Avô regulariza contato com a neta; vínculo familiar foi enfraquecido após separação da avó

Um avô que foi impedido por seu filho de ver a neta, após o divórcio com a avó, conseguiu a fixação do contato com a menina por videoconferência durante a pandemia. A decisão é da 12ª Vara da Família e Sucessões de São Paulo. O caso contou a atuação da defensora pública Claudia Aoun Tannuri, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

O avô alegou que, após a separação, acabou ficando distante do filho, que já o permite visitar a neta de 2 anos. Ele afirmou ainda que não sabe onde eles residem e que o contato com a menina é apenas por telefone, restrito ao primeiro aniversário da criança e à visualização de fotos pelo WhatsApp.

Em razão da pandemia do coronavírus, o homem idoso – pertencente ao grupo de risco – pediu que a convivência por videochamada, de uma hora de duração, fosse regularizada liminarmente. Alegou que, embora não haja previsão legal para tanto, a determinação é medida alternativa salutar a ser imposta. Os pais da menina não apresentaram contestação.

O juiz responsável pelo caso ressaltou que, considerando a tenra idade da neta, o contato gradual e constante com o avô é “adequado ao convívio inicial”. Determinou, dessa forma, que ele passe a ter contato com a menina semanalmente, aos domingos, por videoconferência. O processo corre em segredo de justiça.

No mês passado, avós regularizam convivência com a neta em apenas 8 dias

Em maio, o IBDFAM noticiou que um casal de avós conseguiu regulamentar a guarda, a convivência e a pensão alimentícia da neta, que vive com eles desde o nascimento, em Goiás. Por conta da pandemia do coronavírus, eles sequer precisaram sair de casa e encontraram a solução em tempo recorde: oito dias. O caso apresentou consenso entre as partes – pais e avós da criança.

Para a presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa do IBDFAM, a advogada Maria Luiza Póvoa, a decisão foi acertada por considerar o princípio do melhor interesse da criança. Em entrevista, ela ressaltou o papel fundamental desempenhado por pessoas de idade avança na vida das famílias e na criação dos netos.

“Se antes o papel dos avós no cuidado das crianças era muitas vezes como coadjuvante, agora cabe a eles uma contribuição bem mais significativa, seja por motivos financeiros, imaturidade dos pais ou divórcio entre os mesmos e até abandono, além dos casos de orfandade”, atenta a advogada. Leia a entrevista na íntegra.

Fonte: IBDFAM

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Registro da instituição de condomínio edilício – Área de propriedade e de uso comum, não construída, que apesar de indicada nas descrições das unidades autônomas não foi descrita na instituição de condomínio e no memorial que o integra – Critério puramente quantitativo que não serve para aferir a existência, ou não, de condomínio edilício – Ausência de indícios de fraude às disposições legais que tratam do parcelamento do solo – Divergência entre as áreas da planta baixa do empreendimento – Óbice mantido – Memorial de incorporação que não atende ao princípio da especialidade objetiva – Necessidade de adequação – Nega-se provimento ao recurso, com observação.

Apelação Cível nº 0002772-10.2019.8.26.0344

Espécie: APELAÇÃO
Número: 0002772-10.2019.8.26.0344
Comarca: MARÍLIA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 0002772-10.2019.8.26.0344

Registro: 2020.0000413350

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0002772-10.2019.8.26.0344, da Comarca de Marília, em que é apelante CM 2 EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MARÍLIA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, com observação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 5 de junho de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 0002772-10.2019.8.26.0344

Apelante: CM 2 Empreendimentos Imobiliários SPE LTDA

Apelado: 2º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Marília

VOTO Nº 31.092

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Registro da instituição de condomínio edilício – Área de propriedade e de uso comum, não construída, que apesar de indicada nas descrições das unidades autônomas não foi descrita na instituição de condomínio e no memorial que o integra – Critério puramente quantitativo que não serve para aferir a existência, ou não, de condomínio edilício – Ausência de indícios de fraude às disposições legais que tratam do parcelamento do solo – Divergência entre as áreas da planta baixa do empreendimento – Óbice mantido – Memorial de incorporação que não atende ao princípio da especialidade objetiva – Necessidade de adequação – Nega-se provimento ao recurso, com observação.

1. Trata-se de apelação interposta por CM 2 Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. contra a r. sentença proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Marília/SP, que manteve os óbices apresentados ao registro da instituição de condomínio edilício na matrícula nº 61.326 daquela serventia imobiliária (fl. 98/102).

Alega a apelante, em síntese, que foram atendidos todos os requisitos da Lei nº 4.591/64, estando previstas, no empreendimento, a área privativa de 251,50m², correspondente a 64,56% da área útil total, assim como a área comum de 138m², correspondente a 35,43% da área útil total. Aduz que as salas comerciais serão construídas em uma única fachada, o que afasta a alegada ocorrência de burla à Lei de Parcelamento do Solo (Lei nº 6.766/79) e também impede a aplicação da Lei nº 13.465/17, que trata do condomínio urbano simples. Esclarece que a Prefeitura de Marília/SP aprovou o projeto, mediante expedição de alvará de construção das salas comerciais com número próprio na via pública, visando facilitar a construção por não existir acesso comum, como portaria ou recepção.

O título foi devolvido com as seguintes exigências pelo registrador: “- Apresentar atestado de idoneidade financeira mencionando o empreendimento; – Retificar na planta e na convenção a referência a números da rua diversos para cada unidade, pois o condomínio exige um único número para todo o prédio, ficando cada unidade com a designação de loja 1, 2, etc.; – Esclarecer a divergência de áreas constantes da planta de fls. 18, constando uma área no quadro de áreas e outra nas unidades; – Efetuar depósito de R$ 3.620,38” (fl. 64).

A interessada cumpriu a primeira e a última exigências, insurgiu-se em relação às demais e insistiu no registro da incorporação (Protocolo nº 220289 – fl. 12) , requerendo, caso mantida a qualificação negativa do título, a suscitação de dúvida pelo Sr. Oficial Registrador (fl. 67/72).

É o relatório.

2. A dúvida foi suscitada pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Marília/SP, a requerimento da ora apelante, que não se conformou com a exigência de retificação da planta e da convenção, a fim de que passe a constar um único número para todo o prédio, e tampouco com a exigência de esclarecimentos quanto à divergência de áreas, ambas apontadas na nota devolutiva expedida (fl. 64).

Da análise das razões da dúvida suscitada pelo registrador, observam-se dois fundamentos distintos para a recusa. O primeiro diz respeito à descaracterização do condomínio em sentido amplo, por conta da existência de área comum ínfima em relação à área construída, numeração distinta para cada unidade e acesso autônomo de cada uma para a via pública. Entendeu o Oficial pela possibilidade de conversão do pedido para um condomínio urbano simples, na forma da Lei nº 13.465/2017, o que não foi aceito pela incorporadora. O segundo está relacionado à necessidade de correção da planta baixa do condomínio junto à Prefeitura, após os esclarecimentos prestados pela incorporadora a respeito da divergência nas áreas de cada unidade prevista.

O primeiro óbice apresentado pelo Oficial deve ser afastado.

A instituição de condomínio edilício exige a comprovação da ocorrência das circunstâncias de fato descritas nos arts. 1.331 e seguintes do Código Civil, especialmente a existência de edificação em que se observem partes que são de propriedade exclusiva e partes que são de propriedade comum dos condôminos. E no que tange à propriedade comum, há de se considerar que esta, seja quanto à extensão de área, seja quanto à sua especificação, deve indicar com segurança que serve a todas as unidades autônomas, tanto em relação à fruição pelos proprietários, quanto à própria estrutura do bem, ou indicar a unidade que dela poderá usufruir exclusivamente.

No caso concreto, apesar da existência de pequena área de uso comum em relação às áreas das unidades autônomas, da numeração própria e do acesso exclusivo à via pública para cada uma dessas unidades autônomas, ficou satisfatoriamente demonstrada a existência de um condomínio edilício.

Com efeito, da análise do memorial descritivo e, particularmente, da planta baixa do empreendimento, observa-se a construção de cinco unidades autônomas, para fins comerciais, com previsão de áreas comuns que se caracterizam como parcela essencial e única para todas aquelas. Além do solo, tem-se a previsão de propriedade comum a todos os condôminos nas paredes divisórias, fachada, compartimentos de luz, troncos de entrada de serviços públicos, muros e gradis externos e jardins, a indicar a efetiva existência de um condomínio em seu sentido funcional.

O projeto é claro na indicação da pretensão do incorporador: criar um condomínio de estabelecimentos comerciais na forma de lojas, em área comum defronte a futuro empreendimento habitacional, sem indícios, pois, de que há intenção de fraudar a legislação específica do parcelamento de solo.

O precedente citado pelo Oficial não encontra aplicação no caso concreto, por conta da divergência de fatos a afastar a mesma solução jurídica. Naquele caso (Apelação CSM nº 1066651-03.2014.8.26.0100), as casas não possuíam uma área de propriedade comum, a não ser pela existência de uma churrasqueira que já havia sido construída em data anterior ao projeto. Como se vê, o paradigma, em seu aspecto fático, é diverso do caso em análise. Em termos amplos, o precedente citado refere-se a um caso de simulação relativa, em que a instituição do condomínio visava ocultar uma divisão ilícita da propriedade urbana.

Na hipótese dos autos, entretanto, não se vislumbra nenhuma intenção de burlar à legislação urbanística. A divisão das unidades comerciais prevista no projeto não só atende à sua finalidade econômica, mas também à ocupação lícita e viável do solo, sem significar desrespeito à legislação.

O condomínio a ser instituído, nesse aspecto, está em conformidade com a lei, pois conjuga o exercício da propriedade exclusiva com o uso de áreas de propriedade comum, administrada em favor dos condôminos.

Note-se que a existência de numeração distinta para cada uma das unidades autônomas, todas com acesso à via pública a partir de uma área comum, não traduz por si só um parcelamento irregular do solo urbano. Embora o acesso comum seja um dos elementos identificáveis do condomínio instituído, não se mostra obrigatório, especialmente em casos como o presente.

A situação fática, como se vê, não pode ser comparada à previsão de um conjunto de residências, com numeração própria e acesso à via pública individualizado, sem a existência efetiva de uma área comum.

Assim, o primeiro fundamento da recusa, qual seja, a inexistência de propriedade comum suficiente à caracterização do condomínio, merece ser afastado.

Contudo, o segundo fundamento de recusa está correto.

Conforme sustenta o Oficial, há divergência entre as áreas da planta baixa do empreendimento, constando uma medida das unidades no desenho dos imóveis e outra no quadro de áreas.

A propósito, a apelante justificou a divergência ao argumento de que “as medidas corretas são aquelas constantes no quadro da planta, conforme respectivo alvará de construção e inclusa declaração anexa da Incorporadora junto com Arquiteto responsável pelo projeto (DOC. 2), pela qual, foi utilizada para elaborar o respectivo quadro de áreas da Tabela NBR” (sic, fl. 68).

Ora, ainda que os esclarecimentos apresentados pela apelante pudessem ser aceitos, mostra-se imprescindível a correção da planta baixa aprovada pela Prefeitura Municipal. Tal providência é essencial para que se permita o ingresso do título, eis que a representação gráfica do condomínio a ser instituído, com especificação de todas as dimensões das unidades e partes comuns, deve ser única, seja na planta aprovada pelo Município, seja na descrição feita no projeto de construção constante no pedido de alvará para realização da obra.

A manutenção de parte das exigências feitas pelo Oficial, por si só, é suficiente para o acolhimento da dúvida e, consequentemente, para negativa de ingresso do título junto ao fólio real.

Entretanto, há ainda outro óbice a impedir o registro requerido. No caso concreto, o princípio da especialidade objetiva foi desrespeitado, havendo descrição insuficiente das áreas de uso comum, não construídas, no memorial de incorporação, o que impede a identificação, no plano espacial, de sua exata localização dentro do condomínio.

A instituição de condomínio deve descrever, com precisão, a localização e o regramento do uso das áreas comuns em relação às unidades autônomas. O art. 8º da Lei nº 4.591/1964 indica a necessidade de se discriminar, com precisão, as partes comuns do bem imóvel objeto da instituição do condomínio, o que pressupõe também a descrição precisa de sua localização e a previsão geral de seu uso, dando-se publicidade à forma de uso da propriedade pelos condôminos.

“Art. 8º. Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte:

(…)

c) serão discriminadas as partes do total do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sobre os vários tipos de unidades autônomas;

d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si.”

O mesmo comando se observa, de forma geral, para todos os condomínios de prédios, consoante disposto nos arts. 1.331 e 1.332 do Código Civil, exigindo-se a discriminação e a individualização das partes comuns que irão compor o condomínio.

No caso concreto, o memorial de incorporação do “Condomínio Comercial II Villa Felicittà Brigadeiro” assim descreve as partes comuns do empreendimento:

A) PARTES COMUNS – consubstanciada de coisas e áreas de uso comum dos condôminos, inalienáveis e indivisíveis, acessórias e indissoluvelmente ligadas às unidades autônomas, tal como definidas no artigo 3º da Lei n. 4.591/64, a saber: o terreno em que se levantam as edificações e suas instalações; as estruturas de alvenaria e suas fundações, as paredes externas de cada unidade; as paredes internas divisórias entre as unidades autônomas e entre estas e as partes comuns; as fachadas de cada unidade e seus ornamentos (exclusiva janelas das unidades autônomas); os compartimentos dos medidores de luz; os telhados que cobrem as unidades autônomas; os fios e encanamentos; a (sic) caixas d’água; os troncos de entrada de água, eletricidade, telefone e os de saída de esgoto e todos os respectivos ramais que servem as dependências e uso comum; os condutores de águas pluviais; bem como, as áreas do subsolo; os muros e gradis externos; os jardins e os passeios e respectivas (sic) e rebaixamento de guias para acesso as unidades e demais benfeitorias (g.n.).”

Não há descrição precisa, no memorial, das medidas e localização dos jardins, passeios e eventuais áreas comuns de acesso às unidades autônomas, observando-se, inclusive, erro material no documento a impedir a correta identificação de alguma estrutura que seria indicada após a partícula “respectivas”, constante no item VIII, A, parte final do documento (fl. 18).

Nem é possível, da análise da planta baixa do condomínio, identificar de forma clara e isenta de dúvidas a localização das áreas comuns, a fim de se aferir sua correspondência com as medidas indicadas no memorial de incorporação, bem como para que o registro das unidades condominiais futuras possa dar publicidade das áreas comuns de uso exclusivo ou não, como, por exemplo, o acesso à via pública, defronte aos cinco prédios (fl. 80).

Como se vê, o memorial de incorporação não respeita o princípio da especialidade objetiva, impedindo seu registro na matrícula do imóvel a ser incorporado, sob pena de ofensa ao art. 176 da Lei nº 6.015/1973, perfeitamente aplicável aos casos de registro de memoriais de incorporação para fins de implantação de condomínios.

Assim, sem a devida adequação do memorial de incorporação ao princípio da especialidade objetiva, também não há como se admitir o ingresso do título junto ao fólio real.

À vista do exposto, NEGO PROVIMENTO, com observação.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (DJe de 19.06.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


CSM/SP: Registro de Imóveis – Imóvel rural – Constituição de garantia de alienação fiduciária em favor de instituição financeira cujo controle societário é detido por pessoa jurídica estrangeira – Lei nº 5.709/71, art. 1º, § 1º – Orientação normativa contida na decisão da Corregedoria Geral da Justiça, que aprovou o Parecer nº 461/2012-E, suspensa por força de liminar deferida na Ação Civil Originária – ACO 2463, em curso perante o E. STF – Exigências mantidas – Dúvida julgada procedente – Apelação não provida.

Apelação Cível nº 1004462-94.2019.8.26.0073

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1004462-94.2019.8.26.0073

Comarca: AVARÉ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1004462-94.2019.8.26.0073

Registro: 2020.0000339780

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004462-94.2019.8.26.0073, da Comarca de Avaré, em que é apelante NUTRIEN AG SOLUTIONS INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA. (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL), é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE AVARÉ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 28 de abril de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1004462-94.2019.8.26.0073

Apelante: Nutrien Ag Solutions Indústria e Comércio de Produtos Agrícolas Ltda. (Em Recuperação Judicial)

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Avaré

VOTO Nº 31.132

Registro de Imóveis – Imóvel rural – Constituição de garantia de alienação fiduciária em favor de instituição financeira cujo controle societário é detido por pessoa jurídica estrangeira – Lei nº 5.709/71, art. 1º, § 1º – Orientação normativa contida na decisão da Corregedoria Geral da Justiça, que aprovou o Parecer nº 461/2012-E, suspensa por força de liminar deferida na Ação Civil Originária – ACO 2463, em curso perante o E. STF – Exigências mantidas – Dúvida julgada procedente – Apelação não provida.

1. Trata-se de apelação interposta por Nutrien AG Solutions Indústria e Comércio de Produtos Agrícolas Ltda. contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Avaré/SP, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa ao registro do instrumento particular de abertura de crédito e seu aditivo, garantido por alienação fiduciária de parte ideal correspondente a 94,5361536% do imóvel rural denominado Sítio do Cerrado, objeto da matrícula nº 38.463 da referida serventia imobiliária (fl. 117/120).

Alega a apelante, em síntese, que a hipótese não se refere à aquisição de imóvel rural por estrangeiro, mas sim, à constituição de garantia de alienação fiduciária em favor de instituição financeira cujo controle societário é detido por pessoa jurídica estrangeira, razão pela qual não se aplicam ao caso concreto as restrições estabelecidas pela Lei nº 5.709/1971 (fl. 128/139).

Na nota de devolução expedida (fl. 83), o Oficial registrador formulou duas exigências: “1. Juntar a autorização do INCRA para a aquisição, tendo em vista que a maioria do capital social é detida por empresas estrangeiras, em atenção ao disposto no artigo 1º, § 1º, e no artigo 6º, ambos da Lei 5.709/71. A credora Nutrien AG Solutions Indústria e Comércio de Produtos Agrícolas Ltda tem como sócias Alberta Ltd (610918) empresa canadense (0,000002) e Nutrien AG Solutions Participações Ltda (99,9999998) e esta tem como sócias Nutrien AG Solutions Argentina S/A – empresa argentina (0,11) e a Alberta Ltd (610918) – empresa candense (99,89). 2. Em virtude da autorização do INCRA solicitada no item acima, a transmissão da propriedade resolúvel do imóvel deve ser feita através de escritura pública (artigo 8º da Lei 5.709/71).

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 157/161).

É o relatório.

2. Dispõe a Lei nº 5.709/71 que:

“Art. 1º – O estrangeiro residente no País e a pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil só poderão adquirir imóvel rural na forma prevista nesta Lei.

§ 1º – Fica, todavia, sujeita ao regime estabelecido por esta Lei a pessoa jurídica brasileira da qual participem, a qualquer título, pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas que tenham a maioria do seu capital social e residam ou tenham sede no Exterior.

§ 2º – As restrições estabelecidas nesta Lei não se aplicam aos casos de sucessão legítima, ressalvado o disposto no art. 7º”.

A matéria relativa à interpretação do § 1º do art. 1º da Lei nº 5.709/71, que para efeito das restrições de aquisição de imóvel rural por estrangeiro equipara a pessoa jurídica brasileira que tenha sede no exterior ou cuja maioria acionária seja estrangeira, foi objeto de apreciação pelo Órgão Especial deste Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[1].

Em consonância com o entendimento adotado por referido órgão julgador, sobreveio orientação normativa da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo no sentido de que: “o § 1.° do artigo 1.° da Lei n.° 5.709/1971 não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, de sorte a dispensar os tabeliães e oficiais de registro de observarem as restrições e as determinações impostas pela Lei n.° 5.709/1971 e pelo Decreto n.° 74.965/1974, bem como do cadastramento no Portal do Extrajudicial, em relação às pessoas jurídicas brasileiras cuja maioria do capital social se concentre em poder de estrangeiros residentes fora do Brasil ou de pessoas jurídicas com sede no exterior.” (Parecer nº 461/2012-E, proferido nos autos do Processo CG nº 83.224/2010, aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini, por decisão datada de 05.12.2012).

O tema voltou a ser debatido perante o Supremo Tribunal Federal, em virtude de ação ajuizada pela União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária Incra contra o Estado de São Paulo (Ação Civil Originária nº 2.463), visando a declaração de nulidade da orientação normativa contida no Parecer nº 461/2012-E da Corregedoria Geral da Justiça deste Estado, acima transcrito, para o fim de lhes assegurar a atribuição de autorizar, ou não, a aquisição de propriedade rural, no Brasil, por pessoas jurídicas brasileiras cuja maioria do capital social pertença a estrangeiros residentes no exterior ou com sede em outro país.

Em atenção à liminar[2] deferida pelo ilustre Ministro Marco Aurélio nos autos da referida ação, foi publicado o Comunicado CG nº 1577/2016 (DJe de 08.09.2016), nos seguintes termos:

“COMUNICADO CG Nº 1577/2016

PROCESSO Nº 2010/83224 – A Corregedoria Geral da Justiça COMUNICA que, nos Autos da Ação Cível Originária ACO 2463 Distrito Federal, foi deferida pelo Excelentíssimo Senhor Ministro do Supremo Tribunal Federal, liminar suspendendo os efeitos do Parecer nº 461/12-E, de 03/12/2012, acolhido por r. decisão de 05/12/2012, do Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo, que dispensou os Tabeliães e Oficiais de Registro de observarem as restrições e determinações impostas pela Lei nº 5709/1971 e pelo Decreto nº 74965/1974 e do cadastramento no Portal do Extrajudicial, em relação às pessoas jurídicas brasileiras cuja maioria do capital social se concentre em poder de estrangeiros residentes fora do Brasil ou de pessoas jurídicas com sede no exterior, até o julgamento definitivo da ação.”

Ou seja, a orientação que dispensava os Tabeliães e Oficiais de Registro de observarem as restrições e determinações impostas pela Lei nº 5.709/1971 e pelo Decreto nº 74.965/1974 e do cadastramento no Portal do Extrajudicial, em relação às pessoas jurídicas brasileiras cuja maioria do capital social se concentre em poder de estrangeiros residentes fora do Brasil ou de pessoas jurídicas com sede no exterior, está suspensa.

Logo, estando suspensa a dispensa antes autorizada, prevalecem as restrições e determinações trazidas pela Lei nº 5.709/1971 e pelo Decreto nº 74.965/1974 que, assim, devem ser observadas pelos Tabeliães e Oficiais de Registro.

E considerando que, até a presente data, não há notícia do julgamento da ACO 2463 pelo E. Superior Tribunal Federal3, tal orientação vem sendo cumprida pelas serventias extrajudiciais do Estado de São Paulo. Nesse sentido, e não como interpretou a apelante, é o Parecer nº 182/2018-E nos autos do Processo nº 2018/00063613 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo.

Acrescente-se que, sobre a aquisição de imóvel rural por pessoa jurídica estrangeira, assim dispõem as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:

“Capítulo XVI, Subseção II – Dos Imóveis Rurais

70. A pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil somente pode adquirir bens imóveis rurais, seja qual for a extensão, mediante a prévia aprovação do Ministério da Agricultura.

(…)

74. Quando o adquirente de imóvel rural for pessoa jurídica estrangeira, da escritura pública correspondente à aquisição constará, obrigatoriamente, a aprovação pelo Ministério da Agricultura, os documentos comprobatórios de sua constituição e de licença para seu funcionamento no Brasil e, nos casos previstos no § 3.º do art. 12 da Lei n.º 5.709, de 7 de outubro de 1971, e no § 3.º do art. 5.º do Decreto 74.965, de 26 de novembro de 1974, a autorização do Presidente da República.

74.1. O prazo de validade do deferimento do pedido é de 30 (trinta) dias, dentro do qual deverá ser lavrada a escritura.

75. O Tabelião de Notas, que lavrar escritura que viole as prescrições legais atinentes à aquisição de imóvel rural por pessoa estrangeira, e o Oficial de Registro de Imóveis, que a registrar, responderão civil e criminalmente por tais atos”.

E também:

“Subseção VIII – 1. Do Livro de Registro de Aquisição de Imóveis Rurais por Estrangeiros

97. O Livro de Registro de Aquisição de Imóveis Rurais por Estrangeiros terá o formato e os lançamentos preconizados no regulamento da lei que o instituiu.

97.1. A escrituração deste livro não dispensa a correspondente do Livro nº 2 de Registro Geral.

(…)

99. Na aquisição de imóvel rural por pessoa estrangeira, física ou jurídica, é da essência do ato a escritura pública, sendo vedado ao registrador, sob pena de responsabilidade, registrar títulos que não atendam aos requisitos legais.

(…)

103. Aplicam-se as mesmas restrições relativas à aquisição de imóvel rural por estrangeiro aos casos de fusão ou incorporação de empresas, de alteração de controle acionário de sociedade, ou de transformação de pessoa jurídica nacional para pessoa jurídica estrangeira.”

Nesse cenário, havendo expressas disposições legais e normativas sobre o tema e, ainda, considerando que a alienação fiduciária transfere a propriedade resolúvel, o que também justifica a exigência de autorização quando o credor é estrangeiro, mostra-se correta a recusa formulada pelo registrador. Por conseguinte, há que ser mantida a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator.

Notas:

[1] TJSP; Mandado de Segurança Cível 0058947-33.2012.8.26.0000; Relator (a): Guerrieri Rezende; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo; Data do Julgamento: 12/09/2012; Data de Registro: 05/10/2012.

[2] Andamento processual: 01/09/2016 – Liminar deferida – Por MIN. MARCO AURÉLIO. Em 1/9/2016. “…3. Defiro a liminar pleiteada para suspender os efeitos do parecer nº 461/12-E da Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo, até o julgamento definitivo desta ação. 4. Considerada a identidade de objetos, apensem este processo ao revelador da arguição de descumprimento de preceito fundamental nº 342, para julgamento conjunto. 5. Pronunciem-se os autores acerca da contestação. 6. Vindo ao processo a manifestação, colham o parecer da Procuradoria-Geral da República. 7. Publiquem.”

[3] http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4598070 (DJe de 19.06.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.