MP-SP/PGJ: RESOLUÇÃO Nº 1.919/2024-PGJ, de 18 de setembro de 2024. (SIS 0739.0034717/2024)

RESOLUÇÃO 1.919/2024-PGJ, de 18 de setembro de 2024. (SIS 0739.0034717/2024)

Dispõe sobre a manifestação do Ministério Público em escrituras públicas de inventário e partilha extrajudiciais com menores ou incapazes.

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições conferidas pela Lei Complementar Estadual nº 734/1993:

CONSIDERANDO a edição da Resolução nº 571, de 26 de agosto de 2024, do Conselho Nacional de Justiça, que alterou a Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do mesmo colegiado, que disciplina a lavratura dos atos notariais relacionados a inventário, partilha, separação consensual, divórcio consensual e extinção consensual de união estável por via administrativa, introduzindo o artigo 12-A;

CONSIDERANDO que o referido artigo 12-A, da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, estabelece que o inventário que inclua interessado menor ou incapaz, poderá ser realizado por escritura pública, desde que o pagamento do seu quinhão hereditário ou de sua meação ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados e haja manifestação favorável do Ministério Público, devendo o Tabelião de Notas encaminhar o expediente ao respectivo Promotor de Justiça;

CONSIDERANDO que o referido art. 12-A da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, estabelece que em caso de impugnação pelo Ministério Público ou terceiro interessado, o procedimento deverá ser submetido à apreciação do juízo competente;

CONSIDERANDO a necessidade de definir a forma pela qual se dará a manifestação do Ministério Público no inventário extrajudicial, com o objetivo de

garantiraceleridadedesseprocessoefomentaradesjudicialização;editaa seguinteRESOLUÇÃO:

Art. . A manifestação do Promotor de Justiça, nas escrituras públicas de inventário e partilha extrajudiciais que incluam herdeiros menores ou incapazes, nos termos do art. 12-A da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, será feita por meio eletrônico, nos termos desta Resolução.

Art. 2º. O Ministério Público disponibilizará meio eletrônico oficial para o trâmite de escrituras públicas de inventário e partilha extrajudiciais que incluam herdeiros menores ou incapazes.

Art. 3°. O Tabelião de Notas encaminhará a respectiva minuta com todos os documentos exclusivamente por meio eletrônico oficial ao Ministério Público do Estado de São Paulo, informando a comarca do foro do domicílio do autor da herança, ou do foro estabelecido no parágrafo único do art. 48 do Código de Processo Civil, caso o autor da herança não possua domicílio certo, conforme modelo anexo.

§ 1º. O Tabelião de Notas deverá certificar que não houve discordância anterior de qualquer membro do Ministério Público quanto à lavratura da escritura extrajudicial.

§ . A minuta deverá ser acompanhada da documentação exigida pelo Código de Processo Civil, pela Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, e pela legislação vigente para o trâmite do processo sucessório, sob pena de indeferimento liminar.

§ . A minuta deverá fazer menção aos documentos apresentados.

§ . Nos termos do § 1º do art. 12-A da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, é vedada a alienação de bens de que trata seu art. 11.

Art. . Ao receber a minuta, o Ministério Público instaurará procedimento eletrônico, que será encaminhado ao Promotor de Justiça com atribuição para atuar nos processos e procedimentos de sucessões da comarca mencionada no artigo anterior.

§ . Na Capital, nos casos em que houver registro e cumprimento de testamentos e codicilos, a atribuição será do Promotor de Justiça de sucessões do Foro Central, nos termos do art. 4º, III, “a” da Lei estadual n. 3.947/83.

§ . Instaurado o procedimento eletrônico, o Ministério Público informará o Tabelião de Notas o número de registro e lhe fornecerá acesso externo.

Art. . O Promotor de Justiça deverá analisar a minuta e lançar sua manifestação no procedimento eletrônico, no prazo de até 15 (quinze) dias, a contar de seu recebimento.

Art. . Havendo necessidade de ajuste, esclarecimento ou diligência, o Promotor deverá determiná-lo no procedimento eletrônico, no prazo mencionado no artigo anterior.

§ 1º. O Tabelião de Notas deverá atender o ajuste, o esclarecimento ou a diligência, quando possível, no prazo de até 15 (quinze) dias.

§ 2º. O Promotor de Justiça, ao receber vista do procedimento, com as informações prestadas, deverá lançar sua manifestação no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. . No caso de manifestação favorável do Ministério Público, o Tabelião de Notas deverá anotá-la na escritura pública, fazendo constar o nome e o cargo do Promotor de Justiça competente, o número do procedimento no MPSP e a data da manifestação, arquivando-a nos termos do disposto pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Parágrafo único. Após a lavratura da escritura pública, o Tabelião de Notas deverá enviar seu traslado ao Ministério Público, no mesmo procedimento eletrônico, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, para controle.

Art. . Caso a manifestação do Ministério Público seja desfavorável, o Tabelião de Notas deverá emitir certidão com anotação da discordância do Promotor de Justiça, encaminhando o procedimento à apreciação judicial.

§ 1º. A certidão acima referida deverá ser instruída com cópia da manifestação do Ministério Público.

§ . O Promotor de Justiça poderá se opor à minuta de escritura se, dentre outras hipóteses:

  1. –não houver o pagamento do quinhão hereditário ou da meação do menor ou incapaz em parte ideal em cada um dos bens inventariados;

  2. – houver fundados indícios de fraude, simulação ou dúvida sobre a declaração de vontade do herdeiro menor ou incapaz;

  3. – houver prejuízo ou lesão injustificados aos direitos ou interesses juridicamente protegidos do herdeiro menor ou incapaz.

§ . Sobrevindo autorização judicial, o Tabelião fará nova anotação ao final a escritura e emitirá certidão com menção à decisão judicial.

Art. 9º. Lavrada a escritura nos termos do art. 8º desta Resolução, o Tabelião de Notas deverá remeter seu traslado ao membro do Ministério Público, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sem prejuízo do Tabelião de Notas encaminhar o expediente ao respectivo representante do menor ou incapaz herdeiro ou sucessor, nos termos do § 3º do art. 12-A da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça.

Art. 10. Em caso de prévia existência de inventário ou partilha judicial com posterior desistência das partes, a fim de promovê-los na forma extrajudicial, a

minuta deverá ser apresentada ao Promotor de Justiça que naqueles oficiou em juízo.

Art. 11. Os sistemas digitais referidos nesta Resolução serão indicados em aviso expedido pelo Procurador-Geral de Justiça.

Art. 12. Aplicam-se as disposições desta Resolução:

  1. à sobrepartilha, inclusive decorrente de inventário ou partilhas judiciais, no que couber;

  2. – às verbas previstas na Lei nº 6.858, de 24 de novembro de 1980;

  1. – ao reconhecimento da meação do convivente, observado o disposto no art. 19 da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça.

Art. 13. Havendo um só herdeiro com direito à totalidade da herança, e sendo este menor ou incapaz, observar-se-á o disposto no art. 26 da Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça.

Art. 14. O Centro de Apoio Operacional disponibilizará modelos de manifestação nos termos dessa Resolução.

Art. 15. O Procurador-Geral de Justiça resolverá os conflitos de atribuição e as recusas de intervenção a respeito da matéria.

Art. 16. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, produzindo seus efeitos em 30 (trinta) dias.

São Paulo, 18 de setembro de 2024.

Paulo Sérgio de Oliveira e Costa
Procurador-Geral de Justiça

Fonte: MP-SP/PGJ.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura pública de compra e venda – Titular de domínio casada sob o regime da separação obrigatória de bens – Alienação de imóvel com natureza de bem próprio, havido por sucessão hereditária – Bem particular – Desnecessidade de outorga uxória ou suprimento judicial – Inteligência do art. 1647, caput, do Código Civil à luz da interpretação contemporânea do STJ sobre a aplicação da súmula 377 do STF – Necessidade de prova do esforço comum atualmente exigida pelo STJ que faz dispensar a outorga uxória para venda de bem manifestamente particular, em razão de sua origem com fundamento em sucessão hereditária – Óbice afastado – Apelação provida.

Apelação nº 1000094-56.2023.8.26.0120

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1000094-56.2023.8.26.0120
Comarca: CÂNDIDO MOTA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1000094-56.2023.8.26.0120

Registro: 2024.0000868079

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000094-56.2023.8.26.0120, da Comarca de Cândido Mota, em que é apelante ABÍLIO PASSARELLI, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE CÂNDIDO MOTA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 12 de setembro de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1000094-56.2023.8.26.0120

APELANTE: Abílio Passarelli

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Cândido Mota

VOTO Nº 43.500

Registro de imóveis – Escritura pública de compra e venda – Titular de domínio casada sob o regime da separação obrigatória de bens – Alienação de imóvel com natureza de bem próprio, havido por sucessão hereditária – Bem particular – Desnecessidade de outorga uxória ou suprimento judicial – Inteligência do art. 1647, caput, do Código Civil à luz da interpretação contemporânea do STJ sobre a aplicação da súmula 377 do STF – Necessidade de prova do esforço comum atualmente exigida pelo STJ que faz dispensar a outorga uxória para venda de bem manifestamente particular, em razão de sua origem com fundamento em sucessão hereditária – Óbice afastado – Apelação provida.

Trata-se de apelação interposta por Abílio Passarelli contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Cândido Mota/SP, que manteve a recusa de registro da escritura de venda e compra, tendo por objeto a parte ideal correspondente a 9,72222222221% do imóvel matriculado sob nº 11.856 junto à referida serventia extrajudicial (fls. 76/79).

Sustenta o apelante, em síntese, que a vendedora era casada sob o regime da separação obrigatória de bens quando adquiriu o imóvel a título de herança, em virtude do falecimento de seus pais.

Assim, afirma que se trata de bem particular, o que dispensa a outorga uxória exigida pelo registrador. Ressalta, ainda, que segundo a atual interpretação jurisprudencial dada à Súmula 377 do E. STF, apenas na hipótese de comprovação do esforço comum na aquisição dos bens é que estes deverão ser partilhados (fls. 122/132).

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 146/150).

É o relatório.

A escritura pública de venda e compra, tendo por objeto a fração ideal correspondente a 9,72222222221% do imóvel matriculado sob nº 11.856 junto ao Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Cândido Mota/SP (fls. 21/24) foi qualificada negativamente pelo registrador, que expediu nota de devolução nos seguintes termos (fls. 10/11):

1. (…) verifica-se que a senhora MARIA PASSARELLI SILVA, casada sob o regime da separação obrigatória de bens, antes da vigência da Lei nº 6.515/1977, com o senhor ANTONIO SILVA, houve uma parte ideal correspondente a 9,72222222221% do imóvel, a título de herança, em decorrência do falecimento de seus pais.

2. Porém, da leitura do traslado da escritura pública de venda e compra ora apresentado a registro, não é possível inferir que o cônjuge da vendedora (…) tenha efetivamente anuído/consentido com a alienação instrumentalizada.

2.1. Com efeito, a Certidão de Casamento dos sobreditos ANTONIO SILVA e MARIA PASSARELLI SILVA, cuja cópia autenticada acompanhou o título, atesta que os mesmos contraíram matrimônio em data de 15.07.1970, sob o regime da separação (legal/obrigatória) de bens (art. 258, parágrafo único, inciso IV, do CC/1916).

3. Logo, permissa vênia, diante do acima constatado, faz-se necessário que o cônjuge da vendedora, o senhor Antonio Silva, dê expressa e formal anuência/consentimento à alienação retratada na predita escritura, ou o suprimento judicial dessa concordância, de modo a aperfeiçoar o negócio jurídico instrumentalizado, eis que a eventual incomunicabilidade da sobredita fração ideal do imóvel não possibilita a sua alienação por um dos cônjuges sem a devida outorga conjugal, salvo superior entendimento.

3.1. Neste caso concreto, a exigência de outorga conjugal decorre do texto legal do art. 1.647, inciso I, do Código Civil. (…)“.

No título (fls. 21/24), Maria Passarelli Silva, casada sob o regime da separação obrigatória de bens, consta como outorgante vendedora da fração ideal correspondente a 9,72222222221% do imóvel matriculado sob nº 11.856 junto ao Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Cândido Mota/SP. A certidão imobiliária (fls. 37/48) e a certidão de casamento (fls. 33/34) confirmam que o imóvel é de titularidade exclusiva de Maria Passarelli Silva, que o adquiriu por herança, em virtude do falecimento de seus pais, na constância do casamento sob o regime da separação obrigatória de bens.

Incontroverso que se cuida de imóvel particular, pois havido a título gratuito por força de sucessão hereditária pela ora vendedora.,

Resta analisar a necessidade de outorga uxória para venda de imóvel manifestamente particular, adquirido por sucessão hereditária, por vendedora casada sob o regime da separação obrigatória de bens. .

Toda a celeuma repousa, em última análise, nos efeitos da vetusta Súmula 377 do E. Supremo Tribunal Federal, do seguinte teor: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.

Tenho pessoalmente sérias dúvidas sobre a incidência da referida Súmula 377 na vigência do atual Código Civil. Isso porque desapareceu a razão de ser de referida súmula, qual seja, o art. 259 do Código Civil de 1.916, segundo o qual, no silêncio do pacto antenupcial, havia a comunicação dos aquestos. O atual Código Civil não contém dispositivo semelhante.

De qualquer modo, o mais recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito da interpretação da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal foi fixado nos Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.171.820/PR, Rel. o Min. Raul Araújo, julgado em 26/08/2015, com a seguinte ementa:

“(…)

1. Nos moldes do art. 258, II, do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos (matéria atualmente regida pelo art. 1.641, II, do Código Civil de 2002), à união estável de sexagenário, se homem, ou cinquentenária, se mulher, impõe-se o regime da separação obrigatória de bens.

2. Nessa hipótese, apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, e desde que comprovado o esforço comum na sua aquisição, devem ser objeto de partilha.

(…)”. (grifo nosso).

Do corpo do v. acórdão consta a seguinte passagem, que resume com precisão a controvérsia e a exata interpretação do alcance da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça:

Cabe definir, então, se a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento ou da união depende ou não da comprovação do esforço comum, ou seja, se esse esforço deve ser presumido ou precisa ser comprovado. Noutro giro, se a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço comum, ou se é a regra.

Tem-se, assim, que a adoção da compreensão de que o esforço comum deve ser presumido (por ser a regra) conduz à ineficácia do regime da separação obrigatória (ou legal) de bens, pois, para afastar a presunção, deverá o interessado fazer prova negativa, comprovar que o ex-cônjuge ou ex-companheiro em nada contribuiu para a aquisição onerosa de determinado bem, conquanto tenha sido a coisa adquirida na constância da união. Torna, portanto, praticamente impossível a separação dos aquestos.

Por sua vez, o entendimento de que a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço comum, parece mais consentânea com o sistema legal de regime de bens do casamento, recentemente confirmado no Código Civil de 2002, pois prestigia a eficácia do regime de separação legal de bens. Caberá ao interessado comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a dissolução da união (prova positiva).

No mesmo sentido, diversos precedentes recentes da Corte Superior: EREsp 1623858/MG, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018; REsp 1689152/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 22/11/2017.

Do exposto, conclui-se que no regime da separação obrigatória apenas os bens adquiridos na constância do casamento a título oneroso e mediante esforço comum se comunicam.

Em outras palavras, inexistindo prova do esforço comum do casal, não há que se falar em fato jurídico capaz de amparar divisão de bens entre os cônjuges e, nessa hipótese, é de se reconhecer a ausência de interesse jurídico no eventual direito à meação. Nesse sentido, o entendimento de Francisco José Cahali:

(…) Isto porque o novel legislador deixou de reproduzir a regra contida no malfadado artigo 259 (CC/1916).

Desta forma, superada está a Súmula n° 377, desaparecendo a incidência de seu comando no novo regramento. Sabida a nossa antipatia à Súmula, aplaudimos o novo sistema. E assim, não mais se admite a prevalência dos princípios da comunhão parcial quanto aos bens adquiridos na constância do casamento pelo regime de separação obrigatória (separação legal). A separação obrigatória passa a ser, então, um regime de efetiva separação de bens, e não mais um regime de comunhão simples (pois admitida a meação sobre os aquestos), como alhures. A exceção deve ser feita, exclusivamente, se comprovado o esforço comum dos cônjuges para a aquisição de bens, decorrendo daí uma sociedade de fato sobre o patrimônio incrementado em nome de apenas um dos consortes, justificando, desta forma, a respectiva partilha quando da dissolução do casamento. Mas a comunhão pura e simples, por presunção de participação sobre os bens adquiridos a título oneroso, como se faz no regime legal de comunhão parcial, e até então estendida aos demais regimes, deixa de encontrar fundamento na lei. (…)”. (CAHALI, Francisco José. A súmula n° 377 e o novo código civil e a mutabilidade do regime de bens.in: Revista do Advogado. n° 75, abril. 2004, p. 29).

O caso concreto é ainda mais caro. Não se cogita nem em tese da existência de bem comum. Isso porque, novamente se repete, a aquisição se deu pela ora vendedora e título gratuito, por força de sucessão hereditária.

Incontroversa , no caso concreto, a incomunicabilidade do imóvel e a impossibilidade de direito à meação pelo cônjuge, pois o bem foi adquirido a título gratuito por sucessão hereditária e não é produto do esforço comum do casal, não há que se falar em necessidade de outorga uxória para sua venda.

E assim é porque a norma trazida pelo o art. 1.647, caput, do Código Civil, que dispensa a outorga uxória para a venda de bens imóveis por um dos cônjuges, quando casados no regime da separação absoluta, deve ser interpretada de maneira funcional e sistemática, alcançando não apenas o regime da separação convencional, mas, igualmente, o regime da separação legal ou obrigatória.

O regime da separação absoluta de bens pode ser legal (art. 1.641 CC) ou convencional (art. 1.687 CC). Não há na lei referência a que o termo “absoluta” se restrinja à separação convencional.

No caso concreto existe separação legal absoluta de bens. Nem em tese se cogita da incidência da Súmula 377, pois incompatível a interpretação da existência de esforço comum, como hoje exige o STJ, em situações de aquisições a título gratuito – ucessão hereditária.

Não faria o menor sentido exigir outorga uxória para a venda de imóvel particular, se a vendedora se casou sob o regime da separação absoluta e legal de bens.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 18.09.2024 – SP).

Fonte: DJE/SP.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Desapropriação de imóvel rural – Carta de adjudicação qualificada negativamente – Dúvida procedente – Exigências consistentes na descrição georreferenciada do imóvel desapropriado, com certificação pelo INCRA, e na comprovação de que esse imóvel foi inscrito no SICAR/CAR – Imóvel desapropriado que não será utilizado para exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial, uma vez que destinado à instalação de praça de pedágio, o que afasta a submissão do registro aos requisitos previstos para o desmembramento rural – Exigências afastadas – Apelação a que se dá provimento para julgar a dúvida improcedente

Apelação nº 1000055-30.2023.8.26.0453

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1000055-30.2023.8.26.0453
Comarca: PIRAJUÍ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1000055-30.2023.8.26.0453

Registro: 2024.0000868083

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000055-30.2023.8.26.0453, da Comarca de Pirajuí, em que é apelante ENTREVIAS CONCESSIONARIA DE RODOVIA S/A, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PIRAJUÍ.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação e afastaram a recusa do registro do título, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 12 de setembro de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1000055-30.2023.8.26.0453

Apelante: Entrevias Concessionaria de Rodovia S/A

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Pirajuí

VOTO Nº 43.547

Registro de Imóveis – Desapropriação de imóvel rural – Carta de adjudicação qualificada negativamente – Dúvida procedente – Exigências consistentes na descrição georreferenciada do imóvel desapropriado, com certificação pelo INCRA, e na comprovação de que esse imóvel foi inscrito no SICAR/CAR – Imóvel desapropriado que não será utilizado para exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial, uma vez que destinado à instalação de praça de pedágio, o que afasta a submissão do registro aos requisitos previstos para o desmembramento rural – Exigências afastadas – Apelação a que se dá provimento para julgar a dúvida improcedente.

Trata-se de apelação interposta por Entrevias Concessionária de Rodovia S.A., contra a r. sentença de fls. 227/231, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Registro de Imóveis e Anexos de Pirajuí, que manteve a negativa de registro da carta de adjudicação extraída dos autos nº 1000491-57.2021.8.26.0453, da 2ª Vara de Pirajuí, cujo objeto é a área destacada do imóvel rural matriculado sob o nº 22.834 daquela serventia.

Em preliminar, alega a apelante que o juízo não atendeu seu pedido de expedição de ofício ao INCRA para esclarecimentos dos procedimentos a serem adotados para a regularização da área declarada de utilidade pública e atualização cadastral da área remanescente junto ao Sistema Nacional de Cadastro Rural, o que configuraria cerceamento de defesa. No mérito, afirma que a destinação da área desapropriada tem por finalidade “obra de extensão de via pública”, de modo que a faixa destacada do imóvel não é mais rural, não sendo possível a apresentação do georreferenciamento certificado pelo INCRA; que a desapropriação é forma originária de aquisição, não se submetendo às exigências feitas ao registro do desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóvel rural; que a exigência de apresentação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) já foi cumprida, conforme cópia do demonstrativo juntado a fls. 52 e da matrícula nº 22.834 (fls. 154). Ao final, requer, em preliminar, seja declarada a nulidade da sentença. Subsidiariamente, pede a reforma do julgado para determinar o registro do título (fls. 239/251).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 363/365).

É o relatório.

De início, afasto a preliminar de cerceamento de defesa.

Embora o art. 201 da Lei nº 6.015/73 prescreva que a dúvida será julgada apenas se não forem requeridas diligências, é inegável que o Juiz Corregedor Permanente pode indeferir esse tipo de pleito se considerá-lo desnecessário para o deslinde da causa. E foi exatamente o que fez o MM. Juiz Corregedor Permanente: por meio de decisão devidamente fundamentada, ressaltou que o ofício solicitado já havia sido expedido anteriormente e que o procedimento de dúvida não é o meio adequado para obtenção de informação junto ao INCRA (fls. 229).

No mérito, cuida-se de registro de carta de adjudicação extraída do processo nº 1000491-57.2021.8.26.0453, em que homologada transação extrajudicial envolvendo a ora apelante e Jib Agropecuária Ltda.

Consoante a suscitação da dúvida (fls. 1/5), o registro da carta de adjudicação relativa a uma área de 8.324,57m² foi obstado por dois motivos distintos.

O primeiro diz respeito aos trabalhos técnicos de engenharia (planta e memorial descritivo) que acompanharam a carta.

Sustenta o Oficial que esses documentos não foram desenvolvidos pelo sistema de georreferenciamento com situação posicional certificada pelo INCRA (SIGEF).

O segundo se refere à ausência de inscrição da área destacada junto ao Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR/CAR).

As exigências devem ser afastadas, conforme entendimento adotado por este Conselho no julgamento das apelações nº 1020918-18.2020.8.26.0451 (j. em 7/5/2024) e 1000700-71.2023.8.26.0189 (j. em 29/5/2024).

A desapropriação de parcela do imóvel para destinação como rodovia comporta a análise sob enfoque específico, por se tratar de via de circulação destinada ao uso comum do povo (art. 99, I, do Código Civil).

No caso concreto, a desapropriação recaiu sobre área de 8.324,57m², a ser desfalcada do imóvel objeto da matrícula nº 22.834 do Registro de Imóveis e Anexos de Pirajuí, destinada à implantação de praça de pedágio (fls. 28).

Nas hipóteses de desapropriação para implantação de rodovia ou instituição de servidão pública, a destinação para atividade distinta da rural afasta a exigência de observação dos requisitos que incidiriam se a área desapropriada continuasse sendo utilizada, pela expropriante, para exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial.

Isso porque a destinação do imóvel não se confunde com a espécie de zona em que situado (rural, urbana, urbanizável, de urbanização específica e de interesse urbanístico especial), podendo existir imóvel com destinação rural em área urbana, ou situação contrária.

Por sua vez, não se ignora a existência de diferentes critérios para a qualificação de imóvel como urbano ou rural, prevendo o Código Tributário Nacional, em seus arts. 29 e 32, que o imóvel é urbano quando situado em zona urbana e rural quando situado em zona rural.

Porém, outras normas, como os arts. 8º e 9º do Decretolei nº 57/1966, que dispõe sobre o Imposto Territorial Rural (ITR), e o art. 2º da Lei nº 5.868/1972, que criou o Sistema Nacional de Cadastro Rural, adotam o critério da destinação para a identificação do imóvel como sendo rural.

O critério da destinação também foi previsto na Lei nº 4.504/1964 (Estatuto da Terra) que, em seu art. 4º, I, define como imóvel rural “o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada”.

Ainda, o art. 64, II, da Lei nº 4.504/1964 dispõe que são urbanos os lotes que forem implantados em razão de colonização “quando se destinem a constituir o centro da comunidade, incluindo as residências dos trabalhadores dos vários serviços implantados no núcleo ou distritos, eventualmente às dos próprios parceleiros, e as instalações necessárias à localização dos serviços administrativos assistenciais, bem como das atividades cooperativas, comerciais, artesanais e industriais”.

O critério da destinação, ademais, é previsto no art. 6º da Instrução Normativa Incra nº 82/2015, que se encontra vigente:

Imóvel rural é a extensão contínua de terras com destinação (efetiva ou potencial) agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, localizada em zona rural ou perímetro urbano[1].

A adoção desse critério consta no sítio de internet mantido pelo Incra, em página destinada ao esclarecimento de dúvidas:

O que é imóvel rural? Imóvel rural, segundo a legislação agrária, é a área formada por uma ou mais matrículas de terras contínuas, do mesmo titular (proprietário ou posseiro), localizada tanto na zona rural quanto urbana do município. O que caracteriza é a sua destinação agrícola, pecuária, extrativista vegetal, florestal ou agroindustrial [2]“. José Afonso da Silva, sobre a definição do imóvel como urbano ou rural, considera que deve prevalecer o critério da destinação, como a seguir se verifica:

A teoria da vocação urbanística ou da destinação do solo, e não sua localização ou situação, é que orienta a definição da sua qualificação. É que a localização dos terrenos consiste numa delimitação da área à vista, precisamente, da sua vocação ou destinação urbanística; ao contrário, portanto, da qualificação da propriedade urbana, já que será tal justamente porque situada, localizada, em solo qualificado como urbano.

Com base no critério da vocação, a primeira qualificação do solo permite a distinção do território municipal em zona rural e zona urbana. Além disso, o Código Tributário Nacional admite considerar como urbanas áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana” (Direito urbanístico brasileiro. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 172).

A destinação dada ao imóvel é, com efeito, a adequada para a sua qualificação como urbano ou rural, sendo esse o critério utilizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA.

Adotado o critério da destinação, a parcela que foi desapropriada para uso como rodovia não pode ser caracterizada como rural e, em razão disso e da natureza originária da desapropriação, não se submete às exigências para o registro de imóvel rural, no Registro de Imóveis, ainda que a área da rodovia tenha origem em desmembramento de imóvel que tinha essa finalidade de uso.

Cabe anotar, nesse ponto, que o art. 9º do Decreto nº 4.449/2002 prevê a necessidade de certificação pelo Incra para a identificação do imóvel rural, sendo, em consequência, dispensada para a área da rodovia que foi desapropriada e passou a ter finalidade de uso não rural:

Art. 9º – A identificação do imóvel rural, na forma do §3º do art. 176 e do §3º do art. 225 da Lei nº 6015, de 1973, será obtida a partir de memorial descritivo elaborado, executado e assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro, e com precisão posicional a ser estabelecida em ato normativo, inclusive em manual técnico, expedido pelo INCRA.

§ 1º – Caberá ao INCRA certificar que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e que o memorial atende às exigências técnicas, conforme ato normativo próprio.

Afastada a submissão do registro da aquisição da área da rodovia aos requisitos para o desmembramento de imóvel rural, não prevalece a exigência de apresentação da descrição georreferenciada com certificação pelo Incra.

A dispensa da certificação, ademais, não causará prejuízo para a identificação do imóvel rural porque o proprietário, ao solicitar nova certificação para a área remanescente, deverá especificar a parcela que foi desapropriada para uso como rodovia.

Afastada a destinação rural a ser dada para o imóvel desapropriado, porque será utilizado para instalação de praça de pedágio de rodovia, não prevalecem as exigências de comprovação da sua inscrição no Cadastro Ambiental Rural SICAR/CAR.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação e afasto a recusa do registro do título.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator

Notas:

[1] Cf. https://www.gov.br/incra/pt-br/centrais-de-conteudos/legislacao/instrucao-normativa, consulta em

22/03/2024.

[2] Cf. https://www.gov.br/incra/pt-br/acesso-a-informacao/perguntas-frequentes, consulta em 21.03.2024. (DJe de 18.09.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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