Processual civil e tributário – Arrolamento sumário – Tributos incidentes sobre os bens do espólio e de suas rendas – Comprovação de quitação – Condição para a sentença de homologação da partilha – Expedição dos formais de partilha – Prévio pagamento do imposto de transmissão – Desnecessidade

RECURSO ESPECIAL Nº 1.704.359 – DF (2017/0271715-0)

RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA

RECORRENTE : DISTRITO FEDERAL

PROCURADOR : JÚLIO CÉSAR MOREIRA BARBOSA E OUTRO(S) – DF022138

RECORRIDO : ANTONIA RODRIGUES TORRES FERREIRA

RECORRIDO : ANTONIO VALDENOR TORRES RODRIGUES

RECORRIDO : FRANCISCA RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : FRANCISCO RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : INGRID DOS SANTOS RODRIGUES

RECORRIDO : JOSE RODRIGUES PERES

RECORRIDO : JOSE RODRIGUES SOBRINHO – ESPÓLIO

REPR. POR : FILOMENA PAULINO DOS SANTOS RODRIGUES -INVENTARIANTE

RECORRIDO : LUIS CLAYTON RODRIGUES DE FARIAS

RECORRIDO : MARIA TEREZA RODRIGUES MOTA

RECORRIDO : ANTONIO FLAVIO RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : REJANE RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : JOSE EDCARLOS RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : CICERO RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : MARIA VALDEREZA TORRES RODRIGUES

RECORRIDO : RAIMUNDA DILMA RODRIGUES TORRES

RECORRIDO : SEBASTIAO RODRIGUES SOBRINHO

RECORRIDO : VALTER RODRIGUES TORRES

ADVOGADOS : JOÃO RODRIGUES NETO – DF002203

MARILI MARIA AMORIM PEIXOTO RODRIGUES – DF030369

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ARROLAMENTO SUMÁRIO. TRIBUTOS INCIDENTES SOBRE OS BENS DO ESPÓLIO E DE SUAS RENDAS. COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. CONDIÇÃO PARA A SENTENÇA DE HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA. EXPEDIÇÃO DOS FORMAIS DE PARTILHA. PRÉVIO PAGAMENTO DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO. DESNECESSIDADE.

1. A sucessão causa mortis, independentemente do procedimento processual adotado, abrange os tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, porquanto integrantes do passivo patrimonial deixado pelo de cujus, e constitui fato gerador do imposto de transmissão (ITCM).

2. Segundo o que dispõe o art. 192 do CTN, a comprovação da quitação dos tributos referentes aos bens do espólio e às suas rendas é condição sine quo non para que o magistrado proceda à homologação da partilha.

3. O CPC/1973, em seu art. 1.031, em conformidade com o art. 192 do CTN, exigia a prova de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas como condição para a homologação da partilha (caput) e o pagamento de todos os tributos devidos, aí incluído o imposto de transmissão, para a ultimação do processo, com a expedição e a entrega dos formais de partilha (§ 2º).

4. O novo Código de Processo Civil, em seu art. 659, § 2º, traz uma significativa mudança normativa no tocante ao procedimento de arrolamento sumário, ao deixar de condicionar a entrega dos formais de partilha ou da carta de adjudicação à prévia quitação dos tributos concernentes à transmissão patrimonial aos sucessores.

5. Essa inovação normativa, todavia, em nada altera a condição estabelecida no art. 192 do CTN, de modo que, no arrolamento sumário, o magistrado deve exigir a comprovação de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas para homologar a partilha e, na sequência, com o trânsito em julgado, expedir os títulos de transferência de domínio e encerrar o processo, independentemente do pagamento do imposto de transmissão.

6. Recurso especial parcialmente provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, preliminarmente, por maioria, vencido o Sr. Ministro Sérgio Kukina, decidiu pela competência da egrégia Primeira Seção para o julgamento do feito e, no mérito, por maioria, vencido o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, dar parcial provimento ao recurso especial, para, cassando o acórdão recorrido e, por conseguinte, a sentença homologatória, determinar a devolução dos autos à primeira instância, para que seja procedida a comprovação da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas como condição para que seja homologada a partilha, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 28 de agosto de 2018 (Data do julgamento).

MINISTRO GURGEL DE FARIA

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto pelo DISTRITO FEDERAL, fundado na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão assim ementado (e-STJ fls. 253/254):

PROCESSO CIVIL. ARROLAMENTO SUMÁRIO. INOVAÇÃO DO CPC DE 2015. INTERVENÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO DOS TRIBUTOS. APÓS SENTENÇA DE HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA. RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. ART. 146, III, CF. MATÉRIA PROCESSUAL. NÃO APLICAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.

1. O Código de Processo Civil de 2015 inovou ao estabelecer que no arrolamento sumário não devem ser discutidas questão referentes a taxas judiciárias ou tributárias.

2. No arrolamento sumário somente é necessária a comprovação da quitação dos tributos após a homologação da sentença de partilha, momento em que haverá a intervenção da Fazenda Pública.

3. Por se tratar de matéria processual, a alteração do arrolamento não deve respeitar a reserva de Lei Complementar prevista no art. 146, III, da CF.

4. Apelação conhecida e desprovida.

Rejeitados os aclaratórios (e-STJ fls. 283/290).

Nas suas razões (e-STJ fls. 293/311), o recorrente aponta violação dos arts. 663 e 664, §§ 4º e 5º, do CPC/2015, 192 do CTN e 31 da Lei n. 6.830/1980. Sustenta, em resumo, que, a despeito da previsão contida no art. 659, § 2º, do CPC/1973, o encerramento do processo de arrolamento sumário, com a entrega dos formais de partilha e alvarás aos herdeiros, pressupõe a comprovação de quitação dos tributos devidos à Fazenda Pública. Afirma que: (a) “continua hígido no Novo CPC, com poucas alterações meramente redacionais, o mesmo regramento constante do CPC/73 relativamente à necessidade de prévia comprovação da quitação para o encerramento do procedimento de arrolamento (comum ou sumário)”; (b) o art. 659, § 2º, do CPC é inconstitucional, pois contraria o disposto nos arts. 192 do CTN e 31 da LEF; e (c) “o processo de inventário tem importância fundamental para a recuperação do crédito tributário em termos gerais”, por se tratar “de momento em que não apenas se recolhe o ITCD, mas, em grande parte das vezes, se extinguem várias execuções fiscais que abarrotam o Poder Judiciário”. Pugna pelo provimento do recurso para que seja condicionada “a expedição e entrega dos formais de partilha e/ou alvarás de levantamento à prévia comprovação de regularidade fiscal relativa ao ITCD e a outros tributos eventualmente devidos pelo espólio”.

Contrarrazões às e-STJ fls. 332/336.

Decisão a quo de admissão do recurso especial às e-STJ fls. 338/339.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator):

Conforme relatado, o presente recurso especial discute a possibilidade de, sob a égide no novo Código de Processo Civil, encerrar-se o processo de arrolamento sumário, com a expedição e entrega de formais de partilha e alvarás aos sucessores, sem a prévia quitação dos tributos devidos para com a Fazenda Pública.

Considerando que essa questão jurídica foi devidamente prequestionada perante a Corte distrital e que estão preenchidos os demais pressupostos recursais, conheço do apelo nobre e, doravante, passo a analisar o seu mérito.

Pois bem.

A sucessão causa mortis, independentemente do procedimento processual adotado, abrange os tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, porquanto integrantes do passivo patrimonial deixado pelo de cujus, e constitui fato gerador dos tributos incidentes sobre a transmissão do patrimônio propriamente dita, dentre eles o ITCM.

Segundo o que dispõe o art. 192 do CTN, a comprovação da quitação dos tributos referentes aos bens do espólio e às suas rendas é condição sine quo non para que o magistrado proceda a homologação da partilha. Confira-se:

Art. 192. Nenhuma sentença de julgamento de partilha ou adjudicação será proferida sem prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas.

A meu sentir, diversamente do assentado pelo acórdão recorrido, essa norma não é de natureza processual, mas sim de direito material, porquanto se refere ao levantamento e à quitação de parte destacada do passivo do espólio deixado pelo de cujus, encerrando prerrogativa da Fazenda Pública de recuperar seus créditos tributários antes que os ativos sejam destinados ao pagamento de outros credores ou à partilha com os sucessores, sendo certo que esse direito de preferência está inclusive expressamente assegurado no art. 189 do CTN.

A respeito da interpretação do art. 192 do CTN, trago os seguintes ensinamentos doutrinários:

A garantia que se confere em favor da uma maior efetividade do crédito tributário, mediante a exigência, em determinadas situações, da prova de quitação dos tributos, encontra, igualmente, aplicação nos processos de inventário e arrolamento, ao ensejo da transmissão dos bens do autor da herança a seus sucessores. “Diante disso, a partilha amigável ou judicial somente poderá se julgada após a liberação do espólio pela Fazenda Pública. Com ela se busca garantir a liquidação dos créditos fiscais decorrentes do acervo patrimonial do espólio. Tais créditos tributários costumam ser apurados mediante comunicação do juiz aos órgãos de administração fazendária” (Carlos Valder do Nascimento, ob. cit., infra, p. 483).

Quanto não há partilha, há adjudicação, e a mesma cautela relativa à partilha é observada nas cartas de adjudicação que registram as quitações fiscais.

A norma em comento tem contato com a disposição do art. 131, II e III, deste Código. Sacha Calmon Navarro Coelho, depois de anotar que uma inversão na ordem dos incisos II e III do referido artigo 131 seria adequada, ensina:

“…morrendo o de cujus, abre a sucessão. Dá-se logo a transmissão da propriedade aos herdeiros e legatários e meeiros, ou mesmo a terceiros sub-rogados nos direitos destes, sendo o caso. Todavia, o monte é uma universitas rerum, um conjunto complexo de direito e de deveres, um feixe jurídico e, o que é mais, pro indiviso. Ao cabo do inventário ou do arrolamento, por efeito da partilha ou da adjudicação é que se saberá quanto coube a título de meação, ou de legado, ou de quinhão de herdeiro. Isto posto, pelo débitos à conta do de cujus responde o espólio. E pelas dívidas do espólio, posteriormente ao passamento, responderá, obviamente, o próprio espólio, representado pelo inventariante. Mas aqui não há falar em sucessão. As dívidas do espólio são próprias. Ora bem, efetivada a partilha, cessão a indivisão. Cada qual responderá com o que recebeu. Se dívidas do de cujus ou mesmo do espólio vierem a ser exigidas na hora da partilha, serão imputadas, agora sim, a cada quinhão ou legado e à meação até o limite dos mesmos. Assim é que deve ser entendida a questão.” (ob. cit. infra. p. 631). (RAU DE SOUZA, Maria Helena, in Código Tributário Nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS e ISS, coordenação de Vladimir Passos de Freitas, 7ª ed., Editada Revista dos Tribunais, São Paulo, 2017, p. 974/975)

O dispositivo legal condiciona a prolação da sentença de julgamento de partilha ou adjudicação com a consequente divisão dos bens do autor da herança entre seus sucessores à apresentação da prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio e suas rendas. Dessa forma, a continuidade da tramitação para a repartição dos bens tem como condição a exibição de tais documentos pelos interessados.

No entanto, como no enfoque dado ao art. 191, cabe perquirir o que se entende por “prova da quitação”. Necessariamente configura ela uma verdadeira “prova de pagamento” ou pode significar uma prova de sua extinção, por exemplo?

Na linha do raciocínio anteriormente exposto, o encargo a que se vincula o comando normativo relaciona-se diretamente à existência e possível exigibilidade de crédito tributário. Por sua vez, se verificada quaisquer das hipóteses de extinção ou exclusão deste crédito, a sua permanência jurídica torna-se insustentável. Cabe ao inventariante trazer ao juízo competente a comprovação da ocorrência de tais hipóteses.

A precaução revela-se justificável, pois pode ocorrer de a Fazenda Pública se deparar, posteriormente, com a existência de créditos tributários que deixaram de ser reclamados ou considerados no processo de inventário ou arrolamento. Nesse caso, nada mais poderá fazer em relação ao espólio, já que este deixa de existir no mundo jurídico no momento em que é feita a partilha ou a adjudicação dos bens.

A responsabilidade pelo pagamento poderá ser exigida do sucessor em relação aos tributos devidos pelo de cujus até a data da partilha ou adjudicação, sendo esta, contudo, limitada ao montante do quinhão, ou legado ou da meação, conforme preconiza o art. 131, II, do Código Tributário Nacional.

Como ficariam, então, os débitos do de cujus ou do espólio eventualmente apurados posteriormente ao término do inventário ou arrolamento, isto é, após a partilha ou adjudicação? De quem poderiam ser exigidos?

Como dito acima, em relação ao espólio nada mais pode ser feito, já que este não mais existe e o art. 131, III, a este atribui a responsabilidade pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão. Por sua vez, o Código Tributário Nacional apenas dispõe sobre a responsabilidade pessoal dos sucessores, legatários ou meeiros, limitada ao montante do quinhão, legado ou meação pelas dívidas do de cujus até a data da partilha ou adjudicação (art. 131, II).

Dessa forma, não existindo previsão para a esta situação e em razão de a sentença homologatória da partilha ou da adjudicação somente poder ser proferida mediante a comprovação do pagamento dos tributos devidos, apóia-se a corrente daqueles que defendem a impossibilidade de sua cobrança forte na máxima segundo a qual “o direito não socorre aos que dormem”.

Como no caso do artigo anterior, consubstancia-se essa determinação legal em mais uma garantia de que desfruta o crédito tributário. (GUTJAHR, Valéria, in Comentários ao Código Tributário Nacional, coordenadores Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe, MP Editora, São Paulo, 2005, p. 1359/1360)

Considerado isso, passo a analisar a aplicação dessa norma do Código Tributário Nacional no procedimento processual referente ao arrolamento sumário.

O CPC/1973, em seu art. 1.031, em conformidade com o art. 192 do CTN, exigia a prova de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas como condição para a homologação da partilha (caput) e o pagamento de todos os tributos devidos, aí incluído o ITCM, para a ultimação do processo, com a expedição e a entrega dos formais de partilha (§ 2º).

Importa salientar a vedação contida no art. 1.034 do CPC/1973, que impossibilitava a discussão referente ao lançamento e à quitação do imposto de transmissão perante o juízo da sucessão.

A esse propósito, cumpre destacar o julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.150.356/SP, Relator Ministro Luiz Fux, segundo o qual, no arrolamento sumário processado sob o rito do CPC/1973, depois de homologada a partilha, o juízo da sucessão, por não ter competência para decidir sobre questões tributárias, devia sobrestar o processo até que a questão acerca da exigibilidade e da quitação do imposto de transmissão fosse decidida pela autoridade administrativa. Eis a ementa desse julgado:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. ARROLAMENTO SUMÁRIO POST MORTEM. RECONHECIMENTO JUDICIAL DA ISENÇÃO DO ITCMD. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 179, DO CTN.

1. O juízo do inventário, na modalidade de arrolamento sumário, não detém competência para apreciar pedido de reconhecimento da isenção do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de quaisquer Bens ou Direitos), à luz do disposto no caput do artigo 179, do CTN, verbis:

“Art. 179. A isenção, quando não concedida em caráter geral, é efetivada, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o qual o interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei ou contrato para concessão.

(…)”

2. Como cediço, a abertura da sucessão (morte do autor da herança) reclama a observância do procedimento especial de jurisdição contenciosa denominado “inventário e partilha”, o qual apresenta dois ritos distintos: “um completo, que é o inventário propriamente dito (arts. 982 a 1.030) e outro, sumário ou simplificado, que é o arrolamento (arts. 1.031 a 1.038)” (Humberto Theodoro Júnior, in “Curso de Direito Processual Civil: Procedimentos Especiais”, Vol. III, 36ª Ed., Ed. Forense, pág. 240).

3. O artigo 1.013, do CPC, rege o procedimento para avaliação e cálculo do imposto de transmissão causa mortis no âmbito do inventário propriamente dito, assim dispondo:

“Art. 1.013. Feito o cálculo, sobre ele serão ouvidas todas as partes no prazo comum de 5 (cinco) dias, que correrá em cartório e, em seguida, a Fazenda Pública.

§ 1º Se houver impugnação julgada procedente, ordenará o juiz novamente a remessa dos autos ao contador, determinando as alterações que devam ser feitas no cálculo.

§ 2º Cumprido o despacho, o juiz julgará o cálculo do imposto.”

4. Conseqüentemente, em sede de inventário propriamente dito (procedimento mais complexo que o destinado ao arrolamento), compete ao Juiz apreciar o pedido de isenção do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis, a despeito da competência administrativa atribuída à autoridade fiscal pelo artigo 179, do CTN (Precedentes do STJ: REsp 138.843/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 08.03.2005, DJ 13.06.2005; REsp 173.505/RJ, Rel. Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, julgado em 19.03.2002, DJ 23.09.2002; REsp 143.542/RJ, Rel. Ministro Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, julgado em 15.02.2001, DJ 28.05.2001; REsp 238.161/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 12.09.2000, DJ 09.10.2000; e REsp 114.461/RJ, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, julgado em 09.06.1997, DJ 18.08.1997).

5. É que a prévia oitiva da Fazenda Pública, no inventário propriamente dito, torna despiciendo o procedimento administrativo, máxime tendo em vista o teor do artigo 984, do CPC, verbis:

“Art. 984. O juiz decidirá todas as questões de direito e também as questões de fato, quando este se achar provado por documento, só remetendo para os meios ordinários as que demandarem alta indagação ou dependerem de outras provas.”

6. Por seu turno, os artigos 1.031 e seguintes, do CPC, estabelecem o procedimento a ser observado no âmbito do arrolamento sumário, cujo rito é mais simplificado que o do arrolamento comum previsto no artigo 1.038 e o do inventário propriamente dito, não abrangendo o cálculo judicial do imposto de transmissão causa mortis.

7. Deveras, o caput (com a redação dada pela Lei 7.019/82) e o § 1º (renumerado pela Lei 9.280/96) do artigo 1.031, do CPC, preceituam que a partilha amigável (celebrada entre partes capazes) e o pedido de adjudicação (formulado por herdeiro único) serão homologados de plano pelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas.

8. Entrementes, o artigo 1.034, do CPC (com a redação dada pela Lei 7.019/82), determina que, “no arrolamento, não serão conhecidas ou apreciadas questões relativas ao lançamento, ao pagamento ou à quitação de taxas judiciárias e de tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio” (caput), bem como que “o imposto de transmissão será objeto de lançamento administrativo, conforme dispuser a legislação tributária, não ficando as autoridades fazendárias adstritas aos valores dos bens do espólio atribuídos pelos herdeiros” (§ 2º).

9. Outrossim, é certo que, antes do trânsito em julgado da sentença de homologação da partilha ou adjudicação (proferida no procedimento de arrolamento sumário), inexiste intervenção da Fazenda Pública, a qual, contudo, condiciona a expedição dos respectivos formais, à luz do disposto no § 2º, do artigo 1.031, do CPC, verbis:

“Art. 1.031. (…)

§ 2º Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou adjudicação, o respectivo formal, bem como os alvarás referentes aos bens por ele abrangidos, só serão expedidos e entregues às partes após a comprovação, verificada pela Fazenda Pública, do pagamento de todos os tributos. (Incluído pela Lei nº 9.280, de 30.5.1996)”

8. Consectariamente, nos inventários processados sob a modalidade de arrolamento sumário (nos quais não cabe o conhecimento ou a apreciação de questões relativas ao lançamento, pagamento ou quitação do tributo de transmissão causa mortis, bem como tendo em vista a ausência de intervenção da Fazenda até a prolação da sentença de homologação da partilha ou da adjudicação), revela-se incompetente o Juízo do inventário para reconhecer a isenção do ITCMD, por força do disposto no artigo 179, do CTN, que confere, à autoridade administrativa, a atribuição para aferir o direito do contribuinte à isenção não concedida em caráter geral.

9. Ademais, prevalece o comando inserto no artigo 192, do CTN, segundo o qual “nenhuma sentença de julgamento de partilha ou adjudicação será proferida sem prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas”, impondo-se o sobrestamento do feito de arrolamento sumário até a prolação do despacho administrativo reconhecendo a isenção do ITCMD.

10. Assim, falecendo competência ao juízo do inventário (na modalidade de arrolamento sumário), para apreciar pedido de reconhecimento de isenção do ITCMD, impõe-se o sobrestamento do feito até a resolução da quaestio na seara administrativa, o que viabilizará à adjudicatária a futura juntada da certidão de isenção aos autos.

12. Recurso especial fazendário provido, anulando-se a decisão proferida pelo Juízo do inventário que reconheceu a isenção do ITCMD. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

Agora, o novo Código de Processo Civil, em seu art. 659, § 2º, traz uma significativa mudança normativa no tocante ao procedimento de arrolamento sumário, ao deixar de condicionar a entrega dos formais de partilha ou da carta de adjudicação à prévia quitação dos tributos concernentes à transmissão patrimonial aos sucessoresin verbis:

Art. 659. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos da lei, será homologada pelo juiz, com observância dos arts. 660 a 663.

§ 1º O disposto neste artigo aplica-se, também, ao pedido de adjudicação, quando houver herdeiro único.

§ 2º Transitada em julgado a sentença de homologação ou de adjudicação, será lavrado o formal de partilha ou elaborada a carta de adjudicação e, em seguida, serão expedidos os alvarás referentes aos bens e às rendas por ele abrangidos, intimando-se o fisco para o lançamento administrativo do imposto de transmissão e de outros tributos porventura incidentes, conforme dispuser a legislação tributária, nos termos do § 2º do art. 662.

Ressalto que, na minha compreensão, a expressão “outros tributos porventura existentes” relaciona-se com aqueles “incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio” de que trata o caput do art. 662, que permanece com a proibição de no arrolamento sumário discutir-se o lançamento e a quitação de tais exações. Eis a redação desse artigo:

Art. 662. No arrolamento, não serão conhecidas ou apreciadas questões relativas ao lançamento, ao pagamento ou à quitação de taxas judiciárias e de tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio.

§ 1º A taxa judiciária, se devida, será calculada com base no valor atribuído pelos herdeiros, cabendo ao fisco, se apurar em processo administrativo valor diverso do estimado, exigir a eventual diferença pelos meios adequados ao lançamento de créditos tributário em geral.

§ 2º O imposto de transmissão será objeto de lançamento administrativo, conforme dispuser a legislação tributária, não ficando as autoridades fazendárias adstritas aos valores dos bens do espólio atribuídos pelos herdeiros.

Assim, em relação ao “Código Buzaid”, considerando a reconhecida incompetência do juízo da sucessão para decidir sobre o tema, o novo CPC apenas desvinculou o encerramento do processo de arrolamento sumário à quitação dos tributos gerados com a transmissão propriamente dita, permitindo que, com o trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, sejam expedidos desde logo os respetivos formais ou a carta de adjudicação.

Da mesma forma como já era previsto pelo art. 1.034, § 2º, do CPC/1973, à Fazenda Pública caberá lançar e promover a regular cobrança do imposto e dos demais tributos eventualmente incidentes sobre transmissão dos sucessores beneficiados pela transmissão patrimonial.

Entretanto, em meu entendimento, a inovação normativa contida no art. 659, § 2º, do CPC/2015 em nada altera a condição estabelecida no art. 192 do CTN, de modo que, interpretando conjuntamente esses dispositivos legais, é possível concluir que, no arrolamento sumário, o magistrado deve exigir a comprovação de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas para homologar a partilha (condição expressamente prevista para o inventário processado na forma de arrolamento – art. 664, § 5º) e, na sequência, com o trânsito em julgado, expedir os títulos de transferência de domínio e encerrar o processo, independentemente do pagamento do imposto de transmissão.

Ponderados esses elementos, tenho que, no caso em apreço, o acórdão recorrido deve ser cassado, já que manteve a sentença que dispensara a comprovação de quitação de quaisquer tributos para homologar a partilha (e-STJ fls. 202/203).

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso especial, para, cassando o acórdão recorrido e, por conseguinte, a sentença homologatória, determinar a devolução dos autos à primeira instância, para que seja procedida a comprovação da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas como condição para que seja homologada a partilha.

É como voto.

VOTO-VENCIDO

(MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO)

1. Senhora Presidente, o eminente Relator entende que é possível a exigência, nesse momento processual, de pagamento de alguns tributos devidos à entidade tributante estadual, no caso, o Distrito Federal.

2. Penso que o arrolamento, como todos sabemos, é um procedimento especial. E o Código Fux o tratou de maneira distinta e peculiar, apenas no arrolamento, e fez de tal maneira que não se admite a intervenção da Fazenda Pública no arrolamento. No inventário, sim; mas, no arrolamento sumário, a orientação é que não há oportunidade para esse tipo de diligência por parte da Fazenda Pública. O intuito do Código Fux, como todos sabemos, foi celerizar as operações à vida econômica, dinamizar os negócios, as transações e tudo o que diz respeito à modernização jurídica dos procedimentos sociais, econômicos e financeiros etc.

3. Senhora Presidente, penso que, sem prejuízo para o lançamento que a Fazenda Pública deve fazer pós-conclusão da partilha, não se deve exigir esse tributo agora, inclusive porque poderá haver, e certamente haverá, discussão sobre o quantum. Quem iria definir esse quantum? Seria o Juiz do arrolamento que iria definir esse quantum? Aliás, há uma decisão, um acórdão antigo, de 2013, da Ministra ELIANA CALMON, que diz precisamente isto – discussão relativa ao imposto sobre transmissão causa mortis, tese, decadência do lançamento, admissibilidade -, que o Juiz do arrolamento não aprecia essas coisas, nem o lançamento. Depois de concluído o processo de sucessão via arrolamento, a Fazenda Pública, evidentemente, poderá tomar as vias administrativas tributárias que entender adequadas, autuar, inscrever, executar e fazer o que for conveniente, inclusive até, se for o caso, pedir tutelas cautelares ou tutelas de urgências para que aqueles bens não sejam alienados pelos herdeiros ou qualquer outra coisa que a Fazenda Pública entenda cabível, menos exigir o pagamento do tributo prévio, a meu ver.

4. Penso que a matéria deve ter regulação prioritária pelo Código Fux, e não pelo Código Tributário, que está naturalmente, como se vê, em descompasso com o Código Fux. O Ministro FRANCIULLI NETTO, em 2003, dizia que não se admitem no arrolamento questionamentos acerca do pagamento de tributos relativos à transmissão, porque desaparecia o caráter célere e específico do arrolamento.

5. Peço vênia ao eminente Relator para dissentir respeitosamente dele nesse ponto e manter, também nesse ponto, o acórdão regional, o acórdão distrital, o acórdão do Tribunal de Contas do Distrito Federal. Mantenho o acórdão porque a legislação processual é bastante clara nesse ponto. Evidentemente, isso não quer dizer que se subtraia nenhuma função de fiscalização e de autuação da Fazenda Pública.

6. É assim que voto, Senhora Presidente. – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.704.359 – Distrito Federal – 1ª Turma – Rel. Min. Gurgel de Faria – DJ 02.10.2018

Fonte: INR Publicações.

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STJ: Seguradora é responsável por vícios ocultos mesmo após quitação do imóvel pelo SFH

A quitação do contrato de financiamento não extingue a obrigação da seguradora de indenizar os compradores por vícios ocultos na construção de imóveis adquiridos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH).

O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso de compradores de imóveis financiados pelo SFH, que pediam a cobertura do seguro para vícios de construção que somente foram revelados depois de quitado o financiamento.

Segundo os autos, as casas objeto da ação, construídas em um conjunto habitacional de Natal, apresentaram rachaduras, paredes fissuradas, quedas de reboco e instabilidade dos telhados. Diante da ameaça de desmoronamento, os proprietários buscaram a Justiça para que a seguradora contratada junto com o financiamento fizesse os reparos.

Em primeiro grau, a seguradora foi condenada a pagar aos autores da ação, a título de indenização, os valores individuais necessários à recuperação dos imóveis. Todavia, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) deu provimento à apelação da seguradora e julgou improcedente o pedido. Os compradores recorreram então ao STJ.

Cobertura

De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, o seguro habitacional é requisito obrigatório para financiar um imóvel pelo SFH. Isso porque o seguro habitacional tem conformação diferenciada por integrar a política nacional de habitação, destinada a facilitar a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes de menor renda.

A ministra explicou ainda que o seguro habitacional é contrato obrigatório com o objetivo de proteger a família e o imóvel e garantir o respectivo financiamento, “resguardando, assim, os recursos públicos direcionados à manutenção do sistema”.

“Por qualquer ângulo que se analise a questão, conclui-se, à luz dos parâmetros da boa-fé objetiva e da proteção contratual do consumidor, que os vícios estruturais de construção estão acobertados pelo seguro habitacional, cujos efeitos devem se prolongar no tempo, mesmo após a conclusão do contrato, para acobertar o sinistro concomitante à vigência deste, ainda que só se revele depois de sua extinção (vício oculto)”, esclareceu a ministra.

Boa-fé

Nancy Andrighi afirmou que, conforme preceitua o Código Civil, o contrato de seguro, tanto na conclusão como na execução, está fundado na boa-fé dos contratantes, no comportamento de lealdade e confiança recíprocos, sendo qualificado pela doutrina como um verdadeiro “contrato de boa-fé”.

Dessa maneira, segundo a relatora, a boa-fé objetiva impõe que a seguradora dê informações claras e objetivas sobre o contrato para que o segurado compreenda, com exatidão, o alcance da garantia contratada. Também obriga que a seguradora evite subterfúgios para tentar se eximir de sua responsabilidade com relação aos riscos previamente cobertos pela garantia.

Ao dar provimento ao recurso e reformar o acórdão do TJRN, a ministra afirmou que, quando constatada a existência de vícios estruturais cobertos pelo seguro habitacional, os recorrentes devem ser devidamente indenizados pelos prejuízos sofridos, conforme estabelece a apólice.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1717112

Fonte: STJ | 26/10/2018.

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CNJ: Estímulo a métodos alternativos de solução de conflitos está na CF/88

Em consonância com o preâmbulo da Constituição Federal de 1988, que descreve como objetivo maior a instituição de “um Estado Democrático […] de uma sociedade fraterna comprometida com a solução pacífica das controvérsias”, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem empregado esforços contínuos no sentido de valorizar o uso dos métodos alternativos de solução de controvérsias. Entre as ações adotadas, estão a criação da Semana Nacional da Conciliação, o Prêmio Conciliar é Legal e a própria Resolução CNJ n. 125, que institui a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesse.

Durante recente encontro com representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, lembrou que existe apenas um magistrado para cada 471 metros quadrados do país. A esse cenário, de acordo com o ministro, acrescentam-se dois agravantes: crescimento no número de demandas, “que já somam 80 milhões em tramitação”, e um déficit nos cargos de juízes. “Buscar métodos pacíficos de solução de conflitos não é apenas uma alternativa. É uma medida urgente”, afirmou. Ao proferir o discurso, ele participava de um seminário na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em Brasília, para discutir como a cultura da mediação judicial pode fazer frente ao excesso de ações que sobrecarregam os tribunais.

Em 2017, durante a XII Semana Nacional de Conciliação, evento promovido pelo CNJ, foram homologados 126,9 mil acordos judiciais em todo o país, totalizando R$ 1,5 bilhão. Foram atendidos 757 mil cidadãos que representavam 321 mil processos judiciais. A próxima edição da Semana Nacional da Conciliação, deste ano, já tem data marcada. Será entre os dias 5 e 9 de novembro, nos Tribunais Estaduais, Federais e do Trabalho, em todo o país. A expectativa é de que o volume de acordos seja ainda maior. Somando todas as 12 edições do evento, foram tirados dos trâmites judiciais mais de 1,7 milhão de processos, resolvidos por conciliação.

“Estamos trabalhando com uma mudança de cultura. A população está acostumada com a figura do juiz, que arbitra a decisão por ela. Mas a melhor decisão é aquela em que as partes participam e encontram a solução juntas”, destacou a conselheira do CNJ Daldice Santana, presidente do Comitê Gestor da Conciliação.

Política nacional

“A Constituição Federal, em seu capítulo II, artigo 4º, determina que compete ao CNJ incentivar a conciliação e a mediação. A Resolução CNJ n. 125 é uma resposta a essa demanda constitucional”, explicou Daldice Santana. A conselheira afirma que essa resolução do CNJ, que institui a Política Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesse consolidou, em um normativo único, a política de busca pela solução pacífica dos conflitos. Dentro da Resolução, ela destaca a determinação aos Tribunais de Justiça acerca da implantação dos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMECs).

Os Nupemecs de cada tribunal são responsáveis pelo desenvolvimento da Política Pública nos Estados e pela instalação e fiscalização dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs). Os CEJUSCs são as “células” de funcionamento da Política Pública, nas quais atuam conciliadores, mediadores e demais facilitadores de solução de conflitos, bem como servidores do Judiciário, aos quais cabe a triagem dos casos e a prestação de informação e orientação aos jurisdicionados para garantia do legítimo direito ao acesso à ordem jurídica justa.

Os CEJUSCs originaram-se de experiências anteriores, entre elas a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei n. 7.244/1984), posteriormente aprimorada pela Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/1995). Essas experiências, além de trazerem a mediação para o processo, permitiram a utilização tanto desse método quanto o da conciliação em pré-processual, evitando a judicialização de conflitos.

Quem pode conciliar?

A conciliação pode ser utilizada em quase todos os casos: pensão alimentícia, divórcio, desapropriação, inventário, partilha, guarda de menores, acidentes de trânsito, dívidas em bancos e financeiras e problemas de condomínio, entre vários outros. Só não pode ser usada em casos que envolvam crimes contra a vida (homicídios, por exemplo) e situações previstas na Lei Maria da Penha. “É complicado para um juiz decidir sozinho com quem vai ficar com a guarda de uma criança, por exemplo. É preciso a participação dos pais em uma decisão como essa. Tem de haver a participação ativa dos envolvidos e é isso que estamos buscando. Mais diálogo entre todos”, enfatizou a conselheira.

“Quando um juiz dá uma sentença, encerra o conflito entre duas partes. No entanto, necessariamente, se uma das duas partes não fica satisfeita com a decisão e, se tem possibilidade, acaba recorrendo e o processo se prolonga”, disse o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli. Segundo o ministro, a mediação e a conciliação previnem que a enxurrada anual de novos processos sobrecarregue a estrutura do Judiciário pois encerra o litigio. “Todos nós, nas faculdades, somos ensinados a litigar. Aprende-se a entrar na Justiça e a Justiça não dá mais conta de resolver, a tempo, todos os litígios que lhe são apresentados”, afirmou o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), citando ainda a Lei da Mediação e o texto do novo Código de Processo Civil (CPC) também determinam que a mediação e a conciliação façam parte da solução de processos judiciais.

Banco de boas práticas

Para incentivar ainda mais a solução pacífica dos conflitos, o CNJ possui um banco de boas práticas, advindos do Prêmio Conciliar é Legal. Desde 2010, o condecoração reconhece as práticas de sucesso, estimula a criatividade e dissemina a cultura dos métodos consensuais de resolução dos conflitos. Podem concorrer ao Prêmio os tribunais, magistrados, instrutores de mediação e conciliação, instituições de ensino, professores, estudantes, advogados, usuários, empresas ou qualquer ente privado, mediante a apresentação de práticas autocompositivas executadas individualmente ou em grupo.

Em 2018, os critérios para avaliação e julgamento das práticas são eficiência, restauração das relações sociais, criatividade, replicabilidade, alcance social, desburocratização, efetividade, satisfação do usuário e a ausência ou baixo custo para implementação da prática.

Em 2017, além dos 14 projetos vencedores, 19 práticas receberam menções honrosas pelos projetos eficientes voltados à solução pacífica de conflitos. Naquele ano, pela primeira vez foi incluída a categoria Mediação e Conciliação Extrajudicial.

Curiosidade

O ato de conciliar um litigio não é uma política nova no sistema jurídico brasileiro. No Brasil a conciliação remonta à época imperial (século XVI e XVII), precisamente nas Ordenações Manuelinas (1514) e Filipinas (1603) que trazia em seu livro III, título XX, § 1º, o seguinte preceito: “E no começo da demanda dirá o Juiz a ambas as partes, que antes que façam despesas, e sigam entre eles os ódios e dissensões, se devem concordar, e não gastar suas fazendas por seguirem suas vontades, porque o vencimento da causa sempre é duvidoso. […].”

No século XIX, pela primeira Constituição Imperial Brasileira (1924), a conciliação ganhou status constitucional. O texto trazia, em seu artigo 161, o seguinte texto: “Sem se fazer constar que se tem intentado o meio da reconciliação não se começara processo algum”.

Em 1943, entra em vigor a Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei n. 5.452, de 1/5/1943), trazendo em seu artigo 764 e parágrafos, a obrigatoriedade de se buscar sempre nos dissídios individuais e coletivos do trabalho, a conciliação entre as partes, deixando a decisão do Juízo somente para o caso de não haver acordo (art. 831).

Fonte: CNJ | 26/10/2018.

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