CSM/SP: Registro de imóveis – Contrato de locação comercial com cláusula de vigência – Reapresentação do título cujo registro havia sido anteriormente negado – Pedido reformulado com fundamento em recente precedente do Colendo Conselho Superior da Magistratura – Possibilidade de reiteração de dúvida – Preclusão administrativa não configurada – Dúvida suscitada, contudo, sem a prévia qualificação do título – Incumbência do oficial de examinar e qualificar o título que lhe é apresentado para registro e, caso o considere inapto para tanto, é seu dever indicar em nota devolutiva as razões da recusa – Nulidade configurada – Apelação provida, com determinação.


  
 

Apelação nº 1001005-87.2020.8.26.0568

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1001005-87.2020.8.26.0568
Comarca: SÃO JOÃO DA BOA VISTA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1001005-87.2020.8.26.0568

Registro: 2024.0000895595

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001005-87.2020.8.26.0568, da Comarca de São João da Boa Vista, em que é apelante STONE PERFORMANCE BRASIL INDÚSTRIA DE ROCHAS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO JOÃO DA BOA VISTA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação e anularam o procedimento de dúvida ab initio, com observação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 19 de setembro de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1001005-87.2020.8.26.0568

APELANTE: S. P. B. I. de R. LTDA

APELADO: O. de R. de I. e A. da C. de S. J. da B. V.

VOTO Nº 43.573

Registro de imóveis – Contrato de locação comercial com cláusula de vigência – Reapresentação do título cujo registro havia sido anteriormente negado – Pedido reformulado com fundamento em recente precedente do Colendo Conselho Superior da Magistratura – Possibilidade de reiteração de dúvida – Preclusão administrativa não configurada – Dúvida suscitada, contudo, sem a prévia qualificação do título – Incumbência do oficial de examinar e qualificar o título que lhe é apresentado para registro e, caso o considere inapto para tanto, é seu dever indicar em nota devolutiva as razões da recusa – Nulidade configurada – Apelação provida, com determinação.

Trata-se de apelação interposta por Stone Performance Brasil Indústria de Rochas Ltda. contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de São João da Boa Vista/SP, que julgou extinto o processo, nos termos do art. 485, inciso V e § 3º, do Código de Processo Civil, pela ocorrência da coisa julgada (fls. 136/137).

Sustenta a apelante, em síntese, a inexistência de coisa julgada material, por se tratar a dúvida de procedimento administrativo que pode ser reiterado a pedido do interessado sempre que houver novo entendimento sobre a matéria ou alteração da situação fática. Entende que a ausência de nova qualificação do título pelo Oficial e consequente omissão na expedição, se o caso, de nota devolutiva, levou o MM. Juiz Corregedor Permanente à incorreta compreensão do caso concreto.

Ainda, afirma que não há necessidade de comparecimento dos demais proprietários no título, bastando a coincidência entre o nome de um dos proprietários do bem locado, devidamente qualificado, e o locador, pois no contrato de locação foi consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada (art. 167, inciso I, 3) (fls. 169/178).

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 255/256 e 277). Nos termos da r. decisão (fls. 261), os autos foram redistribuídos a este Colendo Conselho Superior da Magistratura.

É o relatório.

Desde logo, relevante consignar que a recusa de registro do título foi objeto de anterior suscitação de dúvida, julgada procedente pela Corregedoria Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de São João da Boa Vista/SP (Processo nº 1001003-54.2019.8.26.0568, fls. 229/232).

A apelação interposta contra referida decisão não foi conhecida por este Colendo Conselho Superior da Magistratura (fls. 249/251).

Reapresentado o título, o Oficial, informando que a interessada apresentou novos argumentos, protocolou o pedido de registro (prenotação nº 243.580, de 6 de fevereiro de 2020) e, sem requalificar o título, suscitou a presente dúvida.

Como é sabido, incumbe ao Oficial examinar e qualificar o título que lhe é apresentado para registro e, caso o considere inapto para tanto, é seu dever indicar em nota de devolução as razões da recusa, conforme dispõe o art. 198 da Lei nº 6.015/1973.

No caso em tela, afirma o registrador que não houve alteração do título anteriormente qualificado na Nota de Devolução nº 238.291 (fls. 227/228) e que, em verdade, a apresentante do título, ora apelante, apenas alterou os fundamentos jurídicos de sua impugnação aos óbices anteriormente apresentados (fls. 01/05, in fine).

Ora, não há vedação para a reapresentação de título que já teve o registro negado, tampouco para, mantida a qualificação negativa, ser reiterado o pedido de suscitação de dúvida, embora sob diverso fundamento fático ou jurídico. É possível a revisão administrativa das decisões anteriormente lançadas, desde que haja fato novo ou alteração na orientação jurisprudencial acerca da matéria discutida.

Por conseguinte, não há que se falar, no caso concreto, em preclusão ou coisa julgada administrativa.

Ocorre que, uma vez renovada a prenotação do título, caberia ao registrador requalificá-lo e, na hipótese de persistirem os óbices ou outros surgirem, expedir nota de devolução atualizada e devidamente fundamentada, como dispõe o item 287, do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

A qualificação registral é ato próprio do registrador, que deve analisar o título com base em seus saberes jurídicos e técnicos.

Trata-se de atribuição fundamental e indissociável da atividade do Oficial de Registros, de natureza obrigatória, inafastável e vinculada ao princípio da legalidade, que traduz o controle dos requisitos legais e normativos do documento apresentado, em juízo prudencial (DIP, Ricardo. Registro de Imóveis: vários estudos. Porto Alegre: IRIB: Sérgio Antonio Fabris; Ed., 2005. p. 168).

Para obtenção da segurança jurídica que se espera dos registros públicos, não basta que o registrador impeça o acesso de títulos inaptos. Há que possibilitar a correção dos títulos viciados, expedindo nota devolutiva clara, explicativa e conclusiva.

Em outras palavras, a qualificação deve abranger completamente a situação examinada, em todos os aspectos relevantes para ingresso do título no fólio real ou seu indeferimento, permitindo a certeza de sua aptidão registrária, ou a indicação integral das deficiências para a inscrição perseguida, lembrando-se, por oportuno, que o procedimento de dúvida é limitado à análise da insurgência do apresentante com as exigências formuladas para o registro do título, como disposto no art. 198 da Lei nº 6.015/73.

In casu, o registrador, ao suscitar a presente dúvida, deixou de qualificar o título segundo a inscrição que lhe foi rogada e o título protocolado. Em verdade, fez referência ao procedimento de dúvida anteriormente julgado, deixando, porém, de esclarecer qual seria a exigência específica para registro do título agora prenotado, à luz dos novos argumentos e do recente precedente que lhe foram apresentados.

Ao Oficial de Registro de Imóveis não é possível substituir a qualificação dos títulos que lhe são apresentados para registro mediante questionamento ao Juiz Corregedor Permanente quanto à admissibilidade da prática de ato de registro considerado em seu sentido estrito ou mesmo ao modo como deve fazê-lo. Não se enfeixa no âmbito das funções administrativo judiciais da Corregedoria Permanente das Serventias Extrajudiciais e da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo “o múnus de responder a consultas de caráter genérico, sequer o de, preventivamente, qualificar atos específicos, julgando de sua subsunção a determinada hipótese normativa, a cujo propósito dúvida possua serventuário incumbido de sua realização.” (CGJSP Processo nº 81.013/87).

Na forma como suscitada a dúvida, ou seja, com mera referência à dúvida anteriormente suscita (Processo nº 1001003-54.2019.8.26.0568) e sem requalificação do título a partir dos novos fundamentos jurídicos apresentados pela ora apelante e do precedente por ela referido, o presente procedimento administrativo acabou por suprimir a qualificação que deveria ser realizada pelo registrador e adquiriu um caráter consultivo, o que não se admite.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação e anulo o procedimento de dúvida ab initio, a fim de que o Oficial de Registro de Imóveis promova a qualificação do título, tal como protocolado, à luz dos novos fundamentos jurídicos formulados pela apresentante e da atual jurisprudência deste C. Conselho Superior da Magistratura, e formule as exigências que eventualmente entender cabíveis, prosseguindo, se o caso, na forma do art. 198 da Lei nº 6.015/1973.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 25.09.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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