1VRP/SP: Registro de Imóveis. Título Judicial. Inalienabilidade. Incomunicabilidade. Súmula n. 49 do STF


  
 

Processo 1108736-57.2021.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1108736-57.2021.8.26.0100

Processo 1108736-57.2021.8.26.0100

Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Lucia Aparecida Ghiraldi – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para determinar a averbação do divórcio da parte requerente sem a necessidade da apresentação prévia de mandado judicial declarando que não houve a comunicação do imóvel herdado (fls. 39/40), bem como do óbito de seu ex-cônjuge, Benedito Irineu Ferreira da Luz (fls. 41/42). Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: SHIRLEY DAISY DE MELO KELLER (OAB 376885/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1108736-57.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis

Requerente: Lucia Aparecida Ghiraldi

Requerido: 14º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado por Lúcia Aparecida Ghiraldi em face do Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, requerendo averbação de seu divórcio e do falecimento do ex-cônjuge na matrícula n. 15.972 daquela serventia.

A parte requerente aduz que recebeu parte do imóvel como herança de seu pai, com gravação de cláusula de inalienabilidade; que, quando de seu divórcio de Benedito Irineu Ferreira da Luz, com o qual era casada sob o regime de comunhão universal de bens, restou claro que a parte ideal do imóvel tinha siso herdada apenas por ela, de modo que não houve partilha; que o Oficial nega-se a averbar o divórcio, sob a alegação de que o imóvel passou a integrar o patrimônio de Benedito após ter sido herdado por ela, diante do que deve ser partilhado no divórcio ou levado ao inventário dos bens deixados por ele, já que falecido; que a exigência afronta a súmula n. 49 do Supremo Tribunal Federal, vez que a gravação de inalienabilidade abarca a de incomunicabilidade; que foi providenciado inventário negativo diante da inexistência de bens deixados por Benedito, o que também não foi aceito para as averbações pretendidas.

Diante disso, requer averbação do seu divórcio e do óbito de seu ex-cônjuge.

Documentos vieram às fls. 04/26.

O Oficial manifestou-se às fls. 30/32, sustentando que a parte requerente recebeu 1/12 (um doze avos) da nua propriedade do imóvel indicado conforme formal de partilha expedido no inventário dos bens deixados por seu genitor, Luiz Ghiraldi (autos n. 000.05.091582-7), sendo que, naquela época, ela era casada sob o regime de comunhão universal de bens (casamento ocorrido antes da Lei n. 6.515/77 com Benedito Irineu Ferreira da Luz); que referido imóvel foi partilhado aos herdeiros com cláusula de inalienabilidade (Av.10/15.972); que deve-se distinguir doação (ou recebimento de herança por testamento) feita antes ou depois do casamento do donatário pelo regime da comunhão universal de bens; que, se o donatário é solteiro, a doação a ele com cláusula de inalienabilidade implica incomunicabilidade do bem conforme a súmula n. 49 do STF; que, se o donatário é casado pelo mesmo regime, como na hipótese, a situação é diferente, pois o doador (ou testador) já sabe desse fato e, em não querendo a comunicação do bem, deve expressamente colocar como donatário (ou herdeiro) apenas a pessoa beneficiada, com imposição da cláusula da incomunicabilidade, além da inalienabilidade, não se aplicando, portanto, referida súmula; que a parte requerente juntou decisão judicial considerando a incomunicabilidade, porém sem a expressão usual “servindo como mandado”. Diante disso, para a averbação do divórcio, é necessária a apresentação de mandado declarando que não houve a comunicação do bem, o que deve ser prenotado antes e separadamente do requerimento da averbação do divórcio.

O Ministério Público opinou pela procedência (fls. 52/53).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, o pedido é procedente.

Com efeito, a controvérsia diz respeito à necessidade de mandado judicial com declaração de que não houve a comunicação do bem recebido pela parte requerente em virtude de testamento deixado por seu genitor, o qual dispõe apenas de cláusula expressa de inalienabilidade (Av.10/15.972), sendo que, no divórcio havido entre ela e Benedito Irineu Ferreira da Luz, noticiou-se a não constituição de patrimônio comum.

A exigência fundamenta-se na alegada inaplicabilidade da súmula n. 49 do STF ao caso concreto, uma vez que a requerente já era casada pelo regime de comunhão universal de bens quando foi beneficiada pelo testamento, pelo que o testador deveria ter instituído cláusula expressa de incomunicabilidade caso essa fosse sua vontade, o que não ocorreu.

Em que pesem as alegações do Oficial, o que se vê é que a súmula n. 49 do STF prescreve entendimento de que se inclui implicitamente, na cláusula de inalienabilidade de bens prevista por testador ou doador, a incomunicabilidade:

“Súmula 49/STF – A cláusula de inalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens”.

Como bem salientado pela parte requerente e pelo Ministério Público (fls. 02 e 53), o entendimento sumulado do STF é claro e não faz qualquer menção a situações excepcionais.

Ademais, o divórcio ocorrido entre a parte requerente e seu ex-cônjuge deu-se por homologação judicial a acordo havido entre eles, no qual se indicou expressamente a inexistência de patrimônio comum (fls. 12/16), o que corrobora a situação de incomunicabilidade do imóvel recebido por força do testamento.

Não bastasse isso, em ação de inventário negativo movida por herdeira de Benedito (autos n. 1023315-70.2019.8.26.0003), na qual todos os demais herdeiros encontravam-se representados, houve reconhecimento daquele juízo de que “o bem recebido por Lúcia, durante o matrimônio, não se comunicou com o seu então cônjuge, ora inventariado e, portanto, não há que se falar em partilha” (fls. 17/20).

A decisão transitada em julgado amparou-se na vigência da cláusula de inalienabilidade quando da dissolução do matrimônio e, justamente, na súmula n. 49 do STF, que representa o entendimento da matéria assentado naquela Corte.

Como se observa, a análise do testamento e das normas aplicáveis ao caso já ocorreu por ocasião da homologação do divórcio e da sucessão dos bens deixados pelo falecimento de Benedito.

Não incumbe a este juízo, portanto, dentro dos estreitos limites do âmbito administrativo, avaliar ou rever o mérito do julgado, notadamente quando se desconhecem os termos do testamento objeto da controvérsia.

Vale reiterar que o divórcio foi decretado com base em acordo do casal, com reconhecimento de que a disposição de vontade no testamento envolveu tanto a inalienabilidade quanto a incomunicabilidade do imóvel transmitido, e que as regras sucessórias aplicadas em razão do falecimento de Benedito já foram analisadas no âmbito da competência do juízo do inventário, com o devido processo legal, o que deve prevalecer.

Por fim, diante do acima fundamentado, não há qualquer óbice à averbação do óbito do ex-cônjuge da parte requerente na matrícula.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para determinar a averbação do divórcio da parte requerente sem a necessidade da apresentação prévia de mandado judicial declarando que não houve a comunicação do imóvel herdado (fls. 39/40), bem como do óbito de seu ex-cônjuge, Benedito Irineu Ferreira da Luz (fls. 41/42).

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 09 de novembro de 2021.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 11.11.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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