2VRP/SP: Tabelionato de Notas. A publicidade como lançada, em tese, ferira as disposições normativas, ao apresentar-se como competição predatória em busca de funcionários, com o chamariz do “salário acima da média do mercado”.


  
 

Processo 0040740-59.2021.8.26.0100

Pedido de Providências – 2ª Vara de Registros Públicos – VISTOS, Trata-se de pedido de providências instaurado por esta Corregedoria Permanente, visando a apuração de irregularidades em publicação de oferta de emprego realizada por Tabelião de Notas da Capital, a qual, eventualmente, violaria dispositivos legais e normativos que vedam a concorrência desleal entre notários. A citada publicidade encontra-se acostada às fls. 02. O Senhor Tabelião prestou detalhados esclarecimentos (fls. 04/06). Sobreveio manifestação pelo Colégio Notarial do Brasil Seção São Paulo (CNBSP), às fls. 10/19. É o breve relatório. Decido. Cuida-se de expediente instaurado por esta Corregedoria Permanente, visando a apuração de irregularidades em publicação de oferta de emprego, em contrariedade à lei e às normas, realizada por Tabelião de Notas da Capital. Constou do referido poster que o Tabelionato ofereceria aos interessados salário acima da média do mercado (fls. 02). Nesse sentido, a publicidade desafiaria em tese o disposto no item 3.1, do Capítulo XVI, das Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça, que veda a concorrência desleal entre os Notários. Com efeito, a redação do item 3.1 é a seguinte: 3.1. A competição entre os Tabeliães de Notas deve ser leal, pautada pelo reconhecimento de seu preparo e de sua capacidade profissional e praticada de forma a não comprometer a dignidade e o prestígio das funções exercidas e das instituições notariais e de registro, sem utilização de publicidade individual, de estratégias mercadológicas de captação de clientela e da intermediação dos serviços e livre de expedientes próprios de uma economia de mercado, como, por exemplo, a redução de emolumentos. Especificamente, o citado dispositivo repudia a “publicidade individual” e “as estratégias mercadológicas de captação de clientela”, bem como qualquer outra atuação com caráter “próprio de uma economia de mercado”. Nesse quadro, o Senhor Tabelião foi instado a se manifestar. De sua parte, o Sr. Delegatário esclareceu que a propaganda foi realizada por profissional terceirizado, contratado para esse fim, de modo que não teve conhecimento e não aprovou o texto tal como redigido e publicado. Declarou, assim, que tão logo teve conhecimento do ocorrido, de modo informal, por meio de notícias repassadas pelos colegas de profissão, tratou de tomar as medidas necessárias à correção do erro e remediação das consequências. Adicionalmente, destacou o i. Titular que providenciou, junto da empresa terceirizada, as devidas orientações, de modo a impedir a ocorrência de situação similar. Com efeito, destacou o Senhor Tabelião que retirou a propaganda das redes sociais da serventia antes mesmo de ter tido conhecimento deste expediente, de modo que a peça publicitária esteve on-line somente por um dia. Adicionalmente, apontou o Sr. Delegatário que tem plena convicção de que a publicidade não afetou negativamente seus colegas, em especial porque não contratou ninguém após o incidente. Noutro turno, o CNB-SP considerou que o incidente foi devidamente solucionado pelo Notário, que não agiu com dolo ou má-fé. Igualmente, destacou o CNB-SP seu entendimento quanto às práticas mercadológicas entre tabeliães: “(…) entende esse colegiado serem necessárias a assunção de medidas que visem coibir a concorrência desleal por meio do aliciamento de funcionários entre os notários e registradores, aconselhando-se que, por ética, os delegatários sejam consultados sempre que o preposto ou ex preposto de uma unidade se candidatar a vaga de emprego em outra unidade.” (fls. 19). Nessa consideração, ressaltou o i. Colegiado a importância de práticas conscientes de contratação de funcionários, especialmente quanto os prepostos oriundos de outras serventias, por ética profissional e respeito à toda a classe. Pois bem. É de conhecimento geral que os delegatários do serviço extrajudicial atuam em regime privado, nos termos do artigo 236 da Constituição Federal. Na mesma senda, dispõe o artigo 21, da Lei 8.935/1994, que incumbe privativamente aos titulares a gerência e administração de seus ofícios. Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestação dos serviços. Desse modo, é certo que o Senhor Tabelião, dentro de sua esfera de atuação, tem o poder de decidir sobre contratações de funcionários, seus salários e demais atividades pertinentes à gerência interna da serventia. Todavia, a legislação de regência também é clara ao afirmar que, pese embora o caráter privado das delegações, sendo um serviço público, o mister deve ser exercido com excepcional atenção às leis e normas que recobrem a matéria, em conformidade ao artigo 30, XIV, e 31, I, do referido diploma legal. Conforme destacado pelo i. Colégio Notarial há tutela do contrato de trabalho em relação ao empregador nos termos do artigo 608 do Código Civil, o qual estabelece: Art. 608. Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos. Nessa perspectiva está presente em nosso ordenamento jurídico a previsão da tutela externa do contrato, enquanto ilícito civil. Desse modo, a violação desse regramento encerra tanto ilícito administrativo como civil, porquanto, sabidamente, no exercício da atividade de tabelião de notas há relevância na construção dos contatos profissionais dos Srs. Escreventes de Notas capitaneados pelo Tabelião Titular. Nessa perspectiva a oferta de ganhos superiores aos valores de mercado, eventualmente, visa o desvio dos serviços de uma unidade a outra, o que somente é cabível em termos de lealdade para fins do aumento dos serviços em decorrência da contratação de novos prepostos. Portanto, a publicidade como lançada, em tese, ferira as disposições normativas, ao apresentar-se como competição predatória em busca de funcionários, com o chamariz do “salário acima da média do mercado”. Não obstante, no caso concreto ora analisado, o Senhor Tabelião logrou êxito em comprovar que não agiu (ou se omitiu) com dolo ou má-fé, certo que ciente dos fatos tomou diversas medidas para corrigi-los em sede própria e junto de seus colegas de profissão. Em especial, destaco que afirmou o i. Titular que a propaganda não ficou por mais de um dia on-line e não fez qualquer contratação após os fatos. No mais, providenciou o Senhor Tabelião a orientação de seus prepostos quanto a oferta de emprego a colaboradores de outras unidades, bem como garantiu que eventuais próximos anúncios de busca de funcionários passarão, antes de ganharem vida, pelo seu crivo. Em razão do contato profissional anteriormente existente, compete afirmar que o referido Sr. Tabelião é profissional culto, honesto e de ímpar saber técnico, o qual, inclusive, já prestou elevado auxílio a esta Corregedoria Permanente na organização de unidades extrajudiciais vagas. Por conseguinte, à luz de todo o narrado, não verifico que houve atuação irregular ou ilícito administrativo pelo Senhor Tabelião, que tão logo consciente da situação, tratou de a corrigir e implementar medidas que visam a evitar sua repetição. Nessa ordem de ideias, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, determino o arquivamento dos autos. Por fim, de forma geral, permito-me consignar aos Senhores Notários que permaneçam atentos e zelosos aos preceitos formadores de sua atividade, de modo a conscientemente promover e respeitar a concorrência saudável e leal entre as partes, sem fins mercadológicos, ante o caráter de serviço público essencial que é prestado por seu ofício. Ciência ao Sr. Tabelião. Remeta-se cópia da presente decisão ao Colégio Notarial do Brasil Seção São Paulo (CNB-SP), por e-mail, servindo a presente como ofício. Publique-se a presente decisão no DJE, ante o interesse geral da matéria à classe extrajudicial e aos usuários do serviço público delegado. Encaminhe-se cópia integral dos autos à E. Corregedoria Geral da Justiça, por email, servindo a presente como ofício. P.I.C. (DJe de 26.11.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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