TJ-PR Divulga resultado final do 3º Concurso

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Fonte: Concurso de Cartório.com.br

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Usucapião Extrajudicial – Herdeiros – Necessidade de apresentação da Escritura Pública Declaratória de Únicos Herdeiros ou de Nomeação de inventariante – Dúvida Procedente.

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1108767-43.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 17º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Suscitado: Leandro Costa Guedes e outro

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida formulada pelo Oficial do 17º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Leandro Costa Guedes e Mariane do Carmo Issimine à vista de exigências feitas em procedimento pelo reconhecimento extrajudicial de usucapião do imóvel objeto da matrícula n.20.770 daquela serventia (prenotação n. 229.804).

O Oficial esclarece que, após a qualificação dos documentos e encaminhamento das notificações, exigiu apresentação das partilhas ou escrituras declaratórias de únicos herdeiros em nome dos titulares do domínio, bem como esclarecimento acerca da origem da posse exercida, uma vez que informações colhidas em diligência revelaram indícios de que a posse foi recebida por sucessão hereditária, de modo que o irmão de Mariane também deveria comparecer ao procedimento como requerente ou anuente, sendo necessário, ainda, avaliar eventual incapacidade desse irmão.

Documentos vieram às fls.09/413 e 418/422.

A parte suscitada se manifestou às fls.423/427, alegando que a exigência pela apresentação das partilhas ou escrituras declaratórias de únicos herdeiros tem por base o precedente judicial do processo de autos n.1000523-45.2020.8.26.0470, o qual não se aplica ao caso concreto, pois o paradigma tratava de pedido de notificação genérica de herdeiros por edital, enquanto, na espécie, foram fornecidos os endereços dos titulares do domínio, com exceção do proprietário Francisco Garagarza; que, em relação a este último, apresentou documentação comprobatória da situação sucessória demonstrando que ele não deixou herdeiros necessários e dispôs da totalidade de seu quinhão em favor de Sérgio Paulo Rogonatti, o que convalida a anuência prestada pelo legatário; que a norma deve ser adaptada ao caso concreto, sob pena de se inviabilizar a opção da usucapião extrajudicial; que a origem da posse já foi esclarecida e que eventuais permissões temporárias de co-habitação de terceiros, parentes ou não, em nada repercutem na legalidade do pleito.

O Ministério Público opinou pela procedência (fls.430/432).

É o relatório.

Fundamento e Decido.

No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.

Por primeiro, é importante consignar que a existência de outras vias de tutela não exclui a da usucapião administrativa, a qual segue rito próprio, com regulação pelo artigo 216-A da Lei n. 6.015/73, pelo Provimento 65/17 do CNJ e pela Seção XII do Cap. XX das NSCGJSP.

Assim, como a parte interessada optou por esta última para alcançar a propriedade do imóvel, a análise deve ser feita dentro de seus requisitos normativos.

Por segundo, vale ressaltar que, em regra geral, no processo extrajudicial de usucapião, não se pode dispensar a notificação de titulares de direitos que não tenham dado prévia anuência à pretensão do interessado usucapiente. Nesse sentido a redação do parágrafo 2º, artigo 216-A, da Lei n.6015/73:

“§ 2° Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes, o titular será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar consentimento expresso em quinze dias, interpretado o silêncio como concordância”.

Excepcionalmente, também é possível considerar outorgado o consentimento mediante apresentação de justo título ou instrumento que demonstre relação jurídica com o titular registral, situação em que, conforme o item 419, Cap.XX, das NSCGJ, a notificação pode ser dispensada.

No caso concreto, entretanto, não foi demonstrada a formalização de relação jurídica com os titulares dos direitos registrados na matrícula, dos quais somente um foi notificado e permaneceu inerte, o que autoriza presumir concordância.

A parte suscitada pretende o reconhecimento de usucapião especial com fundamento no artigo 1.240 do Código Civil, alegando posse há mais de treze anos, a qual recebeu gratuitamente de Guenisi Ysimine e Alice Kikue Ysimine, tios de Mariane.

Conforme esclarecido pelo requerente Leandro (fl.174), os pais de sua esposa, Mariane, residiam no Japão e enviaram dinheiro para que Alice, tia da requerente, adquirisse o imóvel. O negócio foi feito diretamente entre Alice e os titulares do domínio e não há informação sobre a formalização da avença, o que buscam regularizar por meio da usucapião.

O imóvel usucapiendo é o descrito na matrícula n.20.770 do 17º Registro de Imóveis da Capital, cujos direitos reais são de titularidade de Francisco Garagarza, viúvo; Cyrenia da Conceição Rigonatti, casada pelo regime da comunhão de bens com Eliseu Rigonatti, e Alaíde Rodrigues Ferreira, solteira, a qual recebeu a nua-propriedade por doação feita por Maria Antunes, solteira, que reservou o usufruto para si (fls. 408/413).

Para melhor compreensão, convém analisar individualmente a situação de cada um dos titulares de direitos reais envolvidos.

Logo no início do procedimento, a parte suscitada requereu a notificação de Cyrênia, de Eliseu e de Alaíde, informando desconhecer o paradeiro de Francisco Garagarza (fl.11).

Contudo, as certidões inicialmente apresentadas indicaram a existência de ação judicial de abertura, registro e cumprimento de testamento de Francisco (processo de autos n.0815050-74.1993.8.26.0100 – fls.34/35), pelo que se exigiu apresentação de cópias para identificação dos herdeiros a serem notificados (fl.135).

Assim, após o retorno das notificações enviadas (fls.137/157), a parte suscitada informou o falecimento do proprietário Francisco, ocorrido em 27/12/1992, no estado civil de viúvo, o qual deixou como herdeira uma única filha, Cyrennia (fl.162).

Embora Cyrennia tenha sido indicada na certidão de óbito de Francisco como sua filha, na verdade, era filha da falecida esposa de Francisco, Corina Antunes, e de Rouxinol Conceição, o qual não tem relação com o imóvel (fl.163).

Conforme escritura de testamento de Francisco, lavrada em 06 de fevereiro de 1991 e copiada às fls.387/390, ele era viúvo de Corina, não tinha ascendentes nem descendentes e manifestou sua vontade de deixar todos os bens que possuísse por ocasião do falecimento para Sérgio Paulo Rigonatti. Cyrennia, por sua vez, faleceu em 05/10/1994 (fls.163), na condição de viúva de Elizeu, cujo óbito ocorreu em 24/11/1988 (fls.164/165), os quais deixaram três filhos:

Ana Maria Rigonatti; Sérgio Paulo Rigonatti e Arnaldo Rigonatti.

Apenas a nua-proprietária Alaíde Rodrigues Ferreira, que agora se chama Alaíde Ferreira Barbosa, foi notificada na pessoa de sua procuradora, conforme certificado por Tabelião da Comarca do Guarujá (fls.369/382).

Neste ponto, contudo, é deficiente a comprovação da identidade entre a detentora dos direitos reais apontada na matrícula e a pessoa efetivamente notificada.

Verifica-se que, após intimação para indicação do endereço de Alaíde Rodrigues Ferreira (fl.233), a parte suscitada comunicou que uma pesquisa realizada junto ao Serasa Experian, com base no número do CPF, revelou a alteração de nome para Alaíde Ferreira Barbosa (fls.236/239).

Assim, o Oficial a intimou para apresentação da certidão de casamento de Alaíde, a fim de verificar o regime de bens e a necessidade de intimação do cônjuge (fl.248). A parte requerente ofereceu resistência com fundamento na cláusula de incomunicabilidade que grava o quinhão de Alaíde desde a doação (fls.257/258).

A certidão, porém, é imprescindível para comprovação da celebração do casamento e, consequentemente, da alteração do nome dos nubentes, conforme dispõe o artigo 1543 do Código Civil, o qual afasta a possibilidade de demonstração por outro documento.

Observe-se que a certidão juntada à fl.41 informa a existência de ação de divórcio envolvendo Alaíde Rodrigues Ferreira (processo de autos n.0003602-49.1991.8.26.0152), na qual a localização do registro pode ser pesquisada pela parte para a produção de prova adequada.

Da mesma forma, em relação à usufrutuária Maria Antunes, apesar da probabilidade de seu falecimento e extinção do usufruto conforme defendido pela parte suscitada na manifestação de fls.236/238, a localização do registro de óbito pode ser acessado no processo de inventário de autos n.0249266-68.1997.8.26.0004, indicado na certidão de fl.189, e é necessária para o conhecimento de sua exata situação jurídica, que não pode ser presumida.

Portanto, em relação aos titulares de direitos reais indicados na matrícula, basta a apresentação da certidão de casamento de Alaíde para confirmar a alteração de seu nome e sua notificação, bem como a certidão de óbito de Maria Antunes para confirmar a extinção do usufruto.

Os demais proprietários tabulares faleceram sem manifestar concordância com o requerimento.

Já em relação aos herdeiros desses titulares falecidos, o tratamento jurídico é outro.

A anuência deles somente será eficaz se apresentada por escritura pública declaratória de herdeiros únicos, com nomeação de inventariante, não bastando notificação ou eventual consentimento, ainda que expresso.

É o que se extrai do artigo 12 do Provimento CNJ n. 65/17, cuja redação identifica-se integralmente com o contido no item 418.14, Cap. XX, das NSCGJ (destaque nosso):

“418.14. Na hipótese de algum titular de direitos reais e de outros direitos registrados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula do imóvel confinante ter falecido, poderão assinar a planta e memorial descritivo os herdeiros legais, desde que apresentem escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação do inventariante“.

Tal exigência normativa se justifica pela necessidade de se conhecer a exata situação sucessória, confirmando que o consentimento foi legitimamente prestado, como bem explicado no acórdão da Apelação Cível n.1000523-45.2020.8.26.0470, transcrito pelo Oficial na intimação de fls.394/395 e na peça inicial.

Assim, com relação ao coproprietário Francisco Garagarza, é suficiente a apresentação da escritura de testamento de fls.387/390, equivalente àquela exigida pela norma acima citada, pois informa que Francisco não tinha herdeiros necessários e deixou todo o seu patrimônio por ocasião do seu falecimento para Sérgio Paulo Rigonatti, nomeando-o testamenteiro.

O testamenteiro, por sua vez, se apresentou como representante do espólio de Francisco Garagarza e firmou declaração de anuência com o pedido de usucapião (fl.166).

Porém, a situação sucessória dos coproprietários Cyrenia e Elizeu precisa ser comprovada.

Ambos faleceram deixando os filhos Ana Maria Rigonatti, Sérgio Paulo Rigonatti e Arnaldo Rigonatti.

Apesar de Arnaldo se apresentar como representante do espólio de Cyrenia (fl.168), essa condição precisa ser confirmada por documento oficial.

Considerando que não há informação sobre a abertura oficial da sucessão de Cyrenia e Elizeu (fls.37/39), não se pode falar na nomeação de inventariante para a administração da herança, o que deverá ser promovido por meio da escritura pública declaratória de únicos herdeiros, como determina o item 418.14, Cap.XX, das NSCGJ, para que se possa admitir o prosseguimento pela via administrativa.

Note-se, ademais, que, dos três herdeiros de Cyrenia e Elizeu, somente os filhos Sérgio e Arnaldo manifestaram anuência nos autos, bem como suas esposas, inexistindo manifestação ou notificação da filha Ana Maria, o que também prejudica o pedido.

Sérgio Paulo Rigonatti manifestou anuência como testamenteiro à fl.166 e sua esposa, Solange D’Elboux Guimarães Rigonatti, foi notificada acerca do procedimento extrajudicial e anuiu expressamente com o pedido (fls.167, 184/185 e 190/191). Arnaldo Rigonatti, por sua vez, firmou declaração de anuência como representante do espólio de Cyrenia Rigonatti (fl.168) e sua esposa, Ana Maria Furlanetto Rigonatti, foi notificada acerca do procedimento extrajudicial (fls.169, 186/187 e 270/271)

Observe-se que Ana Maria Rigonatti, filha de Elizeu e Cyrennia, que se casou com Gilmar Merejoli em 06/02/1982 e se separou em 03/08/1990, não foi encontrada no endereço fornecido pela parte suscitada (fls.170/171 e 206/229).

Intimada, a parte suscitada pleiteou nova diligência no endereço da esposa do filho Arnaldo, que também se chama Ana Maria (fls.233 e 238) e que já havia sido notificada no mesmo endereço (fl.186).

Portanto, também é necessário notificar a herdeira Ana Maria Rigonatti.

Vale observar, ainda, que a notificação por edital é autorizada em apenas duas hipóteses no procedimento administrativo: para ciência de terceiros eventualmente interessados e para ciência de notificandos que não tenham sido encontrados pessoalmente ou que estejam em lugar incerto ou não sabido (§§ 4º e 13, do artigo 216-A, da Lei n. 6.015/73; artigos 11 e 16 do Prov. CNJ n. 65/17; e itens 418.16 e 418.21, Cap. XX, das NSCGJ):

“418.16. Caso não seja encontrado o notificando ou caso ele esteja em lugar incerto ou não sabido, ou inacessível, tal fato será certificado pelo registrador, que deverá promover a sua notificação por edital mediante publicação, por duas vezes, em jornal local de grande circulação, pelo prazo de quinze dias cada um, interpretado o silêncio do notificando como concordância.

(…)

418.21. Após as notificações dos titulares do domínio do imóvel usucapiendo e dos confrontantes, o oficial de registro de imóveis expedirá edital, que será publicado pelo requerente e às expensas dele, na forma do art. 257, III, do CPC, para ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão manifestar-se nos quinze dias subsequentes ao da publicação…”.

Por fim, também deve ser mantida a exigência pelo esclarecimento acerca da real origem da posse diante dos dados coletados ao longo do procedimento, além de eventual adequação do requerimento.

Consta da certidão de fl.174, lavrada pelo escrevente autorizado:

“CERTIFICO e dou fé que nesta data, me dirigi para a Rua Margarino torres, n.1346, a fim de constatar a posse do imóvel usucapiendo pelos requerentes. No local fui recebido pelo Sr. Leandro Costa Guedes, (…), o próprio requerente que me permitiu a entrada no imóvel usucapiendo. Antes de ter sido recebido pelo requerente, fui atendido por um jovem que apresentava certo grau de deficiência mental que, posteriormente, o Sr. Leandro me informou que se tratava do irmão de sua esposa, a Sra. Mariane do Carmo Issimine, e que, em razão de sua deficiência, não foi incluído no procedimento. Ato contínuo, indaguei o Sr. Leandro como se deu a posse do imóvel pelos requerentes, o qual me informou que antigamente os pais de sua esposa, Mariane do Carmo Issimine, residiam no Japão e, antes de retornarem ao Brasil, deram dinheiro para a Sra. Alice Kikue Ysimine, tia da requerente, adquirir um imóvel no Brasil para moradia para residirem com seus filhos. Todavia, a compra foi feita de entre a tia de sua esposa e os titulares de domínio, situação que pretende se regularizar por meio da usucapião. Outro questionamento levantado foi no tocante as poucas provas documentais acostadas ao procedimento, somente três contas de energia, um Boletim de ocorrência em nome dos requerentes e um contrato de banco, o qual foi esclarecido que antes do falecimento de seu sogro as constas estavam em nome do mesmo”.

Como se vê, a declaração prestada pelo requerente diverge da sua alegação inicial em pontos relevantes, que foram omitidos.

Constata-se que o imóvel foi adquirido com recursos que os pais da requerente enviaram enquanto viviam no Japão e que as contas de consumo, as quais demonstrariam a posse sobre o bem, estavam em nome do sogro do requerente. Um vizinho confirmou que os pais da requerente residiram no local (fl.175).

Evidencia-se, portanto, a hipótese de sucessão hereditária na posse do imóvel, com omissão acerca do falecimento dos reais adquirentes do imóvel e potencial prejuízo de herdeiro aparentemente incapaz, que também reside no local.

Tal contradição com o requerimento formalizado não pode ser ignorada e a falta de esclarecimento deve levar à rejeição do pedido administrativo.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter os óbices registrários.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 17 de novembro de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito

(DJe de 21.11.2022 – SP)

FonteDiário da Justiça Eletrônico

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