1VRP/SP: Registro de Imóveis. Sem a apresentação da partilha, não há como averiguar se houve divisão igualitária dos bens do casal, continuando o acervo patrimonial em sua totalidade à disposição de ambos os ex-cônjuges. Por isso mesmo, correta a negativa oposta pelo Oficial, com a exigência de registro prévio da partilha dos bens do casal, não sendo suficiente mera averbação de alteração do estado civil.


  
 

Processo 1056883-09.2021.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital – Ulisses Simões da Silva – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 18º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ulisses Simões da Silva e, em consequência, mantenho o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: ULISSES SIMÕES DA SILVA (OAB 273921/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1056883-09.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 18º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ulisses Simões da Silva, tendo em vista negativa em se proceder ao registro de instrumento particular de venda e compra e financiamento com alienação fiduciária de imóvel matriculado sob o n. 144.916 daquela serventia.

Segundo o Oficial, a negativa foi motivada em respeito ao princípio da continuidade na medida em que, ao tempo da aquisição, os proprietários eram casados sob o regime da comunhão parcial. Entretanto, ao tempo da venda, estavam divorciados, de modo que necessário o registro prévio da partilha dos bens do casal.

Documentos vieram às fls. 08 e seguintes.

A parte suscitada manifestou-se às fls. 43/53 e 127/133, defendendo que inexiste exigência legal para a providência imposta; que ambos os proprietários compareceram ao negócio de venda e compra, com requerimento de averbação da alteração de estado civil; que não há diferença entre a venda feita antes ou depois do divórcio.

O Ministério Público opinou pela procedência (fls. 163/165).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.

Segundo Afrânio de Carvalho, citado pela parte suscitada (fl.129), “o princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia, de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente” (Registro de Imóveis, editora Forense, 4ª edição, p.254).

Em outras palavras, o título que se pretende registrar deve estar em conformidade com o inscrito na matrícula. Para tanto, o titular de domínio necessita ser o mesmo (artigo 195 da Lei n. 6.015/73).

Conclui-se, assim, que os registros necessitam observar um encadeamento subjetivo.

Na presente hipótese, vê-se que Sílvia Camargo da Silva Pereira e Renato Rodrigues Pereira, casados pelo regime da comunhão parcial de bens, adquiriram mencionado imóvel (registro nº 23 da matrícula nº 144.916 – fl.38). Posteriormente, se divorciaram e alienaram a propriedade (fls. 96 e seguintes), mas sem registro prévio da partilha decorrente do divórcio, o que configura situação de mancomunhão.

A matéria já foi objeto de decisão pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“1. Rompida a sociedade conjugal sem a imediata partilha do patrimônio comum, ou como ocorreu na espécie, com um acordo prévio sobre os bens a serem partilhados, verifica-se – apesar da oposição do recorrente quanto a incidência do instituto – a ocorrência de mancomunhão .

2. Nessas circunstâncias, não se fala em metades ideais, pois o que se constara é a existência de verdadeira unidade patrimonial, fechada, e que dá acesso a ambos ex cônjuges à totalidade dos bens” (RESP nº 1.537.107/PR , Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJE. 25.11.2016).

Em outros termos, sem a apresentação da partilha, não há como averiguar se houve divisão igualitária dos bens do casal, continuando o acervo patrimonial em sua totalidade à disposição de ambos os ex-cônjuges. Por isso mesmo, correta a negativa oposta pelo Oficial, com a exigência de registro prévio da partilha dos bens do casal, não sendo suficiente mera averbação de alteração do estado civil.

Em recente decisão proferida pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura, firmou-se entendimento sobre a necessidade de registro prévio da partilha após o fim do casamento para que futuras alienações possam ingressar no fólio: “DÚVIDA – REGISTRO DE IMÓVEIS – Imóvel registrado em nome de casal divorciado, sem registro de partilha – Escritura de doação feita pelo ex-marido na condição de divorciado, pretendendo a doação de sua parte ideal da propriedade à ex-cônjuge – Partilha não registrada – Necessidade de prévia partilha dos bens do casal e seu registro – Comunhão que não se convalida em condomínio tão só pelo divórcio, havendo necessidade de atribuição da propriedade exclusiva, ainda que em partes ideais, a cada um dos ex-cônjuges – Impossibilidade do ex-cônjuge dispor da parte ideal que possivelmente teria após a partilha – Ofensa ao princípio da continuidade – Exigência mantida – Recurso não provido” (APELAÇÃO CÍVEL: 1012042-66.2019.8.26.0562, Relator: Des. Ricardo Mair Anafe, DJ: 14/04/2020).

Em suma, o óbice subsiste a fim de se preservarem os princípios da continuidade e da segurança jurídica que regem os registros públicos.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do 18º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ulisses Simões da Silva e, em consequência, mantenho o óbice registrário.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

São Paulo, 22 de junho de 2021.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 24.06.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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