CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura de compra e venda – Exame da documentação juntada aos autos que demonstra a natureza rural do imóvel – Critério da localização que, por si só, não é suficiente para definir a natureza do imóvel – Exigências formuladas pelo registrador que merecem ser afastadas – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente


  
 

Apelação n° 1012198-72.2019.8.26.0071

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1012198-72.2019.8.26.0071
Comarca: BAURU

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1012198-72.2019.8.26.0071

Registro: 2019.0000990400

ACÓRDÃO– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1012198-72.2019.8.26.0071, da Comarca de Bauru, em que é apelante CLAUDEMIR GUEDES MISQUIATI, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE BAURU.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL) E ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE).

São Paulo, 14 de novembro de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1012198-72.2019.8.26.0071

Apelante: Claudemir Guedes Misquiati

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Bauru

VOTO Nº 37.970

Registro de Imóveis – Escritura de compra e venda – Exame da documentação juntada aos autos que demonstra a natureza rural do imóvel – Critério da localização que, por si só, não é suficiente para definir a natureza do imóvel – Exigências formuladas pelo registrador que merecem ser afastadas – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

Trata-se de apelação interposta pela Claudemir Guedes Misquiati contra a r. sentença proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Bauru/SP, que manteve o óbice apresentado para registro da escritura de compra e venda tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 58.914 junto àquela serventia imobiliária [1].

O apelante afirma, em síntese, que na matrícula o imóvel consta como sendo rural, com número de cadastro no INCRA e NIRF, tendo sido apresentados comprovantes do CCIR e ITR atuais e devidamente quitados, além da inscrição no CAR e SICAR, de forma que a comprovação quanto à destinação do bem não se justifica. Aduz que todos os elementos necessários à identificação do imóvel rural encontram-se presentes na escritura pública levada a registro, assim como em matrícula. Ressalta que, segundo a Lei de Registros Públicos, todo imóvel cadastrado no INCRA é considerado rural, pouco importando sua utilização ou localização. Ainda, sustenta que a matrícula foi aberta no ano de 1966, quando não se cogitava da existência de fração mínima de parcelamento de solo rural, de forma que a posterior alienação da integralidade do imóvel nada tem de irregular, sobretudo se considerado o tempo já transcorrido [2].

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso [3].

É o relatório.

Desde logo, importa anotar, a despeito do quanto consignado na r. sentença recorrida, que não se trata de dúvida inversa julgada improcedente, mas sim, de dúvida julgada procedente, com a consequente manutenção dos óbices apresentados pelo registrador.

O apelante, por meio de escritura pública de venda e compra [4], adquiriu, juntamente com outras pessoas, o imóvel objeto da matrícula nº 58.914 do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Bauru/SP [5]. Nos termos da nota de devolução expedida, o registrador, considerando que o imóvel está localizado em zona urbana do Município de Bauru (Lei Municipal nº 2.118/1978), exigiu a apresentação de: a) comprovante de cadastro imobiliário emitido pela Prefeitura Municipal; b) comprovante de cancelamento do cadastro rural emitido pelo INCRA; c) certidão municipal de medidas e confrontações; e d) certidão de valor venal do imóvel [6].

Nos termos do art. 176, § 1º, inciso II, da Lei 6.015/73, são requisitos para a identificação do imóvel rural a existência de seu código, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área. Todos estes elementos estão presentes na escritura levada a registro, que reproduz exatamente aquela constante da matrícula do imóvel, aberta em consideração aos elementos da transcrição anterior, como previsto na Lei de Registros Públicos (arts. 196 e 228) e nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (Capítulo XX, item 46).

E muito embora a Prefeitura Municipal de Bauru tenha classificado todo o perímetro do Município como área urbana ou de expansão urbana, tal classificação não implica dizer que não haja imóveis rurais dentro dos limites de seu território, nem tem o condão de afastar automaticamente a competência tributária do INCRA sobre imóveis com destinação rural.

Não competiria ao registrador, pois, exigir o cancelamento do cadastramento do imóvel junto ao INCRA e tampouco a comprovação, pelo apelante, do uso e forma de exploração da terra. É que o critério da localização, por si só, não é suficiente para definir a natureza do imóvel para fins tributários, certo que o descadastramento do imóvel pelo INCRA, para que possa ser alterada a sua destinação, é um imperativo da Lei nº 6.766/79, que assim dispõe em seu art. 53:

Art. 53. Todas as alterações de uso do solo rural para fins urbanos dependerão de prévia audiência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, do Órgão Metropolitano, se houver, onde se localiza o Município, e da aprovação da Prefeitura municipal, ou do Distrito Federal quando for o caso, segundo as exigências da legislação pertinente.

Daí porque o imóvel em referência, que está identificado como Fazenda Ressaca na respectiva matrícula e no título apresentado pelo apelante, presume-se de destinação rural até que seja demonstrada, por intermédio da respectiva certidão de descadastramento junto ao INCRA, eventual alteração de sua natureza.

Não compete ao registrador, contudo, exigir esse descadastramento por ocasião do registro de um título que se encontra formalmente em ordem, razão pela qual também não se sustentam as exigências por ele formuladas no que diz respeito à imposição de cadastramento imobiliário junto à Prefeitura Municipal e apresentação de certidão municipal de medidas e confrontações, assim como de valor venal.

E nem mesmo o fato de ser o imóvel menor que a área mínima exigida pelo INCRA para exploração rural é suficiente para impedir o registro, eis que a matrícula foi aberta no ano de 1966, quando não se cogitava da existência de fração mínima de parcelamento de solo rural, de forma que a posterior alienação da integralidade do imóvel nada tem de irregular, como dispõe o item 60.2 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça [7].

Diante do exposto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Fls. 140/143.

[2] Fls. 150/158.

[3] Fls. 203/206.

[4] Fls. 37/39.

[5] Fls. 40.

[6] Fls. 34/35.

[7] 60.2. Não será considerada irregular a abertura de matrícula que segue os dados existentes no registro anterior (matrícula por transporte), bem como o registro do título subsequente, quando houver coincidência entre os dados.

Fonte: INR Publicações

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