1VRP/SP: Registro de Imóveis. RCPJ. Averbação de ata de reunião.

Processo 1015209-51.2021.8.26.0100

Pedido de Providências – Tabelionato de Protestos de Títulos – Igreja de Cristo Jesus – Do exposto, julgo improcedente o pedido de providências formulado pela Igreja de Cristo Jesus em face da negativa do Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos da Capital, mantendo o óbice apontado. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: GILBERTO VILAS BOAS (OAB 53650/PR)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1015209-51.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Tabelionato de Protestos de Títulos

Requerente: Igreja de Cristo Jesus

Requerido: 1º Oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da

Capital

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Vivian Labruna Catapani

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado pela Igreja de Cristo Jesus em face da negativa do Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos da Capital em averbar a ata da reunião do Conselho Geral da suscitante, realizada em 18/03/2020, em que foi aprovada, de forma unânime, a prorrogação do mandato dos atuais dirigentes do Conselho Geral até o final da pandemia de covid-19.

A parte interessada informou, inicialmente, que os dirigentes que integram seu Conselho Geral são eleitos em assembleias realizadas a cada três anos, tendo a última ocorrido em abril de 2017. Diante da aproximação do fim dos mandatos, havia previsão de realização de nova assembleia para eleição para abril de 2020. Contudo, em março do ano passado teve início a pandemia de covid-19 no Brasil, o que limitou a realização de reuniões presenciais. Em face da situação extraordinária, o próprio Conselho Geral, em reunião realizada em 18/03/2020, deliberou acerca da prorrogação do mandato de seus dirigentes. Argumentou que seu estatuto, no art. 29, alíneas “g” e “q”, e art. 49, autoriza o

Conselho a legislar nos casos de omissão do estatuto; assim, ante a peculiaridade da situação, asseverou que a deliberação foi legítima, devendo ser averbada pelo Oficial.

Afirmou o Oficial, por sua vez, que a negativa apresentada à parte tem duas fundamentações principais: i) incompetência do Conselho Geral para escolha de seus próprios membros, haja vista que o estatuto é expresso acerca do modo como a eleição deve ser realizada, não havendo que se falar em omissão que autorizaria a atuação normativa suplementar do Conselho; ii) impossibilidade de prorrogação dos mandatos por tempo indeterminado, haja vista que as NSCGJ estipulam expressamente que os mandatos de dirigentes de órgãos de administração das pessoas jurídicas devem ser fixados por período certo de tempo.

O Ministério Público opinou às fls. 138/139 pelo afastamento do óbice.

É o relatório.

Decido.

Respeitado o posicionamento do D. Promotor de Justiça, o pedido deve ser julgado improcedente.

Observo, de proêmio, que o óbice apresentado pelo Oficial está lastreado na incompatibilidade entre o teor da deliberação (cuja averbação é o objeto central deste procedimento) e o estatuto da pessoa jurídica interessada (fls. 16/40). Destarte, é salutar destacar o teor dos dispositivos que disciplinam a questão da eleição dos membros do Conselho Geral da suscitante:

Art. 26 – São finalidades das Convenções Gerais: h) Indicar nomes para a Assembleia Geral, para que esta eleja o Presidente e o Vice-Presidente, sendo que estes serão eleitos pelos votos exclusivos dos pastores, presbíteros, evangelistas e missionários (as) consagrados em convenção, delegados e obreiros à frente de obra.

Art. 30º – O Conselho Geral será composto por: 1 (um) Presidente, 1 (um) Vice-Presidente, 1 (um) Diretor de cada região eclesiástica, 1 (um) Diretor Secretário, 1 (um) Diretor Tesoureiro, 1 (um) Diretor Jurídico (somente quando disponível o advogado no quadro de membros da igreja), 4 (quatro) Suplentes que, além das atribuições regimentais, poderão ser convocados pelo Conselho para ocuparem cargos de Diretores auxiliares no Ministério e nas Secretarias gerais.

Parágrafo 1º – Após a eleição, o Presidente eleito, o Vice-Presidente e os Diretores Regionais, que também deverão ter sido eleitos pelas Convenções Regionais, se reunirão em local separado do local da Convenção, para escolherem os demais membros que juntamente com estes comporão o Conselho Geral e os 4 (quatro) suplentes. Após consultar os nomes indicados, sendo aceito, deverão apresentá-los à assembleia geral, que deverá elegê-los por aclamação: o Diretor Secretário, o Diretor Tesoureiro, e os 4 (quatro) Suplentes, ficando assim eleito o Conselho Geral que deverá tomar posse no encerramento da Convenção no Templo da Igreja.

Dos dispositivos em destaque depreende-se que a eleição dos dirigentes do Conselho Geral da pessoa jurídica suscitante é ato complexo, com participação da Convenção Geral, que indica os nomes dos candidatos aos cargos de Presidente e Vice- Presidente, para que a Assembleia Geral (art. 26, alínea “h”) os eleja. Posteriormente a essa escolha, o Presidente e o Vice reúnem-se com os Diretores Regionais (que, por sua vez, foram eleitos pelas Convenções Regionais), para indicar os candidatos para os demais cargos do Conselho Geral, que também serão eleitos pela Assembleia Geral.

Desta feita, a deliberação tomada na reunião ordinária realizada em 18/03/2020 (fl. 146), em razão da qual o próprio Conselho Geral deliberou acerca da prorrogação do mandato de seus membros, originalmente eleitos em 24/04/2017, contrariou inequivocamente as disposições estatutárias elencadas acima, em razão da ausência de participação dos demais órgãos da pessoa jurídica – Convenção Geral e Assembleia Geral – bem como pela inobservância do processo eleitoral regularmente disciplinado.

Cumpre destacar que, ao contrário do quanto afirmado pela interessada, não há qualquer omissão ou lacuna normativa autorizadora da normatização suplementar exercida pelo Conselho Geral, tendo em conta que o tema é regulado de modo expresso pelo próprio estatuto. Sendo assim, as disposições do art. 29, alíneas “g” e “q” (fl. 53), e art.49 do estatuto não se aplicam ao presente caso, eis que tratam de hipótese em que haja omissão do estatuto, o que não é o caso dos autos.

Além disso, observo que a deliberação no sentido de que os atuais mandatos seriam mantidos até que “a epidemia seja erradicada de nosso país, bem como que a OMS emita nota de que estamos livres da pandemia” resulta na prorrogação por tempo indeterminado, o que viola o item 16.3.4 das NSCGJ, que estipula que os mandatos devem ser estipulados por prazo fixo.

Entendo que, quando da realização da reunião, a expectativa geral era de que a pandemia teria curta duração. Entretanto, após mais de um ano de seu início e com conhecimento científico acumulado e divulgado acerca do comportamento epidemiológico do vírus, sabe-se hoje que não há indícios que apontem para sua superação integral em curto prazo, haja vista que isso depende não somente da vacinação (que, apesar de já ter iniciado, avança em ritmo lento, proporcionalmente à população), mas da efetiva queda na taxa de novas transmissões e número de óbitos.

Desta feita, diante da imprevisibilidade acerca da duração da pandemia, resta patente o caráter indeterminado da prorrogação dos mandatos dos membros do Conselho Geral, o que é vedado pelas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça.

Não se ignora que, diante da excepcionalidade dos tempos em que vivemos, reuniões presenciais dos órgãos das pessoas jurídicas estão inviabilizadas. Entretanto, nada impede que as deliberações sejam tomadas em assembleias virtuais. Nessa senda, destaco que os arts. 4º e 5º da Lei 14.010/2020 – que trata do Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (covid-19) – autorizaram a realização de reuniões virtuais, em substituição às presenciais, até o dia 30/10/2020.

Esse prazo, todavia, deve ser relativizado, ante a permanência e agravamento da evolução epidemiológica do vírus, conforme já foi decidido por este Juízo anteriormente (proc. 1123459-18.2020.8.26.0100), de modo que a eleição dos membros do Conselho Geral da suscitante poderá ser procedida de forma virtual.

Do exposto, julgo improcedente o pedido de providências formulado pela Igreja de Cristo Jesus em face da negativa do Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos da Capital, mantendo o óbice apontado.

Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 14 de abril de 2021. (DJe de 19.04.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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1VRP/SP: Registro de Imóveis. Loteamento e Desmembramento. Dispensa do registro especial. Desmembramento em mais de 20 lotes.

Processo 1026746-44.2021.8.26.0100

Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS – Roberto Francisco Alves – Do exposto, julgo procedente o procedimento de dúvida formulado por Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Roberto Francisco Alves, para manter o óbice apontado. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. P.R.I.C. – ADV: NELSON LUIZ DE ARRUDA CAMPOS (OAB 114306/SP), ROBERTA ALESSANDRA F ALVES DE A CAMPOS (OAB 173521/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1026746-44.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS

Suscitante: 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Suscitado: Roberto Francisco Alves

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Vivian Labruna Catapani

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Roberto Francisco Alves, em razão da recusa de registro da escritura de compra e venda de onze prédios e respectivos terrenos localizados à Rua Ida Boschetti, nºs 270, 278, 280, 286, 288, 294, 296, 302, 304, 310 e 318, inseridos em área maior objeto da Transcrição nº 27.388.

Segundo o Oficial, os imóveis objeto da escritura de compra e venda ocupam uma área de 1.000m², enquanto a área total da Transcrição nº 27.388 é de 2.500m².

Em razão de o título referir-se apenas à parte do terreno, o registro da escritura deverá ser precedido do loteamento da área total, bem como das averbações das edificações existentes no local, nos termos do art. 18 da Lei 6.766/79. A exigência do registro especial previsto no dispositivo mencionado só poderia ser dispensada com autorização desta Corregedoria Permanente.

O interessado apresentou impugnação às fls. 155/158, argumentando que a Municipalidade atestou a regularidade de 10 dos 11 prédios adquiridos pelo suscitado, em procedimento realizado em 1968. Afirmou que o registro pretendido não pode ser condicionado ao cumprimento de requisitos da Lei 6.766/79, que é posterior à regularização realizada perante a Prefeitura; caso contrário, haveria violação a seu direito adquirido à “manutenção da construção dos prédios no estado em que se encontram”. Ao final, pugnou pelo afastamento do óbice apontado.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 161/163).

É o relatório.

Fundamento e Decido.

Assiste razão ao Oficial e à D. Promotora de Justiça.

De proêmio, observo que de acordo com o princípio tempus regit actum, à qualificação do título aplicam-se as exigências legais contemporâneas ao registro. O Conselho Superior da Magistratura tem considerado que, para fins de registro, em atenção ao princípio em questão, sujeita-se o título à lei vigente ao tempo de sua apresentação (Apelação Cível nº, 115-6/7, rel. José Mário Antonio Cardinale, nº 777-6/7, rel. Ruy Camilo, nº 530-6/0, rel. Gilberto Passos de Freitas, e, mais recentemente, nº 0004535-52.2011.8.26.0562, rel. José Renato Nalini).

Logo, mesmo que parte dos imóveis adquiridos pelo suscitado tenha passado por procedimento de regularização anterior perante a Municipalidade, a qualificação registral é realizada com base no ordenamento vigente ao tempo da apresentação do título, de modo que as exigências da Lei 6.766/79 devem ser observadas, não havendo que se falar em violação a direito adquirido do interessado.

Nos termos dos artigos 18 e 19 da Lei 6.766/79, no caso de parcelamento do solo, é exigido o registro especial. Este registro tem a finalidade de resguardar o interesse público (ordem urbanística) e tutelar os futuros adquirentes dos lotes, conforme precedentes da Egrégia Corregedoria da Justiça (Processo CG 256/2004, parecer exarado pelo Juiz Auxiliar José Marcelo Tossi aprovado em 10.05.2004 pelo Corregedor Geral da Justiça, Des. José Mario Antonio Cardinale).

Dessa forma, havendo parcelamento, a regra é que as exigências da Lei 6.766/79 sejam observadas, só podendo haver dispensa nos casos previstos no Provimento nº 03, de 22 de março de 1988, desta 1ª Vara de Registros Públicos, e no item 165 do Capítulo XX das NSCGJ. Diante de sua relevância para o deslinde do caso, é salutar destacar o teor dos dispositivos.

Em primeiro lugar, o provimento mencionado dispõe que o registro pode ser dispensado, independentemente de intervenção administrativo judicial, se o parcelamento cumulativamente preencher os seguintes requisitos:

a) não implicar abertura de novas vias de circulação de logradouros públicos, prolongamento, modificação ou ampliação de vias existentes, ou, de modo geral, transferência de áreas para o domínio público (grifei);

b) não provier de imóvel que já tenha, a partir de dezembro de 1979, sido objeto de outro parcelamento;

c) não importar fragmentação superior a 10 (dez) lotes (grifei).

Já as Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, ao tratarem da possibilidade de dispensa do registro especial, preveem que:

165. O registro especial, previsto no art. 18, da Lei nº 6.766/79, será dispensado nos seguintes casos: a) as divisões “inter vivos” celebradas anteriormente a 20 de dezembro de 1979; b) as divisões “inter vivos” extintivas de condomínios formados antes da vigência da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979; c) as divisões consequentes de partilhas judiciais, qualquer que seja a época de sua homologação ou celebração; d) os desmembramentos necessários para o registro de cartas de arrematação, de adjudicação ou cumprimento de mandados; e) quando os terrenos tiverem sido objeto de compromissos formalizados até 20 de dezembro de 1979, mesmo com antecessores; f) Quando os terrenos tiverem sido individualmente lançados para o pagamento de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para o exercício de 1979, ou antes. 165.5. Para a dispensa do registro especial, o oficial registrador deverá ter especial atenção à verificação das seguintes circunstâncias: (1) não implicar transferência de área para o domínio público (grifei); (2) não tenha havido prévia e recente transferência de área ao Poder Público, destinada a arruamento, que tenha segregado o imóvel, permitido ou facilitado o acesso a ela, visando tangenciar as exigências da Lei nº 6.766/79; (3) resulte até 10 lotes; (4) resulte entre 11 e 20 lotes, mas seja servido por rede de água, esgoto, guias, sarjetas, energia e iluminação pública, o que deve ser comprovado mediante a apresentação de certidão da Prefeitura Municipal (grifei); (5) não ocorram desmembramentos sucessivos, exceto se o novo desmembramento não caracterizar intenção de afastar o cumprimento das normas que regem o parcelamento do solo urbano em razão do tempo decorrido entre eles, da alteração dos proprietários dos imóveis a serem desmembrados, sem que os novos titulares do domínio tenham participado do fracionamento anterior; (6) Na hipótese do desmembramento não preencher os itens acima, ou em caso de dúvida, o deferimento dependerá de apreciação da Corregedoria Permanente.

No caso em análise, o imóvel objeto da Transcrição nº 27.388 é composto por 24 casas, por uma passagem particular e respectivo balão de retorno, em área total de 2.500m², conforme Planta de Conservação apresentada ao Oficial em 2010. Todavia, não consta dos autos a aprovação da referida planta pela Municipalidade, ante a ausência de expedição de Alvará de Conservação ou outro documento semelhante que indique a aprovação do parcelamento.

Desta feita, considerando a configuração da totalidade do imóvel, conclui-se que o caso não se amolda às hipóteses de dispensa acima indicadas, haja vista que o parcelamento submete o terreno à fragmentação superior a 20 lotes e, além disso, a abertura da passagem particular exige a regularização da via perante a Municipalidade.

Ressalto que o fato de parte dos edifícios que integram a área adquirida pelo suscitado terem sido regularizados perante a Prefeitura – com Certificados de Regularidade emitidos em 2019 (fls. 111/154) – não afasta a necessidade de observação do registro especial previsto no art. 18 da Lei 6.766/79, uma vez que a análise da dispensa deve levar em conta a totalidade do imóvel, não estando limitada à parte adquirida pelo interessado.

Do exposto, julgo procedente o procedimento de dúvida formulado por Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Roberto Francisco Alves, para manter o óbice apontado.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

P.R.I.C.

São Paulo, 13 de abril de 2021. (DJe de 19.04.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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Processo Administrativo Disciplinar – Pena de perda da delegação – Portaria inaugural que designou perícia sem prévio interrogatório e apresentação de defesa prévia por parte do Oficial processado – Estatuto do Servidor Público do Estado de São Paulo, Lei Estadual nº 10.261/68 – Necessidade de observância do contraditório e da ampla defesa em processo administrativo disciplinar – Obrigatoriedade de acompanhamento por defesa técnica, constituída ou dativa, desde o início do procedimento – Retorno dos autos ao primeiro grau – Recurso provido.

Número do processo: 0000436-46.2018.8.26.0060

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 423

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 0000436-46.2018.8.26.0060

(423/2019-E)

Processo Administrativo Disciplinar – Pena de perda da delegação – Portaria inaugural que designou perícia sem prévio interrogatório e apresentação de defesa prévia por parte do Oficial processado – Estatuto do Servidor Público do Estado de São Paulo, Lei Estadual nº 10.261/68 – Necessidade de observância do contraditório e da ampla defesa em processo administrativo disciplinar – Obrigatoriedade de acompanhamento por defesa técnica, constituída ou dativa, desde o início do procedimento – Retorno dos autos ao primeiro grau – Recurso provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso administrativo interposto por N.B.C.J., Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de (…), contra r. sentença de fls. 405/438 que, em processo administrativo disciplinar, aplicou ao recorrente a pena de perda da delegação, por ofensa ao art. 31, I, II e V da Lei nº 8.935/94.

Sustenta o recorrente a nulidade do procedimento, tendo em vista: a) não ter sido instruído com atas de correição apontadas na D. Portaria inaugural; b) inobservância do art. 15 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), cujo rito deveria ter sido observado; c) nulidade da notificação inicial, haja vista não ter sido oportunizado ao recorrente sua oitiva e apresentação de defesa prévia, tampouco a possibilidade de constituição de advogado.

No mérito, verbera a aplicação do Comunicado nº 1914/2018, que possibilitou a regularização de passivos de unidades extrajudiciais, ausência de qualquer conduta dolosa a indicar deliberada intenção de não recolhimento, razão pela qual estão ausentes os pressupostos de aplicação de pena disciplinar ou, alternativamente, a escolha por penalidade de menor gravidade.

É o relatório.

Opino.

Respeitado o entendimento lançado pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, de fato, salvo melhor juízo de Vossa Excelência, o procedimento padece de nulidade insanável.

Conforme se colhe do teor da Portaria nº 01/2018 (fls. 01/02, aditada à fl. 43), a instauração do PAD teria se dado a partir de irregularidades administrativo-disciplinares supostamente inscritas nas atas de correição ordinária dos anos de 2016 e 2017, relativas ao não recolhimento de parcelas de emolumentos referentes ao Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo-IPESP e ao Estado, em ofensa ao art. 19 da Lei Estadual nº 11.331/2002, bem como ao art. 31 da Lei nº 8.935/94.

Não há qualquer nulidade pela ausência de cópias das atas de correição dentro deste expediente, uma vez que o livro de visitas e correições faz parte do acervo da serventia, de modo que o Oficial a elas possui amplo e irrestrito acesso.

Por outro lado, observa-se que, ao baixar a Portaria inaugural, o MM. Juiz Corregedor Permanente, imediatamente, designou perícia contábil, sem que fosse dada ao recorrente a oportunidade de ser interrogado, bem como de constituir defesa técnica, ou nomeação do defensor dativo.

Verifica-se tal fato da leitura do mandado de notificação de fls. 4/5, podendo ser visto que o Oficial apenas foi comunicado da instauração do procedimento disciplinar, bem como da designação de perícia técnica:

“MANDA a qualquer Oficial de Justiça de sua jurisdição que, em cumprimento deste, expedido nos autos da ação em epígrafe, proceda à CITAÇÃO e INTIMAÇÃO da(s) pessoa(s) acima indicada(s) acerca da instauração de processo administrativo, através da Portaria nº 01/2018 da Vara Única, por infração capitulada no art. 31, I (inobservância das prescrições legais e normativas; II (conduta atentatória as instituições notariais ou de registro) e V (descumprimento de quaisquer dos deveres descritos no art. 30, mormente os incisos I, V e VIII), da Lei nº 8.935/94, bem como NOTIFICAÇÃO acerca das disposições contidas no artigo 465, parágrafo 1º do Código de Processo Civil, em razão da nomeação de perito judicial.”

Na verdade, instaurado o procedimento, deveria ter sido designado o interrogatório do Oficial, com posterior apresentação de defesa prévia, até para que fosse dada a ele a chance de nomear assistente técnico e contrapor a prova pericial.

Em matéria de processo administrativo disciplinar contra titulares de delegações extrajudiciais, à míngua de qualquer disposição expressa na Lei nº 8.935/94, aplicam-se, naquilo que for cabível, as regras do Estatuto do Servidor Público do Estado de São Paulo, Lei Estadual nº 10.261/68, com posteriores alterações.

E sob as regras da referida legislação, diz o seu art. 268 que:

Artigo 268 – A apuração das infrações será feita mediante sindicância ou processo administrativo, assegurados o contraditório e a ampla defesa. (g.n).

Nessa linha, o art. 277 da referida Lei trata da Portaria de instauração do procedimento nos seguintes termos:

Artigo 277 – O processo administrativo deverá ser instaurado por portaria, no prazo improrrogável de 8 (oito) dias do recebimento da determinação, e concluído no de 90 (noventa) dias da citação do acusado.

§ 1º – Da portaria deverão constar o nome e a identificação do acusado, a infração que lhe é atribuída, com descrição sucinta dos fatos, a indicação das normas infringidas e a penalidade mais elevada em tese cabível.”

Logo em seguida, verifica-se que o procedimento legal determina seja designada data para o interrogatório do processado:

Artigo 278 – Autuada a portaria e demais peças preexistentes, designará o presidente dia e hora para audiência de interrogatório, determinando a citação do acusado e a notificação do denunciante, se houver. (g.n).

§ 1° – O mandado de citação deverá conter:

1 – cópia da portaria;

– data, hora e local do interrogatório, que poderá ser acompanhado pelo advogado do acusado;

3 – data, hora e local da oitiva do denunciante, se houver, que deverá ser acompanhada pelo advogado do acusado;

– esclarecimento de que o acusado será defendido por advogado dativo, caso não constitua advogado próprio(g.n).

5 – Informação de que o acusado poderá arrolar testemunhas e requerer provas, no prazo de 3 (três) dias após a data designada para seu interrogatório;

– advertência de que o processo será extinto se o acusado pedir exoneração até o interrogatório, quando se tratar exclusivamente de abandono de cargo ou função, bem como inassiduidade.”

Como dito, uma vez notificado da instauração do procedimento, caso o recorrente não tivesse constituído advogado, seria obrigatória a nomeação de defensor dativo, o que não foi feito pelo MM. Juiz Corregedor Permanente. Isso é reafirmado no art. 281 da Lei Estadual 10.261/68:

Artigo 281 – Ao acusado revel será nomeado advogado dativo.”

Em seguida ao interrogatório, também seria impositivo fosse facultado ao recorrente a oportunidade de apresentação de defesa escrita, com indicação de provas, o que também não ocorreu:

Artigo 283 – Comparecendo ou não o acusado ao interrogatório, inicia-se o prazo de 3 (três) dias para requerer a produção de provas, ou apresentá-las.”

Conclui-se, com todo respeito ao MM. Juiz Corregedor Permanente, que houve franca inversão do procedimento a ser observado, uma vez que o primeiro ato foi justamente a designação de perícia técnica, antes mesmo da possibilidade de interrogatório, sem a constituição de advogado e sem a possibilidade de defesa escrita.

A observância do contraditório e da ampla defesa é impositiva neste procedimento, conforme remansosa jurisprudência desta Eg. Corte:

“MANDADO DE SEGURANÇA – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO EM FACE DO OFICIAL DO (…) CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE (…) – IMPOSIÇÃO DA PENA DE PERDA DA DELEGAÇÃO POR JUIZ CORREGEDOR PERMANENTE – IMPETRAÇÃO CONTRA ATO DO DESEMBARGADOR CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA QUE NEGOU PROVIMENTO A RECURSO ADMINISTRATIVO, MANTENDO A SENTENÇA PUNITIVA – SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO PÚBLICA DELEGADA É MEDIDA PREVENTIVA QUE NÃO SE CONFUNDE COM A PENALIDADE DE PERDA DA DELEGAÇÃO PREVISTA NOS ARTIGOS 32, INCISO IV, E 35, INCISO II, AMBOS DA LEI FEDERAL Nº 8.935/94 COMBINADOS COM O ARTIGO 32, INCISO IV, DO CAPÍTULO XXI DAS NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DE SÃO PAULO – INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM – DESNECESSIDADE, ADEMAIS, DE NOMEAÇÃO DE COMISSÃO PROCESSANTE – TITULARES DAS DELEGAÇÕES QUE ESTÃO SUJEITOS AO PODER CENSÓRIO-DISCIPLINAR DO JUIZ CORREGEDOR PERMANENTE OU DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA, QUE DETÊM COMPETÊNCIA PARA INSTRUÇÃO E JULGAMENTO DOS RESPECTIVOS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS – INFRAÇÃO DISCIPLINAR GRAVÍSSIMA RECONHECIDA NA VIA ADMINISTRATIVA – AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE VALORES DEVIDOS AO ESTADO E À CARTEIRA DE PREVIDÊNCIA DAS SERVENTIAS NÃO OFICIALIZADAS DA JUSTIÇA, EM DESRESPEITO ARTIGO 19, INCISO I, LETRAS ‘B’ E ‘C, DA LEI ESTADUAL Nº 11.331/2002 – DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO – SEGURANÇA DENEGADA”. “O legislador federal, no exercício de sua atribuição constitucional, regulamentou o artigo 236 da Carta Magna editando a Lei nº 8.935/1994 (Lei dos Cartórios), estabelecendo em seu artigo 35, incisos I e II, que a perda da delegação dependerá de sentença judicial transitada em julgado ou de decisão decorrente de processo administrativo instaurado pelo juízo competente, assegurado amplo direito de defesa”. “No Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, os titulares da delegação estão sujeitos ao poder censório-disciplinar das Corregedorias Permanentes e da Corregedoria Geral da Justiça (artigo 19, do Capítulo XXI, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça), o que implica reconhecer a regularidade do processo administrativo instaurado, instruído e decidido pelo MM Juiz Corregedor Permanente a que se encontra subordinado o notário”. (TJSP; Mandado de Segurança 2171578-07.2017.8.26.0000; Relator (a): Renato Sartorelli; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo  NIA; Data do Julgamento: 08/11/2017; Data de Registro: 09/11/2017).

O MM. Juiz Corregedor Permanente é o garante da observância das prerrogativas legais, ciência pelo recorrente de todo o andamento e decisões do processo administrativo disciplinar, bem como da sua efetiva participação na formação da decisão final, em conformidade à ampla defesa e ao contraditório.

E, ainda que se afirmasse que tal nulidade somente seria reconhecível se houvesse prejuízo, o prejuízo aqui é patente; o recorrente foi condenado à pena máxima prevista em lei: perda da delegação.

Sendo assim, face à sua evidente nulidade, a instrução deverá ser renovada, a partir do interrogatório do recorrente, para que, agora, o feito seja ordenado com observância à ampla defesa e ao devido processo legal.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que seja declarada a nulidade do procedimento desde a notificação inicial do recorrente, com o retorno dos autos para que seja designada data de interrogatório, e posterior abertura de prazo para apresentação de defesa prévia e requerimentos sobre provas, com ulteriores atos procedimentais.

Sub censura.

São Paulo, 12 de agosto de 2019.

Paulo César Batista dos Santos

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, dou provimento ao recurso para declarar a nulidade do procedimento desde a notificação inicial do recorrente, com o retorno dos autos para que seja designada data de interrogatório, e posterior abertura de prazo para apresentação de defesa prévia e requerimentos sobre provas, com ulteriores atos procedimentais. I. São Paulo, 15 de agosto de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça  Advogado: PEDRO LUIZ MARTINS ARRUDA, OAB/SP 122.051.

Diário da Justiça Eletrônico de 21.08.2019

Decisão reproduzida na página 157 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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