Processo 1047827-49.2021.8.26.0100
Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS – Ourem Administracao de Bens Ltda – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ourem Administração de Bens Ltda e, em consequência, mantenho o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: PAULO VITOR ALVES MARIANO (OAB 416134/SP), ISIDORO ANTUNES MAZZOTINI (OAB 115188/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo Digital nº: 1047827-49.2021.8.26.0100
Classe – Assunto Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS
Suscitante: 4º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo
Suscitado: Ourem Administracao de Bens Ltda
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ourem Administração de Bens Ltda, tendo em vista negativa em se proceder ao registro de carta de arrematação extrajudicial, que tem como objeto o imóvel da matrícula n. 188.593 daquela serventia.
Informa o Oficial que a negativa foi motivada pelo fato de que a carta de arrematação extrajudicial não é instrumento hábil para ingresso no fólio real, sendo indispensável a lavratura de escritura pública ou instrumento particular com efeitos de escritura pública, na forma do ar. 38 da Lei Federal n. 9.514/97; que, com o advento da Lei n. 13.455/17, tornou-se inaplicável o disposto no art. 37 do Decreto-lei n. 70/66, o que inviabiliza o registro do documento apresentado, por ausência de previsão legal; que o art. 253.1. do capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça também impede o registro do título.
Documentos vieram às fls. 05/116.
A parte suscitada manifestou-se às fls. 117/124, sustentando que a carta de arrematação é título hábil para transferência da titularidade, notadamente porque indica expressamente em seu teor o vendedor/credor fiduciário e o comprador/arrematante, de modo que inexiste a necessidade de escritura para registro; que a segunda exigência também não merece prosperar, pois todos as formalidades aplicáveis à espécie foram cumpridas, incluindo a entrega de outros documentos exigidos pelo Oficial; que a carta de arrematação extrajudicial equivale a instrumento particular com efeitos de escritura pública, em conformidade com o disposto no item 229 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça e no art. 38 da Lei da Alienação Fiduciária.
O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 128/129).
É o relatório.
Fundamento e decido.
Por primeiro, verifica-se que o objeto da dúvida suscitada é o inconformismo voltado à exigência formulada pelo Oficial na nota devolutiva de fls. 30/31 (prenotação n. 600806), pelo que este procedimento restringir-se-á apenas ao óbice apontado pelo registrador (necessidade da lavratura de escritura pública ou instrumento particular com efeitos de escritura pública para registro da carta de arrematação).
No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.
Conforme sustentado pelo Oficial, a Carta de Arrematação obtida em leilão extrajudicial não é título hábil para ingresso no fólio registral (fls. 39/41), por não se tratar de instrumento particular com força de escritura pública.
Vale lembrar que o leilão decorreu da consolidação da propriedade do imóvel em favor do credor fiduciário (fls. 29 e 35/36) e que a Lei n. 9.514/97, que dispõe sobre o assunto, assim estabelece em seu art. 38:
“Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública”.
Neste ponto, o que se denota é que o dispositivo apenas faculta a formalização dos atos e contratos concernentes à alienação fiduciária por escritura pública ou instrumento particular com efeito de escritura pública, sem qualquer indicativo de que a carta de arrematação corresponda ao instrumento.
A mesma lei, ainda, em seu art. 39, II, restringiu expressamente a aplicabilidade das disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-Lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca:
“Art. 39. Às operações de crédito compreendidas no sistema de financiamento imobiliário, a que se refere esta Lei:
II – aplicam-se as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-Lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”.
Desse modo, não há dúvida de que não mais se aplica o disposto no art. 37 do Decreto-Lei n. 70, de 21 de novembro de 1966, aos procedimentos de crédito garantidos por alienação fiduciária, o qual autorizava o registro direto da carta de arrematação:
“Art 37. Uma vez efetivada a alienação do imóvel, de acordo com o artigo 32, será emitida a respectiva carta de arrematação, assinada pelo leiloeiro, pelo credor, pelo agente fiduciário, e por cinco pessoas físicas idôneas, absolutamente capazes, como testemunhas, documento que servirá como título para a transcrição no Registro Geral de Imóveis”.
Não bastasse isso, a conclusão se reforça pelo contido no item 253.1 do Capítulo XX das NSCGJSP, que trata do leilão posterior à consolidação da propriedade fiduciária e regulamenta a transmissão do imóvel ao licitante:
“253.1. Havendo lance vencedor, a transmissão do imóvel ao licitante será feita por meio de registro de contrato de compra e venda, por instrumento público ou particular, no qual deverá figurar, de um lado, como vendedor, o antigo credor fiduciário e, de outro, como comprador, o licitante vencedor”.
Por fim, vale anotar que este entendimento vai ao encontro do previsto no próprio edital do leilão em que arrematado o bem, que assim estabeleceu expressamente, com nossos destaques:
“Dentro de 60 (sessenta) dias, contados da outorga da competente escritura de venda e compra, ressalvada a hipótese de extensão autorizada do prazo, o Arrematante deverá apresentar ao Vendedor, comprovação do registro do respectivo instrumento aquisitivo no Cartório de Registro Imóveis competente” (fl. 45, segundo parágrafo).
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ourem Administração de Bens Ltda e, em consequência, mantenho o óbice registrário.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.
P.R.I.C.
São Paulo, 24 de junho de 2021. (DJe de 28.06.2021 – SP)
Fonte: DJE/SP.
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.
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