestados com explicitude. Poderes especiais são os poderes outorgados para a prática de algum ato determinado ou de alguns atos determinados. Não pode hipotecar o imóvel “a” o mandatário que tem procuração para hipotecar, sem se dizer qual o imóvel: recebeu poder expresso, mas poder geral, e não especial” (Tratado de Direito Privado, Parte Especial, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1972. 3ª edição, reimpressão, Tomo XLIII, p. 35. 4) “…Conclui-se, pois, que os poderes especiais e os poderes expressos, referidos no § 1º do artigo 661 do Código Civil, têm significados diversos. Estes últimos são os referidos no mandato (exemplo: poderes para vender, doar, hipotecar, etc). Já aqueles correspondem à determinação específica do ato a ser praticado (exemplo: vender o imóvel “A”. hipotecar o imóvel “B”, etc). E o ordenamento jurídico, como já visto, exige a presença de ambos na procuração com o escopo de se alienar bens”. Logo, a procuração apresentada não preenche os requisitos legais, razão pela qual é de rigor a manutenção do óbice. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Joiceane Gonzaga dos Santos, e consequentemente mantenho o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: MACIEL LUIS DOS SANTOS SILVA (OAB 426914/SP)  (DJe de 12.06.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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