CSM/SP: COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA: INSTRUMENTO PARTICULAR E DISPENSA DE TESTEMUNHAS.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 9000006-34.2013.8.26.0506

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 9000006-34.2013.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante NOVAEMPEMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃOPRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NÃO CONHECERAM DO RECURSO, V.U.DECLARARÃO VOTOS OS DESEMBARGADORES ARTUR MARQUES DASILVA FILHO E RICARDO MAIR ANAFE.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ RENATO NALINI (Presidente), EROSPICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIROFRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 30 de junho de 2015.

HAMILTON ELLIOT AKEL

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação Cível n° 9000006-34.2013.8.26.0506

Apelante: NOVAEMP EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA.

Apelado: 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE RIBEIRÃO PRETO

VOTO N° 34.200

Duvida – Registro de imóveis – Instrumento particular de promessa de venda e compra – Duas exigências feitas pelo oficial de registros – Suprimento de uma delas já no curso do procedimento – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido.

Cuida-se de apelação interposta contra a decisão de fls. 78/80 que manteve a recusa de ingresso no fólio real de instrumento particular de promessa de venda e compra de imóvel por falta de assinatura das testemunhas no instrumento.

Alega a recorrente, em suma, que a teor do art. 221 do Código Civil a exigência seria prescindível (fls. 85/88).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não conhecimento do recurso, pois uma das duas exigências teria sido suprida já no curso do procedimento, e, no caso do recurso vir a ser conhecido, pelo seu provimento (fls. 99/100).

É o relatório.

Constata-se que a nota de devolução elaborada pelo Oficial de Registros listou duas exigências a serem cumpridas pela parte, a saber:

(1) a retificação do instrumento particular para fazer constar o estado civil da promitente vendedora ou a apresentação de certidão atualizada de nascimento ou casamento dela e (2) a identificação das testemunhas, com suas assinaturas devidamente reconhecidas no instrumento (fl. 26).

Quanto à primeira exigência, já no curso do procedimento, após instaurada e autuada a dúvida, a parte interessada apresentou diretamente ao Juiz Corregedor Permanente uma certidão de casamento atualizada da promitente vendedora.

A dúvida, portanto, está prejudicada. O suprimento da exigência no curso do processo não é possível. A dúvida é pertinente ou não de acordo com a documentação que é apresentada ao Oficial. Vigora o princípio tempus regitactum. A parte tem o prazo da nota de exigência, de trinta dias, para supri-la ou impugná-la. Do contrário, haveria burla ao prazo da prenotação.

Se assim não fosse, porém, a segunda exigência deveria ser afastada. Logo, como forma apenas de orientar futura qualificação, passa-se ao exame da questão.

O requisito do art. 221, II, da Lei dos Registros Públicos, no sentido de que os escritos particulares sejam assinados pelas partes e testemunhas, aplica-se apenas aos escritos que exigirem a presença de testemunhas.

O Código Civil de 2002, posterior à Lei dos Registros Públicos, dispensa a presença de testemunhas nos instrumentos particulares assinados por quem está na livre administração de seus bens, conforme estabelece o seu próprio art. 221:

O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público.

Feitas as considerações supra, não conheço do recurso.

Hamilton Elliot Akel

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJE/SP | 21/08/2015.

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Presidentes de Tribunais de Justiça de todo o País se posicionam contra projeto de lei do documento único do TSE

Risco à segurança jurídica do cidadão, possibilidade de comercialização de dados, repetição de gastos públicos e risco à segurança das eleições são problemas do PL 1775/15.

Os presidentes de Tribunais de Justiça de todo o País manifestaram neste sábado (22.08) sua frontal oposição à aprovação do projeto de lei que a cria o Registro Civil Nacional (RCN) gerido e operado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Reunidos na cidade de Curitiba (PR) para o 104º Encontro do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça do País, a declaração, assinada pelos 27 presidentes de Cortes Estaduais do País, faz parte da Carta de Curitiba, documento final do encontro.

Para os presidentes dos TJs, o PL 1775/15 interfere na segurança jurídica do cidadão por possibilitar a comercialização de dados pessoais e sigilosos do cidadão, vulnerando o disposto no artigo 236 da Constituição da República, que atribui ao Poder Judiciário a disciplina e fiscalização das delegações extrajudiciais no Brasil.

Embora o artigo 5º do novo projeto de lei estabeleça que: “Fica vedada a comercialização, total ou parcial, da base de dados do RCN”, o artigo 8º prevê que: “O Tribunal Superior Eleitoral poderá firmar acordo, convênio ou outro instrumento congênere com entidades governamentais ou privadas, com vistas à consecução dos objetivos desta Lei (…)”. Já o próprio escopo do projeto diz que “há o interesse de diversas entidades públicas e privadas na participação do projeto, inclusive com recursos financeiros … Federação Brasileira de Bancos (Febraban), bancos e outras entidades do sistema financeiro…”.

De autoria do Poder Executivo em conjunto com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o projeto de lei 1775/15 apresenta ainda uma repetição de desperdício de dinheiro público, já utilizado em projeto semelhante lançado em 2010: o Registro de Identidade Civil (RIC) que, com custo estimado de US$ 800 milhões previa que todas as carteiras de identidade seriam trocadas até 2019 e que acabou abandonado pelo Poder Público. O novo projeto do TSE insufla ainda mais os gastos públicos com a previsão de investimento público na casa dos R$ 2 bilhões de reais.

Outros questionamentos relacionados ao PL 1775/15 envolvem a centralização da emissão da identificação nacional no mesmo órgão responsável pela fiscalização das eleições, abrindo a possibilidade para que a Presidência da República tenha controle sobre aprovação e rejeição de títulos de eleitor, colocando em risco a lisura das eleições – situação que já ocorreu no Peru e na Venezuela. A experiência internacional é vasta no sentido de não permitir a centralização de dados pelo Estado, com rejeições a propostas similares nos Estados Unidos, Inglaterra e França.

A saída debatida no Congresso Nacional é o documento único do cidadão venha a ser o CPF, documento já incorporado à vida pública de cada brasileiro, que não integrará a base de dados de outros documentos e apresenta baixo custo de implantação, sem onerar os cofres públicos.

A íntegra da Carta de Curitiba está disponível clique aqui e pode ser lida abaixo.

Fonte: Arpen/Brasil | 24/08/2015.

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Notários e Registradores – a prescrição punitiva de atos infracionais

Em decisão recente [1], a Eg. CGJSP vem de confirmar o entendimento, de certo modo sedimentado no órgão, de que a regra a disciplinar a prescrição da pretensão punitiva de atos infracionais de notários e registradores se extrairia da Lei Federal Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. E isto em razão de que:

  1. A CF/1988 cometeu à União o regramento da responsabilidade dos notários e dos oficiais de registro e a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário (§ 1º do artigo 236 da CF)
  2. A lei 8.935/1994 não tratou especificamente da matéria prescricional;
  3. A Lei 8.112/90, Lei Federal que dispõe sobre a mesma matéria tratada naLei Estadual nº 10.261/90 (Estatuto dos Funcionários Públicos de SP), há de prevalecer em face desta;
  4. À guisa de emprestar maior consistência ao argumento, e apoiada em precedentes, a decisão se projetou apoiada em analogia – como o tema da prescrição administrativa de penalidades aplicadas a magistrados. Sendo silente a Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN seria possível a aplicação analógica da mesma Lei nº 8.112/90 a magistrados. No mesmo sentido o artigo 26 da Resolução n.º 135, de 13/7/2011, do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, acerca do rito e das penalidades.

A r. decisão buscou consagrar um entendimento unívoco sobre a matéria, evitando emitir “sinais equívocos, ambíguos”, especialmente porque há precedentes recentes[2], citados no parecer, afirmando que a data da prática da falta sinaliza o início do prazo prescricional, como previsto no § 1º do artigo 261 da Lei Estadual 10.261/1968:

Artigo 261 – Extingue-se a punibilidade pela prescrição:

(…)

1º A prescrição começa a correr:

1 – do dia em que a falta for cometida;

STJ – divergência jurisprudencial

A r. decisão acena com precedentes do Superior Tribunal de Justiça em arrimo da tese esposada no âmbito administrativo correcional de São Paulo, embora, como ali mesmo se reconhece, haja apontadas divergências.

Como na decisão administrativa se indicam os precedentes de que se valeu a magistrada, vamos aos acórdãos que apanham o problema de uma perspectiva distinta.

O primeiro deles, salvo engano, será o RESP 23.587-RJ[3]. A extensa ementa nos posiciona no coração do problema:

ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DOS NOTÁRIOS E OFICIAIS DE REGISTRO – ARTIGO 22 DA LEI 8935/94 – REGULAMENTAÇÃO DO ARTIGO 236 DA CONSTITUIÇÃO – INFRAÇÃO DISCIPLINAR – PRESCRIÇÃO – OCORRÊNCIA – LEI ESPECÍFICA – APLICAÇÃO DO DECRETO 220/75(ESTATUTO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO). TERMO A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL BIENAL – DATA DA LAVRATURA DA ESCRITURA PÚBLICA.

  1. A regra exegética de que lex specialis derrogat lex generalisimplica a aplicação do Decreto 220/75(Estatuto dos funcionários públicos do Estado do Rio de Janeiro) aos serventuários de justiça punidos com sanções disciplinares, em face da omissão na norma específica, qual seja, a Lei 8.935/1994.
  2. O Estatuto básico dos notários e registradores – Lei 8.935/1994– restou omisso no que tange aos prazos prescricionais dos atos irregulares perpetrados por serventuários da justiça, razão pela qual aplicável, subsidiariamente, o Decreto 220/75, que dispõe, verbis: “Prescreverá em dois anos a falta sujeitas às penas de advertência, repreensão, multa ou suspensão. O § 2º do mesmo artigo acrescenta: ‘O curso da prescrição começa a fluir da data do evento punível disciplinarmente e interrompe-se pela abertura do processo administrativo disciplinar.”
  3. A lei nova que cria, sobre o mesmo tema anterior, um sistema inteiro, completo, diferente, elimina o sistema antecedente.
  4. É que “a disposição especial afeta a geral, apenas com restringir o campo da sua aplicabilidade; porque introduz uma exceção ao alcance do preceito amplo, exclui da ingerência deste algumas hipóteses. Portanto o derroga só nos pontos em que lhe é contrária (1). Na verdade, a regra especial posterior só inutiliza em parte a geral anterior, e isto mesmo quando se refere ao seu assunto, implícita ou explicitamente, para alterá-la. Derroga a outra naquele caso particular e naquela matéria especial a que provê ela própria” (InCarlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, 1991, 11ª edição, páginas 360/361).
  5. In casu, aplica-se a analogia, porquanto possível inferir-se a incidência da prescrição bienal na hipótese.
  6. É cediço que “se entre a hipótese conhecida e a nova a semelhança se encontra em circunstâncias que se deve reconhecer como essencial, isto é, como aquela da qual dependem todas as consequências merecedoras de apreço na questão discutida; ou, por outra, se a circunstância comum aos dois casos, com as consequências que da mesma decorrem, é a causa principal de todos os efeitos; o argumento adquire a força de uma indução rigorosa” (InHermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, 1991, 11ª edição, página 206).
  7. Deveras, as espécies semelhantes devem ser reguladas por normas semelhantes, princípio de verdadeira igualdade jurídica.
  8. Incidência da analogia legis, a qual consiste em aplicar à uma hipótese não prevista em lei aquela disposição relativa a um caso semelhante.
  9. A ideia essencial da lei estadual (Decreto 220/75) deve ser transposta aos serventuários (notários e registradores) porquanto o preceito nela formulado assemelha-se a este grupo definido por “colaboradores do serviço público”, no dizer de Maria Sylvia Zanella di Pietro.
  10. É que ressoa inequívoco que “não podem os repositórios de normas dilatar-se até a exagerada minúcia, prever todos os casos possíveis no presente e no futuro. Sempre haverá lacunas no texto, embora o espírito do mesmo abranja órbita mais vasta, todo o assunto inspirador do Código, a universalidade da doutrina que o mesmo concretiza. Esta se deduz não só da letra expressa, mas também da falta de disposição especial. Até o silêncio se interpreta; até ele traduz alguma coisa, constitui um índice do Direito, um modo de dar a entender o que constitui, ou não, o conteúdo da norma. A impossibilidade de enquadrar em um complexo de preceitos rígidos todas as mutações da vida prática decorre também do fato de podem sobrevir, em qualquer tempo, invenções e institutos não sonhados sequer pelo legislador” (InCarlos Maximiliano, ob. cit., página 208).
  11. Aplicação do preceito Ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositio(“onde se depare razão igual à da lei, ali prevalece a disposição correspondente da norma referida”).
  12. A lei estadual representa a realidade mais próxima àquela descrita nos autos do que a previsão constante do Decreto 20.910/32, o qual adstringe-se à prescrição relativa à Fazenda Pública
  13. O regime dos serventuários da justiça – tais como os notários e registradores – é híbrido – vez que a atividade notarial e registral está ligada intrinsecamente aos princípios do serviço público da legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade (CF/88, art. 37).
  14. O registrador público e o tabelião são agentes públicos uma vez que se enquadram na categoria de “particulares em colaboração à Administração”, sujeitando-se inclusive ao conceito de “funcionários públicos” para fins de responsabilidade penal.
  15. “Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos” (artigo 22 da Lei 8935/94, ao regulamentar o artigo 236 da Constituição Federal).
  16. Os empregados contratados pelos registradores e notários para prestarem serviços nos cartórios, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, responderão perante o titular deste pelo dano causado, em casos de dolo, em ação ordinária, mesmo porque contratados com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho, sem interferência nenhuma do Poder Judiciário.
  17. Contudo, há lei especial versando acerca da prescrição bienal, restando inaplicável, subsidiariamente, o Decreto 20.910/32, regra geral adotada no Direito Administrativo para outros fins, quais sejam, as dívidas Passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza.
  18. A título de argumento obiter dictum, o supracitado decreto não exclui a incidência de norma mais favorável, como se extrai do seu artigo 10, que ora se transcreve, verbis: “Art. 10º. – O disposto nos artigos anteriores não altera as prescrições de menor prazo, constantes, das leis e regulamentos, as quais ficam subordinadas as mesmas regras.”
  19. O Termo a quo para o início do prazo prescricional é o prazo da lavratura da escritura, que ocorreu em 27 de setembro de 2001, o que impõe o reconhecimento da prescrição bienal, porquanto o procedimento administrativo somente foi instaurado em 23 de agosto de 2004 (fls. 21/22) por ocasião da protocolização da petição da interessada em 17 de março de 2004. Precedente: REsp 337.447/SP, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, julgado em 04.12.2003, DJ 19.12.2003.
  20. Recurso ordinário provido, para extinguir a punibilidade da recorrente em face da ocorrência da prescrição bienal.

No caso concreto, controvertia-se sobre a regra a ser aplicada, à míngua de disposição específica na Lei 8.935/1994. O v. acórdão inaugurou uma nova perspectiva para o problema.

A Lei n. 8.112/90 é exceção à regra da actio nata

No RMS 6.548-PR[4], o STJ vinha de sufragar o entendimento de que eventual silêncio do Código de Organização Judiciária estadual acerca do termo a quo do prazo prescricional imporia a aplicação subsidiária da Lei n. 8.112/90, “porquanto essa legislação trata dos servidores públicos federais e é a que mais se aproxima da seara fática dos autos”, a despeito de o requerente não ser servidor público e ser regido por Lei estadual[5].

Todavia, em sede de embargos infringentes[6] firmou-se o entendimento de que a Lei n. 8.112/90 representaria uma “exceção à regra ao princípio da actio nata, porquanto faz protrair o termo a quo da prescrição da pretensão punitiva da Administração à ciência do ato irregular pela autoridade competente. E, em sendo uma regra de exceção, deve ser interpretada restritivamente”.

Notário e registrador – equiparação a servidor público estatutário

Por outro lado, no mesmo aresto, decidiu-se não ser possível, nem por analogia, equiparar o notário ou o registrador público à figura do servidor público estatutário.

A decisão se assenta em precedente do próprio Supremo Tribunal Federal que, ao interpretar a Emenda Constitucional n. 20/1998 firmou o entendimento segundo o qual os notários e registradores não estão enquadrados na definição de servidores públicos efetivos[7]. E concluiu: “não ressoa lógico aplicar o diploma legal, que justamente cuida dos servidores públicos federais, a quem labora em caráter privado, com delegação do Poder Público”[8].

Publicidade dos atos notariais e registrais e a figura da “corregedoria permanente”

Logo em seguida, no bojo do RMS 26.350[9], volta-se ao tema: à falta de previsão legal específica na Lei dos Notários e Registradores, seria “possível aplicar o prazo de prescrição previsto no Estatuto dos Funcionários Civis do Estado”, como grafou a ministra Denise Arruda. A relatora considerou que a presunção de publicidade que decorre dos atos praticados por notários e registradores acaba por colher a todos – inclusive a própria Administração Pública.

Realmente, ao menos como presunção, deve-se considerar que os atos infracionais são de conhecimento da própria administração; não teria sentido atacar essa presunção que, válida para todos, acabaria por excetuar a própria administração.

Além disso, no Estado de São Paulo acha-se em vigor Decreto 4.786/1930, que estabelece o Regimento das Correições do Estado. Nele está prevista a figura docorregedor permanente (art. 2º) que atua permanentemente, promovendo a inspeção assídua e severa dos serviços que especifica, “para que corram com a máxima regularidade” (art. 8º cc. art. 10 do Regimento). É o juízo competente“assim definido na órbita estadual”, nos termos do art. 37 cc. art. 38 da Lei 8.935/1994. A ele compete aplicar as penas previstas no art. 33 do mesmodiploma legal.

Essa correição permanente não tem “forma e figura de juízo” e no Estado de São Paulo a atribuição é cometida aos juízes de direito por designação do Corregedor Geral de Justiça, com aprovação do Conselho Superior da Magistratura (inc. XXVI do art. 28 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo), sem prejuízo de sua competência originária (inc. XIX do art. 28 do mesmo Regimento).

Voltando ao v. aresto, eis a ementa:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. APLICAÇÃO DE PENALIDADE ADMINISTRATIVA A NOTÁRIOS E OFICIAIS DE REGISTRO. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO A QUO.

  1. Hipótese de aplicação da pena de censura a Titular do Ofício Distrital de Natingui/PR, por falta funcional, em decorrência da lavratura de escritura de compra e venda de alienação a non domino supostamente irregular.
  2. O Tribunal de origem, conquanto tenha firmado a orientação de que o prazo prescricional aplicável ao caso é o bienal, servindo-se, por analogia, da norma contida no antigo Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União (Lei 1.711/52), entendeu que a contagem desse prazo tem início na data da ciência da autoridade competente para a aplicação da penalidade.
  3. Entretanto, em recente julgado, a Primeira Turma desta Corte, diante de situação semelhante à dos presente autos, firmou a orientação de que: (a) na ausência de previsão legal específica na lei que regula a aplicação de penalidade administrativa aos notários e oficiais de registro, é possível aplicar o prazo de prescrição previsto no Estatuto dos Funcionários Civis do Estado; (b) a lavratura da escritura dá início à contagem do prazo prescricional, diante da presunção de sua publicidade a todos, inclusive à Administração, por constituir efeito próprio do ato (RMS 23.587/RJ, 1ª Turma, Rel. p/ acórdão Min. Luiz Fux, DJe de 3.11.2008).
  4. Hipótese em que a escritura que ensejou a aplicação da pena de censura foi lavrada em 20 de julho de 1983 e o processo administrativo foi deflagrado somente em 18 de março de 2004, com decisão final em maio de 2006.
  5. Não há dúvida, portanto, de que a pretensão punitiva foi extinta em decorrência da prescrição, considerando o prazo prescricional bienal previsto no art. 301 da Lei Estadual 6.174/70, que estabelece o regime jurídico estatutário dos funcionários civis do Poder Executivo do Estado do Paraná, contado a partir da data da lavratura da escritura.
  6. Recurso ordinário em mandado de segurança provido.

No mesmo sentido o AgRg no RMS 46.429-SP[10]. Eis a ementa:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. DATA DA PRÁTICA DA CONDUTA ILEGAL. EXPRESSA DISPOSIÇÃO DO ART. 261 DO ESTATUTO DOS SERVIDORES ESTADUAIS DE SÃO PAULO. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

  1. Da leitura dos autos, infere-se que: i) o ato considerado irregular punível com multa foi realizado em 2005 enquanto o procedimento administrativo disciplinar somente se iniciou em 2011; ii) o prazo prescricional das infrações sujeitas à multa é de dois anos, conforme disposto no art. 261, inc. I, do Estatuto dos Servidores Públicos de São Paulo.
  2. Com efeito, no momento em que a suposta infração administrativa foi praticada, o art. 261, § 1º, do Estatuto dos Servidores Públicos de São Paulo já indicava, expressamente, o momento da prática da falta como o termo inicial do processo administrativo disciplinar.
  3. Portanto, a multa aplicada pelo Estado de São Paulo deve ser anulada porque o procedimento administrativo disciplinar iniciou-se em momento posterior ao lapso de dois anos da prática do ato tido como irregular.
  4. Agravo regimental não provido.

Conclusões

Concluindo, pode-se assim sintetizar o entendimento do STJ:

  1. Na ausência de previsão legal específica na Lei 8.935/1994, que regula a aplicação de penalidades administrativas aos notários e oficiais de registro, aplica-se o prazo de prescrição previsto no Estatuto dos Funcionários Civis do Estado;
  1. A prática do ato notarial ou registral é que dá início à contagem do prazo prescricional, diante da presunção de publicidade que se irradia erga omnes e colher, naturalmente, a própria Administração Pública, por constituir efeito próprio do ato.
  1. No Estado de São Paulo, vige o Regimento das Correições onde se acha prevista a figura do corregedor permanente (art. 2º). A ele compete, permanentemente, a inspeção assídua e severa dos serviços notariais e registrais. É o juízo competente “assim definido na órbita estadual”, nos termos do art. 37 cc. art. 38 da Lei 8.935/1994. A ele compete aplicar as penas previstas no art. 33 do mesmo diploma legal. Presume-se o conhecimento, pela Administração, dos atos administrativos acoimados de vícios que pudessem acarretar penas disciplinares.

Este é o estado atual das discussões. É preciso harmonizar o entendimento – seja no Superior Tribunal de Justiça, seja na Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, com vistas à esperável segurança jurídica na regular prestação da atividade notarial e registral.

Submeto o tema à apreciação dos acadêmicos.

______

NOTAS.

[1] Processo CG 39.473/2015, Ubatuba, dec. 3/7/2015, DJe 16/7/2015, des. Elliot Akel.

[2] P. ex. Processo CG 43.381/2010, São Paulo, dec. 4/8/2010, DJe 25/8/2010, des. Antonio Carlos Munhoz Soares.

[3] RESP 23.587-RJ(j. 7/10/2008, Dje 3/11/2008, rel. para o acórdão min. Luiz Fux.

[4] RMS 26.548-PR j. 4.3.2010, DJe 19.3.2010, rel. min. Benedito Gonçalves.

[5] Precedentes citados: RMS 13.439/MG, Relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ de 29/3/2004; e RMS 20.481/MT, Relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 11/9/2006.

[6] EDcl em RMS 26.548 – PR, j. 28/9/2010, DJe 11/10/2010, rel. min. Benedito Gonçalves.

[7] ADI 2.602-DF, Relator Ministro Joaquim Barbosa, Relator para acórdão Ministro Eros Grau, DJ de 31 de março de 2006.

[8] Idem nota 6.

[9] RMS 26.350-PR, j. 27/10/2009, DJe 23/11/2009, rel. ministra Denise Arruda.

[10] AgRg no RMS 46.429-SP, j. 16/12/2014, DJe 19/12/2014, rel. ministro Mauro Campbell Marques.

Fonte: Observatório do Registro – http://www.observatoriodoregistro.com.br/ | 18/08/2015.

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