TJ/SP – Registro Imobiliário – Resgate de enfiteuse – Recusa da averbação – Resgate formalizado por instrumento particular – Resgate da enfiteuse que gera a transmissão da propriedade direta em favor do enfiteuta – Escritura pública obrigatória – ITBI – Transmissão do domínio direto que se dá no momento do registro do ato de extinção da enfiteuse – Incidência do tributo em momento posterior ao pagamento do resgate – Previsão legal da transmissão do domínio direto na legislação municipal – Exigência do recolhimento mantida – Recurso não provido.

Número do processo: 1030652-90.2018.8.26.0506

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 21

Ano do parecer: 2020

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1030652-90.2018.8.26.0506

(21/2020-E)

Registro Imobiliário – Resgate de enfiteuse – Recusa da averbação – Resgate formalizado por instrumento particular – Resgate da enfiteuse que gera a transmissão da propriedade direta em favor do enfiteuta – Escritura pública obrigatória – ITBI – Transmissão do domínio direto que se dá no momento do registro do ato de extinção da enfiteuse – Incidência do tributo em momento posterior ao pagamento do resgate – Previsão legal da transmissão do domínio direto na legislação municipal – Exigência do recolhimento mantida – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

1. Trata-se de recurso administrativo interposto por Caram Miguel Jacob contra a decisão que julgou procedente pedido de providências suscitada pela Oficiala do 2° Registro de Imóveis de Ribeirão Preto, mantendo a recusa do acesso ao registro na matrícula nº 19.228 de instrumento particular de resgate de enfiteuse, entendendo pela necessidade de escritura pública e recolhimento de ITBI no momento da inscrição (fls. 112/124).

2. O recorrente sustenta, em resumo, que o resgate deu-se há quarenta anos, antes da atual Constituição, da Lei Municipal que instituiu o ITBI, do Código Tributário Nacional e da Lei dos Registros Públicos, sendo impedida a aplicação retroativa de tais normas para a exigência do tributo; que não há necessidade de realização de escritura pública para o resgate da enfiteuse. Pretende o afastamento da dúvida, determinandose o cancelamento do aforamento sem a formalização por escritura pública e o recolhimento do ITBI (fls. 130/135).

A Procuradoria Geral de Justiça manifesta-se pelo não provimento do recurso (fls. 152/154).

É o relatório.

3. Embora nominado pela Oficiala como suscitação de dúvida, o processamento deu-se como pedido de providências, por se tratar de pretensão de averbação de ato na matrícula imobiliária, com interposição de recurso administrativo, nos termos do art. 246, do Decreto-Lei Complementar Estadual nº 3/1969.

O presente recurso é apresentado em pedido de providências suscitado pela Oficiala do 2° Registro de Imóveis de Ribeirão Preto, entendendo pela impossibilidade de ingresso no fólio de instrumento de resgate de enfiteuse efetuado por Caram Miguel Jacob, ora recorrente, por instrumento particular datado de 20.07.1982 (fls. 18/19), sem formalização do ato por escritura pública e sem recolhimento do ITBI.

Pretende o recorrente que se proceda a averbação da extinção da enfiteuse, fundada no art. 167, II, 2, da Lei nº 6.015/1973, com base tão somente em guia de recolhimento de resgate de aforamento, formalizado em instrumento particular.

Dois são os fundamentos da irresignação. O primeiro, quanto à forma, é de que para a averbação do resgate da enfiteuse não há necessidade de formalização de escritura pública, por se tratar de ato extintivo de direito real sobre coisa alheia sujeito a averbação. O segundo, vinculado ao princípio da legalidade, afirma a não incidência do ITBI sobre o ato, impedida a aplicação retroativa de normas de natureza tributária, criadas a partir da Constituição Federal de 1988, de forma retroativa ao ato de resgate.

O primeiro fundamento não pode ser acolhido, eis que a escritura pública é da essência do ato jurídico de resgate da enfiteuse.

A enfiteuse era prevista como direito real no art. 674, I, do Código Civil de 1916, caracterizando-se pela transmissão do domínio útil da propriedade pelo proprietário ou senhorio ao enfiteuta, mediante pagamento de uma pensão ou foro (art. 678, CC/16). E, por força de sua perpetuidade até o resgate ou extinção, mantidas pela regra transitória do art. 2.038, do Código Civil, permanece eficaz como instrumento de transferência do domínio útil sobre o bem, sem que isto signifique alienação da propriedade de forma absoluta.

E, por isto, há de se entender a enfiteuse como direito real na coisa alheia que, por sua estrutura, determina que a propriedade continue sob o domínio do senhorio direto, havendo em favor do enfiteuta apenas direito de uso e gozo sobre o domínio útil. No dizer de Orlando Gomes (Direitos reais, 19ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 305):

“Outros argumentos poderiam ser aduzidos em demonstração da falsidade da tese de que o enfiteuta é proprietário. Mas não é necessário invoca-los porque, em verdade, a doutrina está superada. O debate carece, aliás, de maior significação prática, porque o Código Civil inclui a enfiteuse entre os direitos reais na coisa alheia, e como tal o define e regula, embora se refira impropriamente ao domínio útil que teria o enfiteuta. Declarando que se dá a enfiteuse quando o proprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel, o Código Civil deixa claro que o proprietário é o senhorio direto. Ora, se proprietário é, proprietário não pode ser o enfiteuta, porque a propriedade é um direito exclusivo.”

Bem por isto, prevê-se o direito do foreiro alienar o direito de exercício do domínio útil, mediante pagamento ao senhorio direto do laudêmio, conforme o art. 686, do Código Civil de 1916.

Ou seja, o direito de propriedade imobiliária, no caso da enfiteuse, permanece, de forma limitada, sob a titularidade do senhorio, somente se transmitindo ao enfiteuta por conta do resgate. Daí porque o resgate da enfiteuse tem característica de ato translativo da propriedade imobiliária.

O resgate da enfiteuse era previsto no art. 693, do Código Civil de 1916, ainda vigente por conta da regra transitória do art. 2.038, do Código Civil, exigindo-se o pagamento de um laudêmio específico:

Art. 693. Todos os aforamentos, inclusive os constituídos anteriormente a este Código, salvo acordo entre as partes, são resgatáveis dez anos depois de constituídos, mediante pagamento de um laudêmio, que será de dois e meio por cento sobre o valor atual da propriedade plena, e de dez pensões anuais pelo foreiro, que não poderá no seu contrato renunciar ao direito de resgate, nem contrariar as disposições imperativas deste capítulo.”

Serpa Lopes (Tratado dos registros públicos; v. III. 3ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955, pp. 280/281), após analisar doutrina estrangeira a respeito da necessidade da transcrição do direito de resgate para sua eficácia, bem como o modo para se realizar tal ato, conclui:

“Ato unilateral ou bilateral, compra e venda ou desapropriação forçada, o que há de persistente e claro é tratar-se de um direito que produz, incontestavelmente, a transferência do domínio direto para o enfiteuta, dando-se, precisamente, o fenômeno assinalado por De Pirro, ou seja a sucessão e a confusão.

É uma transferência coativa, precisa Pietro Germani, que tem a sua fonte mediata no próprio senhorio, ao estabelecer a enfiteuse.

(…)

Assim sendo, deverá ser transcrita a escritura por força da qual o ex-titular do domínio direto declare haver recebido a importância do resgate e passar ao enfiteuta o domínio direto.

Na falta de uma convenção dessa natureza, só por meio de sentença do juiz reconhecendo o direito do enfiteuta e o pagamento realizado por meio de depósito judicial da quantia apurada, de acordo com o critério legal ou mesmo do contrato originário, se este houver previsto e regulado o seu exercício.” (grifei)

Em conclusão, se a extinção da enfiteuse tem características de ato translativo da propriedade imobiliária, sujeito necessariamente à inscrição no registro, há de respeitar a forma prescrita em lei imposta pelos arts. 82 e 134, II, do Código Civil de 1916, vigentes à época da formalização do resgate, e art. 108, do Código Civil de 2002.

Desta forma, a escritura pública é da essência do resgate da enfiteuse, assim como o pagamento do preço fixado pela lei, não se admitindo a averbação da extinção sem que haja formalização que atenda aos requisitos legais.

Sendo necessária a escritura pública constando o resgate da enfiteuse, mantém-se a recusa apresentada pelo registrador.

O segundo fundamento do recurso, de que não é possível a exigência do ITBI por tal fato significar aplicação retroativa de normas tributárias, também não pode ser acolhido.

Como afirmado, o resgate da enfiteuse constitui ato jurídico com a finalidade de extinção de um direito real sobre coisa alheia e, ao mesmo tempo, de transmissão desta mesma propriedade.

Se o ato extintivo da enfiteuse resulta na transmissão da propriedade em favor do enfiteuta, que até então exercia somente o domínio útil sobre o bem, sua eficácia jurídica real decorre da inscrição no registro imobiliário, conforme previsto no art. 676, do Código Civil de 1916 e no art. 1.245, do Código Civil em vigor. Não há que se falar, portanto, em eficácia translativa da propriedade ou do domínio direto por conta do ato particular firmado entre as partes que, em termos finais, apenas comprova o pagamento do laudêmio necessário ao resgate.

Se há transmissão da propriedade direta no momento da inscrição do resgate, conclui-se que há transmissão de bem imóvel como fato gerador do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis e que tal transmissão se dá no momento do registro do ato, sujeitando-se o adquirente ao recolhimento do tributo neste momento.

A Lei Municipal nº 5.430/1989, do Município de Ribeirão Preto, previu a incidência do imposto na transmissão do domínio direto pelo senhorio, fixando sua base de cálculo em 1/5 (um quinto) do valor venal da propriedade (art. 15, IV). Respeita-se, assim, o princípio da legalidade tributária.

Assim, caracterizando o resgate da enfiteuse verdadeira transmissão do domínio direto em favor do enfiteuta, com efeitos reais, haverá incidência do imposto por conta da transmissão, a ser recolhido no momento da lavratura da escritura pública de resgate ou do registro do ato junto ao registro imobiliário. Não importa, assim, que o resgate tenha sido pago no ano de 1981 para fins de incidência tributária, eis que os efeitos translativos do ato somente se conformarão com a lavratura da escritura pública e seu registro.

Não caracteriza o fato, portanto, aplicação retroativa de norma tributária.

Desta forma, não havendo comprovação do recolhimento do ITBI no momento da realização da escritura pública necessária, que aqui não há, deverá o tributo ser recolhido por conta do registro da transmissão, não havendo o que se alterar na exigência formulada pelo oficial.

4. Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido do não provimento do recurso.

Sub censura.

São Paulo, 17 de janeiro de 2020.

PAULO ROGÉRIO BONINI

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e nego provimento ao recurso. Oportunamente, remetam-se os autos à Vara de origem. Intimem-se. São Paulo, 23 de janeiro de 2020. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: ARMANDO ALVES, OAB/SP 30.623, NINA VALÉRIA CARLUCCI, OAB/ SP 97.455, OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL, OAB/SP 15.542, OVIDIO ROCHA BARROS SANDOVAL JÚNIOR, OAB/SP 111.280 e FABIANO DE ARAÚJO THOMAZINHO, OAB/SP 202.425.

Diário da Justiça Eletrônico de 31.01.2020

Decisão reproduzida na página 013 do Classificador II – 2020

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


COMUNICADO CG Nº 1272/2021

COMUNICADO CG Nº 1272/2021

Espécie: COMUNICADO
Número: 1272/2021
Comarca: CAPITAL

COMUNICADO CG Nº 1272/2021

(Processo nº 2021/54559)

A Corregedoria Geral da Justiça PUBLICA, para conhecimento geral, o Ofício Circular Nº 8 – CN (1095141) do Conselho Nacional de Justiça com orientações:

Nota da redação INR: Clique aqui para visualizar a íntegra do ato. (DJe de 17.06.2021 – NP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


TJ/SP – Comunicado suspende prazos de processos físicos e digitais em comarcas do interior

Medida considera atos municipais de lockdown.

A Presidência do Tribunal de Justiça e a Corregedoria Geral da Justiça editaram, nesta quarta-feira (16), o Comunicado Conjunto nº 1.274/21, que suspende os prazos dos processos físicos e digitais nas comarcas Catanduva, Itajobi, Santa Adélia, Tabapuã e Taquarituba, em razão de medidas restritivas nos municípios. De acordo com o art. 3º do Provimento CSM nº 2.603/21, ficarão suspensos os prazos nas comarcas em que adotadas, no município da sede, medidas sanitárias que restrinjam de forma plena a livre locomoção de pessoas – conhecidas como lockdown – enquanto vigorarem os decretos que as instituíram. Os fóruns não são fechados (saiba mais). Outras informações podem ser encontradas no hotsite relacionado ao coronavírus. Veja a íntegra do comunicado:

COMUNICADO CONJUNTO N° 1.274/2021

A Presidência do Tribunal de Justiça e a Corregedoria Geral da Justiça, tendo recebido e apreciado até o momento os atos municipais indicados no parágrafo único do artigo 3º do Provimento CSM nº 2603/2021, referente às comarcas de Altinópolis, Batatais, Catanduva, Cordeirópolis, Itajobi, Santa Adélia, Tabapuã e Taquarituba COMUNICAM, para os fins do caput do artigo 3º do Provimento CSM nº 2603/2021, a suspensão dos prazos dos processos físicos e digitais nas comarcas e períodos a seguir elencados:  

Comarca Início Fim
Catanduva 15/06/2021 29/06/2021
Itajobi 14/06/2021 20/06/2021
Santa Adélia * 11/06/2021 20/06/2021
Tabapuã 14/06/2021 20/06/2021
Taquarituba 16/06/2021 23/06/2021

* Como já publicado no Comunicado Conjunto 1230/2021

Fonte: TJSP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.