1VRP/SP: Registro de Imóveis. Permuta. Valor venal superior ao valor declarado. Incidência do ITCMD


  
 

Processo 1109321-12.2021.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Giselle Gubernikoff – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, mantendo o óbice registrário. Providencie, a serventia judicial, a retificação do polo passivo. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: SANDRO DANTAS CHIARADIA JACOB (OAB 236205/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo nº: 1109321-12.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 10º Oficial de Registro de Imóveis da capital

Suscitado: Giselle Gubernikoff

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Dublu Participações Ltda., tendo em vista negativa em se proceder ao registro de escritura de permuta entre os imóveis objeto das matrículas n.39.642 daquela serventia e n.246.114 do 18º Registro de Imóveis da Capital.

Informa o Oficial que a negativa foi motivada pela ausência de recolhimento do ITCMD, uma vez que, apesar das partes contratantes atribuírem a ambos os imóveis o valor de R$250.000,00, eles possuem valores venais de referência bastante distintos (R$1.182.440,00 e R$3.294.900,00), de modo que a permuta sem torna ou compensação caracteriza doação e hipótese de incidência do ITCMD (acréscimo patrimonial não oneroso àquele que recebe o bem de maior valor). Documentos vieram às fls. 04/57.

Em manifestação dirigida ao Oficial (fls. 19/26), a parte suscitada defendeu que se trata de operação onerosa, geradora de ITBI, o qual foi devidamente recolhido.

Não houve impugnação, porém, nestes autos (fls. 58/60).

O Ministério Público opinou pela improcedência (fls. 64/66).

É o relatório.

Fundamento e decido.

Primeiramente, é necessária a retificação do cadastro deste feito: embora a senhora Giselle Gubernikoff tenha participado do negócio que se pretende registrar, o requerimento para suscitação da presente dúvida foi apresentado pela outra parte contratante, Dublu Participações Ltda, conforme as razões de inconformismo apresentadas às fls.19/26, bem como procuração de fl.59.

Portanto, o polo passivo deste procedimento deve ser corrigido para constar apenas a pessoa jurídica.

No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.

Verifica-se que, por meio da escritura copiada às fls.27/30, as contratantes Dublu Participações Ltda. e Giselle Gubernikoff permutaram os imóveis objeto das matrículas n.246.114 do 18ºRI e n.39.642 do 10ºRI, atribuindo a ambos o valor de duzentos e cinquenta mil reais, sem estipulação de torna ou qualquer tipo de compensação. Também consta da escritura que houve recolhimento do imposto de transmissão inter-vivos ao município de São Paulo (fls.38/40).

Contudo, com razão o Oficial suscitante ao afirmar que a permuta sem torna ou compensação caracteriza doação em virtude do acréscimo patrimonial não oneroso àquele que recebe o bem de maior valor.

A questão já foi apreciada pelo E. Conselho Superior da Magistratura que firmou entendimento de que a permuta sem torna configura hipótese de incidência do ITCMD.

Nesse sentido:

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna. Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação. Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD. Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias. Óbice mantido. Recurso desprovido” (TJSP; Apelação Cível 1007328-09.2020.8.26.0019; Relator(a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Americana – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/02/2021; Data de Registro: 05/03/2021).

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Escritura pública de permuta de bens imóveis de valores venais distintos, sem torna. Acréscimo patrimonial de forma não onerosa a caracterizar doação. Ausência de comprovação de recolhimento de Imposto de Transmissão causa mortis – ITCMD.

Dever do Oficial de velar pelo seu recolhimento, exigindo a apresentação das respectivas guias. Óbice mantido. Recurso desprovido” (TJSP; Apelação Cível 1007778-97.2020.8.26.0100; Relator(a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 05/06/2020; Data de Registro: 09/06/2020).

No mesmo sentido também já se manifestou a 6ª Câmara de Direito Público (nosso destaque):

“DECADÊNCIA – ITCMD – Não ocorrência – Inteligência do art. 173, inc. I do CTN – Créditos tributários constituídos antes de decorrido o prazo decadencial – Preliminar prejudicial de mérito afastada. APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO – ITCMD – Alegação de que se firmou contrato de permuta sem torna a título oneroso, de forma a não incidir o imposto estadual – Inadmissibilidade – Autuação baseada nas informações prestadas na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física onde foram informadas as transferências de valores a título de doação – Admissibilidade – Doação, todavia, que ocorreu em valor menor ao apurado pela fiscalização – Doação relativa a diferença de valores (venais) entre os imóveis permutados – ITCMD que deve recair sobre esta diferença – Minoração do valor autuado que se impõe – Multa confiscatória – Não observada – Conversão do depósito em renda em favor da Fazenda – Possibilidade após o trânsito em julgado – R. sentença parcialmente reformada – Recursos da autora e da ré parcialmente providos” (TJSP; Apelação Cível 1003390-40.2016.8.26.0053; Relator(a): Silvia Meirelles; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 1ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 27/05/2019; Data de Registro: 31/05/2019).

Para a devida harmonização do recente precedente indicado pela parte suscitada, deve-se observar que aquele caso específico envolveu torna considerável, como registrado na própria ementa:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de permuta de bens imóveis com valores distintos e torna – Negócio jurídico oneroso – ITBI recolhido – Inexistência de fato gerador do ITCMD – Exigência de

comprovação do pagamento do imposto estadual afastada – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida determinando o registro do título” (TJSP; Apelação Cível 1099753-06.2020.8.26.0100; Relator (a): Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 26/08/2021; Data de Registro: 15/09/2021).

Ao analisar referido acórdão, constata-se que o caso envolveu a permuta entre um imóvel cujo valor venal era de R$1.552.647,00 por outro com valor venal de R$307.433,00. Ao primeiro, foi atribuído o valor de R$660.000,00 e, ao segundo, o valor de R$360.000,00, com torna de R$300.000,00. Essa contraprestação pecuniária é que caracterizou a onerosidade do negócio.

Entretanto, na permuta ora analisada não houve contraprestação pecuniária, o que consubstancia acréscimo patrimonial não oneroso à parte suscitada, que recebeu imóvel com valor venal três vezes maior que o do imóvel que entregou no negócio (fls.54/55).

Para os registradores, como se sabe, vigora ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (art. 289 da Lei n. 6.015/73; art.134, VI, do CTN e art. 30, XI, da Lei 8.935/1994).

É certo que a orientação do Egrégio Conselho Superior da Magistratura acerca desta matéria é no sentido de que a fiscalização devida não vai além da aferição sobre a existência ou não do recolhimento do tributo e não se houve pagamento correto, sendo tal atribuição exclusiva do ente fiscal.

Contudo, ressalva-se a hipótese de flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo.

Em que pese a alegação de recolhimento do ITBI, o tributo exigível é outro, o que configura flagrante irregularidade, tornando necessária fiscalização do recolhimento correto à vista da obrigação legal destacada acima.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, mantendo o óbice registrário. Providencie, a serventia judicial, a retificação do polo passivo.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

São Paulo, 19 de novembro de 2021. (DJe de 24.11.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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