CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias – Óbice mantido – Recurso desprovido.

Apelação Cível nº 1007778-97.2020.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1007778-97.2020.8.26.0100

Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1007778-97.2020.8.26.0100

Registro: 2020.0000413387

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1007778-97.2020.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante FRANCISCO CARLOS FAGIONATO, é apelado OFICIAL DO 4º REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 5 de junho de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1007778-97.2020.8.26.0100

Apelante: Francisco Carlos Fagionato

Apelado: Oficial do 4º Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 31.172

Registro de Imóveis – Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna – Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação – Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD – Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias – Óbice mantido – Recurso desprovido.

1. Trata-se de apelação interposta por FRANCISCO CARLOS FAGIONATO em face da r. sentença de fl. 56/59, que manteve a recusa levantada pelo 4º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, negando registro de escritura pública em razão da não apresentação de prova de quitação do ITCMD.

Da nota devolutiva de fl. 07 constou o seguinte óbice:

“Tendo em vista que os imóveis da permuta possuem valores dispares, ou seja, não são equivalentes, apresentar guia devidamente recolhida do ITCMD sobre a diferença do valor existente entre eles, nos termos do Art. 1º, II, Art. 6º, II, a e Arts. 13 e 16, todos do Decreto Estadual n.º 46.655, de 01 de abril de 2002.

Neste sentido: processos nºs 1095880-08.2014.8.26.0100, 1003262-68.2019.8.26.0100 e 1047284-17.2019.8.26.0100, todos da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital e Corregedor Permanente desta Serventia”.

Em suas razões, o recorrente afirma que a negativa não se aplica, já que a escritura pública envolveu permuta simples de imóveis sem torna, com valor atribuído aos imóveis pelos proprietários, prerrogativa que lhes é exclusiva, visto que os valores são subjetivos e de livre escolha das partes. Não se pode, ademais, atribuir ao negócio jurídico a chamada renúncia, que não é presumida. E, mesmo eventual renúncia expressa não constituiria fato gerador de ITCMD. Ao final, pugnou pelo provimento da apelação.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fl. 89/92).

É o relatório.

2. O recurso não merece provimento.

Versa a questão sobre a possibilidade de se efetuar o registro de escritura pública de permuta de bens imóveis com valores venais diversos e sem torna, sem que haja prova de recolhimento do ITCMD.

Consoante escritura pública de fl. 08/14, FRANCISCO CARLOS FAGIONATO e sua mulher MARINA BORGES FAGIONATO e GUILHERME BORGES FAGIONATO e ROSANA ALVES BEZERRA permutaram dois imóveis a eles pertencentes matriculados sob os nºs 184.567 e 184.584 no 2º Registro de Imóveis de Ribeirão Preto/SP, possuindo cada um deles valor venal de R$105.744,42 e valor atribuído para efeito da permuta de R$163.965,00, com os imóveis matriculados no 4º Registro de Imóveis da Capital-SP sob os nºs 85.501 e 85.502, com valor venal de referência de R$362.399,00 e R$131.921,00, e valor atribuído para efeito da permuta de R$281.364,00 e R$46.566,00, respectivamente.

O valor dos imóveis permutados atribuído pelos permutantes foi de R$ 327.930,00, não havendo torna ou reposição.

Não se ignora que, se tratando de ITCMD, este Conselho Superior da Magistratura tem seguido a linha de que, em regra, não cabe ao Oficial Registrador aferir a regularidade do valor apurado a título do referido imposto:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA  FORMAL DE PARTILHA – Registro negado, ao argumento de recolhimento a menor de ITCMD – Impossibilidade Não pode o Sr. Oficial obstar registro por entender que o valor recolhido a título de tributo é inferior ao devido  Dúvida improcedente – Recurso provido.” (Apelação n.º 1066691-48.2015.8.26.0100, Rel. Des. PEREIRA CALÇAS).

Contudo, a hipótese não envolve a regular apuração de valor recolhido, mas sim de efetivo não recolhimento.

Com efeito, o Art. 289 da Lei n° 6.015/73 é expresso ao indicar que é dever do registrador fiscalizar o pagamento dos tributos incidentes:

“Art. 289. No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

A omissão do titular da delegação pode levar à sua responsabilidade solidária no pagamento do tributo, nos termos do Art. 134, VI, do Código Tributário Nacional-CTN, não se olvidando, também, de seu dever de analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando-se simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízos ao Fisco.

No caso, o negócio jurídico entabulado, permuta de bens imóveis de valores venais distintos sem haver torna ou reposição em dinheiro, gera acréscimo patrimonial de forma não onerosa àquele que recebe o bem de maior valor, a caracterizar doação, nos termos da legislação civil vigente.

“Art.538, CC: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Outro não é o entendimento jurisprudencial a respeito:

DECADÊNCIA ITCMD  Não ocorrência – Inteligência do art. 173, inc. I do CTN  Créditos tributários constituídos antes de decorrido o prazo decadencial – Preliminar prejudicial de mérito afastada  APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO – ITCMD – Alegação de que se firmou contrato de permuta sem torna a título oneroso, de forma a não incidir o imposto estadual Inadmissibilidade  Autuação baseada nas informações prestadas na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física onde foram informadas as transferências de valores a título de doação – Admissibilidade  Doação, todavia, que ocorreu em valor menor ao apurado pela fiscalização – Doação relativa a diferença de valores (venais) entre os imóveis permutados  ITCMD que deve recair sobre esta diferença – Minoração do valor autuado que se impõe  Multa confiscatória – Não observada  Conversão do depósito em renda em favor da Fazenda – Possibilidade após o trânsito em julgado R. sentença parcialmente reformada  Recursos da autora e da ré parcialmente providos. (Apelação Cível: 1003390-40.2016.8.26.0053, SILVIA MEIRELLES RELATORA).

Nestes termos, assiste razão ao I. Registrador ao exigir a apresentação de guia recolhida do ITCMD sobre a diferença do valor existente entre os imóveis, à luz do que dispõem os Arts. 1º, II, 6º, II, a, e 13 e 16, todos do Decreto Estadual nº 46.655/2002:

“Artigo 1.º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

II – por doação.

Artigo 6.º – Fica isenta do imposto

II – a transmissão por doação:

cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs;

Artigo 13 – O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação, devendo ser atualizado monetariamente, a partir do dia seguinte, segundo a variação da Unidade Fiscal do Estado de São Paulo – UFESP, até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto.

Artigo 16 – O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei 10.705/00, art.13):

 em se tratando de:

a) urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU”.

Neste cenário, não colhe o argumento do recorrente no sentido de ser prerrogativa dos proprietários a atribuição de valores aos imóveis objeto da permuta.

E, como bem ressaltado na r. sentença recorrida, não se está a exigir que toda permuta entre bens imóveis seja feita entre bens de idêntico valor. Não se caracteriza doação tributável, por exemplo, quando a diferença for irrisória, ou seja, inferior ao limite de isenção previsto em lei estadual.

No presente caso, contudo, a cessão patrimonial é relevante, presumindo-se a doação, in casu no valor de de R$282.831,16.

Por epítome, se conclui que, de fato, incabível o registro buscado, com a manutenção do óbice suscitado pelo Sr. Oficial Registrador.

3. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (DJe de 19.06.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


CSM/SP: Usucapião Extrajudicial – Requerente que obteve a posse inicial do bem por força de usufruto registrado na matrícula imobiliária – Casamento futuro previsto como condição resolutiva do direito real limitado – Pretensão de reconhecimento pelo Oficial da modificação da natureza da posse exercida por força da constituição de união estável, dando-lhe eficácia idêntica ao casamento previsto como condição resolutiva – Impossibilidade – Exercício de direito contrário ao direito registrado que não pode ser apreciado pelo Oficial do Registro Imobiliário – Necessidade de cancelamento prévio no registro do usufruto na matrícula – Registrador que não tem atribuição de valorar juridicamente fato extintivo de direito real, mas apenas a simples posse ad usucapionem – Efeitos registrários do reconhecimento da união estável com os mesmos efeitos do casamento depende de decisão judicial, impossibilitando o reconhecimento extrajudicial da usucapião – Recusa mantida – Recurso não provido.

Apelação Cível nº 1104096-79.2019.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1104096-79.2019.8.26.0100

Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1104096-79.2019.8.26.0100

Registro: 2020.0000413366

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1104096-79.2019.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante LEONOR SELVA BARBOSA, é apelado 18º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 5 de junho de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1104096-79.2019.8.26.0100

Apelante: Leonor Selva Barbosa

Apelado: 18º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo

VOTO Nº 31.124

Usucapião Extrajudicial – Requerente que obteve a posse inicial do bem por força de usufruto registrado na matrícula imobiliária – Casamento futuro previsto como condição resolutiva do direito real limitado – Pretensão de reconhecimento pelo Oficial da modificação da natureza da posse exercida por força da constituição de união estável, dando-lhe eficácia idêntica ao casamento previsto como condição resolutiva – Impossibilidade – Exercício de direito contrário ao direito registrado que não pode ser apreciado pelo Oficial do Registro Imobiliário – Necessidade de cancelamento prévio no registro do usufruto na matrícula – Registrador que não tem atribuição de valorar juridicamente fato extintivo de direito real, mas apenas a simples posse ad usucapionem – Efeitos registrários do reconhecimento da união estável com os mesmos efeitos do casamento depende de decisão judicial, impossibilitando o reconhecimento extrajudicial da usucapião – Recusa mantida – Recurso não provido.

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por Leonor Selva Barbosa, em procedimento de dúvida suscitada pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, visando a reforma da sentença de fl. 702/706, que manteve recusa de registro de usucapião extrajudicial do imóvel objeto da matrícula nº 66.181.

A nota de devolução do 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital contém a seguinte motivação para a recusa ao procedimento:

“Conforme R.3/66.181, deste Serviço Registral, nos termos da Carta de Sentença, expedida em 26/04/1983 pelo 3º Ofício Cível, do Fórum Distrital de Pinheiros, desta Capital, dos autos de Separação Consensual (proc. 672/82), foi atribuído a requerente, LEONOR SELVA BARBOSA, o USUFRUTO do imóvel usucapiendo, constando dentre outras condições, que, se a mesma viesse a se casar novamente, o usufruto ficaria automaticamente extinto, devendo ela restituir o imóvel ao nu-proprietário.

A requerente declarou viver em união estável, a partir de abril de 1995, declarando ser de conhecimento público e família essa união, inclusive do nu-proprietário, Antonio Fernando Barbosa, que deveria ter exercido o seu direito de reintegrar-se na posse do imóvel, porém, quedou-se silente.

Tudo indica, todavia, que a requerente permaneceu na posse do imóvel como usufrutuária. O usufruto permaneceu registrado na matrícula do imóvel e ainda não foi cancelado.

Enquanto não cancelado, o registro produz todos os efeitos legais (art. 252 da Lei de Registros Públicos). Assim, a posse da requerida seria, no mínimo, clandestina.

Em razão do acima exposto, a requerente nunca teve posse justa, ficando impossibilitada a aquisição originária ora requerida. Assim, em observância ao § 8º, do art. 216-A, da Lei Federal nº 6.015/73, fica indeferido o requerimento de reconhecimento da usucapião.” (fl. 642/644).

O recurso sustenta, em resumo, a necessidade de reforma da sentença, pois não considerou a união estável como tendo a mesma eficácia do casamento para fins de extinção do usufruto, alternando a natureza da posse. Afirma haver suficiente publicidade da união estável pela homologação judicial de acordo entre a apelante e Luiz Camano, reconhecendo a existência da união estável desde abril de 1995 (Processo nº 1005359-51.2018.8.26.0011 1ª Vara de Família e Sucessões do Foro Regional XI Pinheiros). Ainda, que há provas nos autos a indicar que o nú-proprietário tinha ciência da existência da união estável, observando-se o efeito da transmudação da posse direta do usufruto pela posse com ânimo de proprietário. Afirma a impossibilidade de se atribuir efeito restrito à união estável em relação ao casamento, entendendo pela mesma eficácia jurídica da união estável para fins de extinção do usufruto (fl. 725/737).

A Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fl. 760/764).

É o relatório.

2. Conheço da apelação, presentes seus requisitos de admissibilidade.

A dúvida foi suscitada em procedimento de usucapião extrajudicial, com fundamento no art. 17, § 5º do Provimento CNJ nº 65/2017:

Art. 17. Para a elucidação de quaisquer dúvidas, imprecisões ou incertezas, poderão ser solicitadas ou realizadas diligências pelo oficial de registro de imóveis ou por escrevente habilitado.

§ 1º No caso de ausência ou insuficiência dos documentos de que trata o inciso IV do caput do art. 216-A da LRP, a posse e os demais dados necessários poderão ser comprovados em procedimento de justificação administrativa perante o oficial de registro do imóvel, que obedecerá, no que couber, ao disposto no § 5º do art. 381 e ao rito previsto nos arts. 382 e 383, todos do CPC.

§ 2º Se, ao final das diligências, ainda persistirem dúvidas, imprecisões ou incertezas, bem como a ausência ou insuficiência de documentos, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido mediante nota de devolução fundamentada.

§ 3º a rejeição do pedido extrajudicial não impedirá o ajuizamento de ação de usucapião no foro competente.

§ 4º Com a rejeição do pedido extrajudicial e a devolução de nota fundamentada, cessarão os efeitos da prenotação e da preferência dos direitos reais determinada pela prioridade, salvo suscitação de dúvida.

§ 5º A rejeição do requerimento poderá ser impugnada pelo requerente no prazo de quinze dias, perante o oficial de registro de imóveis, que poderá reanalisar o pedido e reconsiderar a nota de rejeição no mesmo prazo ou suscitará dúvida registral nos moldes dos art. 198 e seguintes da LRP.”

A questão posta no recurso, limitada em relação à dúvida inicial pela devolutividade recursal, diz respeito ao reconhecimento administrativo da eficácia da união estável da apelante, a partir de homologação judicial de acordo declaratório de união estável entre Leonor Selva Barbosa e Luiz Camano, como causa suficiente para a extinção do usufruto do bem imóvel atribuído à mesma, havendo previsão, na instituição do usufruto, do novo casamento da usufrutuária como condição resolutiva do direito real limitado.

Consta do R.3 da matrícula nº 66.181, do 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, a instituição de usufruto com condição resolutiva em favor da apelante:

R.3 em 05 de janeiro de 1984.

Conforme CARTA DE SENTENÇA, referida no R.2, se verifica que nos termos das sentença de 05 de janeiro de 1.983, transitada em julgado aos 31 de janeiro de 1.983, o usufruto do imóvel, avaliado em Cr$ 8.436.871,00, foi atribuído à separanda, LEONOR SELVA BARBOSA, já qualificada, usufruto esse que ficará sujeito a duas condições resolutivas, a saber: 1º) A usufrutuária se obriga a residir no imóvel com seus filhos, até que os mesmos atinjam 21 anos de idade, para que não sintam diminuição no seu padrão de vida. Após ambos os filhos atingirem 21 anos de idade, a casa poderá ser eventualmente alugada a critério da usufrutuária, passando a mesma a receber a renda em seu exclusivo benefício. Se isso vier a acontecer a responsabilidade relativa ao pagamento dos impostos e taxas municipais passará a ser unicamente da usufrutuária e não mais ao nu-proprietário; 2º) caso a usufrutuária venha a se casar novamente, ficará automaticamente extinto o usufruto, devendo a mesma restituir o imóvel ao nuproprietário e ficando desde já autorizado o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis competente, a proceder o cancelamento do usufruto, mediante a simples apresentação da carta de sentença acompanhada da certidão do novo casamento.”

A pretensão da recorrente é pelo reconhecimento administrativo da suficiência da união estável para fins de extinguir o usufruto registrado, como efeito idêntico ao casamento civil, além da modificação, por força daquela extinção, da natureza da posse exercida sobre o bem, passando a ter efeitos para fins de aquisição da propriedade pela usucapião.

A pretensão não prospera, ao menos em sede administrativa.

Pretende a apelante que se reconheça, em procedimento de dúvida, a eficácia da união estável declarada pela interessada, homologada judicialmente, para extinguir os efeitos do usufruto registrado na matrícula imobiliária.

Para antes de se questionar a eventual equivalência da união estável e do casamento, para fins de ocorrência da condição resolutiva imposta ao usufruto, há de se reconhecer a limitação da esfera administrativa para a apreciação da questão.

É que, em termos finais, a pretensão contida no pedido da usucapião extrajudicial é de reconhecimento da extinção dos efeitos de um registro constante da matrícula que, de forma alguma, foi modificado, cancelado ou anulado. Ou seja, pretende que o Oficial registrador, em procedimento especial de reconhecimento da usucapião extrajudicial, venha a derrubar a eficácia do registro como ato de formação do direito real sobre coisa alheia, no caso, o usufruto.

E isto não se admite, posto que o registro mantém todos os seus efeitos até que haja sua modificação, seu cancelamento ou anulação, nos termos dos arts. 1.245, § 2º c.c. art. 1.227, ambos do Código Civil.

Sem que haja prévio cancelamento do registro do usufruto, reconhecendo-se a ocorrência da condição resolutiva constante do registro, não há como se colher efeitos formais de uma posse que se exerceria a partir da inexistência do direito real limitado. Ou seja, enquanto permanecer registrado o usufruto do bem imóvel em favor da apelante, não pode a mesma vindicar um efeito possessório que contrarie a natureza do direito registrado e que, até segunda ordem, legitima sua própria posse, isto em decorrência do efeito previsto no art. 1.203 do Código Civil, a estabelecer a manutenção do caráter da posse inicial até que haja prova em contrário.

E, no caso, eventual prova em contrário, como pretende a apelante, decorrente do reconhecimento de um fato jurídico que não consta do registro imobiliário, impedindo-se o reconhecimento, de plano e na esfera administrativa, de seus efeitos quanto à posse dele decorrente. Em outros termos, tendo a apelante iniciado sua posse como usufrutuária e havendo condição resolutiva expressa no negócio jurídico que estabeleceu o direito real limitado, permanece aquela posse com as mesmas características até que haja modificação do registro que lhe deu causa ou, alternativamente, haja decisão judicial reconhecendo a modificação do animus que empolga o uso do bem.

Veja-se que não se está aqui a discutir se os efeitos da união estável reconhecida equiparam-se ao casamento, quando este é escolhido, em ato de vontade, como condição resolutiva negocial (art. 121 do Código Civil), mas sim a impossibilidade de arguição dos efeitos registrários da ocorrência da condição enquanto tais efeitos não se consolidam no próprio registro, no caso, com o cancelamento do usufruto.

E, no âmbito da atuação do Oficial de Registro de Imóveis e da própria Corregedoria Permanente, não há espaço para, no procedimento declaratório da usucapião extrajudicial, reconhecer a ineficácia de um registro anterior que não tenha sido previamente cancelado ou modificado, seja por ato próprio dos interessados, seja por decisão judicial.

E não é a declaração feita pela parte interessada na ata notarial de legitimação possessória que vai gerar o efeito modificativo do direito real inscrito, posto que a extinção ou modificação do usufruto registrado não se apoia em ato unilateral do usufrutuário. Haveria a afirmação da existência da união estável e mais, seu efeito equivalente ao casamento, de ser reconhecido em pedido específico de cancelamento do registro pela ocorrência da condição, o que somente pode ser apreciado em procedimento judicial, ante sua eficácia perante terceiros, no caso, dos herdeiros do nú-proprietário.

Também a simples repetição da declaração da interessada, sobre a natureza jurídica da posse exercida, não é circunstância suficiente à vinculação do Registrador, obrigado este a apreciar a legalidade do pedido de registro da usucapião extrajudicial. O fato de se lançar na ata notarial uma declaração de vontade do interessado, no sentido de qualificar juridicamente o fato observado pelo tabelião, não importa em atribuição a aquele da fé pública notarial, posto que limitada a ata às impressões físico-materiais do tabelião quanto à existência e o modo de existir de algum fato (art. 384 da Lei nº 6.015/1973).

Não cabe, assim, ao Tabelião que lavra a ata notarial para a legitimação possessória, qualificar ou apreciar eventual tese do requerente no sentido da natureza de sua posse, no caso, por força de uma possível extinção prévia do usufruto ainda eficaz no registro; cabe-lhe apenas descrever a posse do requerente e seus antecessores (art. 216-A, I da Lei nº 6.015/1973).

Assim, havendo necessidade de se apreciar, antes da questão da posse para fins de usucapião, a extinção de um direito real limitado conferido à apelante e ainda constante do registro, não há como se proceder ao reconhecimento extrajudicial da usucapião, ante a limitação do procedimento administrativo previsto no art. 216-A da Lei nº 6.015/1973.

Não se pode, assim, apreciar em procedimento administrativo limitado a pedido da parte interessada, o reconhecimento da transmudação da posse decorrente do usufruto em posse ad usucapionem, por não se admitir, por presunção, a eficácia extintiva atribuída pelo ato de instituição do direito real limitado ao casamento, fixando-o como condição resolutiva do usufruto.

Há de se obter, previamente, o cancelamento do registro para, daí, observar-se eventual efeito da posse exercida não mais com fundamento no direito real limitado, mas em decorrência da posse em si mesma, com intenção de dono.

Tudo isto sem prejuízo da busca judicial de reconhecimento da aquisição pela usucapião, nos termos expressos do art. 217-A, § 9º da Lei nº 6.015/1973.

3. Por tais fundamentos, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a recusa do 18º Oficial do Registro de Imóveis da Capital.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (DJe de 19.06.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


Registro de Imóveis – Retificação de registro – Impossibilidade por não se inferir do título a presença de doação com encargo – Ausência de vinculação entre os contratos de compra e venda imobiliária e doação a par da coincidência do objeto da doação com o preço da compra e venda – Recurso não provido.

Número do processo: 1052425-31.2017.8.26.0506

Ano do processo: 2017

Número do parecer: 74

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1052425-31.2017.8.26.0506

(74/2019-E)

Registro de Imóveis – Retificação de registro – Impossibilidade por não se inferir do título a presença de doação com encargo – Ausência de vinculação entre os contratos de compra e venda imobiliária e doação a par da coincidência do objeto da doação com o preço da compra e venda – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso administrativo interposto contra r. sentença que julgou improcedente o pedido de providências no qual se pretendia a retificação de registro imobiliário.

A recorrente sustenta a ocorrência de doação modal e requer sua averbação com a retificação do registro (a fls. 77/90).

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (a fls. 99/100).

É o relatório.

Opino.

Apesar da interposição do recurso com a denominação de apelação, substancialmente cuida-se de recurso administrativo previsto no artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo , cujo processamento e apreciação competem a esta Corregedoria Geral da Justiça.

Diante disso, pela aplicação dos princípios da instrumentalidade e fungibilidade ao processo administrativo, passo a seu conhecimento.

A doação modal ou com encargo impõe ao donatário o dever de cumprir certa obrigação em favor do doador, de terceiro ou de interesse geral.

Essa modalidade de doação estava prevista no artigo 1.180 do Código Civil de 1916, vigente ao tempo da celebração do negócio jurídico objeto do presente pedido de providências (a fls. 21/23), conforme segue:

Art. 1.180. O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral.

Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o Ministério Público poderá exigir sua execução, depois da morte do doador, se este não o tiver feito.

A característica da doação com encargo é justamente a imposição de uma incumbência ao donatário, a ser realizada em favor do doador, de terceiro, ou do interesse geral.

No título inscrito no registro imobiliário – escritura pública – houve dois contratos um de compra e venda imobiliária e outro de doação de valor em dinheiro.

Apesar de na escritura pública constar “constituindo-se, portanto, a denominada doação modal” (a fls. 23), não foi estabelecida qualquer obrigação a ser realizada pela donatária em favor da doadora, de terceiro ou de interesse geral.

Tampouco houve indicação de cláusula restritiva acerca da limitação da utilização do valor doado apenas para compra do imóvel objeto do contrato de compra e venda.

Apesar da coincidência do preço da compra e venda com o valor doado, nada foi expressamente estabelecido no sentido da vinculação entre os dois negócios jurídicos.

Assim, não é possível a integração do contrato na forma pretendida pela recorrente, porquanto não há elementos bastantes para se concluir que o “valor doado fosse utilizado para a compra do imóvel”, no que pese a semelhança entre o preço e o objeto da doação, como acima destacado.

Respeitosamente, as ponderações da recorrente encerram ilações, pois, atendo-se ao instrumento, não há segurança para afirmar a restrição na utilização do valor doado.

Nesse quadro, não é possível a qualificação jurídica do contrato em questão como doação com encargo. Eventualmente, seria necessária a retificação do título para tanto.

Como está, apesar da redação, não há correlação entre a compra e venda e a doação pura, ainda que realizadas no mesmo instrumento público.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação interposta pelo recorrente seja recebida como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo e, a ele seja negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 06 de fevereiro de 2019.

Marcelo Benacchio

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação como recurso administrativo e a ele nego provimento. Publique-se. São Paulo, 15 de fevereiro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: ALFREDO BERNARDINI NETO, OAB/SP 231.856, FABIO GARCIA LEAL FERRAZ, OAB/SP 274.053 e ANA LUIZA FIGUEIRA PORTO, OAB/SP 331.219.

Diário da Justiça Eletrônico de 20.02.2019

Decisão reproduzida na página 037 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.