STJ: Anuência dos herdeiros com habilitação de crédito em inventário deve ser expressa, decide Terceira Turma.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que a concordância dos herdeiros para a habilitação de crédito em inventário deve ser expressa e inequívoca. Para o colegiado, embora não tenha natureza contenciosa, a habilitação impacta a esfera jurídica dos herdeiros, razão pela qual o seu silêncio não pode ser interpretado como anuência tácita, conforme previsto nos artigos 642, parágrafo 2º, e 643 do Código de Processo Civil (CPC).

O entendimento foi adotado pela turma ao julgar o recurso de duas empresas que buscavam a habilitação de um crédito de R$ 608 mil no inventário do devedor falecido. O valor, segundo as empresas, decorre de contratos atípicos de locação firmados com o autor da herança.

Como o espólio, intimado para se manifestar, permaneceu inerte, o juízo de primeiro grau indeferiu a habilitação, sob o argumento de que a ausência de manifestação dos herdeiros inviabilizava o processamento do pedido no inventário, tornando necessária a propositura de ação autônoma. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) manteve essa decisão.

No recurso ao STJ, as empresas alegaram que a omissão dos herdeiros não poderia ser interpretada como discordância e que apenas uma negativa expressa justificaria a remessa do pedido às vias ordinárias.

Decisão judicial sobre habilitação não substitui a vontade das partes

O relator do recurso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, afirmou que o consenso das partes interessadas em torno do reconhecimento da dívida é condição essencial à habilitação –procedimento de natureza híbrida que pode ser jurisdição não contenciosa ou instrumento cautelar, mas não gera nova lide.

De acordo com o ministro, o CPC prevê duas hipóteses para o pedido de habilitação de crédito: a primeira quando há concordância entre todos os herdeiros e interessados, permitindo a separação dos bens suficientes para o pagamento da dívida; a segunda quando há discordância, o que impõe a necessidade de ação própria. Neste último caso, caberá ao juízo do inventário apenas reservar os bens, mas não resolver a lide.

Portanto, segundo o relator, a prestação jurisdicional quanto ao pedido de habilitação de crédito não substitui a vontade das partes no processo de inventário. Villas Bôas Cueva explicou que, caso haja consenso, o procedimento é de jurisdição voluntária, sem lide; no entanto, havendo dissenso, configura-se uma lide, e a disputa deve ser resolvida em foro próprio, por meio de ações específicas como cobrança ou execução de título extrajudicial.

Habilitação de crédito não pode ser usada para superar devido processo legal

No caso dos autos, o ministro observou que o ponto central da controvérsia é a forma como a concordância sobre o pedido deve ser manifestada. Para o tribunal de segunda instância, o fato de não ter havido manifestação do espólio dentro do prazo não implica anuência tácita e não autoriza o deferimento do pedido, pois é necessário que a concordância seja expressa nos autos. Esse entendimento – acrescentou o ministro – está alinhado com a natureza não contenciosa do procedimento de habilitação em inventário, que exige manifestação explícita das partes.

Villas Bôas Cueva concluiu que, embora a habilitação de crédito não seja contenciosa, ela não pode ser usada para suplantar o contraditório e o devido processo legal. O relator ressaltou que interpretar o silêncio ou a inércia do inventariante como consentimento prejudicaria o direito de discutir a dívida. “O consentimento, portanto, deve ser materializado, senão de forma expressa, ao menos de forma explícita, em razão da prática de atos materiais”, declarou.

Leia o acórdão no REsp 2.176.470.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça.

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Lei GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO nº 18.145, de 26.03.2025 – D.O.E.: 27.03.2025.

Ementa

Dispõe sobre a criação de serventia extrajudicial na Comarca de Paulínia.


O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO:

Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei:

Artigo 1º – Fica criada a delegação correspondente ao Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Paulínia, desmembrado do 4° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas.

Artigo 2º – Fica atribuída a especialidade de Protesto de Letras e Títulos ao já existente Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, Interdições e Tutelas e Tabelião de Notas da Comarca de Paulínia, que passa a ser: “Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, Interdições e Tutelas e Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Sede da Comarca de Paulínia”.

Artigo 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, na data da assinatura digital.

Tarcísio de Freitas

Fábio Prieto de Souza

Secretário da Justiça e Cidadania

Gilberto Kassab

Secretário de Governo e Relações Institucionais

Arthur Luis Pinho de Lima

Secretário-Chefe da Casa Civil

Este texto não substitui o publicado no D.O.E: de 27.03.2025.

Fonte: INR Publicações.

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Ação de imposição de obrigação de fazer com pedido cumulado de indenização por danos morais – Autor que alega ter dado em locação veículo automotor e que fora ele indevidamente vendido pelos réus mediante falsificação de sua assinatura no DUT – Direcionamento da propositura contra o delegatário do cartório de notas que reconheceu a firma – Legitimidade passiva reconhecida por não deter a serventia personalidade jurídica própria, cabendo ao delegatário responder pelos atos nela praticados – Nulidade de sentença não caracterizada – Responsabilidade civil do delegatário que é subjetiva, diferentemente do que ocorre com o Estado, sendo então imprescindível revelação de dolo ou culpa – Art. 22 da Lei nº 8.935/1994 – Autor que não imputou fato específico que a isso correspondesse, nem ficou revelada falha na identificação de quem mediante documentos adequados se apresentou como se fosse o autor, cadastrou firma e teve a assinatura reconhecida por autenticidade – Ação improcedente quanto ao aludido réu – Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1005785-67.2020.8.26.0278, da Comarca de Guarulhos, em que é apelante TERCEIRO TABELIÃO DE NOTAS DA COMARCA DE GUARULHOS, são apelados ANGELO GOMES DA COSTA (JUSTIÇA GRATUITA), CLAUDINES MARIA DA SILVA, CARINA LINO VIEIRA, SILAS SOARES DE MORAIS e CLAUBER DA SILVA ALONSO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LIDIA CONCEIÇÃO (Presidente) E WALTER EXNER.

São Paulo, 22 de janeiro de 2025.

ARANTES THEODORO

Relator(a)

APELAÇÃO 1005785-67.2020.8.26.0278

APELANTE Terceiro Tabelião de Notas da Comarca da Guarulhos

APELADO Ângelo Gomes da Costa

COMARCA Guarulhos 6ª Vara Cível

VOTO Nº 51.352

EMENTA – Ação de imposição de obrigação de fazer com pedido cumulado de indenização por danos morais. Autor que alega ter dado em locação veículo automotor e que fora ele indevidamente vendido pelos réus mediante falsificação de sua assinatura no DUT. Direcionamento da propositura contra o delegatário do Cartório de Notas que reconheceu a firma. Legitimidade passiva reconhecida por não deter a serventia personalidade jurídica própria, cabendo ao delegatário responder pelos atos nela praticados. Nulidade de sentença não caracterizada. Responsabilidade civil do delegatário que é subjetiva, diferentemente do que ocorre com o Estado, sendo então imprescindível revelação de dolo ou culpa. Art. 22 da Lei nº 8.935/1994. Autor que não imputou fato específico que a isso correspondesse, nem ficou revelada falha na identificação de quem mediante documentos adequados se apresentou como se fosse o autor, cadastrou firma e teve a assinatura reconhecida por autenticidade. Ação improcedente quanto ao aludido réu. Recurso provido.

Sentença cujo relatório se adota julgou parcialmente procedente ação aforada por proprietário de veículo automotor contra o locatário do bem e aqueles que vieram a adquiri-lo, assim como o delegatário de cartório de notas que reconheceu a firma no documento de transferência, com o fim de compeli-los a lhe devolver referido bem ou seu valor correspondente, assim como a pagar indenização por danos morais.

O delegatário apela e pede a anulação da sentença ou modificação daquele resultado.

Para tanto ele afirma nula a sentença pela recusa à oitiva do autor em audiência, bem como por se apresentar extra petita na medida em que condenou o delegatário apesar de a propositura ter sido direcionada contra o Tabelionato de Notas.

A propósito ele sustenta que o Tabelionato não detém personalidade jurídica e que por isso lhe faltava legitimidade para responder à propositura, sendo que, ademais, a carta de citação não foi recebida pelo próprio delegatário, sendo então nulo o chamamento.

O apelante acrescenta que nem se justificava a procedência da ação quanto a ele porque não qualquer ato ilícito, já que lhe foram apresentados os documentos pessoais necessários ao ato e perceptível não se mostrava a falsidade da assinatura atribuída ao vendedor do automóvel

Por fim, após salientar que “a revelia é relativa e não se aplica às questões de direito” e pedir “seja reconhecida sua ilegitimidade e a irregularidade da citação”, ele enfatiza que se cuidava aqui de responsabilidade subjetiva e que à vista de tal quadro a sentença há de ser reformada quanto a ele

Recurso regularmente processado e respondido.

É o relatório.

A lei processual admite o julgamento antecipado quando não houver necessidade de produção de outras provas (artigo 355) e, ao lado disso, ela autoriza o Magistrado a dispensar provas inúteis ou impertinentes (artigo 370).

Assim é porque vigora o princípio da livre convicção, segundo o qual o julgador é o destinatário da prova, podendo então dispensar a instrução se constatar que os elementos informativos já presentes se mostram suficientes à formação de seu convencimento.

Nesse sentido já enfatizou a Corte incumbida de ditar o entendimento da lei federal:

“Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o juízo acerca da necessidade ou não da produção de prova é uma faculdade do magistrado, a quem caberá decidir se há nos autos elementos e provas suficientes para formar sua convicção. O juiz, com base em seu convencimento motivado, pode indeferir a produção de provas que julgar impertinentes, irrelevantes ou protelatórias para o regular andamento do processo, o que não configura, em regra, cerceamento de defesa.” (AgInt no AREsp 911.218/BA, rel. Min. Luís Felipe Salomão, 09/10/2018).

Aqui era essa a situação.

Com efeito, ficou incontroversa a falsidade da assinatura atribuída ao autor no documento de transferência do veículo automotor, bem como que fora ela reconhecida autêntica pelo tabelionato, restando então apenas apurar a responsabilidade do delegatário pelo ocorrido.

A oitiva do autor pelo Juiz nada aproveitaria àquele exame, eis que permaneceria o fato de sua assinatura ter sido falsificada e a necessidade de se aferir se houve falha do tabelionato na identificação de quem se apresentou como sendo o proprietário do bem.

Não se justifica, pois, a anulação da sentença pela falta daquela oitiva.

II A petição inicial textualmente direcionou a propositura contra o “Terceiro Tabelião de Notas da Comarca de Guarulhos”, isto é, contra o próprio delegatário do cartório, apesar de não o identificar pelo nome civil, mas se referido ao respectivo tabelionato.

O fato é que a carta de citação foi enviada ao próprio tabelião e sido entregue em sua serventia sem qualquer ressalva (fls. 39), motivo pelo qual se mostrou correta a conclusão do Juiz de que “o próprio Sr. Paulo estava sendo chamado para integrar a lide”.

É verdade que não foi o delegatário quem apresentou contestação e sim o 3º Tabelionato por ele representado, mas tal erro se havia de debitar ao próprio demandado, não importando dizer, destarte, que se cuidava de ação dirigida contra a referida serventia, nem que o Juiz decidiu extra petita por julgar a causa à vista do referido delegatário, já que assim havia mesmo de ser ante os termos da petição inicial.

Logo, não procede a alegação de nulidade da citação, nem que a sentença decidiu extra petita ao julgar a causa quanto ao delegatário, eis que se cuidava de propositura contra ele direcionada.

Aliás, assim havia mesmo de ser porque os cartórios não possuem personalidade jurídica, sendo o delegatário pessoalmente responsável por eventuais prejuízos causados a terceiros.

Nesse sentido dispõe o art. 22 da Lei nº 8.935/1994, isto é, que “os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso”.

Na linha aqui indicada, aliás, tem reiteradamente decidido esta Corte:

“ILEGITIMIDADE “AD CAUSAM” – Passiva – Ação indenizatória decorrente de protesto de título alegadamente indevido – Tabelionatos de protesto não dispõem de personalidade jurídica para ser parte em processo judicial – Legitimidade que é de seus titulares – Inteligência do art. 38 da Lei nº 9.492/97 – Jurisprudência do STJ – Extinção do processo que se faz de ofício – Inteligência do inciso VI e do §3º do art. 485 do CPC – Apelação prejudicada.” (Apelação nº 1001343-46.2021.8.26.0400, rel. Des. José Tarciso Beraldo, 37ª Câmara de Direito Privado).

“RECURSO. Apelação. Presente relação de congruência e de pertinência entre as razões recursais e os fundamentos da sentença. Insurgência conhecida. PRELIMINAR SUSCITADA PELOS RÉUS REJEITADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. Revogação da gratuidade processual. Não caracterização, visto que a cassação foi respaldada no conjunto probatório produzido pelas partes. Matéria, ademais, superada com o restabelecimento do favor legal em sede recursal. PRELIMINAR SUSCITADA PELO AUTOR REJEITADA. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM. Legitimidade passiva. Não a ostenta o tabelionato para a lide indenizatória fundada em omissão funcional do notário. Inteligência do artigo 22 da Lei nº 8.935/1994. Exame da jurisprudência. Mantido o decreto de extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação à serventia. (…). Ação parcialmente procedente”. (Apelação nº 1005940-94.2016.8.26.0477, rel. Des. Jarbas Gomes, 11ª Câmara de Direito Público).

Induvidosa, pois, a legitimidade do apelante para responder pelo ato ocorrido sob sua delegação.

III O autor ajuizou a ação sob a assertiva de que alugou veículo automotor de sua propriedade para o réu Clauber e esse indevidamente o vendeu para o requerido Silas, que por sua vez o repassou para a demandada KR Car Multimarcas, que o revendeu para o réu Claudinês, o que ocorreu mediante falsificação de sua assinatura no documento de transferência, que foi ainda assim reconhecida autêntica pelo 3º Tabelionato de Notas de Guarulhos.

Sob tal exposição ele pediu fosse julgada procedente a ação de modo a compelir os réus a lhe restituir o veículo ou a arcar solidariamente com o valor de mercado do bem, assim como a pagar indenização por danos morais.

O Juiz acolheu parcialmente o pleito autoral, o que motivou o presente recurso por parte do delegatário da serventia.

Pois bem.

O último aviso de recebimento das cartas de citação foi juntado aos autos em 8 de outubro de 2020, de modo que o prazo para que os demandados apresentassem defesa findou em 3 de novembro de 2020 (art. 231, I, e §1º, CPC).

O apelante, no entanto, apresentou sua contestação apenas em 1º de fevereiro de 2022 (fls. 150/190), mostrando-se então manifestamente intempestiva, motivo pelo qual se aplicava o art. 344 do Código de Processo Civil, segundo o qual “se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor”.

O art. 345 inciso I do CPC anuncia, é verdade, que a revelia não produz aquele efeito se havendo pluralidade de réus um deles contestar a ação.

Contudo, na espécie as contestações dos demais réus em nada aproveitavam ao apelante, eis que não diziam respeito à atuação dele ou da respectiva serventia.

Realmente, no caso de pluralidade de réus o afastamento da ficta confissão pela falta de tempestiva defesa da parte de um dos litisconsortes só ocorre quanto às imputações fáticas que sejam comuns a eles.

Assim tem se manifestado esta Corte, sendo disso exemplo acórdão desta mesma 36ª Câmara:

“AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO E OBRIGAÇÃO DE FAZER. Sentença de procedência. Apelo de um dos réus. Alegação de nulidade da citação. Descabimento. Réu que declarou domicílio no endereço para onde foi remetida a carta de citação. Recebimento por terceiro. Irrelevância. Condomínio edilício. Validade da citação, nos termos do art. 248, §4º, do CPC. Revelia corretamente decretada. Presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor não desconstituída. Contestação dos demais réus que aproveita ao apelante somente quanto aos fatos comuns. Conjunto probatório que corrobora a tese de sua responsabilidade. Relação de consumo. Obstáculo ao ressarcimento do consumidor configurado. Aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica. Incidência do art. 28, §5º, do CDC. Precedentes da jurisprudência. Sentença mantida. Recurso desprovido.” (Apelação nº 1036948-17.2020.8.26.0100, rel. Des. Milton Carvalho).

Ocorre que na espécie o autor na petição inicial não especificou o fato que teria caracterizado a falha do delegatário, tendo mesmo admitido que nem sabia “qual documento foi apresentado para abertura da “firma” (fls. 3).

Ora, se não houve imputação ao apelante de algum fato específico que em tese caracterizasse a falha na sua atuação, então não se podia a partir da intempestividade da contestação presumir que ocorreu aquela sorte de falha.

Por consequência, havia o julgador de aferir se os elementos de prova indicavam ter sido realmente falha a atuação do delegatário.

Tal exame era imprescindível porque, diferentemente do que ocorre com o Estado, não é objetiva a responsabilidade civil dos notários pelos danos causados por eles ou seus prepostos na prática de atos próprios da serventia.

Realmente, como resulta do já citado artigo 22 da Lei nº 8.935/1994 a responsabilidade do delegatário em tais casos é subjetiva, ou seja, depende da comprovação de dolo ou culpa.

Essa, ainda, conclusão do Supremo Tribunal Federal posta sob o Tema 777:

“O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa”.

Pois na espécie não havia base para se reconhecer que o delegatário por si ou seus subordinados incorreu em culpa ou dolo ao certificar a autenticidade da assinatura falsamente atribuída ao autor.

Na petição inicial o promovente admitiu que por equívoco entregou ao locatário o documento original que permitia a transferência da titularidade do veículo (fls. 3), que foi então depois apresentado ao cartório juntamente com a suposta Cédula de Identidade do autor (fls. 198), assim como com o suposto cartão de inscrição no CPF (fls. 195) e a Carteira Nacional de Habilitação (fls. 198), documentos semelhantes aos originais, formalmente perfeitos, sem rasuras ou algum indicativo de terem sido adulterados.

Aquelas peças mostraram-se aptas, pois, a enganar o cartório, que à vista delas identificou o apresentante como sendo o autor, cadastrou sua firma e reconheceu por autenticidade a assinatura aposta no documento de transferência.

De lembrar que o reconhecimento de firma por autenticidade só ocorre mediante aposição da assinatura na presença do Oficial e depois da devida identificação, nada havendo aqui a sugerir não ter assim ocorrido.

Ante tal contexto não se podia aqui dizer, destarte, que o delegatário por seus subordinados incorreu em culpa no sentido civil, isto é, que foi omisso, negligente ou imperito quanto ao seu mister.

Em casos parelhos assim se pronunciado esta Corte:

Apelação Responsabilidade civil. Pretensão indenizatória contra o Tabelião de Notas e a Fazenda Pública por ato do tabelião, consistente no reconhecimento de firma, por semelhança, de assinaturas que se afirmam fraudulentas. Negligência ou desídia do tabelião, contudo, não verificada. Não configuração de conduta ilícita. Procedimento observado, com atenção às normas de regência. Análise formal e adequada às normas da Corregedoria Geral de Justiça. Responsabilidade da fraude exclusiva de terceiro. Indenização indevida. Recurso parcialmente provido para afastar a ilegitimidade e manter a improcedência da demanda.” (Apelação nº 1025041-89.2020.8.26.0053, rel. Des. Vicente de Abreu Amadei, 1ª Câmara de Direito Público).

Apelação cível. Responsabilidade civil. Indenização por danos materiais e morais. A autora desembolsou valores para a aquisição de imóvel, mas depois constatou que havia sido vítima de fraude, pois a vendedora, na verdade, não era a proprietária do bem. Falsificação de documentos e reconhecimento de firma. Responsabilidade subjetiva dos notários e registradores, ante os termos do artigo 22 da Lei n.º 8.935/1994, com a redação atribuída pela Lei n.º 13.286/2016. Exegese do Tema n.º 777/STF. Ausência de falsificação grotesca. O reconhecimento de firma efetivado pelas delegatárias não estabelece o nexo causal entre a ação e o dano suportado pela autora, uma vez que este foi causado por terceiro. Pedido inicial julgado improcedente. Manutenção da sentença. Recurso não provido.” (Apelação nº 1014452-57.2021.8.26.0003, rel. Des. Oswaldo de Oliveira, 12ª Cãmara de Direito Público).

Por consequência, respeitada a convicção do douto julgador, era de se julgar improcedente a ação quanto ao apelante, o que agora ocorre, passando o autor a responder pelas custas e despesas processuais pertinentes ao chamamento daquele demandado, assim como por honorários fixados na forma do artigo 85 § 2º do CPC em 10% do valor atualizado da causa.

Para o fim indicado dá-se provimento ao recurso.

ARANTES THEODORO

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1005785-67.2020.8.26.0278 – Guarulhos – 36ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Arantes Theodoro.

Fonte: DJE/SP – 24.01.2025.

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