TJ/RS: Multiparentalidade: Nomes dos pais biológico e socioafetivo constarão em certidão de nascimento do filho

Um menino de cinco anos terá na certidão de nascimento o nome do pai biológico e do pai que o registrou, com quem ele convive desde o nascimento. O caso aconteceu na Comarca de Santana do Livramento. A decisão da Juíza de Direito Carine Labres, da 3ª Vara Cível da Comarca, leva em conta o aspecto da multiparentalidade, reconhecendo a verdade biológica e a realidade afetiva e priorizando o melhor interesse da criança sobre as normas do direito.

Extrai-se dos autos a inegável conclusão de que a lei é fria, já a sociedade é dinâmica. Para compatibilizar tais extremos existe a atividade hermenêutica, cabendo aos operadores do direito a coragem necessária para reconhecer os reflexos de temas inovadores, tais como a multiparentalidade, na vida dos jurisdicionados, em especial no Direito de Família, garantindo-lhes segurança, tão-almejada quando do acesso ao Poder Judiciário, afirmou a magistrada na decisão do último dia 8/5.

Caso

O autor ajuizou ação de investigação de paternidade. Ele argumentou que manteve relacionamento íntimo e afetivo com a ré, do qual resultou no nascimento do menino, que foi registrado em nome do atual companheiro dela como se ele fosse o pai biológico. Feito o exame de DNA, foi confirmado que o autor da ação é o pai biológico da criança, hoje com cinco anos de idade. Em audiência, os litigantes dispensaram a produção de prova testemunhal, tendo o próprio pai biológico reconhecido expressamente o vínculo afetivo existente entre a criança e o pai registral, com quem convive desde o seu nascimento.

Afeto como valor jurídico

Tanto o pai biológico como o registral concordaram quanto à inserção de seus respectivos nomes, em conjunto, na certidão de nascimento do garoto, sem qualquer insurgência da mãe.

Nesse contexto, não há como não reconhecer judicialmente a paternidade daquele que foi pai sem obrigação legal de sê-lo; sendo compelido pelo mais nobre dos sentimentos – o amor -, a guardar, a educar e a sustentar um filho, como se seu fosse, considera a Juíza.

Na avaliação da julgadora, o mérito exige atentar para a multiparentalidade e o afeto como valor jurídico. Nesse escopo, debruçar o olhar conservador do direito registral sobre a questão importaria em desconstituir o vínculo jurídico formado entre o filho e o pai registral, pois o registro civil deve espelhar a verdade dos fatos. No entanto, tal raciocínio simplista não pode mais ser aceito pelos operadores do direito, eis que o afeto, verdadeiro laço formador de entidades familiares, deve balizar o desfecho de demandas de tal espécie.

Multiparentalidade

Para a magistrada, o caso em análise revela situação excepcional e merece tratamento diferenciado pelo ordenamento jurídico, a fim de adequar ao mundo da lei uma realidade fática. Paternidade socioafetiva, como modalidade de parentesco civil, insere-se na expressão ¿outra origem¿ do art. 1.593 do diploma civilista, traduzindo-se na convivência familiar, na solidariedade, no amor nutrido entre ¿pai e filho¿, sem que exista necessariamente vínculo biológico ou jurídico entre eles. Apresenta-se em diversas situações, como na adoção legal, na adoção à brasileira, nos filhos de criação e provenientes de técnicas de reprodução assistida heteróloga, explica a Juíza Carine Labres.

Em casos excepcionais, a maternidade ou a paternidade natural e a civil podem ser reconhecidas cumulativamente, coexistindo sem que uma exclua a outra, sendo denominada pela doutrina multiparentalidade ou pluriparentalidade, explica a julgadora.

Fonte: TJ/RS | 13/05/2014.

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Menina terá dupla paternidade em seu registro

Justiça de GO autorizou que seja acrescentado em seus registros o nome do padrastro e do pai biológico.

O juiz Andrey Máximo Formiga, da comarca de Estrela do Norte/GO, concedeu direito a uma garota para que seja reconhecida dupla filiação paterna e seja acrescentado em seus registros o nome de seu padrastro e de seu pai biológico.

Em ação de investigação de paternidade ajuizada pelo pai, representando a garota, foi manifestado o pleito de alterar o nome da menor e acrescentar o sobrenome "Cardoso", de seu pai biológico. O magistrado observou que não seria necessário apresentar outras provas, pois as partes entraram em acordo.

Ele observou que diante dos novos paradigmas comportamentais apresentados pela sociedade, "se tornou comum a existência de dois indivíduos exercendo a função de pai". Andrey Máximo pontuou que há a figura do pai socioafetivo, que contribui com a educação e dispensa carinho, afeto e respeito, e a do pai biológico, que contribuindo ou não com isso, é o responsável pelo material genético.

De acordo com ele, poderá ser reconhecido como pai o genitor que tiver relação parental já estruturada com o filho. "Percebe-se que a dupla parternidade já se tornou uma realidade na sociedade e no comportamento humano, o que se impõe juridicamente", frisou.

O juiz pontuou que o meio jurídico vem evoluindo no sentido de reconhecer a inclusão de um segundo pai no registro do filho. "A Lei de Registros Públicos sofreu modificação e incluiu o parágrafo 8º no artigo 57 da lei 6.015 para permitir que o enteado possa incluir em seus registros de nascimento o nome de família de seu padrasto", afirmou.

Para o magistrado, embora não seja comum, "é perfeitamente possível o pedido das partes, na medida que se preze o melhor interesse da menor".

Fonte: Migalhas | 08/04/2014.

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Adoção multiparental

* Jones Figueirêdo Alves

Agora, pela primeira vez no país, uma decisão judicial admite acrescentar ao registro de nascimento de menor adotado, o nome de seu genitor e de seus avós paternos, mantendo-se a paternidade adotiva e registral, com o acréscimo do patronímico do pai biológico.

A decisão foi proferida pelo juiz de Direito Clicério Bezerra e Silva, da 1ª vara de Família do Recife, em Ação de Investigação de Paternidade em que a filha adotada, em expressão de sua identidade genética, com anuência expressa dos pais adotivos e do próprio investigado, requereu o reconhecimento do vinculo biológico para os fins de admissão da multiparentalidade existente, quando, predominantemente, as relações de afetividade reúnem todos. (Processo : 0034634-20.2013.8.17.0001, j. em 1/10/13).

Pois bem. É consabido que o instituto da adoção que atribuiu a situação de filho ao adotado (art. 1.626, CC), constitui um vínculo parental civil, na forma do que dispõe o art. 1.593 do CC, por se tratar de parentalidade decorrente de outra origem que não a natural resultante da consangüinidade. Ocorre que, em seus efeitos jurídicos, carrega consigo, ope legis, a ruptura instante de qualquer vínculo com os pais e os parentes consanguíneos (art. 1.626, 2ª parte, CC).

Mais precisamente, vínculos anteriores são desfeitos, por força da lei, rompendo as relações da parentalidade natural, vindo estas ser substituídas pelas do afeto, afinal configuradas no novo vínculo oferecido pela adoção. No caso, serão aqueles vínculos findos, quando preexistentes, na filiação biológica e registral. Diferentemente, aliás, dos casos de reprodução assistida heteróloga, quando sequer se faz estabelecido vinculo parental entre a criança concepta e o doador do material fecundante (art. 1.597, V, CC).

E quando inexiste filiação registral, porquanto desconhecido o pai, por certo tempo, ou no ponto, desconhecendo o pai a existência do filho, a tanto por isso mesmo não expressando sua concordância com a adoção (art. 1.621 e § 1º, CC)?

Nessa hipótese, o vínculo biológico preexistente, sem dispor de registro, cede inexoravelmente frente à adoção, quando os fatos da vida aproximem o pai biológico do filho que veio, com sua insciência, ser adotado?

Hipótese tal reclama, às expressas, configurar-se uma adoção multiparental, onde, diante das circunstâncias dos fatos, a afetividade construída pela adoção poderá ser somada, ao depois, à afetividade resultante de iniludível vínculo biológico que se faça mais presente na convivência entre aquele pai biológico e o filho então inserido em família substitutiva (pela adoção).

É exatamente o caso julgado, a servir, com a maior relevância jurídica, de “leading case”.

A decisão judicial confortou-se, inegavelmente, em consolidar no plano jurídico a dupla paternidade fática, como admitiu o magistrado, quando incontroversos os fatos de que a criança nunca deixara de manter laços de convivência com aquele que indicou depois ser seu pai, a tanto a reconhecendo como filha, em mesmo liame de afeto, para além de um mero vínculo biológico.

Assinalou o juiz decisor que “o caso revelado pelos meandros destes autos, diz respeito à possibilidade da multiparentalidade por meio da cancela judicial, circunstância a particularizar e impingir relativo ineditismo ao caso em julgamento, não obstante existirem pontuais decisões em demandas com certa similitude.” No ponto, apontou que os fatos reclamam a devida tutela estatal à nova formatação de entidade familiar, sustentando que com o advento da CF, “restou superado o reconhecimento tão somente ligado aos limites formais em matéria de prova da parentalidade, passando-se a admitir um pensamento pluralista nas formas de reconhecimento da filiação.”

Em avaliação da prova, exaltou o magistrado que, com exatidão fática, o convívio da autora “permeava ambas as famílias em momentos de lazer e evidentes demonstrações de afetividade estreita com os pais, inclusive juntos aos seus irmãos, filhos do Sr. G.” (o pai biológico).

De fato. É sinalagmática a sua assertiva que “a verdadeira paternidade se consolida por meio das relações de carinho, acolhimento, confiança, de um bom exemplo dado, momento em que os filhos encontram nos pais a figura de referência em suas vidas. Essa identidade há de ser protegida pelo direito.”

A jurisprudência mais moderna vem construindo avanços significativos, a partir de algumas premissas de base essenciais. Vejamos:

(i) “Se é o próprio filho quem busca o reconhecimento do vínculo biológico com outrem, porque durante toda a sua vida foi induzido a acreditar em uma verdade que lhe foi imposta por aqueles que o registraram, não é razoável que se lhe imponha a prevalência da paternidade socioafetiva, a fim de impedir sua pretensão. O reconhecimento do estado de filiação constitui direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser exercitado, portanto, sem qualquer restrição, em face dos pais ou seus herdeiros.” (STJ – 3ª turma, REsp. 1274240, Rel. Min. Nancy Andrigui, j. em 8/10/13);

(ii) “(…) a pretensão voltada à impugnação da paternidade não pode prosperar, quando fundada apenas na origem genética, mas em aberto conflito com a paternidade socioafetiva. (STJ – 4ª turma, REsp 1115428-SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, j. em 27/8/13);

Nessas latitudes, dois postulados se apresentam imediatos e incólumes:

(i) a prevalência da paternidade/maternidade socioafetiva frente à biológica ou vice-versa, terá, em quaisquer dos casos, como principal fundamento o interesse do próprio menor, e/ou os da consolidação e estabilidade do grupo familiar irretocável, sempre na diretiva da dignidade da pessoa: (ii) a parentalidade múltipla guarda conformidade com os fatos da vida, para integrar-se em inexorável liame com o valor do afeto ao contexto personalístico da pessoa, nas relações de filiação que possua, juridicamente consideradas e reconhecidas.

Bem de ver que em julgado também paradigma, admitiu-se, muito além dos limites da adoção conjunta apenas destinada a duas pessoas que forem marido e mulher ou conviventes (art. 1.622, CC), a possibilidade de ser deferido pedido de adoção conjunta a dois irmãos, em face do infante. (STJ – 3ª Turma, REsp. nº 1217415-RS, j. em 19/6/12), com interpretação ampliativa do art. 42, parágrafo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90).

Logo, resta concluir que em sendo a multiparentalidade um fenômeno social-familiar de consenso, entre todos os protagonistas do afeto, por opção que dignifica a todos, a adoção multiparental, nessa mesma toada, deve ser considerada como repercussão natural dos fatos da vida. La vita è bella!!!

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* Jones Figueiredo Alves é desembargador decano do TJ/PE e diretor nacional do IBDFAM.

Fonte: Migalhas I 19/12/2013.

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