Registro de Imóveis – Indisponibilidade – Frações ideais de imóveis de propriedade exclusiva da esposa, casada pelo regime da comunhão parcial de bens, porque as recebeu por doação de seus genitores, com cláusula de incomunicabilidade – Indisponibilidade do patrimônio do cônjuge, por determinação da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, que não atinge a proprietária do imóvel – Averbações indevidas – Determinação de cancelamento – Recurso provido, com observação.


  
 

Número do processo: 1003088-35.2018.8.26.0281

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 151

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1003088-35.2018.8.26.0281

(151/2019-E)

Registro de Imóveis – Indisponibilidade – Frações ideais de imóveis de propriedade exclusiva da esposa, casada pelo regime da comunhão parcial de bens, porque as recebeu por doação de seus genitores, com cláusula de incomunicabilidade – Indisponibilidade do patrimônio do cônjuge, por determinação da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, que não atinge a proprietária do imóvel – Averbações indevidas – Determinação de cancelamento – Recurso provido, com observação.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso interposto por Venina Isabel Poço Viana Leme de Barros contra r. decisão que indeferiu pedido de cancelamento das ordens de indisponibilidade do patrimônio de seu marido, Paulo José Leme de Barros, averbadas nas matrículas nºs 4.934 e 53.284 do Registro de Imóveis da Comarca de Itatiba.

A recorrente alegou, em suma, que é casada com Paulo José Leme de Barros, pelo regime da comunhão parcial de bens. Disse que seu marido foi um dos administradores da Unimed Paulistana Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico no período de doze meses anteriores à decretação do registro de direção fiscal pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. Afirmou que o patrimônio do seu marido se tornou indisponível por força do § 1º do art. 24-A da Lei nº 9.656/98 e do art. 36 da Lei nº 6.024/74. Asseverou que é proprietária de frações ideais dos imóveis que recebeu por doação de seus genitores, com cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade, e que teve os bens de sua propriedade exclusiva atingidos pelas averbações de indisponibilidade do patrimônio do seu marido. Esclarece que, além de não pertencerem ao seu marido, as indisponibilidades não atingem os bens considerados impenhoráveis ou inalienáveis, conforme o § 4° do art. 24-A da Lei nº 9.656/98. Informou que não manteve qualquer vínculo com a prestadora dos serviços de saúde sujeita ao regime de direção fiscal e que as averbações decorreram de erro do Oficial de Registro de Imóveis. Requereu o cancelamento das averbações de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Leme de Barros que foram realizadas nas matrículas nº 4.934 e 53.284 do Registro de Imóveis da Comarca de Itatiba.

A douta Procuradora Geral da Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 57/60).

Opino.

A certidão de fls. 12/15 demonstra que mediante escritura pública lavrada em 13 de maio de 1996, retificada em 04 de agosto e registrada em 23 de agosto de 2000, a requerente, casada pelo regime da comunhão parcial de bens com Paulo José Leme de Barros, recebeu por doação de seus genitores fração ideal correspondente à quinta parte do imóvel objeto da matrícula nº 4.934 do Registro de Imóveis da Comarca de Itatiba, com cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade (R.6 e Av.08).

Conforme a referida certidão, em 1° de novembro de 2013 (Av. 13), 24 de novembro de 2014 (Av. 14), 19 de outubro de 2015 (Av. 15) e 1º de março de 2016 (Av. 16) foram promovidas averbações de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Lemes de Barros, decorrentes de determinações emanadas na ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar (fls. 14/15).

Por sua vez, a certidão de fls. 16/21 comprova que pela escritura pública já referida, registrada em 25 de fevereiro de 2015 (R. 05), a requerente adquiriu fração ideal correspondente a um quinto do imóvel objeto da matrícula nº 53.284 mediante doação feita por seus genitores, com cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade, e que também em relação a esse imóvel foram averbadas, sob nºs 08, 09, 13 e 14, as ordens de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Lemes de Barros decorrentes de determinações emanadas da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Essas doações tiveram como beneficiários exclusivos a requerente e seus quatro irmãos, todos filhos dos doadores, o que decorre dos teores dos registros da escritura pública feitos no R. 6 da matrícula nº 4.934 (fls. 11) e no R.5 da matrícula nº 53.284 (fls. 17), e também cláusulas de incomunicabilidade que impostas pelos doadores.

Outrossim, ainda que inexistentes as cláusulas de incomunicabilidade prevaleceria a regra geral no sentido de que no regime da comunhão parcial de bens não se comunicam as doações que forem feitas para cada um dos cônjuges na constância do casamento, como previsto no art. 259, inciso I, do Código Civil de 1916, vigente na data da escritura pública e do registro da doação do imóvel objeto da matrícula 4.934, e no art. 1.659, inciso I, do Código Civil de 2002 que era vigente na data do registro da doação do imóvel objeto da matrícula nº 53.284.

E, a rigor, no presente caso não houve averbação de indisponibilidade das frações ideais dos imóveis que são bens particulares da requerente.

As averbações contidas nas matrículas nºs 4.934 e 53.284 dizem respeito, de forma exclusiva, às indisponibilidades que recaem sobre o patrimônio de Paulo José Leme de Barros, como se verifica nas certidões das matrículas.

Ocorre que, como visto, os imóveis objeto das matrículas nºs 4.934 e 53.284 não integram o patrimônio de Paulo José Leme de Barros porque as frações ideais doadas constituem bens particulares de sua esposa.

Em razão disso, o procedimento a ser adotado neste caso concreto é o previsto nos itens 421 e seguintes do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, consistente em promover a consulta à base de dados das comunicações de indisponibilidade de bens a cada novo registro de aquisição de propriedade, e somente promover a averbação das restrições que recaem, de forma genérica, sobre o patrimônio de Paulo José Leme de Barros depois que houver o registro de direito real que for constituído em seu favor (subitem 421.3 do Capítulo XX das Normas de Serviço):

“421. Os registradores de imóveis deverão, antes da prática de qualquer ato de alienação ou oneração, proceder à consulta à base de dados da Central de Indisponibilidade de Bens.

421.1 Os Oficiais do Registro de Imóveis deverão manter registros de todas as indisponibilidades em fichas do Indicador Pessoal (Livro nº 5), ou em base de dados informatizada off-line, ou por solução de comunicação via Web Service, destinados ao controle das indisponibilidades e consultas simultâneas com a de títulos contraditórios.

421.2 Verificada a existência de bens no nome cadastrado, a indisponibilidade será prenotada e averbada na matrícula ou transcrição do imóvel, ainda que este tenha passado para outra circunscrição. Caso não figure do registro o número do CPF ou do CNPJ, a averbação de indisponibilidade somente poderá ser feita desde não haja risco de tratar-se de pessoa homônima.

421.3 Em caso de aquisição de imóvel por pessoa cujos bens foram atingidos por indisponibilidade, deverá o oficial, imediatamente após o lançamento do registro aquisitivo na matrícula, promover a averbação da indisponibilidade, independentemente de prévia consulta ao adquirente.

421.4 Após a averbação da indisponibilidade na matrícula, o Oficial do Registro de Imóveis deverá cadastrá-la no sistema, em campo próprio para essa informação” (grifei).

Portanto, a rigor, não se cuida de cancelar averbações de indisponibilidade que recaem sobre os bens da requerente, mas cancelar as averbações de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Leme de Barros feitas em imóveis de que não é proprietário.

Os erros consistentes nas averbações de indisponibilidade em imóveis de que o atingido não é titular de direito real possibilita que sejam canceladas na esfera administrativa, pois foram realizadas com violação da continuidade do registro.

Observo, por fim, que as averbações das indisponibilidades deverão ser promovidas assim que houver o registro de título constitutivo de direito real em favor de Paulo José Leme de Barros, em conformidade com o subitem 421.3 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

Ante o exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de dar provimento ao recurso para determinar o cancelamento das averbações de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Leme de Barros feitas sob nºs 13, 14, 15 e 16 na matrícula nº 4.934 e sob nºs 08, 09, 13 e 14 na matrícula nº 53.284, ambas do Registro de Imóveis da Comarca de Itatiba, todas decorrentes de comunicações realizadas pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, com a observação de que as ordens de indisponibilidade que estiverem vigentes deverão ser novamente averbadas tão logo for promovido registro de direito real de propriedade em favor do atingido pelas restrições.

Sub censura.

São Paulo, 15 de março de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou provimento ao recurso para determinar o cancelamento das averbações de indisponibilidade do patrimônio de Paulo José Leme de Barros feitas sob nºs 13, 14, 15 e 16 na matrícula nº 4.934 e sob nºs 08, 09, 13 e 14 na matrícula nº 53.284, ambas do Registro de Imóveis da Comarca de Itatiba, todas decorrentes de comunicações realizadas pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, com a observação de que as ordens de indisponibilidade que estiverem vigentes deverão ser novamente averbadas tão logo for promovido registro de direito real de propriedade em favor do atingido pelas restrições. O mandado de averbação será expedido pelo MM. Juiz Corregedor Permanente. Oportunamente, restituam-se os autos à Vara de origem. Intimem-se. São Paulo, 19 de março de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: WAGNER ROBERTO FERREIRA POZZER, OAB/SP 207.504 e BELISARIO DOS SANTOS JUNIOR, OAB/SP 24.726.

Diário da Justiça Eletrônico de 02.04.2019

Decisão reproduzida na página 059 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

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